segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

A ilegalidade da exigência de 3 provas pelo INSS para reconhecimento da União Estável

A Lei de Benefícios da Previdência Social estabelece que a companheira ou companheiro que convivem em união estável é dependente um do outro, fazendo jus aos benefícios previdenciários na condição de dependente do segurado que falecer. Referida regra está inserida no artigo 16 da Lei 8.213/91.
A Constituição Federal determina, para efeito da proteção do Estado, que é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
O Código Civil esclarece o que é União Estável da seguinte forma: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família”.
Para ser configurada a união estável não é necessário a convivência de um período de cinco anos ou qualquer outro prazo, pois a lei não estabelece um período mínimo para que seja caracterizada uma união estável. Independentemente do tempo de convivência em união estável, é necessário que esta união contemple alguns elementos, a saber:
  • Deve ser entre Homem e Mulher (existem exceções);
  • Convivência deve ser pública;
  • A união deve ser duradoura; Deve ter por objetivo a constituição de uma família.
Em relação ao primeiro elemento em que a lei estabelece que a união estável dever ser entre homem e mulher, a jurisprudência reconhece a possibilidade de união estável entre pessoas do mesmo sexo. Entendemos que tal posicionamento é equivocado do ponto de vista legal, pois caberia ao Poder Legislativo determinar referida regra e não o Poder Judiciário.
Porém, do ponto de vista econômico e social, referida medida parece ser adequada. Esta discussão requer a redação de um artigo próprio, devido às suas especificidades que não é objeto deste escrito. A questão da união estável ser duradoura, não significa que deve ter um prazo mínimo para ser caracterizada a união estável.
A lei não estabelece nenhum prazo, mas isto deve ser analisado individualmente em cada caso concreto, pois podemos afirmar que uma união de apenas 3 meses pode ser suficiente para caracterizar a união estável, desde que presentes os outros elementos. Também podemos afirmar, por outro lado, que uma união de 1 ano pode não ser considerada como união estável, na hipótese dos demais elementos não estarem presentes nesta relação.
Para fins de concessão de benefício de pensão por morte, o companheiro ou companheira está qualificado como dependente de primeira classe, isto significa que a dependência econômica é presumida e não exige prova. A Constituição Federal, o Código Civil, assim como a Lei de Benefícios Previdenciários 8.213/91, não exigem prova documental da existência da união estável. Desde que preenchidos os elementos necessários para caracterização da união estável, este fato deve ser reconhecido por todos, inclusive pelo INSS.
Muitos benefícios de pensão por morte são indeferidos pelo INSS por motivo de falta de prova de qualidade de dependente quando não são apresentados 3 provas documentais da existência da união estável. Entendemos que a exigência por parte do INSS de 3 provas documentais para aceitar a união estável alegada pela requerente do benefício de pensão por morte é ilegal e fere o princípio da hierarquia das leis.
Não existe, conforme já afirmamos, qualquer regra que determine a prova inequívoca da união estável para qualquer efeito ou finalidade, desde que presentes os seus elementos caracterizadores. Nem mesmo na Lei 8.213/91 que trata da concessão de benefícios previdenciários, existe qualquer regra ou restrição em relação ao reconhecimento da união estável. Porém, o INSS utiliza o Decreto 3.048/99 para justificar a exigência de 3 provas documentais para reconhecimento da união estável. Não temos o propósito de entrar em questões teóricas ou filosóficas, mas, entendemos que existe uma hierarquia das leis, devendo prevalecer a de maior hierarquia sobre a de menor.
Assim, podemos afirmar, sob o ponto de vista da prova da união estável que: Constituição Federal é a regra mais importante; Código Civil é a segunda regra mais importante; Lei de Benefícios Previdenciários é a terceira regra mais relevante. Nenhum dos regulamentos legais acima exigem qualquer prova documental para o reconhecimento da união estável.
É evidente que para se evidenciar a união estável, o companheiro ou companheira deve apresentar algum documento, fotografia, existência de filhos em comum, além de outros elementos para que seja esclarecida a existência de referida união.
No âmbito da Justiça Cível são aceitos todos os documentos que possam evidenciar a união estável, assim como, na falta de prova documental, é possível evidenciar tal fato por intermédio de prova exclusivamente testemunhal. Sabemos que para fins de prova de tempo de serviço ou contribuição, é exigido a existência de início de prova material, não sendo admitida a prova exclusivamente testemunhal. Porém, referida regra não se aplica para prova de união estável, pois não há nenhum dispositivo legal determinando que a prova da união estável, para fins previdenciários, deve ser por intermédio de início de prova documental.
