terça-feira, 1 de outubro de 2013

STJ: Irmão bilateral ganha o dobro do irmão unilateral em caso de herança

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aplicou a regra do artigo 1.841 do Código Civil de 2002 para modificar acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais envolvendo a participação de irmãos – um bilateral (mesmo pai e mesma mãe), outros unilaterais (filhos do mesmo pai ou da mesma mãe) – na partilha de bens deixados por irmão falecido.
O artigo determina que, “concorrendo à herança do falecido irmãos bilaterais com irmãos unilaterais, cada um destes herdará metade do que cada um daqueles herdar”.
No caso julgado, a controvérsia envolveu o correto percentual devido ao irmão bilateral e a três irmãs unilaterais na locação do apartamento deixado pelo irmão falecido, para efeito de depósito judicial de parcela relativa a aluguéis devidos ao espólio.
Segundo os autos, o falecido indicou o irmão bilateral como único herdeiro de sua parte nos bens deixados pela mãe. As irmãs ingressaram na Justiça questionando a validade do testamento. O tribunal mineiro admitiu a inclusão das irmãs unilaterais no inventário e determinou o depósito em juízo de um terço do valor do aluguel do imóvel.
As irmãs recorreram ao STJ, sustentando que a decisão violou o artigo 1.841 do Código Civil ao determinar que apenas um terço do valor do aluguel do imóvel que caberia ao herdeiro falecido fosse depositado em juízo. Alegaram que o percentual correto deveria ser elevado para no mínimo três quintos, equivalentes a 60% do valor do aluguel.

Irmão bilateral
Citando doutrinas e precedentes, o relator do recurso especial, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, concluiu que, de acordo com a fórmula de cálculo extraída do artigo 1.841 do Código Civil, cabe ao irmão bilateral o dobro do devido aos irmãos unilaterais na divisão da herança, atribuindo-se peso dois para cada irmão bilateral e peso um para cada irmão unilateral.
“No caso dos autos, existindo um irmão bilateral e três irmãs unilaterais, a herança divide-se em cinco partes, sendo dois quintos para o irmão germano e um quinto para cada irmã unilateral, totalizando para elas 60% (ou três quintos) do patrimônio deixado pelo irmão unilateral falecido”, concluiu o relator.
Segundo o ministro, não há dúvida de que o irmão bilateral, como herdeiro legítimo de seu irmão falecido, tem direito a uma parte da herança e pode levantar os aluguéis correspondentes a essa parcela.
Assim, por unanimidade, a Turma decidiu que, enquanto persistir a polêmica em torno da validade do testamento deixado pelo irmão falecido em favor do irmão bilateral, as irmãs têm direito a 60% do montante dos aluguéis auferidos com a locação do imóvel, ficando o irmão bilateral com 40%.

Fonte: STJ, 30 set. 2013.
Clique aqui para acompanhar a tramitação.
Para conferir a decisão clique aqui.

http://atualidadesdodireito.com.br/blog/2013/09/30/irmao-bilateral-ganha-o-dobro-do-irmao-unilateral-em-caso-de-heranca/

