terça-feira, 27 de maio de 2014

Comprei um produto com “defeito”, e agora?

Publicado por Izabela Gonçalves

Na verdade, o que costumeiramente os consumidores querem dizer ao falarem que o produto está com “defeito”, à luz do Código de Defesa do Consumidor, significa dizer que o mesmo apresenta um vício.
Podem ser considerados vícios de produtos: uma roupa em que o zíper não abre, um ar condicionado que não refresca o ambiente, um telefone que não funciona, 1kg de saco de arroz que só tem 900 gramas, produto com validade vencida, dentre outros.
Esse vício pode ser aparente ou oculto. É aparente quando é perceptível “de cara”, quase de imediato, como um amassado ou um arranhão. É oculto quando é constatado considerável tempo após a utilização do produto, com o uso diário. Exemplo de vício oculto seria o caso de a câmera de um aparelho celular não funcionar após certo tempo.
No caso de vício de produtos, você pode reclamar ao vendedor, assistência técnica, fabricante. Em se tratando de produtos não-duráveis, você tem até 30 dias do término do tempo de garantia (quando oferecida) ou da data da compra para reclamar; se duráveis, o prazo é de 90 dias. No caso de vício oculto, tais prazos começam a correr no momento em que é constatado o problema.
Lembre-se de sempre pedir uma nota de serviço ou recibo datado atestando que você entregou o produto dentro do prazo legal.
Vale lembrar, por fim, que o consumidor não precisará esperar a decorrência dos prazos mencionados para o conserto do produto quando a substituição da parte viciada puder comprometer a sua qualidade ou suas características, quando diminuir o valor do produto, ou ainda quando se tratar de alimentos e medicamentos. Nesses casos, pode-se exigir a imediata substituição do produto, por exemplo.
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Liberdade de expressão e o direito de criticar

