domingo, 6 de novembro de 2011

Inexistência de direito adquirido de poluir

Em face da semelhança da licença ambiental com a licença administrativa propriamente dita, alguns proprietários chegaram a debater no Poder Judiciário brasileiro a possibilidade de um suposto direito adquirido à inexigibilidade da obrigação de reparar o meio ambiente degradado, seja em razão da omissão continuada da Administração Pública ao longo dos anos, seja porque não seriam eles os autores das eventuais degradações pretéritas.

A jurisprudência pátria, liderada pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça, sedimentou o entendimento segundo o qual "inexiste direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente", assertiva esta fundada, especialmente: (i)na densidade constitucional da função ecológica da propriedade (arts. 170, inc. VI, 186, inc. II, e 225, da CF); (ii) na garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações (art. 225, caput, da CF); e (iii) na indisponibilidade do bem ambiental. Confira-se:
PROCESSUAL CIVIL E AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. INCIDÊNCIA, POR ANALOGIA, DA SÚMULA 282 DO STF.FUNÇÃO SOCIAL E FUNÇÃO ECOLÓGICA DA PROPRIEDADE E DA POSSE.ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVA LEGAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA PELO DANO AMBIENTAL. OBRIGAÇÃO PROPTER REM.DIREITO ADQUIRIDO DE POLUIR. 1. A falta de prequestionamento da matéria submetida a exame do STJ, por meio de Recurso Especial, impede seu conhecimento. Incidência, por analogia, da Súmula 282/STF. 2.Inexiste direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente.O tempo é incapaz de curar ilegalidades ambientais de natureza permanente, pois parte dos sujeitos tutelados – as gerações futuras – carece de voz e de representantes que falem ou se omitam em seu nome.3.Décadas de uso ilícito da propriedade rural não dão salvo-conduto ao proprietário ou posseiro para a continuidade de atos proibidos ou tornam legais práticas vedadas pelo legislador, sobretudo no âmbito de direitos indisponíveis, que a todos aproveita, inclusive às gerações futuras, como é o caso da proteção do meio ambiente.4. As APPs e a Reserva Legal justificam-se onde há vegetação nativa remanescente, mas com maior razão onde, em conseqüência de desmatamento ilegal, a flora local já não existe, embora devesse existir. 5. Os deveres associados às APPs e à Reserva Legal têm natureza de obrigação propter rem, isto é, aderem ao título de domínio ou posse. Precedentes do STJ. 6. Descabe falar em culpa ou nexo causal, como fatores determinantes do dever de recuperar a vegetação nativa e averbar a Reserva Legal por parte do proprietário ou possuidor, antigo ou novo, mesmo se o imóvel já estava desmatado quando de sua aquisição. Sendo a hipótese de obrigação propter rem, desarrazoado perquirir quem causou o dano ambiental in casu, se o atual proprietário ou os anteriores, ou a culpabilidade de quem o fez ou deixou de fazer. Precedentes do STJ. 7. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.[grifonosso] [09]
Observa-se que, tanto o poluidor que não possui licença ambiental alguma, como o que a possui, mas exorbita dos seus limites, não pode postular direito adquirido à manutenção da atividade poluidora. Isto porque, na medida em que descumpridas as condicionantes da licença exigida, a conduta é reputada como ilícita – e, consequentemente, contrária à norma do art. 225 da CF. Nessa situação, o direito adquirido é inoponível contra a própria Constituição. [10]

PEREIRA, André Luiz Berro. Licenciamento ambiental e direito adquirido. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3048, 5 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20360>.

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