A culpa no quesito alimentos pós-divórcio

A nova redação dada à Constituição Federal de 1988, com a Emenda do divórcio, ocasionou a extinção tanto das causas subjetivas (culpa) quanto das objetivas (lapso temporal), no que diz respeito ao divórcio. Não obstante, segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 580),
“a culpa permanecerá em seu âmbito próprio: o das hipóteses de anulabilidade do casamento, tais como os vícios de vontade aplicáveis ao casamento, a saber, a coação e o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge”.
 Por conseguinte, afora essas hipóteses em que a culpa subsistirá, o Estado não poderá mais interferir na vida privada das famílias brasileiras, no que diz respeito à intimidade do casal que pretende se divorciar, ou, em outras palavras, saber qual o motivo, bem como quem deu causa ao divórcio. 
De igual sorte ocorre quanto à prestação alimentícia. Isto porque se não é mais cabível discutir a respeito da culpa no momento da decretação do divórcio, não há, também, motivo para que tal discussão continue vigorando quanto aos alimentos. Por conseguinte, no momento da fixação dos alimentos deve prevalecer apenas o binômio necessidade-possibilidade, ou seja, deve-se levar em consideração apenas a necessidade do credor e a possibilidade econômica do devedor. Devendo-se, ainda, segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 686), levar em consideração o princípio da proporcionalidade e razoabilidade, utilizando-se a justa medida daqueles dois fatores, no momento da decretação dos alimentos. Desse modo, pode-se verificar o que foi exposto anteriormente na seguinte jurisprudência:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - SENTENÇA PROLATADA APÓS A EC Nº 66/2010 - EXTINÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL E REALIZAÇÃO DA PARTILHA DE BENS - PLEITO DE ALIMENTOS INDEFERIDO POR ALEGADA INCOMPATIBILIDADE DE PROCEDIMENTO - INSURGÊNCIA DO VARÃO, QUE AFIRMA TER DEPENDIDO ECONOMICAMENTE DA EX-ESPOSA NO PERÍODO DE 40 (QUARENTA) ANOS EM QUE PERMANECERAM CASADOS, NÃO POSSUINDO CONDIÇÕES DE ATUALMENTE PROVER O SUSTENTO PRÓPRIO - CASAL SEPARADO DE FATO POR LAPSO SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS - POSSIBILIDADE DE A VERBA ALIMENTÍCIA SER FIXADA NA AÇÃO DE DIVÓRCIO - PRECARIEDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO APRESENTADO NA ESPÉCIE - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO BINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ACERCA DE QUE O RECORRENTE ERA QUEM FAZIA AS TAREFAS DOMÉSTICAS E CUIDAVA DA PROLE, ENQUANTO A CÔNJUGE VIRAGO EXERCIA ATIVIDADE REMUNERADA - ALEGAÇÃO DA RECORRIDA NO SENTIDO DE QUE O EX-CONSORTE TRABALHAVA NO COMÉRCIO INFORMAL DE COISAS E ANIMAIS, AUFERINDO, AINDA, COM EXCLUSIVIDADE, O FRUTO DA LOCAÇÃO DOS BENS AMEALHADOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - DÚVIDA QUANTO AO MEIO DE SUBSISTÊNCIA DO APELANTE NO PERÍODO DA SEPARAÇÃO DE FATO - PRETENSÃO QUE DEVE SER RENOVADA EM PROCEDIMENTO AUTÔNOMO, ACOMPANHADA DA RESPECTIVA PROVA - SENTENÇA REFORMADA ANTE A VIABILIDADE DA CUMULAÇÃO DO PEDIDO DE DIVÓRCIO E ALIMENTOS - PLEITO EXAMINADO EM GRAU RECURSAL, MAS, CONTUDO, JULGADO IMPROCEDENTE - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Após a alteração promovida pela Emenda Constitucional 66/2010, o divórcio passou a constituir rompimento do vínculo da sociedade conjugal independente da discussão de culpa pelo fim do relacionamento afetivo, dispensando-se o prévio afastamento dos consortes e, inclusive, anterior declaração judicial acerca da respectiva dissolução, de modo que não há impedimento para que, juntamente com a partilha de bens e definição da guarda dos filhos, seja fixada obrigação alimentar em benefício do cônjuge que fizer prova do seu estado de necessidade, desde que igualmente demonstrado que aquele contra quem se formula o pedido pode responder pelo encargo sem prejuízo do seu sustento próprio ou de seus familiares. (TJ/SC, 696740 SC 2011.069674-0, Relator: Luiz Fernando Boller, Data de Julgamento: 24/02/2012, Quarta Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível nº , da Capital / Estreito).
Como se pode observar, o caso supracitado se trata de um cônjuge varão que dependia economicamente do cônjuge virago, situação esta incomum no Brasil, tendo em vista a sociedade ainda ter resquícios de machismo e patriarcalismo. Dessa forma, após a dissolução do vínculo matrimonial, aquele solicitou judicialmente alimentos a seu favor, independentemente de discussão a respeito de culpa, sendo necessário, somente, a demonstração do binômio necessidade-possibilidade.
Assevera-se que, doutrinariamente, a maioria dos autores defende que a Emenda do divórcio revogou tacitamente os dispositivos que versavam a respeito da culpa no Código Civil de 2002, quais sejam: o art. 1.702 e 1.704. Não obstante, com fulcro no artigo 1.708 do referido código, se o credor contrair novo matrimônio, união estável, concubinato, ou mesmo se tiver qualquer procedimento indigno em relação ao devedor, cessar-se-á seu direito de receber os alimentos.
Quanto aos filhos, deve-se alegar, contudo, que o divórcio não vai modificar em nada a prestação alimentícia devida a eles, mantendo, estes, o direito ao seu recebimento, bem como não se modificará a relação entre pais e filhos, como se encontra expresso no artigo 1579 do Código Civil de 2002, in verbis: “o divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos”. Uma das principais justificativas para isso seria que os filhos não podem ser prejudicados por atos que dizem respeito apenas a seus pais. Em outras palavras, as consequências decorrentes do divórcio devem atingir apenas os ex-cônjuges, não sendo motivo, porém, para quebra de vínculos familiares entre pais e filhos.
No contexto do divórcio, deve-se ressaltar que a extinção do pressuposto “culpa” na decretação daquele e dos alimentos dele advindos, portanto, tem como uma das finalidades diminuir a interferência do Estado no âmbito familiar, resguardando, assim, o direito à intimidade e à privacidade do casal em litígio, não sendo mais necessário expor motivos ao rompimento matrimonial em juízo.

