quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Brigas não impedem ampliação de direito de visitas de pai

Decisão é da 3ª turma do STJ. QUARTA-FEIRA, 30/8/2017.

O fato de os pais litigarem demasiadamente, e, para dizer o óbvio, desnecessariamente, sem facilitar a comunicação interpessoal por mera falta de vontade, situação lamentável, não deve impedir o direito de visitas do pai, que deve ser pleno, porquanto quinzenal.”

A afirmação consta em sensível acórdão relatado pelo ministro Ricardo Cueva, ao prover parcialmente recurso para ampliar o direito de visita de um pai que encontra a filha apenas quinzenalmente.
O autor pediu a ampliação das visitas, para que buscasse a filha na escola, na sexta-feira (ou último dia útil anterior ao fim de semana, em caso de feriado conjugado) e devolvê-la na escola, na segunda-feira (ou primeiro dia útil posterior ao fim de semana, em caso de feriado).
O acórdão recorrido afastou a ampliação sob fundamento de que essa forma de visitação poderia impactar na rotina escolar da menina, “visto que ela teria de levar roupas e pertences para a escola, além do material escolar, o que geraria uma rotina cansativa, irrazoável e confusa”.
Boa vontade
Embora tenha negado o pedido de guarda compartilhada, o ministro Cueva concluiu que nada impede que o pai busque a criança na sexta-feira na escola e a entregue na segunda-feira também no colégio.
Para tanto, basta a boa vontade de ambas as partes, tendo em vista que o pernoite no domingo não teria o condão de confundir a criança, que nasceu no dia 18.9.2003 e já possui quase 11 anos de idade.”
Segundo o ministro relator, o fato dos pais litigarem e não terem boa comunicação entre si não pode influencias no convívio da criança com um dos genitores.
É imprescindível que ambos os genitores se conscientizem que a filha menor, dada a idade e a fase peculiar da vida, ainda não consegue realizar as melhores escolhas e depende, diuturnamente, de seus cuidados com higiene, estudo e alimentação. É indispensável que reconheçam a necessidade de colaborarem mutuamente em tal contexto, em especial no que se refere aos cuidados básicos.”
Na decisão, acompanhada à unanimidade pela 3ª turma do STJ, o ministro assevera que a rotina que permite a ampliação das visitas “é passível de ser implementada com a contribuição dos genitores, que deverão primar pelo bom convívio”.
http://m.migalhas.com.br/quentes/264610/brigas-nao-impedem-ampliacao-de-direito-de-visitas-de-pai

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Direito de família: 4 consequências fundadas no princípio da dignidade da pessoa humana

Conheça 4 consequências jurídicas decorrentes da proteção à dignidade da pessoa humana.

Publicado por EBRADI

O direito de família pode ser compreendido como um ramo do direito civil dotado de regras jurídicas atinentes à estrutura, organização e proteção das diversas formas de família existentes, tal ramo do direito, portanto, ocupa-se de estabelecer as obrigações e direitos permeados nas relações familiares, regulando a convivência familiar.

Nesse contexto, o princípio da dignidade da pessoa humana tem incidência forte no direito de família, diante da convivência humana e das relações que pressupõe a família. Versa-se, aqui, acerca da necessidade de respeito mútuo.

Decorre, portanto, da dignidade da pessoa humana as seguintes consequências jurídicas:

1. Coibição e punição à alienação parental: pois o ato resulta em tratamento indigno do alienado e do terceiro prejudicado, ensejando em problemas de cunho psicológico e social.

2. Preferência à guarda compartilhada: deve o juiz priorizar a guarda compartilhada, mesmo em caso de litígio entre o casal, uma vez que esta ameniza os efeitos da separação para a criança.

A guarda compartilhada não significa a mera alternância de casas (guarda alternada), mas sim o compartilhamento das ações, decisões, planejamento e opiniões, mantendo a criança em um domicílio dominante para que tenha referência.

3. Fixação justa dos alimentos: os alimentos devem refletir a dignidade da qualidade de vida, dentro do binômio necessidade-possibilidade. Devem, pois, não só nutrir o físico, mas manter o padrão social da criança após o divórcio (proteção da dignidade da criança).

Mas, também, os alimentos não podem servir como loteria a quem os recebe, haja vista que um genitor não pode ser obrigado a arcar com todos os custos da criança, deve haver divisão das despesas segundo o critério da possibilidade de cada um (proteção da dignidade de quem paga).

4. Possibilidade de divórcio imotivado: a partir da emenda constitucional 66 de 2010, restou estabelecido o divórcio direto, sem tempo e motivo como fundamento à ruptura do vínculo.

O exercício passa pelo livre arbítrio do requerente, dando dignidade a quem quer findar a sociedade conjugal. É direito potestativo do cônjuge.

Estas são quatro das diversas características que podem ser extraídas do princípio da dignidade da pessoa humana.

https://ebradi.jusbrasil.com.br/artigos/492838272/direito-de-familia-4-consequencias-fundadas-no-principio-da-dignidade-da-pessoa-humana?utm_campaign=newsletter-daily_20170829_5899&utm_medium=email&utm_source=newsletter

STJ: Concessionária não pode reter veículo por falta de pagamento do serviço

Decisão é da 3ª turma do STJ. Terça-feira, 29 de agosto de 2017

Pode uma oficina mecânica que realizou reparos em veículo, com autorização de seu proprietário, reter o bem por falta de pagamento do serviço ou tal ato configura esbulho, ensejador de demanda possessória?

A resposta veio da 3ª turma do STJ, em julgamento de caso relatado pelo ministro Ricardo Cueva.

Em decisão unânime, a turma acompanhou o entendimento do relator de que “o direito de retenção, sob a justificativa de realização de benfeitoria no bem, não pode ser invocado por aquele que possui tão somente a detenção do bem”.

No caso, o carro foi deixado na concessionária pela proprietária somente para a realização de reparos, e conforme o ministro, tal fato não conferiu à oficina sua posse.

“A concessionária teve somente a detenção do bem, que ficou sob sua custódia por determinação e liberalidade da proprietária, que, em princípio, teria anuído com a realização do serviço. Reforça-se, a posse do veículo não foi transferida para a recorrente, que jamais a exerceu em nome próprio, mas, sim, em nome de outrem, cumprindo determinações da proprietária do bem, numa espécie de vínculo de subordinação.”

O ministro Cueva lembrou que, nos termos do art. 1.196 do CC, possuidor é aquele que pode exercer algum dos poderes inerentes à propriedade, circunstância não configurada na espécie.

“O direito de retenção decorrente da realização de benfeitoria no bem, hipótese excepcional de autotutela prevista no ordenamento jurídico pátrio, só pode ser invocado pelo possuidor de boa-fé, por expressa disposição do art. 1.219 do Código Civil de 2002.”

Processo relacionado: REsp 1.628.385

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI264545,91041-Concessionaria+nao+pode+reter+veiculo+por+falta+de+pagamento+do

O STJ e as adoções irregulares


I - A ADOÇÃO À BRASILEIRA
“Adoção à brasileira” ou “adoção à moda brasileira” ocorre quando o homem e/ou a mulher declara, para fins de registro civil, o menor como sendo seu filho biológico sem que isso seja verdade.

Trata-se de conduta prevista como crime como se lê do artigo 242 do Código Penal.

Art. 242. Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho de outrem; ocultar recém-nascido ou substituí-lo, suprimindo ou alterando direito inerente ao estado civil:
Pena - reclusão, de dois a seis anos.
Parágrafo único - Se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza:
Pena - detenção, de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar a pena.

Além de sujeitar o adotante a essas sanções penais, a adoção informal pode dar margem à suspeita de outros crimes, como se viu em caso julgado recentemente no Superior Tribunal de Justiça, sob relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

O Recurso em Habeas Corpus trouxe a história de um bebê recém-nascido, entregue pelos pais biológicos a um casal. A entrega foi intermediada por terceiro, que possivelmente recebeu R$ 14 mil. A mãe biológica também teria recebido uma quantia de R$ 5 mil pela entrega da filha.

