terça-feira, 15 de agosto de 2017

A isonomia e o Registro Civil de Nascimento - Parte II

terça-feira, 15 de agosto de 2017
Vitor Frederico Kümpel e Giselle de Menezes Viana

Prazo

Como visto na coluna anterior, a redação original do art. 52 (antigo art. 53) da Lei dos Registros Públicos (LRP) atribuía a obrigação de declarar o nascimento dos filhos primariamente ao pai, e apenas subsidiariamente à mãe, o que refletia com exatidão a divisão de tarefas própria do modelo familiar e social do meado do século XX. Contudo, há outro detalhe na formulação originária do dispositivo ao qual cumpre atentar: o prazo concedido à mãe era maior que o prazo conferido ao pai, totalizando 45 dias (logo, o triplo do prazo paterno, de apenas 15 dias).

Após a promulgação da Constituição de 1988 – que consagrou a igualdade material entre homens e mulheres, em detrimento da prevalência masculina na estrutura familiar e social –, ficou claro, para muitos, que não fazia mais sentido condicionar a legitimidade da mãe para declarar o nascimento do filho à falta ou impedimento do pai. Mas então, se as obrigações deixaram de ser sucessivas, como se daria a contagem dos prazos? E qual seria o prazo da mãe, sob a ótica da igualdade constitucional (art. 226, § 5º)? Mesmo após a edição da Lei nº 13.112/2015, que expressamente alterou a redação do art. 52, extinguindo não apenas a prioridade paterna, mas também a própria previsão de um prazo especial para a mãe –, remanesce certa confusão na doutrina e nas próprias normativas estaduais (normas de serviço ou consolidações) quanto à questão, não sendo raro afirmar-se que a mãe goza de 60 dias para a declaração, enquanto o pai, de 15 dias.

Para compreender com precisão a mudança legislativa, seus resultados jurídicos e repercussões práticas, é necessário, antes de tudo, investigar o fundamento subjacente à formulação originária da regra. Já se perquiriu, na coluna anterior, o porquê da ordem de preferência instituída na redação original do atual art. 52 da LRP, no que diz respeito à prevalência do pai em relação à mãe. No presente tópico, é preciso investigar o porquê de o prazo concedido à mãe, para se desincumbir dessa obrigação, era maior que o prazo concedido ao pai.

É bom frisar que, muito embora a questão da legitimidade e a questão do prazo dos genitores estivessem entrelaçadas na conformação originária da regra, não são questões necessariamente vinculadas, já que nada obstaria, em tese, a concessão de um prazo maior à mãe (ii) sem a adoção da prevalência do pai (i), ou então a prevalência deste sem que o prazo da mãe fosse maior (dando-se 15 dias para cada um, por exemplo). Não são diretivas intrinsecamente relacionadas, daí a opção em tratar tais pontos separadamente no presente artigo.

Pode-se entender que a razão para a concessão de um prazo maior à mãe estava fulcrado no sistema protetivo: entendia-se que o prazo da mãe deveria contemplar o chamado período de resguardo, isto é, o período de recuperação após o parto, durante o qual a mãe poderia não estar plenamente apta a deslocar-se para a serventia com a finalidade de registrar seu filho1. Por isso, seu prazo era maior: para que tivesse tempo suficiente para se recuperar.

No que tange à questão do período de resguardo, pontue-se que tal argumento foi recorrentemente suscitado pela doutrina não apenas para explicar a origem da regra, mas para inclusive defender a manutenção da legitimidade ordinária do pai para declaração do nascimento, antes da alteração expressa, efetuada pela lei 13.112/2015. Mas, como dito acima, não se pode olvidar que, a rigor, a ampliação do prazo não pressupõe a subsidiariedade da obrigação materna, então nada impedia que fosse conferido um prazo maior à mãe sem que se decretasse a prioridade paterna para a declaração. Tal foi, aliás, a orientação predominante após a promulgação da Constituição de 1988.

Conforme adiantado na coluna passada, a Constituição de 1988 reconheceu a igualdade entre homens e mulheres, não apenas como princípio geral2, mas também no que toca especificamente à direção da sociedade conjugal3. Por isso, mesmo antes da lei 13.112/2015, já se entendia, com fulcro na principiologia constitucional, bem como do Código Civil de 20024, que tanto a mãe quanto o pai eram igualmente legitimados (e obrigados) a declarar o nascimento nos 15 primeiros dias após sua ocorrência, até porque ambos passaram a titularizar igual poder familiar sobre os filhos.