ZARUR, Larissa Alves de Brito. Obrigações alimentares pós-divórcio: a análise de sua legalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3743, 30 set. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25421>. Acesso em: 1 out. 2013.

Legitimidade do ex-cônjuge para requerer alimentos após o divórcio e as hipóteses de cabimento

Consoante o que já foi dito, os alimentos, do ponto de vista jurídico, envolvem não apenas o alimento em si, mas também a condição social que o cônjuge possuía anteriormente ao divórcio, bem como o binômio necessidade-possibilidade, o qual sempre deve ser observado quando se discutir pensão alimentícia.
Nesta perspectiva, afirma o doutrinador Beviláqua apud Cahali (2006, p. 16) que “a palavra alimentos tem, em direito, uma acepção técnica, de mais larga extensão do que na linguagem comum pois compreende tudo o que é necessário à vida: sustento, habitação, roupa e tratamento de moléstias”. Neste sentido, dispõe o ordenamento jurídico pátrio, precisamente no Código Civil de 2002, artigo 1.694, caput, quanto aos cônjuges, que estes possuem o direito de pedir alimentos reciprocamente, quando deles necessitarem para manter mesma condição social, bem como para atender às necessidades de sua educação.
Dessa forma, pode-se observar que a prestação alimentícia tem como uma das características a reciprocidade, já que o devedor dos dias atuais pode vir a necessitar dos alimentos no futuro, de modo que passaria a ocupar o polo passivo da questão. Tal afirmação está prevista no artigo 1.696 do Código Civil de 2002, segundo o qual o direito de perceber os alimentos é recíproco entre pais e filhos, sendo, ainda, extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros.
No que diz respeito ao binômio necessidade-possibilidade, é necessário que se observe os “dois lados da moeda”, ou seja, a condição financeira do alimentante e a necessidade do alimentado.  Porém, a doutrina moderna, segundo os ensinamentos de Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 674), prefere denominar tal requisito de trinômio, visto que é importante levar em consideração três elementos, quais sejam: necessidade, possibilidade do alimentante e proporcionalidade e razoabilidade. Isto porque, além de existirem os dois primeiros, estes devem ocorrer de forma conjunta, a fim de evitar que uma parte se beneficie ou se prejudique além do que é necessário.
Em outras palavras, segundo o artigo 1.695, do Código Civil de 2002, a prestação alimentícia não pode ser aplicada como uma de punição ao devedor, de forma que este seja condenado a pagar um valor alto de prestação alimentícia ao seu dependente, prejudicando o próprio sustento.
Desse modo, se após o divórcio um dos ex-cônjuges não puder nem tiver como se sustentar, ou quando a dissolução da vida matrimonial ocasionar grandes prejuízos a uma das partes, de modo a modificar sua condição de vida social, serão cabíveis os alimentos. Estes, por sua vez, podem ser requeridos tanto pelo homem quanto pela mulher. Isto está em conformidade com o princípio da igualdade de direitos e deveres entre o homem e a mulher, previsto no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal de 1988.  No entanto, se a parte demandante exercer alguma atividade profissional, de modo que possa sustentar-se, dificilmente terá seu pedido deferido pelo magistrado. Conforme o exposto, pode-se observar tal posicionamento na seguinte jurisprudência do TJ–DF:
