terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Reconhecimento de pais biológicos anula o de adotivos

A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça determinou que filha pode fazer investigação para ter seus pais biológicos reconhecidos juridicamente, com todas as consequências legais, anulando o registro de nascimento em que constavam pais adotivos como legítimos.

O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, entendeu que deve prevalecer a “paternidade socioafetiva” sobre a biológica para garantir o melhor interesse dos filhos. Mas isso pode ser relativizado se é o próprio filho quem se interessa no reconhecimento jurídico de seus pais biológicos. A decisão foi unânime.

A decisão do ministro, no caso, é que, embora a autora da ação investigatória tenha sido acolhida em lar adotivo e viveu bem com pais adotivos durante anos, nada lhe tira o direito de investigar sua verdadeira paternidade.

À brasileira
O caso envolve a chamada “adoção à brasileira”, na qual pais adotivos, em vez de registrar a adoção, simplesmente registraram a filha como sua em cartório. Já adulta, a filha entrou com ação na Justiça para que seus pais fossem reconhecidos juridicamente, com todas as consequências legais e jurídicas envolvidas. O primeiro grau concedeu o pedido, mas não mexeu no registro de nascimento, como também foi pedido.
(...)
Leia a integra em http://www.conjur.com.br/2012-dez-28/reconhecimento-pais-biologicos-anula-pais-adotivos-decide-stj

Ônus da prova é do consumidor que alega dano

Quem deve comprovar o dano moral causado por produto defeituoso e o nexo de causalidade entre o dano e a compra é o autor da ação, não o réu. Foi o que decidiu a 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, ao negar pedido de indenização a mulher que acusava fabricante de prótese de silicone por seus problemas de saúde.

O caso é o de uma mulher que implantou próteses de silicone nos seios em 1988 e percebeu defeito nos implantes. Alegou que os problemas lhe afetaram a saúde e a aparência. Também disse que fez “vários exames” que constataram o defeito e apresentou laudo médico de 2005 comprovando suas alegações.
Só que o TJ afirmou que ela não apresentou provas de que a prótese fora fabricada pela empresa Dow Corning, ré no processo. Seriam necessários nota fiscal ou boleto do cartão de crédito, por exemplo, segundo os desembargadores.

No entendimento do relator, desembargador Jorge Alberto Schreiner Pestana, o Código de Defesa do Consumidor afirma que o ônus de comprovar é de quem alega o dano, e não o contrário. E nem que o ônus da prova fosse invertido, continuou, pois isso não ajudaria em nada o caso: impossível exigir que a fabricante comprove que não fabricou a tal prótese. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-RS.
Revista Consultor Jurídico, 28 de dezembro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-dez-28/onus-prova-consumidor-alega-dano-nao-reu-tj-rs

Terceiro pode ser responsabilizado por quebra de contrato

Mesmo que não seja parte em contrato, terceiro pode ser responsabilizado por sua quebra se interferir na relação contratual. O entendimento é da 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo. A notícia é do jornal Valor Econômico.

O colegiado julgou um recurso interposto pela empresa Ipiranga, que ajuizou ação contra postos de gasolina por quebra de contrato de exclusividade no fornecimento de combustível. A Ipiranga acusou também como responsável a empresa Aspen, distribuidora de combustíveis, pedindo o pagamento de danos materiais e morais e o impedimento da venda de combustível aos postos com a bandeira Ipiranga.

Na primeira instância, o caso foi julgado pelo juiz Helmer Augusto Amaral, da 8ª Vara Cível de São Paulo. Ele afirmou que a Aspen não podia ser parte no processo, mas somente os postos que descumpriram o contrato.

Já no TJ-SP, o caso foi relatado pelo desembargador Francisco Loureiro, que aceitou a responsabilidade da Aspen pelo descumprimento do contrato. Loureiro determinou que o processo retorne à primeira instância, para ser julgado novamente. A Ipiranga pede que o valor dos danos materiais seja auferido com base em seu próprio faturamento.

O advogado da Ipiranga, Arystóbulo de Oliveira Freitas, declarou que a venda de combustível a postos que detêm contrato de exclusividade carcteriza concorrência desleal e propaganda enganosa, pois faz com que o consumidor acredite que o combustível comprado é de uma companhia, quando, na verdade, foi produzido por outra. Freitas também afirma que o problema vem ocorrendo há anos, e alguns dos postos que quebraram o contrato não estão mais abertos.

O advogado da Aspen, Vladimir Santana, informou por meio de nota que não é comum à empresa ser demandada em processos judiciais, e que a Aspen está tranquila em relação às “alegações infundadas”, pois cumpre rigorosamente os contratos e normas da Agência Nacional de Petróleo.
Revista Consultor Jurídico, 28 de dezembro de 2012
http://www.conjur.com.br/2012-dez-28/terceiro-responsabilizado-quebra-contrato-tj-sp

TJ-RS não reconhece serviço prestado por amante e nega indenização

‘Serviços prestados’’ em relações afetivas não são indenizáveis, tendo em vista que se caracterizam pelo carinho, solidariedade, atenção e cuidados recíprocos. Com este entendimento, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que não só negou o reconhecimento de união estável entre um homem casado e sua amante, como indeferiu a ela o pedido de indenização de, no mínimo, R$ 200 mil.