No registro da criança constou o nome da mãe biológica e do pai adotante, que se declarou genitor do bebê. A criança permaneceu com o casal adotante por aproximadamente quatro meses, até ser recolhida a um abrigo em virtude da suspeita de tráfico de criança.

O Ministério Público de Santa Catarina ajuizou ação de busca e apreensão do bebê, com pedido de destituição do poder familiar do pai registral e da mãe biológica, bem como de nulidade do registro de nascimento. O juízo de primeira instância deferiu em caráter liminar o acolhimento institucional da criança. O casal impetrou Habeas Corpus pedindo o desabrigamento da criança e a sua guarda provisória.

Com a negativa do HC pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina, o casal recorreu ao STJ. Afirmou que a criança estava sofrendo “danos psicológicos irreversíveis” em virtude da retirada do lar e que não houve tráfico de criança.

Antes de 2009, o STJ tinha o entendimento pacífico de que não era possível a discussão de questões relativas à guarda e adoção de crianças e adolescentes utilizando-se a via do Habeas Corpus. Entretanto, em julgamentos a partir dessa data, os ministros têm excepcionado o entendimento “à luz do superior interesse da criança e do adolescente”, esclareceu Sanseverino. Segundo o ministro, a análise do caso deve se limitar à validade da determinação legal de acolhimento institucional do menor e posterior encaminhamento para adoção.

Sobre a matéria da adoção à brasileira, pronunciou-se Joacinay Fernanda do Carmo Nascimento (Adoção à brasileira):

Convencionou-se a vulgarmente a chamar de adoção à brasileira, um sistema de adoção feito sem o procedimento legal para o processo de adoção, onde consiste no ato de registrar filho alheio como próprio, ou seja, a criança é registrada por pais não biológicos sem atender aos requisitos estabelecidos em lei. Essa prática já existe no Brasil de forma disseminada, e seu nome foi eleito pela jurisprudência, no entender de Maria Berenice Dias (2013, p.509).

O registro da criança é feito no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, de forma extremamente fácil, pois com base no disposto no art. 54 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73), basta o suposto pai ou mãe declarar o nascimento relatando que a criança nasceu em casa.

Além dos motivos que já foram relatados, existem outros fatores que também influenciam na prática da adoção à brasileira, dentre eles estão à esquiva de um processo judicial para adoção, demorado e dispendioso e o medo de não lhe ser concedida a adoção pelos meios regulares, pois há uma grande formalidade a ser seguida durante o processo devendo aguardar no final uma sentença do juiz, que analisará os requisitos, e caso o adotante não esteja apto, rejeitará o pedido. (PAULA, Tatiana Wagner Lauand de, 2007)

Desta forma, as pessoas passam a optar pela adoção à brasileira para atingir seu objetivo de forma rápida e fácil, sem pensar nas conseqüências que poderão surgir através desta prática ilegal. Destacam-se duas conseqüências relevantes de tal ato.

A primeira delas consiste na anulação do registro de nascimento, isso poderá ocorrer caso a mãe venha a se arrepender futuramente de ter dado seu filho para que outro registrasse, e com um simples exame de DNA, a mãe biológica poderá comprovar seus laços sanguíneos, e assim poderá resultar na desconstituição daquela entidade familiar, o que demonstra que tal relação é muito frágil, onde a família que prefere pela forma irregular, acaba também optando por viver uma situação instável e arriscada, se submetendo ao medo de que no futuro a verdade possa vir à tona.

Vale ressaltar que o arrependimento dos pais biológicos não garante que a criança voltará para o convívio deles, pois a legislação brasileira que trata da adoção legal (Lei12. 010/09), tem como prioridade o convívio familiar, onde a família se sobrepõe a instituição, e o afeto tem mais importância que o vínculo biológico, o que dificultaria o retorno dessa criança aos pais biológicos. Lembrando ainda que a adoção à brasileira não goza da irrevogabilidade nem da proteção e segurança jurídica dada à adoção legal.

Além do mais, quando faticamente há uma adoção consolidada, a regularização da situação se faz necessária e tem base no princípio constitucional do melhor interesse da criança, disposto no artigo 227 da Constituição Federal e art. 39 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente. A regularização, neste caso, representa efetivo benefício à criança que tem direito absoluto à convivência e, para quem, muitas vezes, os únicos pais que conhece são os pais adotivos.

Nos casos de adoção através de registro de filho alheio em nome próprio o vínculo familiar representa a verdade sócio afetiva e traz consigo uma estabilidade e segurança física e emocional à criança. Essa proteção é o bem jurídico de maior relevância e é a efetivação do disposto no princípio constitucional do melhor interesse da criança.

A segunda consequência importante é a que trata da esfera penal, visto que há previsão legal do ilícito de registrar filho alheio como próprio, sendo assim a adoção à brasileira é um crime previsto no ordenamento jurídico brasileiro.

A adoção à brasileira vem sendo comumente praticada do Brasil, por mais que seja por nobre motivo, tal pratica vem a ser uma dissimulação e uma infração a lei, visto que é tratada como crime no capítulo “dos crimes contra o estado de filiação” (capítulo II do Título VII), tipificada no artigo 242 do Código Penal Brasileiro (Decreto Lei 2.848/1940). (BOCHNIA, Simone Franzoni, 2010)

Ademais, o crime de falsidade ideológica trazido pelo art. 299 do Código Penal (Decreto Lei 2.848/1940) vem complementar a tipicidade da prática de registro de filho alheio em nome próprio.

Além de dar proteção e garantia ao estado de filiação, o legislador teve intuito de preservar a autenticidade e a veracidade dos documentos públicos. Protegem-se a segurança e a certeza do estado de filiação evitando supressão ou alteração de direito inerente ao verdadeiro estado civil da criança, que poderia ficar juridicamente vinculado a pais diversos de seus verdadeiros.

O combate à adoção à brasileira também se justifica na medida em que a adoção pode ser praticada com fins lucrativos. E a criminalização da adoção à brasileira é a forma de amparar a família, essencial na formação da dignidade de todo cidadão, principalmente das crianças e dos adolescentes. O Estado tem o dever de proteger a família, já que dela depende a subsistência de toda a sociedade.

Todavia, se o crime é praticado com reconhecida nobreza, o próprio Código Penal (Decreto Lei 2.848/1940) reconhece no parágrafo único do art. 242 que poderá o juiz deixar de aplicar à pena e esta tem sido a conduta adotada pela jurisprudência. Tal fato ganhou ainda mais força com o advento da lei 12.010/2009 onde a prioridade é a convivência familiar, através da qual a família se sobrepõe a instituição, e com isso, acredita-se que a adoção à brasileira será analisada sem que haja punição.

Embora se possa pensar que a adoção à brasileira é uma exceção, a ela se arriscando apenas pessoas de menor esclarecimento e de baixa renda, pesquisa elaborada demonstra o contrário. Há quase a mesma proporção de adoções regulares e irregulares no Brasil.

“Destacando-se o percentual de 52,1% de adoções regulares e o restando compondo as adoções irregulares, em que a maioria das adoções informais, ou seja, 41,5% ocorreram através de registro em cartório da criança de outrem, como filho legítimo, através de uma declaração falsa de nascimento. O restante das adoções informais, 6,4% seguiu o procedimento conhecido como filhos de criação, isto é a criança passa a morar definitivamente com outra família, mas sua certidão de nascimento não é alterada, permanecendo com a filiação de seus pais biológicos”. (GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues, Adoção Doutrina e Prática, Curitiba, 2012, p.139)

Outro fator que merece destaque é que a adoção à brasileira pode gerar não só uma possibilidade de condenação penal, como a nulidade do registro, pois o mesmo não está em conformidade com a lei, sendo assim a qualquer momento o mesmo poderá ser declarado como nulo, pois quem se sujeita a adoção à brasileira está constantemente exposto ao risco de descoberta do ocorrido.

Todavia, são unanimes a doutrina e a jurisprudência em diligenciar meio e pretextos para contornar o texto álgido da lei a fim de não cominar pena alguma. Ademais, com o advento da lei 12.010/2009, a prioridade é a garantia do direito à convivência familiar a todas as crianças e adolescentes e, com isso, pode o adotante, de fato, requerer a regularização da situação de sua adoção irregular utilizando o melhor interesse da criança e o fato dela já se encontrar incluída em uma família. Entretanto, será necessária a comprovação dos requisitos para efetivação da adoção legal.