48372362 – APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIVÓRCIO LITIGIOSO. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO ACOLHIMENTO. PEDIDO DE ALIMENTOS CÔNJUGE. NECESSIDADE. POSSIBILIDADE. 01. A prova é dirigida ao juiz e compete a ele aquilatar a necessidade de sua produção ou não, sem que o indeferimento de uma ou outra pretensão acarrete cerceamento de defesa. 02. Embora a Lei Civil admita que, com o divórcio, qualquer um dos cônjuges possa pleitear alimentos, mostra-se indispensável a comprovação inequívoca da necessidade dos mesmos, bem como as possibilidades financeiras do obrigado. 03. Preliminar rejeitada. Recurso improvido. Unânime. (TJ-DF; Rec 2009.09.1.017253-9; Ac. 525.268; Quinta Turma Cível; Rel. Des. Romeu Gonzaga Neiva; DJDFTE 12/08/2011; p. 108).
Sendo assim, do ponto de vista fático, é perfeitamente possível o deferimento de alimentos à ex-mulher, por exemplo, que passou a vida conjugal inteira apenas trabalhando dentro de casa, ou seja, sendo “do lar” enquanto que o ex-marido era o responsável pelo sustento da casa, de forma que após a dissolução do casamento aquela não tenha como se manter. Tal prestação visaria conceder àquela, no mínimo, um pouco de dignidade.
Entretanto, para que ocorra a referida procedência, outro fator deve ser conjuntamente levado em conta, qual seja: a possibilidade da ex-mulher se recolocar no mercado de trabalho. Caso o ex-cônjuge virago, no momento do rompimento do vínculo matrimonial, possua idade avançada, considerada, geralmente, como de difícil ingresso no mercado de trabalho, o juiz poderá conceder a ela alimentos pelo resto da sua vida, desde que ela não se case novamente ou tenha um companheiro ou concubino, pois isto desvincularia a obrigação quanto ao ex-cônjuge varão. Tal fato está disposto no artigo 1.708, caput, do Código Civil de 2002, in verbis: “Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos”. O mesmo não ocorre caso o alimentante contraia matrimônio, conforme expressa o artigo 1.709 do Código Civil de 2002, in verbis: “O novo casamento do cônjuge devedor não extingue a obrigação constante da sentença de divórcio”.
Diferentemente ocorreria caso o ex-cônjuge virago, na mesma ocasião, fosse jovem e apta a exercer atividade laboral, no entanto, também nunca tenha trabalhado “fora de casa”. Nesse caso, ser-lhe-ão concedidos alimentos transitórios, ou seja, por tempo determinado, suficiente para que possa começar alguma atividade que lhe proporcione renda, de modo que possa prover seu próprio sustento. O exposto anteriormente está em conformidade, por exemplo, com a seguinte jurisprudência, a qual se encontra disposta na doutrina de Farias e Rosenvald (2010, p. 696-697), in litteris:
Alimentos. Mulher jovem, saudável, mas despreparada para o mercado de trabalho. Pensão temporária destinada a proporcionar-lhe condições de exercer atividade laboral digna. Se não obstante jovem e saudável a mulher não está qualificada para ingressar no mercado de trabalho, mormente por ter o casamento, contraído em idade muito jovem, a impedido de adquirir uma profissão definida, deve ser-lhe assegurada pensão por prazo razoável a fim de se preparar para o exercício de atividade laboral digna. (TJ/RJ, Ac.2ªCâm.Cív.,ApCív.1998.001.2706, rel. Des. Sérgio Cavalieri Filho, j.18.6.98).
Ressalta-se que este posicionamento é pacífico nos tribunais, de acordo com Farias e Rosenvald (2010, p. 696-697). Nesta perspectiva, pode-se observar, ainda, tal situação no seguinte julgado, citado por Tartuce e Simão (2010, p. 38):
Família. Alimentos entre cônjuges. Prazo. Se, na constância do casamento, a       mulher não dispõe dos meios próprios para prover o seu sustento e se o seu marido tem capacidade para tanto, não se pode fixar o dever alimentício pelo prazo de apenas um ano, apenas porque é jovem e capaz para o trabalho. Recurso conhecido e provido (STJ, REsp 555.429/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, 4.ª Turma, j. 08.06.2004, v.u., Boletim AASP 2.413/1.010, abril de 2005).