O entendimento unânime, nos dois graus de jurisdição, foi a de que a relação havida entra as partes configurou concubinato adulterino, aos efeitos do artigo 1.721 do Código Civil, tanto que foi negado até o pedido de alimentos. O acórdão é do dia 12 de dezembro. O processo tramita sob segredo de Justiça.

Dedicação não é indenizável
O pedido de reconhecimento de sociedade de fato, cumulada com partilha de patrimônio comum ou indenização, movida contra a sucessão do ‘‘companheiro’’, foi julgado improcedente pelo juízo da Comarca de Alegrete. A juíza Caren Letícia Castro Pereira entendeu que a relação havida não levou à constituição de unidade familiar, assim como não houve prova de que ambos amealharam algum patrimônio enquanto durou a relação — 18 anos.

O relator da Apelação no TJ-RS, desembargador Jorge Luís Dall’Agnol negou provimento ao apelo, agregando que o princípio da monogamia não admite a coexistência de casamento e união estável ou mesmo de dois casamentos ou duas uniões estáveis. Na sua visão, não ficou provada a existência de uma ‘‘comunhão de vida e interesses’’, ao citar expressão do jurista Sílvio de Salvo Venosa.

Comprovar a relação marital não seria tarefa árdua, destacou, se de fato tivessem vivido como se casados fossem. A convivência estaria caracterizada pela publicidade, continuidade, durabilidade e objetivo de constituição de família, conforme o artigo 1.723 do Código Civil.

Em apoio às razões de decidir, o desembargador-relator citou o parecer do representante do Ministério Público estadual com assento no colegiado, procurador Luiz Cláudio Varela Coelho. No ponto em que discorre sobre o pretenso direito à indenização por ‘‘serviços prestados’’, disse: ‘‘Além disso, não se pode atribuir valor monetário aos sentimentos que as pessoas têm entre si. Se assim fosse possível, o falecido (...) também possuiria créditos em relação à apelante, por ter-lhe dispensado cuidados, carinho e atenção durante o período em que mantiveram a relação concubinária’’.

Clique aqui para ler o acórdão.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 28 de dezembro de 2012

Analfabetismo não é argumento para anular empréstimo

A 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul aceitou Apelação do Banco Bradesco e restabeleceu a validade jurídica de contrato entabulado com um analfabeto que se considerou ludibriado ao contrair empréstimo consignado. O colegiado se convenceu, ao contrário do juízo de primeiro grau, de que a instituição financeira não se aproveitou da vulnerabilidade do consumidor. O acórdão foi proferido na sessão de julgamento ocorrida dia 13 de dezembro.

Na Comarca de Porto Alegre, o aposentado ajuizou Ação Anulatória de Negócio Jurídico em desfavor do Bradesco. Ele disse que foi coagido a contrair empréstimo e que não conhecia todas as cláusulas do contrato, pois sequer sabe ler — o que evidenciaria vício de consentimento.

A instituição financeira se defendeu. Afirmou que o autor estava acompanhado de pessoa letrada e de sua confiança, que, inclusive, assinou o contrato. O banco garantiu que a contratação foi realizada mediante a entrega de toda documentação necessária. Logo, não houve coação, tampouco ludibrio.
(...)
Leia a íntegra em http://www.conjur.com.br/2012-dez-30/analfabetismo-nao-argumento-anular-contrato-emprestimo

União estável deve ser equiparada a casamento


A união estável gera os mesmos direitos sucessórios que o casamento. Entender diferentemente é retrocesso e traduz ranço preconceituoso da sociedade, que deve ser superado com discussão. O entendimento é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que votou pela inconstitucionalidade do artigo 1790 do Código Civil. Os desembargadores remeteram para o Órgão Especial o processo em que a companheira do falecido pediu os direitos sobre um imóvel.

Segundo a relatora do caso, desembargadora Claudia Telles, o citado artigo é vago em suas definições, determinando que o parceiro só fará parte da sucessão dos bens do cônjuge falecido “quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, excluindo, portanto, bens particulares”.

“Ocorre que o inciso III do dispositivo em questão não faz a mesma restrição contida no caput, referindo-se apenas ao termo “herança” para estabelecer que na concorrência com outros parentes sucessíveis que não os descendentes, a companheira terá direito a um terço da herança”, examinou Telles. Ela ressaltou que a norma contradiz os artigos 1844 e 1849, também do Código Civil, que garantem direitos sucessórios sobre todos os bens do companheiro.

