domingo, 11 de dezembro de 2011

A aproximação entre o controle difuso de constitucionalidade e o controle concentrado

A aproximação entre o controle difuso e o controle concentrado de constitucionalidade tem sido objeto de análise por parte da doutrina.

Fredie Didier Júnior [01] cita algumas alterações implementadas na jurisprudência e na legislação brasileiras que sinalizam a tendência de aproximação:
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O STF, no julgamento do RE 197.917/SP (publicado no DJU de 27.02.2004) interpretou a cláusula de proporcionalidade prevista no inciso IV do art. 29 da CF/88,que cuida da fixação do número de vereadores de cada município. O TSE, diante deste julgamento, conferindo-lhe eficácia erga omnes (note-se que se trata de um julgamento em recurso extraordinário, controle difuso, pois), editou a Resolução n. 21.702/2004, na qual adotou o posicionamento do STF. Essa Resolução foi alvo de duas ações diretas de inconstitucionalidade (3.345 e 3.365, rel. Min. Celso de Mello), que foram rejeitadas, sob o argumento de que o TSE, ao expandir a interpretação constitucional definitiva dada pelo STF, "guardião da Constituição", submeteu-se ao princípio da força normativa da Constituição. Aqui, mais uma vez, aparece o fenômeno ora comentado: uma decisão proferida pelo STF em controle difuso passa a ter eficácia erga omnes, tendo sido causa de edição de uma Resolução do TSE (norma geral) sobre a matéria.
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O Min. Gilmar Mendes [02], contesta a necessidade de o Senado Federal suspender a execução da lei, em caso de declaração da inconstitucionalidade da mesma pelo STF, em sede de controle difuso. Segundo o Ministro, vem ocorrendo típico caso de mutação constitucional:
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Como se vê, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle incidental acabam por ter eficácia que transcende o âmbito da decisão, o que indica que a própria Corte vem fazendo uma releitura do texto constante do art. 52, X, da Constituição de 1988, que, como já observado reproduz disposição estabelecida, inicialmente, na Constituição de 1934 (art. 91, IV) e repetida nos textos de 1946 (art. 64) e de 1967/69 (art. 42, VIII).
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Somente essa nova compreensão parece apta a explicar o fato de o Tribunal ter passado a reconhecer efeitos gerais à decisão proferida em sede de controle incidental, independentemente da intervenção do Senado. O mesmo há de se dizer das várias decisões legislativas que reconhecem efeito transcendente às decisões do STF tomadas em sede de controle difuso.
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Também Dirley da Cunha Júnior [03] ressalta a eficácia geral das decisões do STF proferidas em controle difuso:
Cumpre realçar, outrossim, que o próprio STF, em determinadas situações, vem reconhecendo a eficácia geral de suas decisões de inconstitucionalidade, prolatadas em controle difuso, mesmo sem a intervenção do Senado. Foi o que ocorreu quando a Corte interpretou a regra da reserva do plenário prevista no art. 97 da Constituição de 1988, para, excepcionando-a, admitir a declaração de inconstitucionalidade pelos órgãos fracionários (Câmaras ou Turmas) dos Tribunais nas hipóteses em que o próprio Supremo já havia declarado a inconstitucionalidade da mesma lei, não se alvitrando se tal decisão foi proferida em controle concentrado ou difuso. Esse entendimento do Supremo tornou-se tão pacífico que a Lei 9.756/98 incluiu o parágrafo único ao art. 481 do Código de Processo Civil [...]
O Supremo Tribunal Federal reconheceu a existência dos efeitos transcendentes das decisões prolatadas no âmbito do controle difuso, o que significa dizer que além do dispositivo, também os fundamentos da decisão terão efeitos transcendentes a fim de impedir a violação ao conteúdo essencial do acórdão.
Nesse sentido, citamos as lições de Marcelo Araújo e Luciano Barros [04]:
Em um dado caso concreto, discutido na Reclamação 1.987/DF, o relator Ministro Maurício Corrêa identificou violação, por Tribunal inferior, da autoridade da decisão proferida anteriormente pelo Excelso Pretório em sede de ADIn, reconhecendo a essa decisão efeitos transcendentes à parte dispositiva. Entendeu o STF que o conteúdo essencial do acórdão (e não apenas da parte dispositiva) proferido na mencionada ação direta continha eficácia erga omnes e efeito vinculante, tendo sido o referido conteúdo desrespeitado pelo Tribunal inferior. Na ocasião, o Ministro Maurício Corrêa expressamente asseverou que os "fundamentos resultantes da interpretação da Constituição devem ser observados por todos os tribunais e autoridades, contexto que contribui para a preservação e desenvolvimento da ordem constitucional."
Nota-se, paulatinamente, uma tendência de aproximação entre o sistema difuso e o concentrado de constitucionalidade, na medida em que, no sistema difuso, os efeitos não poderiam ser transcendentes, exatamente porque a eficácia da decisão é apenas inter partes. Então, se se dão efeitos transcendentes às decisões no sistema difuso, realçam-se as duas espécies de decisões: (a) decisões sobre a constitucionalidade/inconstitucionalidade que impactam apenas o próprio processo e (b) decisões sobre a constitucionalidade/inconstitucionalidade de atos que podem gerar a chamada "repercussão geral", ocasião em que poderia ser reconhecido o efeito transcendente. Assim, conclui-se, de passagem, que o próprio Excelso Pretório, antes mesmo da inovação trazida a lume pela EC/45, consubstanciada no §3º do art. 102, já tratava diferenciadamente os julgamentos no controle difuso que continham uma "repercussão geral".

Dessa forma, far-se-á o estudo da aproximação dos modelos de controle de constitucionalidade adotados no sistema brasileiro (difuso em relação ao concentrado), de forma a averiguar quais os efeitos produzidos pela adoção de institutos típicos do controle concentrado na via do controle difuso, de acordo com a doutrina e a jurisprudência existentes.

ROSA, Michele Franco Rosa . A abstrativização do controle difuso de constitucionalidade . Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3082, 9 dez. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20586>.

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