Por conseguinte, pode-se observar que a fixação de alimentos transitórios, ou seja, por prazo determinado, tem como finalidade evitar que o alimentando se aposse daquela vantagem advinda da pensão alimentícia como um critério desmotivador a ir à busca de algum emprego, já que se o pagamento fosse por prazo indeterminado, sempre estaria sob a sombra daquele que sempre lhe sustentou, desde o matrimônio. 
Quanto aos princípios, deve-se ressaltar que dentre os que regem a prestação alimentícia, está um dos mais importantes princípios do ordenamento jurídico, qual seja: o da dignidade da pessoa humana. Isto se deve ao fato de que sem suprir as necessidades básicas da vida, bem como sem continuar tendo um padrão de vida que possuía por muito tempo, após o divórcio, no caso dos ex-cônjuges, não se tem como ter uma vida digna e decente. Segundo Diniz (2011, p. 613), tal princípio encontra respaldo jurídico no dispositivo primeiro, inciso III, da Lei Maior de 1988, o qual cita a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Além deste, pode-se citar também o princípio da solidariedade humana e econômica que deve existir entre os membros da família ou os parentes, como assevera Gonçalves (2011, p. 499). Já esse princípio, encontra-se previsto no artigo 3º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, o qual elenca a solidariedade na sociedade como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.
Outra particularidade do divórcio é a que diz respeito à prestação alimentícia a ser suprida ao ex-cônjuge após a ruptura do vínculo matrimonial. Nas palavras de Farias e Rosenvald (2010, p. 694), “a obrigação alimentícia entre os cônjuges decorre da frustração do dever de mútua assistência e tem o condão de materializar os efeitos impostos pelo matrimônio”. Dessa forma, tendo por base o princípio da mútua assistência entre os consortes, bem como o princípio da igualdade entre o homem e a mulher, sendo este previsto no artigo 5º, inciso I, da Constituição Federal de 1988, os alimentos são devidos após o divórcio, quando houver necessidade.
Deve-se ressaltar, sobretudo, que a prestação alimentícia entre os ex-cônjuges, segundo a doutrina de Farias e Rosenvald (2010, p. 87), tem como uma das finalidades evitar a ocorrência de violação da boa-fé objetiva ou princípio da confiança entre aqueles. Pode-se citar como uma hipótese de tal violação o marido que, na constância do casamento, pede à esposa que não trabalhe e deixe o sustento da casa por conta dele. Não obstante, após muitos anos de união, advém o divórcio, rompendo o vínculo existente entre o casal. Dessa forma, o ora ex-marido se recusa a prestar assistência à ex-mulher, ficando a sobrevivência desta à mercê da sorte, visto que nunca trabalhou nem tem mais condições físicas que possibilite o trabalho. Nesse caso, teria direito a perceber os alimentos.
 Entretanto, no ordenamento jurídico brasileiro, só são possíveis os alimentos atuais e futuros, visto que se a pessoa necessitada conseguiu sobreviver sem os alimentos pretéritos não há motivo para a sua obtenção. Isto ocorre, ressalta-se, em todos os casos de prestação alimentícia, não apenas entre os ex-cônjuges.
Há que se argumentar, ainda, o tocante à pena pelo descumprimento das obrigações alimentares. Este requisito também é aplicável a todos os casos que envolvam alimentos e encontra-se expresso na Súmula 309 do STJ, nos seguintes termos: “O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo”. Dessa forma, pode-se afirmar que, atualmente, esta é a única situação de prisão civil possível no ordenamento jurídico brasileiro, já que a Súmula Vinculante nº 31 considerou como inconstitucional a prisão civil decorrente de atitude de depositário infiel.
Por fim, convém afirmar que no pedido de divórcio o cônjuge interessado na ação pode renunciar ou dispensar os alimentos a serem pagos pelo seu consorte após a dissolução do matrimônio, conforme será discutido adiante.