“A despeito de se traduzir em solução mais justa, a interpretação dos incisos de forma independente do caput não encontra amparo técnico, eis que por regra basilar de hermenêutica jurídica os incisos devem ser lidos em consonância com seu caput”, afirmou. “Logo, inquestionável que a distinção feita pela legislação civil traduz ranço preconceituoso ainda conservado por parte da sociedade e que deve ser superado com a discussão aprofundada da questão, levando-se em conta as transformações sociais e culturais que envolvem a evolução do tema”, analisou. Segundo a desembargadora, “dúvida não há de que a desigualdade entre o companheiro e a pessoa casada e, em determinadas hipóteses, a inferioridade de direitos conferidos àquele, representa inaceitável violação ao princípio da vedação do retrocesso”.
Agravo de Instrumento 0019097-98.2011.8.19.0000
Felipe Vilasanchez é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 31 de dezembro de 2012

A presunção de paternidade na união estável

O artigo 1.597, incisos I ao V, do Código Civil de 2002, previu 05 (cinco) hipóteses de presunção de paternidade dos filhos concebidos na constância do casamento. Este dispositivo é o que a doutrina chama de presunção pater is est. Para melhor entendimento, vale transcrever sua redação:
Art. 1.597. Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos:
I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;
II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.
O dispositivo em testilha, ante sua objetividade textual, não traz maiores questionamentos. De outro lado, peca por dizer menos do que deveria, ao menos sob o viés constitucional de proteção à família e à criança.
Quer-se dizer que, ao fazer referência expressa à presunção de filiação durante a constância do casamento, o legislador perdeu a oportunidade de garantir idêntica proteção aos filhos nascidos durante a constância de uma união estável. Desta forma, há aparente tratamento desigual em situações iguais. Diz-se aparente porque, numa interpretação do dispositivo em comento, sob filtragem constitucional, a presunção deve incidir em ambas as situações, sob pena de cometer-se odiosa injustiça.
Basta a análise do seguinte exemplo para se enxergar a necessidade da aplicação do artigo 1.597 do Código Civil às uniões estáveis. Imagine-se que uma mulher viveu em união estável - comprovada por escritura pública lavrada no tabelionato de notas -  por dez anos com seu companheiro, o qual faleceu e deixou três filhos em comum. Dos três filhos, dois foram reconhecidos e registrados sob a paternidade do finado. O mais novo, porém, nascido um dia antes do falecimento do pai, não teve sua paternidade registrada. Se esta mulher fosse casada com o falecido, quanto a paternidade não haveria maiores problemas, pois, por influxo de expressa disposição legal, o fato se adequaria à hipótese normativa abstratamente prevista. Todavia, como no exemplo dado a mulher não mantinha vínculo matrimonial com o falecido, poderia ser sustentado que diante da falta de previsão legal seria necessário o ajuizamento de ação de investigação de paternidade post mortem. Entretanto, como adiante se verá, esta não é a solução adequada.
A Constituição da República de 1988 conferiu tratamento ímpar à família e, expressamente, elegeu a união estável à condição de entidade familiar, senão, veja-se:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
§ 1º - O casamento é civil e gratuita a celebração.
§ 2º - O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
§ 3º - Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
A leitura do dispositivo acima conduz o intérprete à conclusão de que o casamento e a união estável devem receber idêntica proteção estatal. E a conclusão não poderia ser distinta, uma vez que ambos são espécies do gênero instituição familiar. Tamanha é a importância da união estável que o legislador constituinte, prevendo a possibilidade do intérprete fazer distinções de tratamentos irrazoáveis entre o casamento e a união estável, previu explicitamente em relação a esta a proteção do Estado.
Veja que a previsão contida no § 3º em relação à proteção estatal da união estável não se repetiu em relação ao casamento, embora pareça óbvio que o casamento indiscutivelmente receberá a proteção do Estado. Pensamos que ao legislador constituinte pareceu que a obviedade da proteção conferida ao casamento poderia não se repetir quando do trato da união estável. Por isso, com o fim de não deixar margens às dúvidas, foi expresso e claro.
A proteção à família insculpida no texto constitucional vai ao encontro da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Observe-se que somente haverá dignidade se todas as formas de arranjos familiares forem reconhecidos e protegidos pelo Estado. O princípio da dignidade da pessoa humana, portanto, abre o conceito de família(s).
Sem a pretensão de adentrar nos diversos arranjos familiares (socioafetivo, homoafetivo, monoparental, anaparental, pluriparental etc), que não são o enfoque desta breve análise, vamos nos delimitar à união estável formada entre homem e mulher. A união estável é definida pelo artigo 1.723 do Código Civil nos seguintes moldes:
Art. 1.723. É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família.
Deflagra-se da norma acima que a união estável, sob o prisma sociológico, identifica-se com o casamento. Ora, se o cotidiano da nossa sociedade demonstra que no plano fático a união se equipara ao casamento, posto que é configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família, não cabe ao legislador, muito menos ao exegeta, negar esta realidade.