Mas então surgia a questão: sob a ótica da igualdade constitucional, a mãe não faria mais jus à extensão do prazo? Nesse ponto, cumpre recordar que a isonomia constitucionalmente consagrada deve ser enxergada em seu aspecto concreto, como vetor da transformação social, e não como simples postulado abstrato a justificar a postura absenteísta do Estado em face das desigualdades materiais entre os diversos grupos sociais. E, nesse viés, a igualdade pode implicar justamente a necessidade de tratamento diferenciado.

Partindo desses pressupostos, poder-se-ia sustentar que, se por um lado o advento da Constituição de 1988 tornou inadequada a antiga prioridade paterna para declaração de nascimento, não necessariamente o fez em relação à concessão de um prazo ampliado à mãe, já que o fundamento dessa extensão era protetivo, e estava em plena consonância com a ideia de igualdade material constitucionalmente consagrada.

Isso porque, como dito, o comparecimento da mãe à serventia enfrentava um empecilho intrínseco à condição pós-parto da mulher. Por mais avançada que seja a medicina hodierna, que possibilita uma recuperação muito mais rápida, ainda poderia ser necessário um período de resguardo5. Por essa razão, e tendo em vista a facilitação do acesso ao registro de nascimento, fazia sentido conceder à mãe, se esta comparecesse pessoalmente na serventia, uma ampliação do prazo, mesmo em face da revogação tácita da prioridade paterna para a declaração6. Por isso, entendia-se que a mãe passou a ter o prazo de 60 dias para declarar o nascimento, sendo os 15 primeiros dias comuns ao pai.

Não foi essa, porém, exatamente a orientação dada pela lei 13.112/2015, que, tendo por intuito igualar as condições do pai e da mãe para proceder ao registro de nascimento dos filhos7, em face do princípio da isonomia, dentre outras modificações, alterou a redação do item 2º, que estabelecia à mãe a prorrogação do prazo, concedendo-a ao "outro indicado". Portanto, na falta de um dos genitores do registrando, o outro indicado recebe um prazo especial, isto é, prorroga-se o prazo comum de 15 dias em mais 45 dias para realização da declaração.

Assim, não apenas a ordem de preferência foi expressamente abolida (sendo que, desde a Constituição de 1988, já era considerada tacitamente revogada), mas também a concessão do prazo adicional teve sua lógica alterada: se antes era conferido à mãe e condicionado à falta ou impedimento do pai, passou a ser estendido a ambos, porém ainda em face da falta ou impedimento do outro. Em outras palavras, em vez de vincular a prorrogação do prazo à condição de ser mãe, possibilitou que quaisquer dos genitores fizessem jus ao prazo estendido, desde que verificada a falta ou o impedimento do outro-.

No fundo, a lei 13.112/2015 apenas deixou de criar uma distinção entre a situação do pai e da mãe, sem, contudo, alterar fundamentalmente a lógica do rol. Assim, o critério para a prorrogação do prazo deixou de ser subjetivo (relacionado à pessoa da mãe, pelos motivos já analisados), tornando-se objetivo (referente à própria situação de falta ou impedimento de outro indicado).

Presunções de maternidade e de paternidade

A filiação, em sede registral, pode ser estabelecida, com base em determinados documentos que a demonstrem, ou reconhecida, por meio de ato de vontade. O momento, por excelência, em que a filiação é regularizada é o da lavratura do assento de nascimento. O reconhecimento, por sua vez, pode ser realizado tanto espontaneamente, na ocasião do registro, quanto posteriormente, seja de forma voluntária ou judicial8.

O art. 54, § 2º, da lei 6.015/1973, incluído pela lei 12.662 de 2012, determina que "O nome do pai constante da Declaração de Nascido Vivo não constitui prova ou presunção da paternidade, somente podendo ser lançado no registro de nascimento quando verificado nos termos da legislação civil vigente." Assim, se por um lado o nome da mãe constante na DNV faz prova hábil da maternidade, permitindo inclusive o estabelecimento desta, para fins de registro, a despeito da ausência da mãe, o nome do pai constante no mesmo documento não produz quaisquer efeitos, não tendo o condão de demonstrar a paternidade perante o registrador civil.

O fundamento da distinção reporta à diferença fundamental entre as presunções de maternidade e de paternidade no sistema brasileiro.

