terça-feira, 26 de março de 2013

Escola deve ter cuidador para aluno com deficiência



O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que uma criança com deficiência tem direito a um cuidador especial na sala de aula na escola onde estuda, em Santos. O entendimento da corte é que a educação pública deve ser inclusiva e os profissionais auxiliares atendem às necessidades especiais pedagógicas dos alunos.

Segundo o defensor público que atuou no caso, Thiago Santos de Souza, a aluna tem problemas para se locomover no colégio. “A escola facilitou o acesso ao prédio para receber as adolescentes. Contudo, não forneceu profissional capacitado para suprir a necessidade de locomoção e demais necessidades básicas para que tenham acesso à educação com dignidade”, diz.

Os desembargadores da Câmara Especial do TJ-SP concordaram que as crianças com deficiência apenas terão educação de qualidade se supridas suas necessidades pedagógicas. “Para infantes e jovens portadores de necessidades especiais apenas e tão somente se atingirá o fim educacional ventilado em lei, ou seja, formação de cidadãos e futuros profissionais, se eles tiverem acesso a ensino de qualidade e em perfeita sintonia com suas necessidades”.

De acordo o relator e presidente da Seção de Direito Privado, Silveira Paulilo, o artigo 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente repete a regra do artigo 227 da Constituição da República, quanto ao dever estatal de garantir políticas de educação em caráter de absoluta prioridade. A Deliberação 68/2007 do Conselho Estadual de Educação ainda reforça como proposta pedagógica a educação inclusiva, “devendo ser assegurado atendimento educacional especializado”.
(...)
Segundo ele, uma das demandas mais comuns nas escolas é de profissionais que saibam a Linguagem Brasileira de Sinais (Libras), usada na comunicação com surdos. A Defensoria Pública também atua em solicitações de equipamento para garantir acessibilidade às crianças e adolescentes, como cadeiras de rodas motorizadas. Com informações da Assessoria de Imprensa da Defensoria Pública de São Paulo.

Victor Vieira é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 25 de março de 2013

Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2013-mar-25/escola-publica-cuidador-aluno-deficiencia-tj-sp

Multiparentalidade: alguém pode ter dois pais ou duas mães em seu registro civil?

A multiparentalidade, que é um caminho sem volta na modernização do direito de família, será pauta de vários julgamentos.

O direito de família vem passando por inúmeras modificações com o passar dos anos, e o conceito de família vem se ampliando para abranger as mais diversas formas de núcleos familiares existentes hoje em dia. É nesse contexto, observando que o divórcio vem se tornando algo cada vez mais comum e frequente, é que surge o tema da multiparentalidade.

A título exemplificativo é possível imaginarmos a seguinte situação: uma menina cujos pais biológicos são divorciados perde a mãe biológica ainda na infância, sendo criada a vida toda pelo pai e pela madrasta. Cria-se entre a madrasta e a enteada um vínculo socioafetivo, estabelecido pelo laço de amor e de cuidado, laço este que perdura ao longo da vida em uma exímia relação maternal. Seria possível que esta menina ou que a madrasta requeressem a declaração da maternidade socioafetiva e inclusão em seu registro civil mantendo o nome da falecida mãe biológica?

Trata-se apenas de uma possibilidade, entre tantas outras, em que o assunto da multiparentalidade vem à tona. A Lei 11.924/2009 já regulamentou a possibilidade de o enteado ou enteada adotar o patronímico da família do padrasto ou da madrasta, porém a questão da multiparentalidade vai além, e questiona-se se seria possível alguém ter em seu registro civil o nome de duas mães ou de dois pais.

Sobre o tema não há consenso doutrinário, sobretudo no que tange à questão sucessória e alimentar, porém grande parte dos doutrinadores modernos é favorável a essa possibilidade, como o professor Flávio Tartuce¹, que afirma que a multiparentalidade é um caminho sem volta na modernização do direito de família e que representa uma consolidação da afetividade como princípio jurídico em nosso sistema.

Embora também não haja jurisprudência consolidada acerca do assunto, em agosto de 2012 a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo inovou ao julgar procedente a apelação cível 0006422-26.2011.8.26.0286, interposta em ação declaratória de maternidade socioafetiva, declarando a maternidade socioafetiva concomitantemente com a maternidade biológica.

O relator, desembargador Alcides Leopoldo e Silva Junior, em caso semelhante ao exemplificado acima, mencionou que não haveria qualquer tipo de reprovação social em se declarar legalmente a maternidade socioafetiva concomitantemente com a biológica. Citou por base decisão do STJ que reconheceu a possibilidade de adoção por duas mulheres, equiparando a multiparentalidade à dupla adoção.

Nesse contexto, levando em consideração o princípio da dignidade da pessoa humana, bem como a afetividade, a solidariedade e a idéia de família contemporânea plural, é provável que surjam novas decisões nesse sentido, consagrando a tendência do direito de família de se adaptar a uma nova realidade social, buscando assegurar direitos constitucionalmente protegidos.