Não cabe ao intérprete negar aquilo que o legislador constituinte expressamente determinou, ou seja, a proteção tanto do casamento quanto da união estável.
Importante considerar que não é a formalidade do casamento que faz presumir filiação, mas sim a situação fática, a coabitação do casal. Tanto é verdade que a presunção de filiação permanece intacta ainda que o casamento venha a ser declarado nulo ou se trate de casamento putativo.
Art. 1.561. Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.
§ 1o Se um dos cônjuges estava de boa-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só a ele e aos filhos aproveitarão.
§ 2o Se ambos os cônjuges estavam de má-fé ao celebrar o casamento, os seus efeitos civis só aos filhos aproveitarão.
E se o legislador optou por dar maior proteção à situação fática no casamento, mesmo raciocínio deve ser empregado em relação à união estável. É por isso que onde houver a mesma razão, aplica-se o mesmo direito. Portanto, se há a presunção legal da paternidade no casamento, não há motivos para que esta regra não incida sobre a união estável.
Ao discorrer sobre a possibilidade de presunção legal de paternidade na união estável, leciona Paulo Luiz Netto Lôbo que:
Ainda que o artigo sob comento refira-se à "constância do casamento", a presunção de filiação, paternidade e maternidade aplica-se integralmente à união estável. A redação originária do projeto do Código Civil de 2002 reproduziu a equivalente do Código de 1916, que apenas contemplava a família constituída pelo casamento e a filiação legítima, não tendo sido feita a atualização pelo Congresso Nacional ao disposto no art. 226 da Constituição Federal (AZEVEDO, Álvaro Villaça (coordenador). Código Civil Comentado: Direito de Família, Relações de Parentesco, Direito Patrimonial – artigos 1.591 a 1.693. 15 v. São Paulo: Atlas, 2003. p.59).
A análise de Paulo Lôbo sobre a origem do texto legal denota que o legislador infraconstitucional, ainda apegado aos vetustos valores da nossa sociedade passada, não trouxe ao Código Civil a roupagem constitucional merecida. Aliás, diga-se de passagem, há inúmeros dispositivos espraiados no dito código que certamente serão alterados por projetos de leis que tramitam no Congresso Nacional, com o escopo de adequa-lo à nossa realidade.
É preciso fazer uma interpretação da lei conforme a Constituição da República.
Mais grave ainda do que deixar a união estável desguarnecida, a interpretação que nega a presunção legal da paternidade à união estável deixa desprotegida a criança fruto deste relacionamento.
Não há a menor dúvida de que a ratio do artigo 1.597 do Código Civil não é a proteção ao casamento, mas sim à prole. O objetivo é garantir que esta criança não fique sem um pai reconhecido e que este reconhecimento de paternidade seja feito sem burocracia e questionamentos. A paternidade é relativamente presumida. Relativa porque admite prova em contrário, que deverá ser produzida por quem alegar estado contrário à presunção legal.
Perceba-se que o foco legal é justamente evitar que a criança, que foi concebida durante o período de convivência entre seus genitores, seja submetida a um longo e tormentoso processo judicial de investigação de paternidade.
Do mesmo modo que a união estável, a proteção à criança tem status constitucional e cabe à família, à sociedade e ao Estado efetivar esta proteção com prioridade absoluta.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Atento a questão que aqui discutimos, o Superior Tribunal de Justiça publicou recentemente acórdão enfrentando esta matéria. No caso concreto, reconheceu a presunção da paternidade de prole concebida na constância de união estável.
DIREITO CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. PRESUNÇÃO DE CONCEPÇÃO DE FILHOS. A presunção de concepção dos filhos na constância do casamento prevista no art. 1.597, II, do CC se estende à união estável. Para a identificação da união estável como entidade familiar, exige-se a convivência pública, contínua e duradoura estabelecida com o objetivo de constituição de família com atenção aos deveres de lealdade, respeito, assistência, de guarda, sustento e educação dos filhos em comum. O art. 1.597, II, do CC dispõe que os filhos nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal presumem-se concebidos na constância do casamento. Assim, admitida pelo ordenamento jurídico pátrio (art. 1.723 do CC), inclusive pela CF (art. 226, § 3º), a união estável e reconhecendo-se nela a existência de entidade familiar, aplicam-se as disposições contidas no art. 1.597, II, do CC ao regime de união estável. Precedentes citados do STF: ADPF 132-RJ, DJe 14/10/2011; do STJ: REsp 1.263.015-RN, DJe 26/6/2012, e REsp 646.259-RS, DJe 24/8/2010. REsp 1.194.059-SP, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 6/11/2012.
Por fim, é importante lembrar que para que haja a presunção da paternidade e o registro do nascimento independentemente do ajuizamento da ação de investigação de paternidade, imprescindível que haja prova pré-constituída da união estável, sob pena do ordenamento deixar margens ao cometimento de fraudes.

MIRANDA, Rafael de Souza. A presunção de paternidade na união estável. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3443, 4 dez. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23155>. Acesso em: 1 jan. 2013.