A fixação da maternidade, via de regra, baseia-se na presunção mater semper certa est, absorvida do direito romano pelo nosso ordenamento e mantida quase incólume até os dias de hoje9. A regra, segundo o brocardo romano, é a atribuição inequívoca da maternidade à parturiente. A referida presunção parte da averiguação de determinados sinais externos, verificáveis a "olho nu" (a gestação e o parto, biologicamente jungidos ao processo de procriação), para concluir fatos que, apesar de incertos a priori (o vínculo genético), tornam-se extremamente prováveis quando considerados em conjunto com os primeiros.

A certeza que emana da Declaração de Nascido Vivo, no que tange à maternidade, é tal que dispensa a declaração da mãe, caso esta não possa comparecer à serventia juntamente com o pai, mesmo na hipótese de filhos havidos fora do casamento. Assim, permite-se que o pai, ainda que não casado com a mãe da criança, declare sozinho o nascimento, apresentando o documento de identidade (preferencialmente de ambos) e a via da DNV fornecida pelo hospital, no qual conste o nome da mãe.

Percebe-se, portanto, que o objeto da DNV é a constatação de um fato (o nascimento), que gera efeitos jurídicos justamente em decorrência de um sistema legal de presunções. Na medida em que a DNV identifica a parturiente, e presumindo-se que a parturiente é a mãe, então o documento tem força probante para fins de estabelecimento da maternidade em sede registral. Por outro lado, a paternidade não pode ser pressuposta com base tão somente no fato "nascimento", por não ser aferível "a olho nu", e, portanto, a menção, na DNV, ao nome do pai, não tem por efeito fazer presumir, por si só, a paternidade.

Em outras palavras, a DNV atesta a identidade da parturiente, e com base nessa identificação é possível presumir a maternidade (presunção esta que pode ser afastada mediante comprovação de inseminação artificial por exemplo), mas não a paternidade. Esta, não obstante, também é suscetível de presunção, mas com outro fundamento. As hipóteses de presunção de paternidade (previstas no rol taxativo do art. 1.597 do Código Civil10) estribam-se no dever de fidelidade conjugal, daí apenas incidirem mediante comprovação do vínculo matrimonial (ou até de união estável) entre a mãe e o pai.

Dessa forma, em sede registral, o estabelecimento da paternidade ocorre principalmente por meio da apresentação da certidão de casamento (ou, no caso de união estável, da sentença judicial ou escritura pública que comprovem o vínculo). Isso porque a referida certidão, ao provar o vínculo matrimonial entre o pai e a mãe, permite inferir que o filho nascido da mãe é também do pai, por ser o casamento regido pelo dever de fidelidade recíproca11. Ou seja, o Código Civil, ao estabelecer situações em que a definição da maternidade basta para atribuir a paternidade ao marido (presunção pater is est), parte da premissa da monogamia conjugal, respaldada no dever de fidelidade recíproca legalmente imputado aos cônjuges. Muito embora não seja sempre observado na prática, a existência do referido dever basta para um juízo de probabilidade da origem matrimonial da filiação12, permitindo o lançamento do nome do pai no assento de nascimento mesmo sem o seu consentimento.

Por isso, havendo certidão comprobatória do casamento, somada à DNV (que atesta a maternidade), não é necessário o ato de reconhecimento da paternidade para que esta possa ser estabelecida em sede registral, daí dispensar-se a presença paterna na hipótese13.

Por outro lado, não basta o mero lançamento do nome do pai na DNV para estabelecer a paternidade por ocasião da lavratura do assento de nascimento, já que a paternidade não se deduz diretamente do fato nascimento, e portanto não poderia ser abarcada pela presunção de veracidade que reveste a indicação da maternidade na DNV: é preciso estabelecê-la com base na certidão de casamento (se a apresentante for a mãe) ou reconhece-la diretamente perante o oficial (na hipótese de declaração pelo próprio pai)14.

Naturalidade

A Medida Provisória 776, publicada em 27 de abril de 2017, entrou imediatamente em vigor15, alterou a lei 6.015/1973, de modo a instituir, no sistema registral brasileiro, a chamada "opção de naturalidade", aparentemente cindindo as noções de naturalidade e local de nascimento, até então indissociáveis no sistema registral civil brasileiro.