O INSS utiliza como fundamento para exigir 3 provas documentais da união estável a regra constante no artigo 22, § 3º do Decreto 3.048/99, conforme segue:
§ 3º Para comprovação do vínculo e da dependência econômica, conforme o caso, devem ser apresentados no mínimo três dos seguintes documentos:
I - certidão de nascimento de filho havido em comum;
II - certidão de casamento religioso;
III - declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como seu dependente;
IV - disposições testamentárias;
V - (Revogado pelo Decreto nº 5.699, de 2006)
VI - declaração especial feita perante tabelião;
VII - prova de mesmo domicílio;
VIII - prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;
IX - procuração ou fiança reciprocamente outorgada;
X - conta bancária conjunta;
XI - registro em associação de qualquer natureza, onde conste o interessado como dependente do segurado;
XII - anotação constante de ficha ou livro de registro de empregados; XIII - apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;
XIV - ficha de tratamento em instituição de assistência médica, da qual conste o segurado como responsável;
XV - escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome de dependente;
XVI - declaração de não emancipação do dependente menor de vinte e um anos; ou
XVII - quaisquer outros que possam levar à convicção do fato a comprovar.
Em regra, quando não apresentado ao INSS pelo menos 3 provas da relação acima, o benefício de pensão por morte é indeferido por falta de prova de qualidade de dependente.
Até mesmo uma decisão judicial de reconhecimento de união estável é desprezada pelo INSS. Assim, para exemplificar o absurdo que é praticado pelas agencias do INSS, a dependente pode apresentar os seguintes documentos abaixo relacionados que, mesmo assim, não terá o reconhecimento da sua união estável para fins previdenciários, vejamos:
  • Certidão de nascimento de 4 filhos;
  • Fotografias com o companheiro;
  • Decisão judicial que reconhece a união estável;
  • Cinco testemunhas que acompanharam a união estável de mais de 20 anos; Contrato de locação onde o companheiro sobrevivente reside, firmado pelo falecido.
Os documentos acima indicados foram objeto de um caso real onde uma dependente requereu o benefício de pensão por morte e teve o seu pedido indeferido pelo INSS por não ter reconhecido os documentos acima apresentados.
A justificativa do INSS é que a certidão de nascimento de 4 filhos em comum com o segurado falecido é reconhecida como apenas uma prova, assim como não reconhece fotografias, provas testemunhais e decisão judicial de reconhecimento de união estável. Entendemos que a posição do INSS, além e injusta, é ilegal, pois faz exigência que não está prevista na lei e utiliza de interpretação equivocada para exigir as 3 provas documentais.
Seguem as nossas justificativas:
Não pode o Decreto 3.048/99 que é uma regra inferior à Constituição Federal e ao Código Civil, assim como está abaixo da Lei de Benefícios 8.213/91, estabelecer regras que não constam nestes regulamentos legais. Cabe apenas e tão somente ao Decreto esclarecer e viabilizar a aplicação da lei e não criar restrições inexistentes.
Na pior das hipóteses, mesmo aceitando a aplicação do Decreto 3.048/99 como justificativa da exigência das 3 provas materiais, no próprio Decreto não existe regra específica exigindo provas para a união estável, pois o § 3º do artigo 22 que é utilizado como fundamento pelo INSS para exigir as provas, trata-se de exigência de prova da dependência econômica e não da união estável. Uma vez que a dependência econômica do companheiro é presumida, não é lógico utilizar o mesmo critério que é utilizado na dependência econômica para a união estável.
Não é correto impedir a produção de prova testemunhal da união estável, pois não há impedimento legal para que referida prova seja apresentada em favor do dependente.
O inciso XVII do artigo 22, § 3º do Decreto 3.048/99, estabelece que o INSS deve aceitar qualquer outro documento que levar à convicção do fato a ser comprovado. Na prática o referido dispositivo é inexistente para o INSS, pois este órgão só aplica e interpreta a legislação em seu favor e em prejuízo do dependente que busca a concessão do benefício. Esta situação é evidenciada com o indeferimento do benefício mesmo com a apresentação de dezenas de provas que não estão identificados no rol estabelecido pelo INSS. Existem vários outros argumentos para justificar a irregularidade cometida pelo INSS em relação à exigência de 3 prova documentais para aceitar a existência da união estável para fins de concessão do benefício de pensão por morte, mas vamos nos limitar aos quatro fundamentos já lançados que, do nosso ponto de vista, já são mais do que suficientes para justificar a concessão do benefício no âmbito administrativo.