ZARUR, Larissa Alves de Brito. Obrigações alimentares pós-divórcio: a análise de sua legalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3743, 30 set. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25421>. Acesso em: 1 out. 2013.

O casamento e a sua dissolução

O casamento é uma das situações que geram obrigações mútuas de prestar alimentos entre os envolvidos. Segundo o posicionamento da ilustre jurista Diniz (2011, p. 51), “o casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família”. Entretanto, atualmente, parte desse posicionamento está ultrapassado, visto que o Supremo Tribunal Federal (STF) passou a admitir, em sua jurisprudência, que a família não advenha apenas da união entre um homem e uma mulher, mas também entre pessoas do mesmo sexo.
Quanto a este posicionamento, pode-se citar um trecho da ADPF 132, in litteris:
“ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL (ADPF). PERDA PARCIAL DE OBJETO. RECEBIMENTO, NA PARTE REMANESCENTE, COMO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. UNIÃO HOMOAFETIVA E SEU RECONHECIMENTO COMO INSTITUTO JURÍDICO. CONVERGÊNCIA DE OBJETOS ENTRE AÇÕES DE NATUREZA ABSTRATA. JULGAMENTO CONJUNTO. Encampação dos fundamentos da ADPF nº 132-RJ pela ADI nº 4.277-DF, com a finalidade de conferir “interpretação conforme a Constituição” ao art. 1.723 do Código Civil. Atendimento das condições da ação.”.
Diante da análise da ADPF supracitada, percebe-se que o STF reconheceu a união estável homoafetiva, indo de encontro ao o que acontece há algum tempo na sociedade, mas que sempre ocorreu de forma irregular, qual seja a convivência entre pessoas do mesmo sexo como se fossem uma família.
Voltando à discussão a respeito do casamento, ressalta-se que, durante a vigência do Código Civil de 1916, acreditava-se na indissolubilidade do casamento, visto que ocorria, segundo Rosenvald e Farias (2010, p. 108), a incorporação da máxima canonista, qual seja: “o que Deus uniu o homem não separa”, da qual se percebe a forte influência religiosa sobre essa união. Nesse contexto, destaca-se a clássica definição de Clóvis Beviláqua, Beviláqua apud Diniz (2011, p. 52), segundo a qual
 “o casamento é contrato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legitimando por ele suas relações sexuais; estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses e comprometendo-se a criar e educar a prole que de ambos nascer”.
Entretanto, a partir da Lei nº 6.515 de 26 de dezembro de 1977 (Lei do Divórcio), tal posicionamento se modificou, visto que o casamento deixou de ser indissolúvel, sendo possível sua ruptura pelo divórcio. Dessa forma, este é o entendimento que rege a Constituição Federal de 1988, conforme dispõe o seu artigo 226, §6º, in verbis: “o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Deve-se destacar, ainda, que o dispositivo supracitado foi incorporado pela Emenda Constitucional nº 66 de 2010 (Projeto de Emenda Constitucional nº 28, de 2009, usualmente denominada “PEC do Divórcio”, projeto este sugerido pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM).
Conforme os ensinamentos de Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 542), a supracitada emenda facilitou a implementação do divórcio no Brasil, já que inovou o ordenamento em dois pontos fundamentais, quais sejam: a extinção da separação judicial e a extinção da exigência de prazo de separação de fato para a dissolução do vínculo matrimonial. Por conseguinte, a separação judicial deixa de ser pré-requisito para concessão do divórcio, facilitando, assim, a ruptura do vínculo matrimonial entre aqueles que não mais suportam a vida em comum. Ressalta-se que para que isso ocorra não há mais um período mínimo de separação de fato, de modo que o divórcio pode ocorrer a qualquer tempo, seja um dia ou dois anos após a realização do casamento.
No entanto, há questionamentos quanto a essa rápida possibilidade de propositura da ação de divórcio, tendo em vista que os casais poderiam agir por impulso emocional, se divorciarem, e, posteriormente, se arrependerem, não podendo mais reatar a relação, a não ser casando-se novamente. Diferentemente ocorria antes da Emenda Constitucional nº 66/2010, quando se fazia necessário, primeiramente, a separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei ou a comprovada separação de fato por mais de dois anos, para que fosse possível dissolver o casamento.