Uma rápida análise filosófica sobre decisão do Ministro Celso de Mello

Publicado por Wagner Francesco

O Ministro Celso de Mello decide no Recurso Extraordinário com Agravo 722.744 do Distrito Federal que "Jornalista tem o direito de fazer crítica impiedosa".
A decisão do ministro é longa, constituída de 18 páginas, e comentá-la ponto a ponto daria um livro. Como não tenho esta pretensão, serei lacônico em minha prédica: Todo o equívoco do ilustre ministro se funda em dois conceitos que são essencialmente filosóficos, quais sejam: liberdade e crítica. Diz o ministro Celso de Mello na página 5:
“Não se pode desconhecer que a liberdade de imprensa, enquanto projeção da liberdade de manifestação de pensamento e de comunicação, reveste-se de conteúdo abrangente, por compreender, dentre outras prerrogativas relevantes que lhes são inerentes, (a) o direito de informar, (b) o direito de buscar informação, (c) o direito de opinar e (d) o direito de criticar.”
Pois bem. Sartre é a melhor pessoa para nos auxiliar aqui – e desde já peço a compreensão de todos pela ausência da citação das referências, pois não é meu intuito transformar esta reflexão em artigo acadêmico...
O ministro acerta quando fala da liberdade como algo inerente ao ser humano. Para Sartre, principalmente no livro “O Ser e o Nada”, o ser humano é produto de sua liberdade, já que a todo momento escolhe as ações que irá praticar. Dessa forma, a liberdade não é uma conquista humana, ela é uma condição da existência humana. Acontece que a liberdade é uma via de mão dupla, onde um vai com sua liberdade e o outro vem. Não existe liberdade do indivíduo isolado, pois o indivíduo não é só. A liberdade é conjunta, daí na obra do Sartre quando se fala em liberdade, se fala, também, no Outro. O outro é necessário para a minha existência, mas é também um mal; um mal necessário. “Somos, eu e o outro, duas liberdades que se afrontam e tentam mutuamente paralisar-se pelo olhar. Dois homens juntos são dois seres que se espreitam para escravizar a fim de não serem escravizados.” E diz mais Sartre no livro “O Ser e o nada”, p. 473,
"Pode acontecer que, pela própria impossibilidade de identificar-me com a consciência do outro por intermédio da minha objetividade para ele, eu seja levado a me voltar deliberadamente para o outro e olhá-lo. Nesse caso, olhar o olhar do outro é colocar-se a si mesmo em sua própria liberdade e tentar, do fundo desta liberdade, afrontar a liberdade do outro. Assim, o sentido do preterido conflito será deixar às claras a luta de duas liberdades confrontadas enquanto liberdades."
Em resumo: a minha liberdade limita a do outro e a do outro, limita a minha. Direitos e deveres, senhor ministro: o direito de criticar e o dever de respeitar. O senhor bem sabe que não existe hierarquia entre direitos e garantias fundamentais, certo? Logo assim, se por um lado a Constituição Brasileira diz em seu art. IV, que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, imediatamente após diz: V - “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”; e tem mais: IX – “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”, e imediatamente após: X – “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
Andou bem o legislador da Constituição quando inseriu o direito à liberdade de expressão e a responsabilidade por suas manifestações em incisos próximos. Liberdade de expressão e respeito ao outro são, em Sartre e na Constituição, gêmeos siameses.
Sigamos.
O ministro fala em direito à crítica. Do que se retira da fundamentação do Celso, a crítica pra ele é um caminhão carregado de brita, desgovernado descendo uma ladeira e o outro que será atingindo, um fusquinha subindo esta ladeira bem devagar. Desculpe-me, ministro, mas eu sou uma pessoa muito apegada a conceitos.
A palavra Crítica vem do grego “Crinein” que significa “separar; julgar”. Criticar é concordar ou discordar de algo, apresentando argumentos pertinentes à questão. Criticar, ministro, não é a licença que um jornalista – ou qualquer outra pessoa – tem para ofender quem quer que seja. Um jornalista, uma pessoa qualquer, que chame outro de mentiroso, de ladrão, sem apresentar provas concretas não está sendo crítico, no mínimo um irresponsável e, no máximo, uma pessoa que se enquadra em dois crimes previstos no Código Penal: o da difamação (art. 139) por chamar o outro de mentiroso e o de calúnia (art. 138), por chamar o outro de ladrão.
Se ainda resta dúvidas quanto ao conceito ou sentido do que seja uma crítica, recomendo a reflexão profunda sobre uma frase do teólogo Leonardo Boff:
"Ser crítico é tirar a máscara dos interesses escusos e trazer à tona conexões ocultas. A crítica boa é sempre também autocrítica. Só assim se abre espaço para um conhecimento que melhor corresponde ao real sempre cambiante. Pensar criticamente é dar as boas razões para aquilo que queremos e também implica situar o ser humano e o mundo no quadro geral das coisas e do universo em evolução."
Então, Dr. Ministro Celso de Mello, o que o senhor chama de liberdade pra criticar é, nada mais nada menos, do que a abertura dos portões que deixam adentrar em nossa sociedade o direito de “falar o que eu quiser, doa a quem doer”; e esta prática, sabemos, não condiz com bons costumes e nem é um caminho indicado pra uma sociedade como a nossa que, dia após dia, vem perdendo a capacidade de dialogar e resolvendo tudo “na base da porrada”.
Por fim e enfim, como eu disse, a decisão do ministro é longa e comentar cada parte, cada trecho, me tomaria um tempo que eu não disponho e que nem seria interessante pra este espaço. Peço que leiam a íntegra da decisão dele e percebam como, brilhantemente, usando o recurso da falácia – recurso que só gênios conseguem usar com louvor – ele quer nos fazer entender que “esculhambar o outro é um direito inerente à profissão do jornalista”.
Estamos perdendo a capacidade de argumentar, de fazer ideias e teses brigarem. Estamos optando pelo recurso retórico do argumentum ad hominem ao invés de fundamentar nossos pensamentos numa base teórica sólida. O jornalismo, então, está deixando de informar pra se tornar um instrumento de mera opinião, de politicagem, de manipulação ideológica. Estamos caminhando para a barbárie. E o pior: com a benção jurídica do Supremo Tribunal Federal.
Como diz o teólogo François Fénelon: "As difamações e calúnias são os argumentos daqueles que não têm razão."
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