sábado, 18 de fevereiro de 2012

Aula sobre A INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO - Estudo de caso - Caso 1

Caso 1: Em execução por título extrajudicial, foram penhorados os seguintes bens de determinado devedor: televisão, freezer, microondas, máquina de lavar e teclado musical. O executado opôs embargos do devedor e alegou, preliminarmente, ter havido nulidade dos bens penhorados para garantir a execução, haja vista que os objetos penhorados são protegidos pela Lei 8.009/90. Após resposta do embargado, o magistrado considerou que, entre os bens penhorados, apenas a televisão poderia ser considerada bem de família e determinou que a execução deveria prosseguir, tendo o executado de nomear bem para substituir a televisão. A questão chegou ao STJ onde foi proferido o seguinte acórdão:
PROCESSUAL CIVIL. LEI 8.009/90. BEM DE FAMÍLIA. HERMENÊUTICA. FREEZER, MÁQUINA DE LAVAR E SECAR ROUPAS E MICROONDAS. IMPENHORABILIDADE. TECLADO MUSICAL. ESCOPOS POLÍTICO E SOCIAL DO PROCESSO. HERMENÊUTICA. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO. I - Não obstante noticiem os autos não ser ele utilizado como atividade profissional, mas apenas como instrumento de aprendizagem de uma das filhas do executado, parece-me mais razoável que, em uma sociedade marcadamente violenta como a atual, seja valorizada a conduta dos que se dedicam aos instrumentos musicais, sobretudo quando sem o objetivo do lucro, por tudo que a música representa, notadamente em um lar e na formação dos filhos, a dispensar maiores considerações. Ademais, não seria um mero teclado musical que iria contribuir para o equilíbrio das finanças de um banco. O processo, como cediço, não tem escopo apenas jurídico, mas também político (no seu sentido mais alto) e social. (grifei). II - A Lei 8.009/90, ao dispor que são impenhoráveis os equipamentos que guarnecem a residência, inclusive móveis, não abarca tão-somente os indispensáveis à moradia, mas também aqueles que usualmente a integram e que não se qualificam como objetos de luxo ou adorno. III - Ao juiz, em sua função de intérprete e aplicador da lei, em atenção aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, como admiravelmente adverte o art. 5º, LICC, incumbe dar exegese construtiva e valorativa, que se afeiçoe aos seus fins teleológicos, sabido que ela deve refletir não só os valores que a inspiraram, mas também as transformações culturais e sócio-políticas da sociedade a que se destina. (REsp 218.882/SP, Recurso Especial 1999/0051658-3, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira (1088), STJ, 4ª Turma, j. 02.9.1999, DJ 25.10.1999, p. 92).

Problema: Há quem argumente que decisões como essa incentivam a inadimplência de grande parcela da população (aqueles que não possuem carro em nome próprio, “bens de luxo”, mais de um imóvel, etc.). Portanto, é importante indagar até que ponto é válido deixar a critério do magistrado decidir em cada caso concreto o que é ou não bem de família (art. 1º, parágrafo único da Lei 8.009/90).
Seria mais conveniente um rol taxativo? Existe segurança jurídica para os envolvidos em casos como esse? É possível afirmar que a decisão, ao dar uma interpretação extensiva aos benefícios da Lei 8.009/90, realmente atende aos escopos sociais e políticos do processo? (Considere-se que, algumas vezes, o exeqüente pode estar em situação econômica ainda mais precária que o executado).


Fonte: Apostila da FGV - Teoria Geral do Processo - Autor: Rodrigo Pereira Martins Ribeiro

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