Liberdade afetiva parental

O abandono afetivo parental põe frente a frente duas situações: de um lado a liberdade parental, de outro, a solidariedade familiar e a integridade psíquica dos filhos.
A liberdade parental divide-se em duas subespécies: I- uma de caráter objetivo, que engloba os direitos e deveres parentais, dos quais não se pode eximir sob pena de, no campo material, sofrer ação de alimentos, e no, extrapatrimonial, ser destituído do poder familiar; b) outra de caráter subjetivo, que consiste na liberdade afetiva, isto é, no desejo inconsciente de dar afeto aos filhos.
Dado o enorme caráter subjetivo da liberdade afetiva parental ela não pode ser imposta, exigida ou obrigada, não se tratando, portanto, de dever, mas sim de uma opção, até mesmo inconsciente, do pai/mãe de sentir ou não carinho por seu filho, e, assim, lhe dar afeto[9].
Os pais têm a obrigação natural (ou moral) de amar seus filhos. E como obrigação natural, seu adimplemento não pode ser exigido em juízo. Essa obrigação encaixa-se numa zona intermediária[10] e, guardadas as proporções, assemelha-se, por exemplo, à obrigação natural pelo adimplemento de dívida de jogo, em que o credor não pode exigir, judicialmente, o pagamento do débito. Isso porque a obrigação jaz no campo da Moral e não do Direito.
De outro lado, a própria lei civil diz que “o pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia” (CC, art. 1.589). Claramente, o legislador, respeitando os limites da autonomia da esfera privada humana, não obriga o pai ou a mãe (sem a guarda) a ser presente na vida dos filhos, embora em outros dispositivos obriguem-nos à manutenção material da prole (alimentos).
Os defensores do caráter ilícito e, portanto, ressarcível do abandono afetivo parental, trazem à baila a redação do art. 227 da Constituição Federal que diz:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
A Constituição Federal brasileira não regula a família dentro de moldes petrificados por antigas práticas, numa reprodução secular de estruturas familiares impostas pela tradição (família patriarcal e matrimonializada). O constituinte, como lhe competia, foi muito pragmático e auscultando a realidade social ao redor (costumes, anseios e práticas cotidianas) expandiu o raio de abrangência da família do determinismo biológico para o eixo afetivo.
E é sobre essa base axiológica que há o reconhecimento e a proteção estatais da comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes (CF, art. 226, § 4º - família monoparental). Ou seja, para termos uma família não é necessário casamento, filhos biológicos ou a presença conjunta do pai e da mãe. Portanto, o filho sob a guarda da mãe ou do pai, constitui uma família monoparental com todos os deveres, direitos e proteção das outras formas de entidades familiares contempladas pela Constituição. Daí porque as disposições contidas no art. 227 da CF não servem, por si sós, para censurar eventual conduta omissiva, do ponto de vista afetivo, do pai ou da mãe sem a guarda do filho.

RODRIGUES, João Gaspar. Abandono afetivo parental versus teoria do Estado. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3464, 25 dez. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23304>. Acesso em: 1 jan. 2013.

A responsabilidade civil no Direito de Família

Introdução

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral (Art. 186, Código Civil), terá que indenizar.
As relações familiares não tem cunho contratual, portanto qualquer discussão direta sobre a responsabilidade civil oriunda de uma relação institucional dever ser verificada com muito vagar.
Tanto isto é verdade, que os Tribunais brasileiros por várias décadas se mostraram acanhados em tomar decisões a este respeito.
Somente há pouco mais de uma década começaram a surgir tímidas decisões embasadas unicamente na doutrina, pois a legislação somente terá interesse em abordar o tema após inúmeras solicitações por parte da sociedade, ou seja, sem demanda não haverá razão para se estabelecer uma norma específica e, aqui, a importância de se discutir as principais incidências sobre o tema.

1.Responsabilidade Jurídica nas relações familiares

A responsabilidade do infrator pode ser administrativa, criminal ou cível.
Quanto às relações conjugais não há no Brasil sanções administrativas, restando estas somente em relação aos filhos, tal como descrito nos artigos 245 usque 248-B do Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/1990.
Criminalmente o Brasil redigiu em seu Código Penal capítulo próprio sobre os “crimes contra o casamento”, estes enumerados entre os artigos 235 e 239, salientando-se que o crime de adultério deixou de ser crime no Brasil.
Ainda, o Código Penal estabeleceu uma diversidade de crimes “contra o estado de filiação”, “contra a assistência familiar” e “contra o pátrio poder, tutela curatela” – artigos 244 usque 249.
Contudo, não há nenhuma menção de responsabilidade civil quanto ao ofensor e ofendido dentro das relações familiares.
A Espanha, Argentina, França e Portugal já possuem disciplinados em seu ordenamento a responsabilidade civil nas relações conjugais.
Já na Alemanha, uma enorme resistência é encontrada quanto à aplicação da responsabilidade civil.
No Brasil, a mais antiga jurisprudência que denota responsabilidade civil nas relações familiares é de 2001 (STJ, REsp. 37.051/SP).
As relações familiares não têm natureza contratual, portanto, não admitem pronto uma sanção pelo descumprimento, ou seja, a responsabilidade civil propriamente dita não atua diretamente sobre qualquer relação familiar.
Diferente do que ocorre em alguns países, o pacto antenupcial estabelece uma verdadeira relação contratual entre os cônjuges, inclusive estipulando deveres pessoais irrecusáveis com duras penas para o cônjuge que a descumpre.
Em outros países, em razão de ser o casamento uma instituição de imenso valor comunitário, o próprio Estado penaliza os cônjuges infratores dos deveres matrimoniais, tal como ocorre com a Malásia em que um homem foi condenado a entregar a comunidade quatro búfalos e um porco por ter cometido adultério (ESP BRASIL, 2010).

