segunda-feira, 19 de março de 2012

Revisitando a suspeição entre juiz e advogado

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O objetivo da declaração de suspeição é dar à parte o direito a um julgamento imparcial. A amizade próxima do juiz com o advogado da parte contrária, sem dúvida, desperta dúvidas ao adversário sobre a neutralidade necessária. E esta imparcialidade não deve apenas existir, é preciso que pareça existir.

Exagero? Não, por certo. A ninguém agradaria em uma audiência ver o advogado da parte contrária tratando o juiz pelo nome, com uma informalidade própria dos íntimos. Mesmo que o magistrado seja o símbolo nacional da retidão, a parte contrária e seu advogado ficarão desconfiados.

Nestas relações profissionais o juiz caminha em terreno perigoso. Não pode fechar-se a tudo e a todos, porque sua conduta será tida como arrogante, nem deve ser o campeão da popularidade, distribuindo abraços e dando ruidosas gargalhadas. Uma cordialidade discreta e serena, a todos dando atenção, mas economizando gestos e palavras, evitará suposições sobre sua imparcialidade e eventuais problemas decorrentes.

Nos centros menores a situação é mais complexa. Não ir a lugar algum e não aceitar nenhum convite é psicologicamente negativo. Ademais, o juiz precisa do convívio para saber como se conduz a sociedade e julgar melhor. Mas, se todo fim de semana participar de pescarias com o mesmo advogado, em convívio exclusivo, pessoal, certamente suscitará a suposição de favorecimento nas causas do amigo. Hoje, com a evolução tecnológica, poderá ver-se um dia envolvido em uma exceção de suspeição, com base no art. 135, inc. V (interesse no julgamento a favor de uma das partes), na qual se junte uma foto de ambos comemorando algo, informalmente.

Nos grandes centros a cobrança da sociedade é menor. A participação esportiva (v.g., jogar futebol), em confrarias, grupos de interesse, é altamente positiva. E nisto não há problema algum. Mas um juiz da única Vara de Família sair em viagem com o advogado do maior escritório da área na cidade, é permitir que alguém invoque sua suspeição e isto, independentemente do resultado, lhe dará muitos incômodos.
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Vladimir Passos de Freitas é desembargador federal aposentado do TRF 4ª Região, onde foi presidente, e professor doutor de Direito Ambiental da PUC-PR.http://www.conjur.com.br/

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