Deve-se ressaltar, contudo, que a adoção, atualmente, só poderá ser deferida pelo juiz quando apresentar reais vantagens para o adotando e tão somente quando não mais houver possibilidades de resgatar a filiação biológica.

A análise jurisprudencial referente à adoção à brasileira vem a ser muito importante, pois vem dispor sobre as decisões dos tribunais acerca da desconstituição do vínculo parental nas adoções de forma irregular.

Pode-se concluir que a doutrina e a jurisprudência são pacificas na busca pelo melhor interesse para criança, garantindo assim a convivência familiar, onde pôr fim acabam desconstituindo o vínculo parental em face do vínculo socioafetivo.

Sendo assim a doutrina e a jurisprudência são unânimes em diligenciar meios e pretextos para contornar o texto álgido da lei a fim de não cominar pena alguma, quando alguns, entre esses milhares de casos que anualmente ocorrem, chegam por qualquer circunstancias as barras dos tribunais. Ninguém resiste à verdadeira coação de ordem moral decorrente do alto valor espiritual e humano que inspiram tais gestos. (GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues, 2012)

Com base nisso, encontrou-se, por proposta da Associação Brasileira de Juízes e Promotores da Infância e da Juventude, uma solução legislativa que, embora não descriminalizasse o fato, penalizava-o de forma mais branda, permitindo até o perdão judicial.

Com efeito, a lei 6.898 de 30.03.1981, passou a tipificar o “registrar como seu o filho de outrem”, como crime no Código Penal, em seu art. 242, onde a pena é de dois a seis anos de reclusão, mas em contrapartida vem excepcionar em seu parágrafo único, onde diz “se o crime é praticado por motivo de reconhecida nobreza, a pena é de um a dois anos, podendo o juiz deixar de aplicar à pena".

O que se observa é que cada vez mais as decisões são em favor do vínculo afetivo e da entidade familiar, onde os acórdãos absolutórios são quase que unanimes.

A título de exemplo podem ser citados os pronunciamentos: RT 149/706; 155/305; 167/541, 542, 190/65; 195/97, bem como TJ-RS - Apelação Crime: ACR 70042425280 RS; 2ª Vara Cível, Criminal e de Execuções Penais de MangaProcesso: 0393.03.006610-3; Natureza: Ação penal (art. 242 do CP) Autor: Ministério Público do Estado de Minas Gerais; TJ-SC - Apelação Criminal : APR 722784 SC 2008.072278-4, além dos julgados do Superior Tribunal de Justiça: Resp 1172067/MG, RESP 234833/MG, RESP 1088157/PB e RESP878941.

Entende-se que a jurisprudência afirma que a paternidade jurídica afasta a paternidade biológica, e a paternidade socioafetiva passou a ter reconhecimento, uma vez que nenhum interesse pode se sobrepor a República Federativa do Brasil, onde esta tem como base a dignidade da pessoa humana. Diante disso fica claro e justificado os inúmeros posicionamentos dos tribunais em preservar a paternidade socioafetiva, bem como conceder o perdão judicial para pessoas que optaram pela pratica da adoção à brasileira.

Todos os julgados consultados demostram que os Tribunais Brasileiros preferem decidir pela preservação da paternidade socioafetiva, mesmo sendo ela resultado de uma adoção irregular, e havendo previsão legal de crime para tal ato, do que desconstituir os laços afetivos criados, privilegiando a paternidade biológica, na qual houve abandono.

Há decisões, inclusive, que acreditam não haver uma falsidade no registro, indo contra o que determina a lei para privilegiar os laços afetivos, sob alegação de que o registro é o espelho das relações sociais de parentesco, sendo o registro sempre verdadeiro se estiver conciliado com o fato jurídico que lhe deu origem. Ademais, não pode o direito ser baseado numa racionalidade de formas, devendo ser baseado numa razão de conteúdo e, portanto, não se pode decidir de acordo com o simples vinculo biológico.

Diante disso, verifica-se que a tipificação prevista no Código Penal, em seu Art. 242, referente à punição daquele que registra filho alheio como próprio, está em completo desuso, visto que, não há condenação para pais que registraram aquela criança como sua, pois suas atitudes foram motivadas pelo afeto e amor, e não podem, por não ser justo, serem punidos por darem uma vida melhor aquela criança, resultando assim no perdão judicial para os atos praticados.

Concluíram Isabel Marques e Vanesca Marques de Souza(Adoção à brasileira: a justiça cúmplice de um ato ilícito): "Quando há a descoberta da adoção irregular, acarreta em algumas consequências. A legislação vigente pune os responsáveis por essa adoção, com punições na esfera tanto civil, como penal. Na esfera cível se inicia com anulação do registro de nascimento da criança, podendo inclusive ocorrer a retirada da criança dos pais. Já na esfera penal, os mesmos responderão pela prática do crime intitulado como registro de parto alheio como próprio.

Contudo, apesar de previsto na legislação, é importante destacar que deverá ser analisado o caso concreto, pois a filiação não é apenas um direito da verdade, e sim também é um direito da vida, do melhor interesse da criança, da afetividade, dos sentimentos e do tempo que já passou.

Portanto, a filiação biológica não poderá se sobrepor à filiação afetiva constituída por demais causas e assim prevalecendo a convivência familiar prevista na Constituição Federal, em seu artigo 227.

Quando houver um conflito entre os pais biológicos e os pais socioafetivos do filho menor, este não irá ser resolvido pela prevalência dos biológicos sobre os afetivos. A melhor solução para a resolução deste conflito levará em consideração os interesses das crianças. A Convenção Internacional dos Direitos da Criança preceitua que em todas as ações que envolvam crianças deverá ser considerada o melhor interesse da criança, primeiramente, em prevalência aos interesses dos pais. Tal norma foi recepcionada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e também pelo Código Civil."

Daí porque disse Galdino Augusto Coelho (adoção, Curso de direito da criança e do adolescente: Aspectos teóricos e práticos, 2010, pág. 197 a 266): "A adoção é o grande exemplo da filiação socioafetiva, seu único elo é o afeto, que deve prevalecer sobre tudo. Toda criança/adolescente que tem a possibilidade de ser adotada já passou por um momento de rejeição em sua vida, tendo conseguido obter e dar amor a um estranho que vê, agora, como um pai, superando o sentimento de perda. Não se justifica que, em nome ao respeito a uma regra que tem a finalidade única de dar publicidade e legalidade às adoções, o sentimento, o sustentáculo da adoção, seja colocado em segundo plano e a criança seja obrigada a passar por outro drama em sua vida, sair da companhia de quem aprendeu a amar."

II - A ADOÇÃO INTERNACIONAL


A adoção internacional envolve famílias estrangeiras.

Isso inclui tanto brasileiros morando no exterior quanto pessoas de outra nacionalidade que habitem no exterior, que queiram adotar uma criança ou adolescente no Brasil e que devem cumprir três requisitos:
• Quando a colocação em família substituta é a única solução para o caso da criança ou adolescente.
• Quando não houve opção de uma família residente no Brasil adotar a criança ou adolescente.
• Quando o adotando tiver idade suficiente para se manifestar, ele deve ser consultado para se ter certeza que ele quer ir com aquela família para outro país.

Guarda e tutela são proibidos aos estrangeiros.

Organismos credenciados podem intermediar a adoção internacional, desde que a legislação do país de acolhida permita isso.

O adotando só pode sair do Brasil depois que houver o trânsito em julgado da sentença que concedeu a adoção internacional.

A adoção por estrangeiro deverá obedecer aos casos e condições estabelecidas(CC, artigo 1629).

Na matéria há condutas estabelecidas como crime pelo ECA:
Artigo 238: Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante paga ou recompensa:
Pena - reclusão de um a quatro anos, e multa.
Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa

Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro:
Pena - reclusão de quatro a seis anos, e multa.
Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: (Incluído pela Lei nº 10.764, de 12.11.2003)
Pena - reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência

O Brasil também passou a aderir a tratados, acordos e convenções internacionais para permitir a adoção por estrangeiros. Esse assunto não é recente, mas bastante discutido principalmente para preservar o melhor interesse para os adotandos.