Referências Bibliográficas
¹ - TARTUCE, Flávio. O princípio da afetividade no direito de família. In: http://www.ibdfam.org.br/novosite/artigos/detalhe/859


PIOLI, Roberta Raphaelli. Multiparentalidade: alguém pode ter dois pais ou duas mães em seu registro civil?. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3528, 27 fev. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23828>. Acesso em: 26 mar. 2013.

Crise no sistema médico de saúde e consequências jurídicas para hospitais, médicos, consumidores e planos de saúde

Inúmeras têm sido, em 2013, as notícias veiculadas pelos principais meios de comunicação do país a respeito da falta de médicos em hospitais do Brasil e da consequente má prestação de serviços a que os pacientes acabam sendo submetidos. Somado a isso, há o risco de que a falta de médicos gere resultados negativos na evolução do tratamento dos pacientes podendo, até mesmo, vir a agravar a situação dos mesmos ou, pior, aumentam-se as chances de sobrevirem erros médicos, dada a ausência do devido cuidado e acompanhamento dos pacientes.

Com isso, hospitais e médicos devem conhecer as consequências jurídicas que podem vir a ser geradas por eventuais falhas na prestação de seus serviços. Também é, inclusive, essencial às operadoras de saúde escolher minuciosamente aqueles hospitais e médicos que contratarão, sob pena de responderem solidariamente em eventual litígio, como será discutido à frente. Ao consumidor/paciente, não deixa de ser de suma importância conhecer seus direitos. 

Em primeiro lugar, no Direito Civil brasileiro, em caso de inexecução da obrigação assumida pelo prestador, pelo fornecedor ou pelo fabricante, tem-se a responsabilidade civil, isto é, a obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outra.

A responsabilidade civil, em breve resumo, tem dois atributos essenciais. O primeiro deles é o de prevenção, que visa incentivar as pessoas a não atuarem em atividades que possibilitem a ocorrência de danos. O segundo diz respeito ao caráter ressarcitório, isto é, aquele que garante aos indivíduos prejudicados por essas condutas a reparação das eventuais perdas e danos sofridos. 

Ao se tratar de responsabilidade objetiva, constata-se que esta se dá em desfavor do agente causador do dano, desconsiderando-se qual a conduta proporcionada. Então, objetiva-se atribuir ao causador do dano a internalização dos custos e prejuízos ocorridos em razão do sinistro.

Já em relação à responsabilidade por culpa, o objetivo é impor ao indivíduo incentivos para que se previna o cometimento de algum ilícito civil, pois ele terá conhecimento de que, caso ocorra o sinistro, será responsabilizado, mediante constatação a respeito de sua negligência, imprudência ou imperícia.

Em conflitos entre hospital e paciente, devido a má prestação de serviços, a posição dominante dos tribunais é de que devem ser examinados sob a égide da responsabilidade civil objetiva, sendo que para o reconhecimento do dever de indenizar do hospital é necessário verificar a existência do dano e do nexo causal entre o procedimento realizado pelo médico e o dano sofrido pelo paciente, independente da demonstração de culpa do hospital. A base legal está no caput do art. 14 do CDC.

Porém, em se tratando de conflito entre paciente e médico, em casos de discussão de erro médico, por exemplo, a responsabilidade do médico é subjetiva, nos termos do §4º do mesmo dispositivo e artigos 186 e 951 do CC e, por isso, imprescindível é a comprovação de culpa (negligência, imprudência ou imperícia). Nesse caso, fundamental ainda se faz conhecer se o médico é cooperado do plano de saúde ou contratado do Hospital para se enquadrar, da forma correta, a responsabilidade solidária. 

Quanto às operadoras de planos de saúde, há de se destacar, podem figurar no pólo passivo de uma ação de responsabilidade civil culminada com danos materiais e morais em face de hospital ou médico(s), por exemplo, haja vista ser ela fornecedora do serviço médico (art. 3º, §2º, do CDC), sendo responsável pelos profissionais que escolheu para integrar o seu corpo médico credenciado, além dos hospitais nos quais deverão ser prestados os serviços, de modo que ela tem a obrigação de garantir o tratamento adequado e a qualidade dos serviços prestados.

Não fosse isso suficiente, o Código Civil, em seu artigo 932, III, reza que também respondem pela reparação civil o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais ou prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.