2.  Elementos ensejadores da Responsabilidade Civil

Diferente do que ocorre na responsabilidade civil de uma forma geral, sua aplicação no Direito de Família é extremamente intrincada.
Para que exista responsabilidade civil necessário se faz a verificação de três elementos indispensáveis: o ato ilícito, o dano e o nexo de causalidade.
O ato ilícito é o ato desconforme ao direito, praticado pelo sujeito de direito através da ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência que viola direito de outrem, ou exercido com excesso aos limites impostos pelo seu fim econômico e social, tal como descreve o artigo 186 do Código Civil.
O dano é a lesão a um bem jurídico e se perfaz por um prejuízo suportado pelo titular de um bem jurídico afetado, reflexo do ato ilícito.
No caso do dano moral, não é materializado, mas deve ser efetivo.
Ou seja, para que ocorra a responsabilidade civil que decorra uma lesão extrapatrimonial, deve o ato ilícito atingir os direitos da personalidade do ofendido (Art. 12, Código Civil) e afetar diretamente a dignidade da pessoa humana (Art. 1º, III, Constituição Federal).
Tais direitos não passíveis de ressarcimento, eis que a dignidade não tem preço.
Assim, somente é possível a reparação como forma de indenização, procurando-se compensar ou atenuar o sofrimento suportado.
O dano moral não é pretérito, nem futuro, pois não há como se restaurar a situação anterior à ofensa, nem sequer como forma de prevenção.
Na responsabilidade civil em que incide dano moral, haverá uma subtração de elementos, eis que o dano que deveria ser exaustivamente comprovado, agora se presume.
Ou seja, deverá ser comprovado o ato ilícito e o nexo de causalidade entre ele e o dano psicológico que se alega ter sofrido, diante disto, inexiste a necessidade de comprovação de que a moral, a dignidade da pessoa humana foi abalada, pois, do próprio fato se presume a lesão.
Tais demandas se tornaram tão comuns, que somente o Superior Tribunal de Justiça, nos últimos 10 anos, somou 67 mil processos, sendo que só em 2008 contabilizaram 11.369 processos que debatiam de alguma forma dano moral (STJ, 2009).
Já o nexo de causalidade é a ação que vincula o ato ilícito ao dano.
A conduta do lesante é o ato ilícito e o dano, o resultado obtido pela sua conduta.
Contudo, para a apuração da responsabilidade civil, deve se verificar se foi à conduta do lesante que incorreu no resultado obtido, não havendo este liame, não há a responsabilidade.
“É preciso esteja certo que, sem este fato, o dano não teria acontecido. Assim, não basta que uma pessoa tenha contravindo a certas regras; é preciso que sem esta contravenção, o dano não ocorreria (DEMOGUE, 1923, p. 66)”
O nexo de causalidade é certamente o primeiro dos pressupostos da responsabilidade civil que deve ser apurado, pois, não interessa se a conduta é um ato ilícito e se houve a existência do dano, se não houver um liame entre o acontecimento e o mal causado.
Em razão da teoria da causalidade adequada, adotada pelo Código Civil brasileiro, somente as condutas condescendentes para a efetivação dos resultados são relevantes para concretizar o dever de indenizar.
Ou seja, não se aplica no Brasil a teoria da equivalência das condições em que qualquer condição ou circunstância é capaz de produzir o dever de indenizar.
Para se verificar se determinada conduta contribuiu para o resultado do ato, deve-se aplicar o “processo hipotético de eliminação”, simplesmente suprimindo o fato e verificando se o dano ocorreria da mesma forma, este método é conhecido como “método hipotético de Thyrén” (LEITE, 2007).