O Congresso Nacional aprovou a Convenção de Haia, que começou a vigorar em Abril do ano de 1995, contendo em seu artigo 1 e 5, o objetivo e os elementos necessários para adoção internacional respectivamente:
“Art. 1. A presente convenção tem por objetivo:
a) Estabelecer garantias para que as adoções internacionais sejam feitas segundo o interesse superior da criança e com respeito aos direitos fundamentais que lhe reconhece o direito internacional;

Art. 5. As adoções abrangidas por esta Convenção só poderão ocorrer quando as autoridades competentes do Estado de acolhida:
a) tiverem verificado que os futuros pais adotivos encontram-se habilitados e aptos para adotar;
b) tiverem-se assegurado de que os futuros pais adotivos foram convenientemente orientados;
c) tiverem verificado que a criança foi ou será autorizada a entrar e a residir permanentemente no Estado de acolhida.”

Esta convenção tem o intuito de que a adoção internacional venha apresentar real vantagem para crianças e adolescentes que não conseguem uma família substituta no seu próprio país, atuando de forma preventiva e repressiva ao tráfico, assegurando acima de tudo a preservação dos direitos fundamentais e respeitando o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

Essa preocupação pode bem ser observada no artigo 8 da Convenção[ que estabelece: “As Autoridades Centrais tomarão, diretamente ou com cooperação de autoridades públicas, todas as medidas apropriadas para prevenir benefícios materiais induzidos por ocasião de uma adoção e para impedir qualquer prática contrária aos objetivos da Convenção”.

A Constituição Federal, em seu art. 227 § 5º estabelece que: “A adoção será assistida pelo poder público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros”.

O legislador brasileiro incorporou ao Estatuto da Criança e do Adolescente os dispositivos legais que contém regras e condições para a realização da adoção internacional estabelecidas na Convenção de Haia como se pode observar nos artigos art. 51 a 52-D.

O art. 51 do Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece o que vem a ser uma adoção internacional: “Considera-se adoção internacional aquela na qual a pessoa ou casal postulante é residente ou domiciliado fora do Brasil, conforme previsto no art. 2º da Convenção de Haia, de 29 de maio de 1993, Relativa à Proteção das Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção Internacional, aprovada pelo Decreto Legislativo 1, de 14 de janeiro de 1999, e promulgada pelo Decreto 3.087, de 21 de junho de 1999.

Como se pode observar, o que determina a realização da adoção internacional, é justamente, o adotante residir ou morar fora do país. Isso quer dizer que não seria aquela feita por estrangeiros, necessariamente, mas é internacional em razão do domicílio, critério territorial.

Antes de se estabelecer os requisitos necessários para a efetivação do processo de adoção internacional, há de se trazer um comentário realizado por Stolze e Gagliano(Novo Curso de Direito Civil, volume 6: Direito de família – As famílias em perspectiva constitucional. 2 ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Editora Saraiva, 2012, p. 679) que serve de reflexão: “Se por um lado, não podemos deixar de incentivar a adoção, como suprema medida de afeto, oportunizando às nossas crianças e aos nossos adolescentes órfãos uma nova vida, com dignidade, por outro, é de se ressaltar a necessidade de protege-los contra graves abusos e crimes.”

Trata-se de um assunto bastante delicado tendo em vista a incerteza do real benefício que a adoção internacional poderá trazer ou não aos adotados.

A adoção internacional se apresenta como exceção da exceção e para realização desse processo há de se observar alguns critérios. Inicialmente as pessoas interessados em adotar devem se habilitar perante a autoridade central em matéria de adoção internacional no seu país de origem, conforme estabelecido na Convenção de Haia.

Há, em qualquer caso, a primazia dos interesses do menor.

III - A ADOÇÃO E O POUCO CONVÍVIO DOS ADOTANTES IRREGULARES COM O MENOR

Recentemente o Superior Tribunal de Justiça entendeu que o pouco convívio com adotantes irregulares não autoriza adoção à brasileira.

Segundo o site do STJ, ao analisar um caso de adoção irregular – a chamada adoção à brasileira –, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que uma criança de um ano de idade seja recolhida em abrigo, por entender que a medida atende melhor ao seu interesse. Os ministros levaram em conta a idade da criança, seu pouco tempo de convívio com os adotantes irregulares e também as suspeitas de tráfico de menores apontadas pelo Ministério Público.

Para o ministro Marco Buzzi, relator de um habeas corpus impetrado no STJ pelos adotantes, a situação é peculiar e exige uma solução que não incentive a adoção irregular, de modo a “verdadeiramente” preservar o melhor interesse da criança.

Os adotantes alegaram que o menor não sofria maus tratos e já teria criado vínculos com a família, razão pela qual a guarda deveria ser mantida, apesar da adoção irregular.

Ao rejeitar o pedido, o juiz de primeiro grau destacou que a guarda só foi requerida formalmente depois que o Ministério Público estadual ingressou com a ação de destituição de poder familiar contra os adotantes e a mãe biológica.

“Tal postura por parte dos impetrantes reforça as gravíssimas suspeitas de tráfico de criança narradas na ação de destituição de poder familiar”, afirmou o ministro Buzzi.

Segundo ele, a atitude dos adotantes também confirma a ilegalidade na forma como foi feita a transferência da guarda do menor, “em afronta à legislação regulamentadora da matéria sobre a proteção de crianças e adolescentes, bem assim às políticas públicas implementadas com amparo do Conselho Nacional de Justiça”.

Citando precedentes das turmas de direito privado do STJ em casos semelhantes, Marco Buzzi disse que a pouca idade da criança e o fato de os elos de convivência não estarem consolidados inviabilizam a flexibilização das regras legais para permitir a adoção à brasileira em nome da primazia dos interesses do menor.

“No caso, o melhor interesse da criança se consubstancia no acolhimento provisório institucional, tanto em razão do curto lapso de tempo de convívio com os impetrantes, de modo a evitar o estreitamento dos laços afetivos, quanto para resguardar a adequada aplicação da lei”, disse o ministro.

ROMANO, Rogério Tadeu. Situações irregulares de adoção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5172, 29 ago.2017. Disponível em: <https://jus.com.br/artigos/59957>. Acesso em: 30 ago. 2017.

terça-feira, 29 de agosto de 2017

Mulher consegue guarda definitiva de papagaio que está há 30 anos na família

Decisão é da Justiça de SC.
segunda-feira, 28 de agosto de 2017

"Levando-se em consideração que as normas ambientais visam proteger o meio ambiente, retirar o papagaio do lar em que vive há mais de vinte anos acarretaria em mais prejuízos que efetivamente proteção."
Assim decidiu o juiz de Direito Flávio Luís Dell'Antônio, de Tangará/SC, ao conceder o direito de posse e guarda doméstica de papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva) a uma mulher que cuida do animal há aproximadamente 30 anos.
O magistrado anulou a multa que foi aplicada pela Polícia Ambiental pela posse do papagaio, que não está ameaçado de extinção; o julgador deixou de aplicar a regra em relação a outra ave que surgiu no quintal da autora e do qual cuidou, um papagaio-de-peito-roxo, “posto que estando ameaçado de extinção não se enquadra na exceção prevista em lei”.
O advogado Riquelmo Cesar Menegatt Taietti patrocinou a causa pela mulher.
  • Processo: 0300234-22.2015.8.24.0071
Veja a decisão.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI264472,61044-Mulher+consegue+guarda+definitiva+de+papagaio+que+esta+ha+30+anos+na

Exercícios de fixação dia 28/08/17 (Direito das Obrigações)

1. Eliane foi contratada para prestar serviços de animação em uma festa infantil. No dia da festa, foi sequestrada, ficando impossibilitada de cumprir a obrigação. A contratante Raquel buscou as vias judiciais pleiteando danos materiais e morais, alegando que os convidados ficaram frustrados e ela própria, dona da festa, ficou envergonhada. Há chances da ação movida por Raquel ser procedente com base na lei civil? Justifique sua resposta.