O DIVÓRCIO A PARTIR DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 66/2010

A Emenda Constitucional n. 66/2010, também denominada Emenda do divórcio, modificou a redação original do artigo 226, §6º, da Lei Maior, a qual era a seguinte: “§6.º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio consensual ou litigioso, na forma da lei”. A referida emenda ocasionou, ainda, a revogação tácita da separação judicial. Além disso, foi extinto o prazo mínimo para a dissolução do casamento, podendo ocorrer a qualquer tempo, seja um dia, um mês ou um ano, por exemplo, após o matrimônio.
Na situação jurídica anterior, era possível a ocorrência da separação judicial, a qual era apenas a dissolução da sociedade conjugal, em que seria cabível uma possível reconciliação entre os cônjuges. Por outro lado, para que ocorresse o divórcio, caracterizado, à época, de “direto”, seria preciso o casal estar separado de fato há mais de dois anos, sem que houvesse, no correspondente período, possível conciliação.
Por outro lado, após a mudança, o divórcio a ser requerido por qualquer dos cônjuges que esteja interessado no rompimento matrimonial, deixa de se submeter a qualquer requisito temporal. Dessa forma, basta a simples insatisfação com a vida em comum para se justificar a dissolução do vínculo matrimonial através do divórcio.
No que diz respeito à separação judicial, o Presidente do IBDFAM, Rodrigo da Cunha, afirma que, apesar de não ter ocorrido uma revogação expressa do instituto da separação judicial, esta foi suprimida do ordenamento jurídico. No entanto, aplicam-se ao divórcio as mesmas regras que versavam a respeito da separação judicial, com exceção do lapso temporal que era exigido, bem como comprovação da separação de fato ou judicial. Por conseguinte, apesar de a separação judicial ainda estar prevista no Código Civil, visto que não houve uma revogação expressa, não há mais nenhuma aplicação no ordenamento jurídico, de modo que se as pessoas que estejam separadas judicialmente após a mudança ocorrida, queiram se divorciar, não ocorrerá mais a conversão da separação em divórcio, mas sim o divórcio propriamente dito.
Nesta perspectiva, entende-se que o que ocorreu de fato foi uma revogação tácita da separação judicial, devendo, a partir daquela, todas as normas infraconstitucionais se adequarem com o dispositivo constitucional acerca do assunto, dentre elas diversos institutos do Direito de Família, inclusive no que diz respeito aos alimentos.

ZARUR, Larissa Alves de Brito. Obrigações alimentares pós-divórcio: a análise de sua legalidade. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3743, 30 set. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25421>. Acesso em: 1 out. 2013.