3. Esponsais

A família é a base da sociedade, como bem salientou Fustel de Coulanges:
“Há três coisas que, desde os tempos antigos, se encontram fundadas e estabelecidas solidamente nas sociedades grega e italiana: a religião doméstica, a família e o direito de propriedade (A cidade antiga, 2001, p. 35).”
O Brasil reconheceu ao casamento a natureza jurídica de instituição indispensável ao Estado, estabelecendo no artigo 226 da Constituição Federal que “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.”
Tais explicações são necessárias examente para se entender o porquê do noivado compromisso solene de casamento, não gerar, a priori, responsabilidade civil para aquele que não vier a contrair núpcias.
“[...] O descumprimento da promessa de casamento e a ruptura de namoro ou coabitação não ensejam dano moral, pois qualquer um dos nubentes tem o direito de se arrepender, haja vista que ninguém é obrigado a manter uma relação conjugal com outrem.
Não há como atribuir ilicitude ao comportamento do apelado, qual seja, o rompimento da relação conjugal;  é certo que a mera manifestação de interesse de casamento não obriga as partes a contrair núpcias.
(Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apelação Cível 1.0325.06.000495-0/001)”
É também por este motivo que o noivo não tem legitimidade para pleitear dano moral por ricochete ou reflexo em caso de falecimento da futura esposa por culpa de outrem, eis que o noivo não pertence ao núcleo familiar (STJ, REsp. 1.076.160, Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 10/04/2012).
Contudo, se o rompimento for injustificado e cause ao outro danos materiais e morais, ocorrendo lesão a honra objetiva e subjetiva, prevalecerá o dever de indenizar.
“Responsabilidade civil - rompimento de noivado as vesperas do casamento - falta de motivo justo, gerando responsabilidade e indenização - dano moral - configuração - valor da indenização fixado moderadamente - reconvenção improcedente face a culpa do réu pelo rompimento - recurso da apelante provido e do apelado desprovido. O noivado não tem sentido de obrigatoriedade. pode ser rompido do modo unilateral ate o momento da celebração do casamento, mas a ruptura imotivada gera responsabilidade civil, inclusive por dano moral, cujo valor tem efeito compensatório e repressivo, por isto deve ser em quantia capaz de representar justa indenização pelo dano sofrido; no que tange a reconvenção apresentada pelo réu, a fim de imputar a autora a culpa pelo rompimento ante os motivos expendidos, obrigando-a a devolução de quantia a ela enviada pelo então namorado, resta a mesma improcedente, pela a culpa exclusiva do réu no episodio analisado.
(Tribunal de Justiça do Paraná, Apelação Cível 4651. Rel. Des. Antonio Gomes da Silva. Julgado em 15/02/2000)”
Mas nestes casos, sempre se deverá verificar a ressalva do princípio da boa-fé, isto com base na credibilidade e confiança mútuas exigidas, pois as tratativas não possuem força vinculante, mas o prejuízo moral decorrente do abrupto rompimento, violador das regras da boa-fé, enseja à indenização (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 5ª C. Cív., Apelação Cível 2001.001.17643, Rel. Des. Humberto de Mendonça Manes, julgado em 17/10/2001)

4. Quebra dos deveres do matrimônio

Na ruptura do noivado, não se consumando o casamento, não há incidência de ato ilícito.
O mesmo ocorre com a dissolução do matrimônio, em que o simples rompimento conjugal sem culpa não gera o dever de indenizar (STJ, REsp. 302.930/SP (Ministro Jorge Scartezzini, julgado em 06/12/2004).
Contudo, os deveres do casamento devem ser respeitados, tanto por imposição moral como por imposição legal, tal como referenciam os artigos 1.565 e 1.566 do Código Civil:
“Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
§ 1o Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro.
§ 2o O planejamento familiar é de livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e financeiros para o exercício desse direito, vedado qualquer tipo de coerção por parte de instituições privadas ou públicas.
Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV - sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos.”
É neste seara que se admite a responsabilização, pois a falta do cumprimento dos respectivos deveres gera um ato ilícito, como bem salientou a professora Maria Berenice Dias:
“Quem casa, sabe que está assumindo com o outro um pacto. Não pode ser desleal esperando que somente o outro cumpra as promessas do casamento. A lealdade é inerente ao respeito e deve ser exercida por aqueles que se dispõe a permanecerem casados.
(BELFORT, 2012).”
Portanto, é necessária que a conduta do cônjuge cause no outro situação que lhe implique sofrimento, o que se consuma pela exposição vexatória, pois, o que dá ensejo à indenização não deve é o fracasso do matrimônio, mas o descumprimento de dever legal durante a sua vigência.
“Separação judicial. Proteção da pessoa dos filhos (guarda e interesse). Danos morais (reparação). Cabimento. [...] 2. O sistema jurídico brasileiro admite, na separação e no divórcio, a indenização por dano moral. Juridicamente, portanto, tal pedido é possível: responde pela indenização o cônjuge responsável exclusivo pela separação 3. Caso em que, diante do comportamento injurioso do cônjuge varão, a Turma conheceu do especial e deu provimento ao recurso, por ofensa ao Art. 159 do Cód. Civil, para admitir a obrigação de se ressarcirem danos morais.
(STJ, REsp. 37.051/SP, Ministro Nilson Naves, julgado em 25/06/2001)”
Em junho de 2008, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de São Paulo negou reparação financeira por danos morais a um marido traído. O fundamento do julgado foi que “ele sabia que estava sendo enganado pela mulher e não tomou qualquer atitude contra o fato, que era de conhecimento público”. O relacionamento adúltero era feito com um vizinho do casal (BIRNFELD, 2008).
A indenização proveniente da responsabilidade civil por ato ilícito de um dos cônjuges pode ser verificada na omissão do conhecimento da paternidade real dos filhos e não terá o amante responsabilidade solidária (STJ, REsp. 74.2137/RJ Ministro Nancy Andrighi, julgado em 29.10.2007).
Inclusive, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é que o terceiro envolvido com o cônjuge não será responsável por um possível adultério, pois este não tem nenhum dever para com a instituição do casamento:
“[...] não há no ordenamento jurídico pátrio norma de direito público ou privado que obrigue terceiros a velar pela fidelidade conjugal em casamento do qual não faz parte.
(STJ, REsp. 1.122.547/MG, Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 10.11.2009).”
Basicamente, o cônjuge pode se divorciar quando quiser, não havendo nada que lhe imponha ficar junto, mas, não poderá desrespeitar os deveres legais instituídos no casamento, pois assim gerará um ato ilícito passível de indenização.