Assim, além de constar no assento o local de nascimento, deverá também constar a naturalidade, que poderá ser a do próprio local do nascimento ou o Município de residência da mãe, desde que localizado em território nacional16, a critério do declarante. No que toca ao tema do presente artigo, o que chama atenção no dispositivo citado é este não ter previsto a hipótese de fixação da naturalidade no município de domicílio do pai: apenas no da mãe.

Para entender o motivo da omissão, primeiramente é preciso definir o que vem a ser a naturalidade. Tradicionalmente, a naturalidade é definida como o local de nascimento, daí afirmar-se que é no momento do parto em que se fixa a naturalidade do neonato. Haja vista a coincidência entre o critério de fixação da naturalidade e a determinação do local de nascimento, a lei registral não fazia qualquer menção à naturalidade como categoria jurídica autônoma, exigindo tão somente o lançamento do local de nascimento no assento registral, bem como nas certidões respectivas.

A MP 776, contudo, cindiu as duas noções, exigindo que fosse lançado no assento não apenas o local de nascimento, como também a naturalidade, que pode ou não coincidir com aquele. Nas certidões, por seu turno, apenas deverá constar a naturalidade. Comentando tal mudança, a doutrina concluiu que a MP, ao aparentemente dissociar naturalidade e nascimento, teria mudado o próprio conceito de naturalidade no ordenamento jurídico brasileiro.

Entretanto, a ideia de naturalidade permanece ontologicamente vinculada ao local de nascimento, não houve uma mudança conceitual propriamente dita. O que ocorre é que com a previsão da opção, admitiu-se um critério artificial de fixação da naturalidade, que se reporta não ao local de nascimento de fato, mas ao local em que deveria ter ocorrido o nascimento em condições normais. Ou seja, entende-se que, se houvesse condições ideais (como a existência de maternidades) no local de residência habitual da mãe, esta não precisaria deslocar-se a outra cidade para o parto. Evita-se, por meio da opção, que fatores circunstanciais (a falta de infraestrutura adequada no município de residência da mãe, por exemplo) vinculem a pessoa eternamente a um município estranho, que possivelmente não criará qualquer vínculo jurídico posterior ao fato do nascimento.

Partindo desse entendimento, pode-se concluir que não houve uma mudança no conceito de naturalidade, houve, na verdade, a instituição de um critério alternativo para sua fixação, atrelado a uma verdadeira ficção jurídica.

Justamente por isso não é possível a fixação da naturalidade no domicílio do pai, porque a naturalidade não de dissociou ontologicamente do fato do nascimento, isto é, do local do parto, e este vincula-se naturalmente ao local em que estiver situada a mãe na ocasião. Ora, se a opção de naturalidade busca justamente permitir a definição da naturalidade com base não apenas no local real do nascimento (onde este ocorreu) mas também com base no local ficto (onde o nascimento teria ocorrido em condições ideias), então não há surpresa em se vincular a opção à residência habitual da mãe, já que é este o local em que ela estaria, em tese, por ocasião do parto.