2. Newton foi proibido, judicialmente, de se aproximar de Cláudia. Que tipo de obrigação é essa? Como pode o juiz garantir o afastamento de Newton?

3. Cynthia foi contratada por Sthefane para a confecção de uma estante de madeira. Quando o bem estava pronto, Cynthia se descuidou e deixou o objeto em lugar exposto, sem qualquer proteção. No dia seguinte, o bem foi roubado. Analise os efeitos civis da situação exposta.

4. Laísa tem o direito de receber de Nathália um carro, no valor de R$100.000,00 (cem mil reais) ou a quantia correspondente. O carro foi roubado uma semana antes do cumprimento da obrigação. Quais os efeitos jurídicos desse fato?

segunda-feira, 28 de agosto de 2017

Plano de saúde e hospital indenizarão mulher que sofreu violência obstetrícia

Decisão é da Justiça de SP.
sexta-feira, 25 de agosto de 2017

O juiz de Direito Rafael Rauch, de Taboão da Serra/SP, condenou um plano de saúde e um hospital a indenizarem uma mulher que sofreu violência obstetrícia.
A autora narrou ser titular de plano de saúde com segmentação “ambulatorial+hospitalar+ obstetrícia”, tendo direito a internação em quarto privativo. No entanto, chegada a hora do parto, não foi acomodada em quarto individual, o que impediu o acompanhamento do procedimento por seu marido.
O magistrado lembrou na sentença que a própria ANS determina a obrigação dos fornecedores dos planos de saúde de garantir o acesso de acompanhante às parturientes, em todo o procedimento, seja no pré-parto, parto ou pós-parto.
Para o juiz, as rés não comprovaram que não havia vagas em acomodações individuais, e ainda que fosse o caso, “tinham as requeridas o dever de promover a remoção da autora para estabelecimento em condições adequadas de atendimento”.
Violência obstetrícia
O juiz Rafael Rauch entendeu comprovada a alegação da autora que realizou o parto em ambiente insalubre e foi tratada com descaso no atendimento. Uma testemunha narrou que “as enfermeiras chegaram a indicar que autora estava “enchendo o saco”.”
E tudo isso ocorreu em um dos momentos mais importantes da vida da requerente, o que ela recordará para sempre, acarretando sentimentos de amargura e injustiça.”
Diante de tal quadro, o julgador fixou condenação solidária para as rés no valor de R$ 18.740, a ser corrigido monetariamente e acrescido de juros moratórios.
As advogadas Karina Santos Correia e Olga Sofia Rocha Teixeira da Fonseca Colonnese patrocinaram a causa.
  • Processo: 1003315-16.2015.8.26.0609
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI264365,21048-Plano+de+saude+e+hospital+indenizarao+mulher+que+sofreu+violencia

Governo Federal extingue reserva e permite a exploração mineral em área da Amazônia equivalente à da Dinamarca

Direito de imagem MARIO TAMA/GETTY IMAGE

O Decreto, de n.º 9.142/2017, foi assinado pelo Presidente Michel Temer.

Publicado por André Cavalcanti

Flávia Milhorance, Para a BBC Brasil em Londres, 24 agosto 2017

Área na Amazônia do tamanho da Dinamarca perderá o status de proteção ambiental.

Em meados de 1980, uma região da floresta amazônica entre o Pará e Amapá comparada à Serra dos Carajás por seu potencial mineral despertava o interesse de investidores brasileiros e estrangeiros.

Para salvaguardar sua exploração, o então governo militar decretou em 1984 que grupos privados estavam proibidos de explorar a Reserva Nacional do Cobre e Associados (Renca), uma área de quase 47 mil km quadrados - maior que o território da Dinamarca. A ideia era que a administração federal pesquisasse e explorasse suas jazidas.

Nos anos seguintes, no entanto, o projeto avançou pouco, e a riqueza natural da área levou à criação de nove zonas de proteção dentro da Renca, entre elas reservas indígenas. A possibilidade de mineração foi, então, banida.

Mais de três décadas depois do decreto, nesta quarta-feira, o governo federal reabriu a área para a exploração mineral, numa iniciativa que gera expectativa de empresas e preocupação de pesquisadores e ambientalistas.

Assinado pelo presidente Michel Temer, o decreto nº 9.142 extingue a Renca e libera a região para a exploração privada de minérios como ouro, manganês, cobre, ferro e outros.

Em meio à crise econômica, o Ministério de Minas e Energia argumenta que a medida vai revitalizar a mineração brasileira, que representa 4% do PIB e produziu o equivalente a US$ 25 bilhões (R$ 78 bilhões) em 2016, mas que vinha sofrendo com a redução das taxas de crescimento global e com as mudanças na matriz de consumo, voltadas hoje para a China.
Críticas

O ministério garante que o decreto cumprirá legislações específicas sobre a preservação da área. Ou seja, áreas de proteção integral (onde não é permitida a habitação humana) e terras indígenas serão mantidas.

No entanto, a iniciativa foi bombardeada por especialistas brasileiros e estrangeiros, que acreditam que os prejuízos da mineração serão sentidos amplamente.



"Não poderia ter uma notícia pior", resumiu à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, Antonio Donato Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe, que monitora o desmatamento da Amazônia) e do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa).

Segundo o pesquisador, haverá impacto nas correntes marítimas que transportam umidade à região amazônica e que uma seca pode ser sentida até nos vizinhos do continente.

"Isso vai afetar toda a bacia amazônica e o continente sul-americano. É o mesmo que pegar uma pessoa pelo pescoço", afirma Nobre.

A Amazônia brasileira chegou a ter recorde de 80% na queda do desmatamento entre 2004 e 2012, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente. Mas voltou a crescer nos últimos cinco anos - embora uma tendência comece a indicar novamente uma redução. Além disso, 2015 e 2016 foram anos recordes de queimadas na região, segundo dados do Inpe.

Áreas de proteção são essenciais para conter o desmatamento, ressalta Erika Berenguer, pesquisadora-sênior do Instituto de Mudança Ambiental da Universidade de Oxford.

"O maior impacto não será na área de mineração, mas indireto. Haverá um influxo de pessoas que levará a mais desmatamento, mais retirada de madeira e mais incêndios" , explica. "É uma visão muito simplista do governo de dizer que só uma área será afetada."

"Fora que a mineração é altamente poluidora e tem poucos benefícios para a população local, vide a situação socioeconômica de Carajás", acrescenta Berenguer.
Jazidas de Carajás

A Serra dos Carajás, no sudoeste do Pará, é vizinha da Renca e abriga parte das maiores jazidas de minério de ferro, ouro e manganês do mundo. Com a corrida de minérios a partir dos anos 1960, grandes centros urbanos se instalaram no entorno, pressionando o bioma dali.

O potencial geológico da Renca é semelhante ao de Carajás, segundo a organização WWF e o geólogo Onildo Marini, diretor-executivo da Agência para o Desenvolvimento Tecnológico da Indústria Mineral Brasileira (Adimb). Por isso é tão interessante para investidores.

"Essa região é altamente promissora para a exploração de diversos minérios", afirma Marini.

O geólogo concorda que a abertura da área provocará "certo impacto" com a construção de rodovias, chegada de energia elétrica e de moradores. Mas defende que ele ficará restrito.


Direito de imagem: EZRA SHAW/GETTY IMAGES

Reservas indígenas estão entre as áreas preservadas da Renca.

"As empresas exploradoras precisam manter um plano de manejo adequado, e as áreas de proteção integral não serão afetadas", garante.

A fiscalização do local não impede o garimpo ilegal. Jos Barlow, da Universidade de Lancaster (Reino Unido), pesquisa a Amazônia há quase duas décadas e já esteve na estação ecológica do Jari, na borda sul da reserva.

"Eu conheço bem o Jari. Quando você está ali, escuta aviões de garimpeiros a cada 30 minutos. Todos estão pousando na Renca", conta o professor de ciência da conservação.