5. Abandono afetivo na filiação

O Superior Tribunal de Justiça entende que o abandono afetivo na filiação gera o dever de indenizar, não nas formas habituais da responsabilidade civil como forma de compensação, mas como forma de coação para que o pai venha a realizar a sua função social de cuidar moralmente de seu filho:
“DANOS MORAIS. ABANDONO AFETIVO. DEVER DE CUIDADO.
O abandono afetivo decorrente da omissão do genitor no dever de cuidar da prole constitui elemento suficiente para caracterizar dano moral compensável. Isso porque o non facere que atinge um bem juridicamente tutelado, no caso, o necessário dever de cuidado (dever de criação, educação e companhia), importa em vulneração da imposição legal, gerando a possibilidade de pleitear compensação por danos morais por abandono afetivo. Consignou-se que não há restrições legais à aplicação das regras relativas à responsabilidade civil e ao consequente dever de indenizar no Direito de Família e que o cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento pátrio não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas concepções, como se vê no art. 227 da CF. O descumprimento comprovado da imposição legal de cuidar da prole acarreta o reconhecimento da ocorrência de ilicitude civil sob a forma de omissão. É que, tanto pela concepção quanto pela adoção, os pais assumem obrigações jurídicas em relação à sua prole que ultrapassam aquelas chamadas necessarium vitae. É consabido que, além do básico para a sua manutenção (alimento, abrigo e saúde), o ser humano precisa de outros elementos imateriais, igualmente necessários para a formação adequada (educação, lazer, regras de conduta etc.). O cuidado, vislumbrado em suas diversas manifestações psicológicas, é um fator indispensável à criação e à formação de um adulto que tenha integridade física e psicológica, capaz de conviver em sociedade, respeitando seus limites, buscando seus direitos, exercendo plenamente sua cidadania. A Min. Relatora salientou que, na hipótese, não se discute o amar – que é uma faculdade – mas sim a imposição biológica e constitucional de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerar ou adotar filhos. Ressaltou que os sentimentos de mágoa e tristeza causados pela negligência paterna e o tratamento como filha de segunda classe, que a recorrida levará ad perpetuam, é perfeitamente apreensível e exsurgem das omissões do pai (recorrente) no exercício de seu dever de cuidado em relação à filha e também de suas ações que privilegiaram parte de sua prole em detrimento dela, caracterizando o dano in re ipsa e traduzindo-se, assim, em causa eficiente à compensação. Com essas e outras considerações, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu parcial provimento ao recurso apenas para reduzir o valor da compensação por danos morais de R$ 415 mil para R$ 200 mil, corrigido desde a data do julgamento realizado pelo tribunal de origem.
(STJ, REsp. 1.159.242-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 24/4/2012).”
O Supremo Tribunal Federal ainda não se manifestou a respeito, estando pendente de julgamento o Agravo de Instrumento que pretende a elevação do Recurso principal a instancia extraordinária.
Em novembro de 2012, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul divergiu da decisão do Superior Tribunal de Justiça ao entender que não há como aferir a culpa no caso de abandono afetivo:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COM PEDIDO DE ALIMENTOS. ABANDONO AFETIVO. ALIMENTOS. Ainda que comprovado o vínculo de pai e filha entre as partes, os alimentos às pessoas maiores de idade e capazes somente são reconhecidos quando comprovada a imperiosa necessidade. DANO MORAL. Os abalos ao psicológico, à moral, ao espírito e, de forma mais ampla, à dignidade da pessoa humana, em razão da falta de afetividade, não são indenizáveis por impossibilidade de aferição da culpa. Negaram provimento ao apelo.
(Tribunal de Justiça do Rio Grade do Sul, 8ª Câmara Cível, Relator Desembargador Alzir Felippe Schmitz, Apelação Cível 70050203751/2012)”

Conclusão

A responsabilidade civil no Direito de Família ainda é tema muito controverso, não amparado por embasamento legal e adstrito aos entendimentos doutrinários e parcos julgados jurisprudenciais.
Mais difícil que se interpretar a lei é construir um entendimento que vise sua criação, portanto, somente uma análise mais acurada pelos juristas poderá proporcionar uma vivência sob esta nova matéria.
Diante desta sistemática é que se verifica que muito ainda será visto sobre a responsabilidade civil no Direito de Família antes de ser um tema pacífico.

MANJINSKI, Everson. A responsabilidade civil no Direito de Família. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3450, 11 dez. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23215>. Acesso em: 1 jan. 2013.