A eg. Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça também teve oportunidade de examinar esse tema, concluindo que "quem se compromete a prestar assistência médica por meio de profissionais que indica, é responsável pelos serviços que estes prestam" (REsp 138.059/MG, Rel. Min. ARI PARGENDLER, DJ de 11/6/2001). No julgamento desse recurso especial, a eminente Ministra NANCY ANDRIGHI proferiu voto, cuja transcrição é salutar:
"[...]
No caso de responsabilidade civil por falta de outrem quando regida pelo CDC não se pode buscar apoio no art. 1.521, III do CC, que contemplando a responsabilidade subjetiva, impõe-se que as culpas sejam examinadas separadamente, porém quando a responsabilidade é objetiva há uma unidade entre o elemento subjetivo daquele que elege o realizador do serviço e do próprio realizador.
Esta unidade subjetiva é fruto de responsabilidade objetiva concebida para garantir a maior probabilidade da vítima ver-se indenizada com sucesso, independente de quem tenha sido o culpado efetivo no evento danoso.
Em outras palavras, a operadora de planos de saúde, responde objetivamente pela eleição, escolha do plantel de profissionais que oferece a seus associados, bem como pelas instituições hospitalares, quando não for proprietária desta e, ainda, pelo acidente de serviço, independente de ter tido o profissional agido ou não com culpa.
Por isso, fica afastada a possibilidade de a questão ser resolvida pelos arts. 1.521 cumulado com o art. 1.523 do CC, porque estes regem relações civis segundo as regras da responsabilidadesubjetiva.
Perante o consumidor a responsabilidade da operadora, do hospital e do médico é objetiva e concorrente; porém a responsabilidade entre estes responsáveis solidários enumerados, se rege pelo Código Civil, respondendo cada um nos limites da sua culpa.
Contudo, a responsabilidade objetiva apenas se aplicará aos planos de saúde quando o paciente/consumidor utilizar serviços médico-hospitalares credenciados pela operadora e indicados por esta. Caso o usuário do plano de saúde utilizar-se de serviços não indicados e/ou credenciados pelo plano de saúde, restará apenas o direito ao reembolso das despesas hospitalares realizadas no hospital não conveniado, se provado que o caso era de emergência, urgência ou quando não puder ter acesso aos hospitais conveniados (Lei 9656/98, arts 12, VI c/c art. 35-C, I e II).

Ainda nesta questão, cabe ressaltar, por último, que ao se analisar o caso concreto, se o médico, o plano de saúde ou o hospital provarem a culpa exclusiva do paciente ou de terceiro; situação de caso fortuito ou de força maior; poderão ficar desobrigados do dever de indenizar.

Dada por encerrada tais questões, é preciso analisar os possíveis danos de ordem material e moral resultantes de falha na prestação de serviços médicos e hospitalares. Logicamente, serão verificados no caso concreto, mas podem vir a causar aos planos de saúde, hospitais e médicos o dever de indenizar, com fulcro nos artigos 186 e 927 do Código Civil. 

A quantificação do dano moral, resultante, por exemplo, de abalos psicológicos causados pela demora do atendimento, na aflição e insegurança na prestação do serviço, bem como nas angústias e sofrimentos sofridos pelo paciente, obedece ao critério do arbitramento judicial, que, norteado pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, fixará o valor, levando-se em conta o caráter compensatório para a vítima e o punitivo para o ofensor. A situação impera análise ainda mais relevante por envolver o direito à saúde, direito este fundamental e cujo valor vincula-se ao próprio direito à vida e à dignidade da pessoa humana.Esta questão deve atentar as operadoras e os hospitais a desenvolver consciência jurídica e gestora mais maduras.

Ademais, o país está enfrentando um problema crônico de leitos para internação de clientes dos convênios médicos. Com a expansão dos beneficiários de convênios médico-hospitalares e o baixo valor pago pelos planos de saúde aos hospitais e médicos, ocorre verdadeira fuga de médicos preparados e qualificados que outrora trabalhavam em hospitais. A consequência drástica disso é evidente: a rede hospitalar está saturada e sem planos imediatos para expansão necessária de serviços, e a falta de orientação jurídica desse setor resulta em consequências incômodas na Justiça, o que apenas contribui para o aumento do passivo em suas contas, impossibilitando investimentos e melhorias.

Nesse sentido, malgrado os consumidores investirem, mensalmente, altos valores em planos que abrangem ampla cobertura, no momento de usufruir dos benefícios o retorno muitas vezes é frustrante, já que são obrigados a enfrentar longas filas e péssimo atendimento, com a única certeza de que, ato contínuo, o estado de saúde se agravará. Para piorar, muitos desses usuários retornam às suas casas sem saberem que na falta de leitos para planos de saúde, eles podem ser internados em leitos particulares e/ou solicitar serviços e exames, e, posteriormente, requerer o ressarcimento. 

Em termos processuais, ainda há o instituto da inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor), segundo o qual o consumidor, por ser parte mais “fraca” no negócio jurídico, após restar claro nos autos a verossimilhança de suas alegações ou a sua hipossuficiência, pode, após autorização judicial, transmitir o dever de produção de provas aos acusados (hospitais e médicos, no caso).

Inegável é o momento delicado do sistema de saúde do país, em que não só faltam médicos em diversos hospitais, como se eleva o número de beneficiários de planos de saúde sem qualquer investimento na rede hospitalar. Essa realidade é preocupante, pois pode causar falhas na prestação de serviços, envolvendo não só a demora no atendimento, mas também erros médicos, devido até mesmo ao sobrecarregamento dos poucos médicos presentes nos hospitais. As consequências, muitas vezes, podem vir a ser irreversíveis aos consumidores/pacientes e, por isso, é fundamental a estes, aos hospitais, aos médicos e aos planos de saúde a devida orientação jurídica para se anteverem de demandas judiciais.
___________
*Igor de Souza Mercêdo Moreira e Ivan de Souza Mercêdo Moreira são membros do escritório Ivan Mercêdo Moreira Sociedade de Advogados

http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI174885,101048-Crise+no+sistema+medico+de+saude+e+consequencias+juridicas+para