Fonte: http://ramosprev.com.br/exigencia-provas-inss-união-estável/
Autor: Waldemar Ramos Junior

http://ramosprev.jusbrasil.com.br/artigos/164297564/a-ilegalidade-da-exigencia-de-3-provas-pelo-inss-para-reconhecimento-da-uniao-estavel?utm_campaign=newsletter-daily_20150202_667&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Direitos do embrião

"Já não se pode limitar o direito do nascituro apenas ao de nascer."
Eudes Quintino de Oliveira Júnior


O Direito é uma ciência que não se esgota em uma única dimensão. Assim, por ser evolutivo e protetivo, todo fato novo com relevância social reclama sua participação, com a utilização de ferramentas próprias para a alcançar a eficácia da medida.
A 5ª câmara de Direito Civil do TJ/SC decidiu pela procedência do pedido de indenização referente ao seguro DPVAT. Isto porque, em razão de um acidente automobilístico, a autora da ação contava com 37 semanas de gestação, quando ocorreu a morte do nascituro. A decisão foi calcada na interpretação do disposto no art. 2º do CC: "A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro".
O embrião surge como agente de tutela estatal em várias oportunidades. A Declaração dos Direitos da Criança, promulgada pela Assembleia Geral da ONU, preconiza que a criança, em razão de sua imaturidade física e mental, necessita de proteção legal apropriada, tanto antes como depois do nascimento. O Estatuto da Criança e do Adolescente acrescenta ainda o direito de proteção à vida e à saúde, proporcionando um nascimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência.
Já não se pode limitar o direito do nascituro apenas ao de nascer. E sim ampliá-lo e agregar a ele o nascer com dignidade, com saúde, com a proteção estatal necessária, extensiva à sua mãe, de quem é dependente na vida pré-natal. Pode o embrião, desta forma, pela projeção alcançada, figurar como interessado em ação de alimentos, investigação de paternidade e outros direitos compatíveis com sua condição de concebido, mas não nascido.
Tanto é que a lei 11.804/08, conhecida impropriamente como "alimentos gravídicos", confere direito à mulher gestante, não casada e que também não viva em união estável, de receber alimentos, desde a concepção até o parto. Para tanto, deverá ingressar com o pedido judicial em desfavor do futuro pai. O juiz decidirá, no âmbito de uma cognição sumária, com base em indícios de paternidade, a obrigação alimentar do suposto pai, que poderá contestar, mas em restrito núcleo cognitivo também.
Agora, no entanto, em razão evolução da engenharia genética, já é possível a realização no Brasil de exame não invasivo consistente na procura do DNA fetal circulante na mãe e compará-lo com o material fornecido pelo pretenso pai. O avanço científico é tamanho
que, além do objetivo da paternidade, carrega precisão quase que incontestável no sentido de demonstrar que o embrião seja portador de síndromes de Down, Edwards, Patau, Turner, Klinefelter e Triplo X.
O nascituro, conforme se extrai do regramento pátrio, tem seus direitos preservados, porém não é detentor de capacidade jurídica. Tanto é verdade que, se não tiver pai e a mãe não for a responsável pelo poder familiar, a ele será nomeado um curador, que poderá, dentre outros direitos, representá-lo como donatário e pleitear em favor dele assistência médica. Defere-se ao embrião uma tutela sui generis. O status conferido a ele é totalmente divorciado daquele preconizado pelos romanos, no sentido de que o feto é apenas parte das vísceras da mulherpars viscerum matris –e que dele podia dispor, de acordo com sua conveniência, pois, enquanto não fosse dado à luz não seria considerado ser humano.
Tramita pelo Congresso Nacional o PL 478/07, dos deputados Luiz Bassuma (PT/BA) e Miguel Martini (PHS-MG), que dispõe sobre o Estatuto do Nascituro e foi aprovado pela Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados. Define o nascituro como sendo o ser humano concebido, mas não nascido, compreendendo aquele concebido "in vitro" ou por qualquer outro meio científico eticamente aceito. A respeito da personalidade humana estabelece que a adquire com o nascimento com vida, mas sua natureza humana é reconhecida desde a concepção, conferindo-lhe proteção jurídica através do estatuto, da lei civil e penal. É a repetição do pensamento do médico francês Jérôme Lejeune, pai da genética moderna, responsável pela descoberta de um cromossomo a mais sobre o par 21, quando avaliava uma criança com Síndrome de Down. Sua revelação, porém, contra sua vontade, começou a trilhar pela interrupção da gravidez de embriões portadores da doença. Veio a público defender o pensamento que, mesmo sendo um embrião portador de doença, deveria ser respeitado desde sua concepção até sua morte natural, em nítida luta contra o aborto.
Desta forma, por meio do Direito, o homem vai extrapolando o próprio conceito de concepção e vida humana e novos caminhos vão se abrindo para conferir ao embrião uma tutela mais abrangente. O direito à vida é inerente à pessoa humana e, pelo seu caráter de indisponibilidade, merece proteção desde a concepção, com o direito de nascer. Após, em todas as suas fases, infância, juventude, maioridade, maturidade e velhice, o homem continua recebendo a proteção legal compatível com seu estágio e vai acumulando direitos até se transformar numa fonte inesgotável, chamada de sujeito pleno de direitos.
Desta forma, o embrião, em sua clausura silenciosa, tem voz suficiente para transformar o mundo exterior para que possa recebê-lo com a pompa merecida e, principalmente, para que sua mãe possa ter as melhores condições de vida e saúde para gerá-lo. É um sujeito sem personalidade jurídica própria, mas com muita personalidade, convenhamos. Mesmo sem ter nascido, projeta-se como uma pessoa humana. É bom não esquecer que o homem de hoje foi o embrião de ontem.

*Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, pós-doutorado em Ciências da Saúde, advogado e reitor da Unorp - Centro Universitário do Norte Paulista.
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI214867,101048-Direitos+do+embriao