O governo federal e Marini argumentam que a atividade mais extensiva no local vai inibir os garimpeiros ilegais. Já Erika Berenguer diz o contrário: com o corte de verbas de órgãos ambientais, a abertura da região vai dificultar ainda mais a fiscalização.

O valor de R$ 3,9 bilhões, um dos menores da história, será dividido entre Ibama e outros dez órgãos ambientais neste ano, anunciou o Ministério do Meio Ambiente.
'Mudará para sempre'

Os pesquisadores também lembraram o evento de Mariana, o pior acidente da mineração brasileira, em 2015, quando uma barragem rompeu no município de Minas Gerais, destruindo vilarejos no entorno do Rio Doce.

"O desastre aconteceu em plena Minas Gerais, totalmente urbanizada, imagine o controle que se tem em lugares ermos como a Amazônia", afirma Bereguer.

Jos Barlow também critica a iniciativa de Temer: "Isso mudará a área inteira para sempre".

Ele alertou para problemas sociais na região, semelhantes aos que ocorreram em Belo Monte e Altamira, e a previsão de mudanças climáticas.

"Qualquer perda de floresta e entrada de agricultura e estradas vai baixar a resiliência das florestas para secas severas, aumentando incêndios florestais", afirma.


Direito de imagem: AFP.
Número de queimadas foi recorda na Amazônia nos últimos dois anos.

Em entrevista à BBC, Ghillean Prance, da organização Trustee Eden Project, da Inglaterra, considerou a quarta-feira do decreto "um dia triste para o meio ambiente da Amazônia".

Perguntado sobre o argumento do governo de que as áreas ricas ambientalmente serão preservadas, ele afirmou: "Não acredito nisso. Há cada vez mais impacto ocorrendo nas reservas indígenas."

E lembrou que o mercúrio usado na extração de ouro pode afetar populações locais. "Vilarejos já morrem de envenenamento de mercúrio na Amazônia", disse.


Direito de imagem: MARIO TAMA/GETTY IMAGES

Mineração em Bom Futuro, em Rondônia, é uma das áreas já impactadas
Processo de dois anos

A extinção do Renca é aventada desde 2015, quando começava-se a debater o marco regulatório para a mineração. Em novembro passado, representantes do CPRM, o serviço geológico brasileiro, testaram a popularidade da área com investidores numa conferência do setor em Londres.

E em abril deste ano, o Ministério de Ministério de Minas e Energia publicou uma portaria balizando os trâmites para a extinção da reserva - o decreto confirmou a mudança.

Antes mesmo da criação da Renca, na década de 1980, houve 160 requerimentos de mineração na área, segundo levantamento da WWF. A maior parte deles foi retirada, mas os que restaram, em torno de dez, terão prioridade na análise do governo de concessões.

Esses pedidos que deverão prosseguir compreendem uma área de 15 mil quilômetros quadrados, em torno de 30% do total da Renca. Para o restante da área, devem ser abertas licitações.

Fonte: http://www.bbc.com/portuguese/brasil-41043853

https://andredemessias.jusbrasil.com.br/noticias/492474742/governo-federal-extingue-reserva-e-permite-a-exploracao-mineral-em-area-da-amazonia-equivalente-a-da-dinamarca?utm_campaign=newsletter-daily_20170828_5894&utm_medium=email&utm_source=newsletter

DECLARAÇÃO DE INDIGNIDADE: Matar marido não retira de viúva direito a comunhão universal de bens

Por 

Mulher que mata o marido não pode ser excluída da partilha dos bens de família se os dois eram casados em regime de comunhão universal de bens. O entendimento é da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ao negar provimento de recurso interposto pelo filho do casal.
O filho do casal ajuizou Ação de Declaração de Indignidade contra a mãe, com base no artigo 1.814, inciso I, do Código Civil. Argumentou que, embora sendo meeira, deve ser punida pelo ato atentatório contra a vida, perdendo o seu direito à sua parte dos bens. Disse que a atitude da mãe merece repúdio e todas as sanções cíveis possíveis, para que perca seu direito à meação.
O autor citou voto proferido pela desembargadora Maria Berenice Dias, já aposentada, na Apelação Cível 70005798004: “Quem matou o autor da herança fica excluído da sucessão. Este é o princípio consagrado no inciso I do artigo 1.595 do Código Civil, que revela a repulsa do legislador em contemplar com direito sucessório quem atenta contra a vida de alguém, rejeitando a possibilidade de que, quem assim age, venha a ser beneficiado com seu ato’’. O juízo de primeiro grau indeferiu o pedido, e o autor interpôs Apelação Cível no TJ-RS.
Qualidades distintas
O relator do recurso, desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, negou provimento ao apelo. Explicou que a mulher casou-se sob o regime da comunhão universal de bens, de forma que, nos termos do artigo 1.829, inciso I, do Código Civil, não carrega a qualidade de herdeira.
“Considerando que a meação não decorre de direito sucessório, mas, isso sim, de direito próprio, pois ‘os bens que um cônjuge leva para o casamento se fundem com os trazidos pelo outro, constituindo uma única massa, e não voltando à propriedade originária quando do desfazimento do matrimônio’, sopesada a clareza do art. 1.814 do Código Civil Brasileiro no sentido de que a declaração de indignidade visa afastar a percepção do quinhão por herdeiro, com a devida vênia, não comporta reparos a sentença acoimada, que julgou improcedente o pedido inicial”, registrou no acórdão.
Na mesma linha entendeu o procurador de justiça Antonio Cezar Lima da Fonseca, representante do MP no colegiado. Segundo expressou no parecer, a viúva sequer participa da sucessão, por ser casada no regime de comunhão universal de bens. Mesmo que seja culpada por matar o marido, a viúva não ostenta a condição de herdeira nem de legatária, mas tão somente possui direito à sua meação — o qual não é atingido pela prática de ato de indignidade.
“Nos termos do artigo 1.829, I, do CC, a cônjuge não é herdeira do falecido marido. Não se trata de ela fazer jus à metade dos bens inventariados por direito sucessório, haja vista que, sendo meeira, metade do patrimônio já lhe pertence por direito, independente da morte do marido. Ou seja, havendo meação, pelo regime comunitário de bens, não haverá concurso na herança, uma vez que o cônjuge acha-se garantido com parte do patrimônio”, concluiu o procurador.

Clique aqui para ler o acórdão modificado.
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 27 de agosto de 2017, 7h53
http://www.conjur.com.br/2017-ago-27/matar-marido-nao-retira-viuva-direito-comunhao-universal-bens

domingo, 27 de agosto de 2017

Curatela: o que é isso?

Publicado por Direito Familiar

No artigo “Uma criança perdeu os pais: quem ficará responsável por elas?”(clique aqui), explicamos que a tutela existe para garantir a criação e a educação de crianças ou adolescentes que tenham perdido seus genitores. Isso porque, até que atinjam os 18 anos de idade, entende-se que não teriam capacidade de reger sua própria vida civil.

Mas, para o Direito, o que significa essa “capacidade” afinal? E o que acontece se uma pessoa maior de idade não a possui? É esse o tema do artigo de hoje! Quer entender melhor? Continue lendo!

A capacidade civil é a aptidão de adquirir direitos e de assumir deveres nas relações jurídicas patrimoniais (ex.: comprar, vender, realizar contratos). Ou seja, somente aqueles que são considerados “capazes” para a lei, podem, sozinhos, realizar estes atos.

Por exemplo, uma criança é um sujeito titular de direitos como qualquer outro, mas não lhe é permitido praticar atos jurídicos, pois somente atinge a capacidade total quando completa 18 anos de idade. No caso das crianças e dos adolescentes, geralmente os genitores ou algum dos familiares é que exercerá a guarda ou a tutela (leia sobre as diferenças entre esses dois institutos clicando aqui), sendo eles, portanto, que representarão os interesses dos pequenos até que atinjam a maioridade.

A curatela, por sua vez, segue o mesmo raciocínio. No entanto, ela vale para aqueles que já completaram a maioridade civil (ou seja, já possuem 18 anos ou mais), porém, por conta de alguma doença mental – ou por alguma outra razão, listada em lei – não possuem capacidade de autodeterminação, de gerir seus próprios interesses. Embora eles sejam adultos, que, teoricamente, poderiam exercer os atos jurídicos, a doença (ou o outro motivo) lhes retira a “capacidade” para tanto. E por isso precisam de um representante. Este representante exercerá a “curatela” daquele incapaz.

