terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Luta histórica por uma reparação póstuma (ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva)

* Artigo originalmente publicado no jornal Folha de S.Paulo desta quarta-feira (22/2).

A morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva, no último dia 3 de fevereiro, não apaga duas violações que atingiram sua dignidade e suas garantias fundamentais.
A primeira decorre de decisão proferida em 16 de março do ano passado, quando juízo da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba autorizou o levantamento do sigilo de uma conversa telefônica privada que ela manteve com um de seus filhos — sem qualquer relação com a investigação em curso.
A outra violação ocorreu quando ela sofreu AVC (Acidente Vascular Cerebral), em 24 de janeiro deste ano. Médicos envolvidos em seu tratamento decidiram tornar público um exame em grupo de WhatsApp, no qual outro integrante apregoava sugestões para acelerar a morte da paciente.
Impressiona o fato de que, embora os dois eventos mostrem injustificáveis violações às garantias fundamentais de Marisa, apenas o segundo tenha sido alvo de providências com o objetivo de responsabilizar os envolvidos.

De fato, após episódio, o Hospital Sírio-Libanês, onde ocorreu o vazamento indevido (ou parte dele), tomou as providências que entendeu cabíveis em relação a uma médica que estaria envolvida nos fatos.
O Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) abriu sindicâncias para apurar e punir os médicos implicados. O resultado da apuração deverá, ainda, ser encaminhado ao Ministério Público e à polícia, na hipótese de o conselho constatar que a conduta também pode, em tese, configurar crime.
Já o agente público envolvido na divulgação de conversa telefônica de Marisa não foi alvo sequer de uma investigação.
Com efeito, a corregedoria do Tribunal Regional Federal da 4ª Região arquivou representação contra o magistrado que autorizou a divulgação do material privado. A decisão foi confirmada, por 13 votos contra 1, no órgão máximo daquela corte.
Na fundamentação de sua decisão, a corte afirmou que a operação "lava jato" não estaria sujeita às "regras gerais", ou seja, à lei, o que formaliza o próprio estado de exceção. 
Na mesma linha, o Conselho Nacional de Justiça não abriu qualquer sindicância para apurar a conduta do magistrado que autorizou a divulgação da conversa telefônica privada, a despeito de haver recebido inúmeras representações.  
A Procuradoria-Geral da República, por seu turno, recebeu em 16/6/2016 representação também subscrita por Marisa pedindo providências para apurar eventual crime de abuso de autoridade (Lei 4.898/65), além daquele previsto no artigo 10 da Lei 9.296/96 — que define como crime, em tese, o levantamento do sigilo de material proveniente de interceptação telefônica.
Mas o órgão máximo do Ministério Público da União igualmente não tomou qualquer providência, conforme documentado em ata notarial que goza de fé pública.
Resta pendente apenas o julgamento de uma queixa-crime subsidiária pelo TRF-4, diante da citada inércia do Ministério Público Federal.
Na hipótese de ser rejeitada, a despeito dos relevantes fundamentos que a sustentam, a afronta ao ordenamento e à dignidade de Marisa ficará sem qualquer consequência jurídica. Nem mesmo a suspeição do juiz responsável pelas violações apontadas foi reconhecida.
Marisa não teve a oportunidade de ver o resultado de qualquer providência tomada em relação às violações que lhe foram impostas, além de haver sido submetida, sem qualquer evidência mínima, à condição de ré pelo mesmo órgão judiciário responsável por sua exposição indevida.
Sua memória impõe uma reflexão sobre este momento e um julgamento histórico capaz de rever todas essas incongruências e o desrespeito à lei e ao Estado de Direito.
Cristiano Zanin Martins é advogado e sócio da Teixeira, Martins e Advogados.
Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2017, 11h20
http://www.conjur.com.br/2017-fev-22/cristiano-zanin-martins-luta-historica-reparacao-postuma

Ação sobre separação após a EC 66 é suspensa por pedido de vista

O julgamento sobre a possibilidade de separação judicial no ordenamento jurídico brasileiro, após sua retirada da Constituição pela Emenda Constitucional 66/2010, foi suspenso por pedido de vista do ministro Luis Felipe Salomão. O caso está sendo analisado pela 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça e começou a ser julgado no dia 14 deste mês.
A ação de separação foi ajuizada amigavelmente por um casal, inclusive com condições pré-estabelecidas sobre pensão, visita a filho menor, bens e o nome da mulher. Mas o pedido foi negado na origem sob o fundamento de que a EC 66 aboliu a separação judicial, revogando, assim, os artigos do Código Civil que disciplinam o tema.
Para a relatora do recurso especial, ministra Isabel Gallotti, não há revogação dos artigos do Código Civil, pois não pode ser dito que a separação foi extinta da ordem jurídica. O que ocorre, continuou, é que a Constituição abriu a possibilidade de ir diretamente ao divórcio, mas sem extinguir a separação.
“Pois quem pode o mais pode o menos também”, disse a ministra. “Entender que tal alteração suprimiu a existência da separação extrajudicial ou judicial levaria à interpretação de que qualquer assunto que não fosse mais tratado no texto constitucional por desconstitucionalização estaria extinto, a exemplo também do que ocorreu com a separação de fato, cuja existência não é objeto de dúvida.”
É importante destacar, disse a ministra, a diferença entre separação judicial e divórcio, pois a primeira é medida temporária, em que os cônjuges podem restabelecer a sociedade conjugal a qualquer tempo ou pedir sua conversão temporária em divórcio.
“A separação é modalidade de extinção da sociedade conjugal, pondo fim aos deveres de coabitação e fidelidade, bem como ao regime de bens [...] O divórcio, por outro lado, é forma de dissolução do vínculo conjugal e extingue o próprio vínculo conjugal, pondo termo ao casamento, refletindo diretamente sobre o estado civil da pessoa e permitindo que os ex-cônjuges celebrem novo casamento, o que não ocorre com a separação”, disse. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
O número do processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Revista Consultor Jurídico, 22 de fevereiro de 2017, 20h57
http://www.conjur.com.br/2017-fev-22/acao-separacao-ec-66-suspensa-pedido-vista