sábado, 24 de setembro de 2011

Possibilidade de usucapião em face de co-proprietário

A jurisprudência há algum tempo já têm se manifestado sobre a possibilidade de usucapir imóveis condominiais.

Com a separação de fato, ocorre o fim da comunicação patrimonial, situação jurídica prevista desde a lei do divórcio [10] e reconhecida pela doutrina e jurisprudência, independentemente de cautelar de separação de corpos.

Cabe, pois, à doutrina e à jurisprudência interpretar que a regra constante do art. 1683 [11] do Código Civil, na realidade, é uma disposição geral, aplicável, portanto, a todos os regimes de bens, e não apenas ao regime de participação final nos aquestos, sob pena de violação aos princípios e postulados constitucionais, além de ser clara hipótese de descumprimento do princípio que veda o enriquecimento sem causa. A regra deve, pois, ser aplicada aos regimes de comunhão (parcial e universal), não se podendo mais cogitar do ingresso dos bens adquiridos, no período de separação de fato, à massa dos bens comuns do casal. [12]

Com a morte, ocorre, a transmissão imediata do patrimônio, regra trazida no Código Civil em seu art. 1.784, [13] em decorrência do efeito da saisine.

Aplica-se o chamado droit de saisine, originário do direito Frances. Segundo ele, o morto transmite seus bens ao vivo, por conseqüência automática e imediata, independentemente da abertura do inventário. Esta se dá depois, para mera formalização do ato transmissivo. [14]

A lei prevê que o abandono de coisa impõe perda do patrimônio, como dita o art. 1.275 do Código Civil. [15]Podendo, inclusive, ir ao Estado, se tal bem não tiver na posse de outra pessoa, pois, para os fins da lei civil, a não conservação do patrimônio e o inadimplemento das obrigações decorrentes do bem causa a configuração do abandono. [16]

Condomínio é utilização do bem indivisível por mais de uma pessoa, presente nos bens de meação e herança. [17]

Estas conjugações têm sido analisadas e interpretadas sistematicamente, promovendo julgados interessantes sobre o uso exclusivo de bem comum e, pelo lapso temporal, sua aquisição por usucapião.

Não refiro-me, embora haja julgados reconhecendo tal direito, na usucapião de área comum em condomínio edilício, por exemplo, mas, da usucapião da cota parte de herdeiros e meeiros. Neste sentido, são julgados que coadunam com tal posição:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. ÁREA PERTENCENTE A ESPÓLIO DO PAI DO AUTOR. POSSIBILIDADE, DESDE QUE PROVADA A POSSE EXCLUSIVA (PRO SUO), A ELIDIR POR COMPLETO A DOS DEMAIS HERDEIROS. CONTROVÉRSIA QUANTO À SITUAÇÃO DA ÁREA E O CARÁTER DA POSSE. SENTENÇA CASSADA. REMESSA DOS AUTOS À ORIGEM PARA INSTRUÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO (Apelação Cível n. 2006.034085-4, de Turvo. Relator: Des. Victor Ferreira. Dj 18/08/2010).
APELAÇÃO CÍVEL.  USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. SUCESSÃO. POSSE EXCLUSIVA DE HERDEIRO. COMPROVAÇÃO. TRANSMUTAÇÃO DO CARÁTER ORIGINÁRIO DA POSSE. SENTEÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA. Aquisição da propriedade do imóvel por meio de herança. Exercício de posse exclusiva por um dos herdeiros, durante mais de vinte anos, sem intervenção dos demais. Transmutação do caráter da posse, oriunda de transmissão causa mortis, em conjunto com os demais herdeiros, mas cuja utilização, individual, com ânimo de dono, desde longa data, possibilitou a usucapião. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME (Apelação Cível n. 70021247291, rel. Des. Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes, j. 06-8-09).
USUCAPIÃO
E,
USUCAPIÃO
 de parte certa e determinada de condomínio tem o efeito de, nesta medida, individuar a área desapossada como propriedade exclusiva" (STJ, REsp n. 101009/SP, rel. Min. Ari Pargendler, j. 13-10-98).
EXTRAORDINÁRIA. HERDEIRO. AFIRMAÇÃO DO EXERCÍCIO DE POSSE EXCLUSIVA COM ANIMUS DOMINI. VIABILIDADE. ANULAÇÃO DO DECISUM PARA PROSSEGUIMENTO DA ACTIO. RECURSO PROVIDO (Apelação Cível n. 2006.034085-4, Rel. Des. Cesar Abreu, j. 25-6-02).
Em todos julgados, nota-se que, o co-proprietário, decorrente de aquisição de sua cota por herança, por exemplo, que utiliza o bem em sua totalidade, como se seu fosse, adquire o elemento animus domini exigido para aquisição por usucapião e, pode, após, o lapso temporal de lei, pleitear o reconhecimento desta propriedade, pois, há anos, fora tratada como se sua fosse, logo, sua será.

Porém, a jurisprudência, também reconhece que certas situações elidem a figuração do animus domini, em situações correlatas ao tema, como, por exemplo, a existência de um comodato:

Usucapião extraordinário Ação procedente Recurso da contestante objetivando o reconhecimento de posse em condomínio Impossibilidade Existência de comodato verbal, reconhecido em outra demanda judicial Ausência de animus domini Recurso improvido. ?Os comodatários, os depositários e os locatários, justamente por não serem portadores de animus domini, não têm posse ad usucapionem (TJSP. AC 0279862-27.2009.8.26.00. Rel.: Des. Jesus Lofrano. Dj 13/09/2011).

Ou, quando há o uso por um dos herdeiro, ou meeiro, mas, com o pagamento das despesas em concorrência com os demais co-proprietários, desconfigurando, portanto, o abandono.

Usucapião extraordinária. Ausência de comprovação do exercício de posse mansa e pacífica, com animus domini. Imóvel, na realidade, havido por herança da titular do domínio, malgrado nunca aberto o devido inventário. Outra herdeira, contestante, incumbida de pagamento de impostos. Prova oral dividida. Improcedência. Sentença mantida. Recurso desprovido (TJSP. AC 9192302-35.2002.8.6.00. Rel.: Des. Claudio Godoy. Dj 06/09/2011).

A usucapião relacionado à questões de família, portanto, embora não seja prática jurídica usual é juridicamente possível, como visto nos julgados acima, desde que presentes – e comprovados - os elementos exigidos por lei, em especial, o animus domini sobre a integralidade do bem condominial, que desnatura-se com a existência de ações de inventário, fixação de alugueres, comodato, participação no pagamento das despesas, alimentos in natura, divórcio, dissolução de união estável, enfim, medidas que colocam o imóvel á disposição ou em benefício de todos condôminos e, não na exclusividade de apenas um co-proprietário, em relação a todos seus bônus e ônus.
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FREITAS, Douglas Phillips. Usucapião e Direito de Família. Comentários ao art. 1240-a do Código Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3005, 23 set. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20060>. Acesso em: 24 set. 2011.

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