Então, o que é a curatela afinal?

A curatela é um mecanismo de proteção para aqueles que, mesmo maiores de idade, não possuem capacidade de reger os atos da própria vida. Ela é o “encargo imposto a uma pessoa natural para cuidar e proteger uma pessoa maior de idade que não pode se auto determinar patrimonialmente por conta de uma incapacidade”1.

E quem pode ser interditado?

O artigo 1767 do Código Civil Brasileiro, foi atualizado pela Lei nº 13.146 de 2015, a qual institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) e prevê as seguintes hipóteses de interdição:

a) aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade: Neste ponto, o artigo é bastante genérico, com o objetivo de retirar o estigma de que pessoas portadoras de determinadas síndromes, tal como a Síndrome de Down, ou doenças como o Alzheimer, por exemplo, sejam automaticamente inseridas no rol de incapazes.

Portanto, neste contexto, cada situação será analisada considerando suas particularidades. A curatela poderá ser definida, considerando as condições ou estados psicológicos, que podem reduzir a capacidade de discernimento acerca da vida e do cotidiano de cada indivíduo.

Ainda, por causa transitória, por exemplo, podem ser considerados aqueles que encontram-se internados em UTI, mesmo que temporariamente, mas que não possuem condições de manifestar a vontade na situação em que se encontram.

A causa da incapacidade, nesses casos, dependerá de comprovação médica.

b) os ébrios habituais (alcoolistas) e viciados em tóxicos: Importante dizer aqui que, nesses casos, o discernimento é reduzido e não se trata de uso eventual de determinadas substâncias.

c) pródigos: São aqueles que dilapidam seu patrimônio de modo a prejudicar seu próprio sustento. É um desvio comportamental e se exige a presença da psicologia para sua averiguação, não bastando o mero volume de gastos para sua verificação. Nesse caso, pode ser que a interdição seja parcial, ou seja, somente para realizar negócios que envolvam o patrimônio da pessoa.

Ressalte-se que este rol é taxativo, o que significa que somente poderá ser concedida a curatela se a situação se amoldar a uma das hipóteses previstas em lei, não sendo possível requisitá-la em qualquer outra circunstância.

E como ela é instituída?

A curatela é estabelecida por meio de um processo de “interdição”. É exigido que se comprove, dentro do processo, a causa geradora da incapacidade. Como é uma medida drástica que atinge determinados direitos, a curatela não pode ser aplicada sem a devida análise do caso, e deve ter sempre por base a proteção do indivíduo interditado. Além disso, somente se justifica em razão das necessidades dele.

Na sentença, o juiz estabelecerá o grau da incapacidade, pois nem sempre ela será absoluta. Assim, a interdição incidirá somente em determinados atos e situações. O ideal é que o juiz observe o alcance do “comprometimento mental do interditando, procurando assegurar que ele mesmo, pessoalmente, possa continuar, se possível, exercendo seus interesses existenciais”2.

No mais, será nomeado um curador, que exercerá a curatela. Esse curador será, preferencialmente, o cônjuge ou companheiro do interditando, bem como um dos parentes mais próximos (ascendente, descendente ou colateral). Caberá ao juiz verificar quem possui melhores condições de exercer o encargo e quem possui uma relação de afeto e afinidade com o incapaz (ou relativamente incapaz).

O curador terá a obrigação de administrar os bens do curatelado e de prestar contas a cada dois anos (ou a critério do juiz) por meio de um relatório contábil com os comprovantes das despesas. Verificada qualquer irregularidade, ele poderá ser destituído do encargo, providenciando-se a sua substituição.

Arethusa Baroni, Flávia Kirilos Beckert Cabral e Laura Roncaglio de Carvalho.

Texto originalmente publicado no Direito Familiar

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1 FARIAS, Christiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil: Famílias. 6ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

https://direitofamiliar.jusbrasil.com.br/artigos/491595791/curatela-o-que-e-isso?utm_campaign=newsletter-daily_20170826_5889&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Justiça garante a filha não reconhecida por familiares o direito de receber herança

Publicado por Kleber Madeira Advogado

A 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) restabeleceu, nesta quarta-feira (23/08), o direito de uma servidora pública a receber herança deixada pelo pai socioafetivo (não biológico), após ela ter registro civil anulado e de ser excluída do benefício por não ser filha biológica.

A relatora do processo, desembargadora Maria de Fátima de Melo Loureiro, explicou que no caso ocorreu uma adoção com o reconhecimento espontâneo da paternidade e o registro civil de criança que se encontrava na posse de um casal. “O registro de criança como filha biológica, além de demonstrar a posse do estado de filha, revela o amor e a vontade dos adotantes de ter aquele bebê como filha, condição que caracteriza filiação socioafetiva”.

De acordo com os autos, a servidora com poucos dias de nascida foi entregue a um casal que a registrou como filha, a única deles. Ainda na infância a mãe faleceu e ela ficou sob a guarda do pai.

Posteriormente, este também faleceu, deixando-a, já adulta, como única herdeira. Na época, foi surpreendida por uma ação de nulidade do registro civil impetrada pelos tios paternos, impedindo-a de ter direito à herança.

Por essa razão, em agosto de 2010, a funcionária pública ingressou com ação na Justiça, requerendo a restauração do registro e consequentemente o direito à herança. Alegou que o reconhecimento de paternidade é “voluntário e irrevogável”, tendo ocorrido na ocasião de “livre e espontânea vontade”.

Na contestação, os familiares dela argumentaram que a servidora apenas morava na residência do casal realizando trabalhos domésticos, não existindo relação familiar entre eles. Sustentaram ainda ter ocorrido prescrição do caso, pois excedido o prazo para recorrer da decisão anulatória. Também contestaram documentos apresentados pela herdeira.

Em dezembro de 2014, o juiz José Cleber Moura do Nascimento, da Vara Única de São Benedito, determinou a restauração do registro, com o direito à herança. O magistrado destacou que, pelos depoimentos prestados, a servidora era “reconhecida no seio familiar e no meio social como filha do extinto, não colhendo a alegação dos promovidos [tios] que ela seria uma mera prestadora de serviços domésticos”.

Requerendo a reforma da sentença, os tios ajuizaram recurso (nº 0005243-30.2010.8.06.0163) no TJCE. Mantiveram as mesmas alegações apresentadas anteriormente. Além disso, defenderam haver o interesse da filha em se apropriar do patrimônio do falecido e “dilapidá-lo.”

Ao julgar o processo, a 2ª Câmara de Direito Privado manteve a decisão de 1º Grau. A desembargadora Maria de Fátima de Melo Loureiro ressaltou que a criança “foi registrada logo após o nascimento pelo instituidor do espólio recorrente [pai] e se passaram mais de 20 anos, quando somente depois do falecimento do seu pai, é que os seus tios paternos ajuizaram a ação de nulidade do registro civil, sob o argumento da ausência de parentalidade biológica, desconsiderando todo e qualquer laço de afetividade existente entre os pais e a filha”.

Fonte: TJCE

https://kleberruddy.jusbrasil.com.br/noticias/492023894/justica-garante-a-filha-nao-reconhecida-por-familiares-o-direito-de-receber-heranca?utm_campaign=newsletter-daily_20170826_5889&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Quem paga pelas dívidas do falecido?

Publicado por Bonfatti Advogados

Quando uma pessoa falece deixando dinheiro, bens móveis e imóveis, muitas dúvidas surgem, não apenas com relação à divisão dos bens propriamente dita, mas também, e principalmente, quanto ao pagamento das dívidas deixadas pela pessoa falecida e se existe responsabilidade dos herdeiros pelas dívidas deixadas.

O patrimônio formado por todos os bens, direitos e obrigações do falecido (de cujus), passa a ser chamado de espólio.

