terça-feira, 25 de outubro de 2011

Direito Privado Codificado e Descodificado

Foi o jusracionalismo moderno [51] (séculos XVIII e XIX), através da ideia de sistema, que trouxe ao Direito Privado, a noção de codificação [52], qual seja, a "reunião de normas jurídicas relativas a certo ramo do Direito positivo, de forma metódica e articulada" [53]. Ela nos apresenta virtudes, como a simplificação do Direito, facilitando sua compreensão e aplicação [54]. Todavia, possui também desvantagens, como não possibilitar ao ordenamento acompanhar as mutações sociais, um pretenso (mas impossível) encerramento do Direito e uma restrição do poder do juiz, ao lhe dar parâmetros estritos de subsunção [55].

A opção brasileira, para o Direito Civil, é, sem dúvida, pela codificação, com suas virtudes e seus defeitos. Todavia, o Direito Privado, ainda na Modernidade, sofreu grande desagregação, surgindo novos ramos, podendo-se citar, dentre outros, o Direito do Trabalho, o Direito Previdenciário, o Direito Agrário e o Direito Imobiliário. São ramos jusprivatistas, que possuem legislação específica, fora do Código Civil [56]. Surge a descodificação.

A descodificação é um fenômeno contemporâneo que consiste na fragmentação do sistema unitário do Código Civil, com a proliferação de leis civis especiais que reduzem o primado do Código e criam uma pluralidade de núcleos legislativos, os chamados microssistemas jurídicos. [57]

Na seara civil, existe o Código Civil, que, graças à constitucionalização, não é o centro (papel exercido pela Constituição), mas é o diploma de aplicação prática mais direta e cotidiana. Mas não o único. No Direito Privado, são inúmeras as leis específicas. A descodificação opera de modo que, além do surgimento de novos ramos, surjam leis específicas e microssistemas legislativos.

Microssistemas são diplomas legais, com objeto específico de proteção, semelhantes às codificações, mas que, ao contrário destas, envolvem mais de um ramo do Direito. O exemplo mais notório é o Código de Defesa do Consumidor – Lei n.º 8.078/90 –, que acopla o Direito Civil (ao tratar de prescrição e decadência, responsabilidade e contratos), o Direito Empresarial (ao abordar a desconsideração da personalidade jurídica e as práticas comerciais), o Direito Penal (ao estabelecer infrações penais), o Direito Administrativo (ao tratar das sanções administrativas), dentre outros, em torno de um mesmo objeto de proteção: o consumidor. Outros exemplos importantes são o Estatuto do Idoso – Lei n.º 10.741/03 – e o Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei n.º 8.069/90 –, cujos objetos de proteção são, respectivamente, o idoso e a criança e o adolescente.

É justamente o Código de Defesa do Consumidor que foi o microssistema (portanto, objeto da descodificação) mais importante na Responsabilidade Civil.
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MANASSÉS, Diogo Rodrigues. Reflexos das tendências do Direito Civil na responsabilidade civil: apontamentos para uma nova teoria do Direito dos Danos. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3036, 24 out. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20266>.

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