O espólio deve ser partilhado entre os herdeiros e sucessores na proporção exata de seus direitos. Para que isso ocorra é necessária a instauração do inventário que pode ser judicial ou extrajudicial e para tanto será nomeado o inventariante, pessoa responsável por administrar a herança durante todo o procedimento até a efetiva partilha dos bens.

Eventuais dívidas deixadas pelo de cujus devem ser pagas por meio de recursos do próprio espólio, até o limite deste. Quitadas as dívidas, o saldo restante, se existente, será partilhado entre os herdeiros.

Se a cobrança da dívida for posterior à partilha cada herdeiro responde proporcionalmente ao quinhão que lhe cabe, até o limite da herança recebida.

Assim, não existe “herança de dívida”, trata-se de expressão equivocada. O que ocorre é o pagamento da dívida com os recursos deixados pelo próprio falecido, e posteriormente a divisão dos bens restantes; ou então, se realizada a partilha sem a devida quitação anterior das dívidas, ocorrerá a cobrança proporcional ao quinhão recebido por cada um dos herdeiros, até o limite da herança recebida, logo, o herdeiro responderá eventualmente, de forma limitada, considerando os valores que tenha recebido a título de herança.

Por fim, destacamos a importância de se verificar eventual existência de obrigações contratuais, antes mesmo de iniciar um procedimento de inventário. Determinadas obrigações contratuais, via de regra, são extintas quando o contratante falece, como é o caso do empréstimo consignado. Nesse caso, nem a herança, muito menos os herdeiros do consignante, responderão por esta dívida.

Outros contratos, a exemplo o contrato de financiamento, podem prever contratação acessória de seguro por morte ou invalidez permanente (também conhecido como seguro prestamista), caso em que a seguradora será responsável pelo saldo da dívida (dependendo do contrato), evitando-se, assim, a inadimplência e consequentes dívidas contratuais.

Entretanto, para verificação da exigibilidade da dívida contratual é necessária análise cautelosa do instrumento (contrato).

Obs.: O teor deste artigo é meramente informativo. Para maiores esclarecimentos consulte um advogado de sua confiança.

Por Murilo Lemes

https://bonfattiadvogados.jusbrasil.com.br/artigos/492144619/quem-paga-pelas-dividas-do-falecido?utm_campaign=newsletter-daily_20170826_5889&utm_medium=email&utm_source=newsletter

sexta-feira, 25 de agosto de 2017

União estável putativa

Trecho retirado das páginas 42 e 43 
(...)
Para prosseguirmos no presente estudo, ainda faz-se necessário adentrarmos, mesmo que brevemente, no conceito da união estável putativa, formulado a partir da teoria do casamento putativo (62), cuja origem etimológica do termo putativo advém do latim putativus (imaginário), putare (crer, imaginar).

Dentre inúmeras definições doutrinárias, podemos citar o conceito de Rodrigues, para quem o casamento putativo “[...] é o casamento reputado ser o que não é. A lei, por meio de uma ficção e tendo em vista a boa-fé dos contraentes ou de um deles, vai atribuir ao casamento anulável, ou mesmo nulo, os efeitos do casamento válido,[...]”.(63) 

Trata-se de um regime de exceção dentro da teoria das nulidades do casamento perfeitamente aplicável ao instituto da união estável - equiparado à entidade familiar pelo Constituinte de 1988 -, para reconhecer-se efeitos pessoais, patrimoniais, em relação a terceiros e ao companheiro de boa-fé. 

O instituto da união estável putativa é conceituado por Veloso (1997, p. 46) como sendo uma união paramatrimonial que, em razão da boa-fé de um ou ambos os companheiros, deve ser regida pelos mesmos princípios que orientam o casamento, nos termos seguintes: […] tratar-se-á de uma união estável putativa, que tem de gerar consequências patrimoniais à companheira, sem prejuízo da esposa, é óbvio (...) a união estável é uma convivência qualificada, 'more uxorio', de caráter notório dotada de estabilidade, permanência, com um substrato moral relevante e o ânimo de permanecer juntos, de constituir família. Os partícipes vivem maritalmente, embora sem casamento. Conforme antes mencionamos, a união estável de um casal transmite a todos a aparência de um casamento ('marriage apparent, 'ménage de fait', como se diz na doutrina francesa). Trata-se, pois, de situação paraconjugal, paramatrimonial, estabelecendo comunidade de vida à qual se aplicam, até pela íntima semelhança, quase igualdade, os princípios do casamento. E nosso sistema, nossa civilização só admite o casamento monogâmico. Não iria transigir com uma 'união estável' poligâmica ou poliândrica. Mas pode acontecer de um dos parceiros estar de boa fé, convicto que integra uma entidade familiar, com todos os requisitos que a lei estipula, sem saber que o outro mantém diversa união ou, até, outras uniões. Podemos falar aqui, igualmente, com relação ao convivente de boa-fé, numa união estável 'putativa', para efeito de gerar consequências para este parceiro inocente. 

Em verdade, na união estável putativa, a companheira ignora a existência de esposa ou de outras companheiras preexistentes e, por consequência, desconhece os reflexos de tal união. A recíproca para o companheiro que, de boa-fé, mantinha união com segurada casada e não separada de fato, também é verdadeira.

Notas:
(62) O artigo 1561 do Código Civil disciplina que: “Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos, produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.”
(63) RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 6. p. 111.
(...)
Trecho retirado das páginas 45 e 46 
(...)
Nesta esteira, Pessoa destaca que: Há que se antever situações nas quais o concubinato pode ser puro somente para uma das partes, aquela que se encontra de boa-fé, admitindo-se, em seu favor, a proteção conferida pela lei, uma vez encontrados nessa união putativa os elementos essenciais e atendidos os fatores de eficácia próprios da generalidade dos casos.(65) 

Também Viana, reconhecendo a possibilidade de existir união estável putativa, elenca como efeitos civis em favor do companheiro de boa-fé, dentre eles, o direito à meação do patrimônio havido na constância da união estável e o de ser herdeiro, em não havendo descendente ou ascendente.(66)

No âmbito do regime geral de Previdência Social, a concorrência do direito da companheira em relação à esposa legítima, no recebimento do benefício previdenciário de pensão por morte, é analisada pela Autarquia Previdenciária diante de cada caso concreto, “predominando o espírito da lei sobre a forma, devidamente adequado ao fato social sobre o qual incide”, nas palavras de Pires.(67)

 No entanto, o mesmo não ocorre nos regimes próprios de Previdência Social onde se verifica uma predominância do não reconhecimento do direito da companheira putativa no recebimento de pensão por morte de segurado casado. 

Não é raro, no nosso dia-a-dia, nos depararmos com a situação da dupla vida conjugal, na qual um homem/mulher consegue administrar uma família, legalmente constituída, com outro relacionamento sério e duradouro, do qual também é responsável pela administração e sustento dos entes familiares. 

Os Tribunais Superiores pátrios firmaram entendimento jurisprudencial (68), ainda não unânime no Superior Tribunal de Justiça, acerca do não reconhecimento do direito de perceber pensão por morte, pelo companheiro do segurado falecido, ante a constatação de concubinato adulterino, ainda que putativo. 
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Notas:
(65) PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 46.
(66) VIANA, Marco Aurélio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 91. 
(67) PIRES, Maria da Graça M. S. Soromenho. O concubinato no direito brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 71. 
(68) Em relação ao STF podemos citar: RE 590.779, Rel. Min. Marco Aurélio, 1 ª Turma, DJE de 27/03/2009, disponível em . Acesso em 10 de abril de 2014; RE 397.762, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJE de 12/09/2008, disponível em . Acesso em 10 de abril de 2014; MS 27.871-MC, Rel. Min. Ellen Gracie, DJE de 17/03/2009, disponível em . Acesso em 10 de abril de 2014; RE 491.039, Rel. Min. Cezar Peluso, DJE de 05/08/2009, disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2382680>. Acesso em 10 de abril de 2014.

Trechos do artigo A PROTEÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL PUTATIVA NOS REGIMES PREVIDENCIÁRIOS PÚBLICOS de Christiane Cruvinel Queiroz, publicado na Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca -  v. 9, n. 2 (2014). - http://www.revista.direitofranca.br/index.php/refdf/article/view/253/237