Acompanhem e sejam felizes!
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1 Em geral, recomenda-se à mulher evitar, no primeiro mês após o parto (ou mais, em se tratando de parto por cesárea) dirigir veículos automotivos e fazer caminhadas, mesmo que leves. Cf. Rosana Reps, O que é permitido (ou não) na quarentena 2014. Não é desarrazoado, portanto, concluir que há limitações à locomoção da mulher no período de resguardo, e que essa dificuldade pode ser determinante para obstar seu comparecimento na serventia registral para proceder ao registro de seu filho.
2 Art. 5º, caput e inc. I, da CF/1988.
3 Art. 226, § 5º, da CF/1988
4 Art. 1.511 do CC/2002.
5 É bom lembrar que essa dificuldade foi em grande medida neutralizada pela criação das Unidades Interligadas, pelo Provimento 13/2010, possibilitando a declaração do nascimento na própria maternidade.
6 Cf. Kümpel, Vitor Frederico; e Ferrari, Carla Modina. Tratado Notarial e Registral – Registro Civil das Pessoas Naturais, vol. II. São Paulo: YK, 2017, pp. 543-544.
7 Declara o preâmbulo da Lei modificadora.: "Altera os itens 1º e 2º do art. 52 da lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, para permitir à mulher, em igualdade de condições, proceder ao registro de nascimento do filho."
8 Cf. Kümpel, Vitor Frederico; e Ferrari, Carla Modina. Tratado Notarial e Registral – Registro Civil das Pessoas Naturais, vol. II. São Paulo: YK, 2017, pp. 582-583.
9 O brocardo romano, na boca do povo, transmutou-se em "mater certa, pater incertus", cf. Pöppelmann, Christa. Nomen est nomen. Trad. port. de Ciro Mioranza, Dicionário da Língua Morta – A Origem de Máximas e Expressões em Latim. São Paulo: Escala, 2010, p. 74. Ou seja, a sabedoria popular não apenas sedimentava o caráter inequívoco da maternidade, como atribuía incerteza à paternidade. Ambas as proposições, até meados do século passado, eram verdadeiras. Atualmente, contudo, não mais têm a força de outrora. Explica-se: em primeiro lugar, a possibilidade de sub-rogação do útero, vulgarmente chamada "barriga solidária", traz uma exceção até antes inimaginável à certeza da maternidade biológica, pois, nesse caso, a mãe biológica não é a parturiente. Quanto à segunda proposição, com o desenvolvimento do exame de DNA, algo antes impossível tornou-se viável: determinar com certeza absoluta a linhagem genética de um indivíduo por meio da análise de seus genes. Conclui-se, portanto, que as referidas máximas sofrem, atualmente, relativização. Esse fenômeno, contudo, não decorre da fragilidade de seus fundamentos, que eram perfeitamente pertinentes à época, mas da própria relativização do binômio "possível-impossível" causada pelas transformações no "estado da arte" da biotecnologia. Cf. Kümpel, Vitor Frederico; e Ferrari, Carla Modina. Tratado Notarial e Registral – Registro Civil das Pessoas Naturais, vol. II. São Paulo: YK, 2017, pp. 584-585.
10 Art. 1.597 do CC/2002: "Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: I - nascidos cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; II - nascidos nos trezentos dias subsequentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento; III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido".
11 Nos dizeres de Pontes de Miranda: "tal presunção de que o filho concebido na constância da sociedade conjugal tem por pai o marido de sua mãe possui, como funda­mento, o que mais ordinariamente acontece: a fidelidade conjugal por parte da mulher. Praesumptio sumiturtx eo quod plerum que. Presumida a fidelidade da mulher, a paternidade torna-se certa. Mas cessa a presunção se o filho nasce antes de cento e oitenta e um dias a contar da celebração, ou trezentos e um dias após a dissolução da sociedade conjugal, porque já então seria presumir-se o improvável, o anormal". PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti, Tratado de Direito Privado, v. 9. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, pp. 84-85.
12 De acordo com DINIZ, Maria Helena. Código Civil Anotado, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2008, p. 1101, o fundamento da presunção seria a probabilidade de paternidade: "Ante a impossibilidade de se demonstrar diretamente a paternidade, a lei assenta relativamente à questão da filiação algumas presunções fundadas em probabilidade que, por admitirem prova em contrário, serão relativas, ou seja, juris tantum".
13 Cf. Kümpel, Vitor Frederico; e Ferrari, Carla Modina. Tratado Notarial e Registral – Registro Civil das Pessoas Naturais, vol. II. São Paulo: YK, 2017, pp. 585-591.
14 Lembrando que também é possível o reconhecimento da paternidade mediante procuração com previsão expressa de poderes especiais para tal mister ou, ainda, com a apresentação de instrumento público ou particular que consubstancie a vontade paterna em reconhecer a filiação.
15 Art. 2º da MP nº 776/2017: "Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação."
16 Art. 54, § 4º, da lei 6.015/1973.

Vitor Frederico Kümpel é juiz de Direito em São Paulo e doutor em Direito pela USP.
http://www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI263712,61044-A+isonomia+e+o+Registro+Civil+de+Nascimento+Parte+II

Lei que isenta idosos de pagar estacionamento em shoppings foi aprovada na Câmara? Não é verdade!

Texto chegou a tramitar entre 2008 e 2011, mas foi arquivado. Estatuto do Idoso não prevê estacionamento gratuito em shopping centers.

Publicado por examedaoab.com

Circula pelas redes sociais a informação de que foi aprovada a lei 2786/08, que isenta pessoas com mais de 60 anos do pagamento de estacionamento em shoppings pelo país. Não é verdade.

O texto falso diz que, para obter a isenção, basta levar o ticket ao balcão juntamente com a carteira de identidade e pedir um carimbo.

O projeto de lei realmente existiu. Ele foi criado em 2008, mas acabou arquivado ao final da legislatura, em 2011.

A assessoria de imprensa da Câmara dos Deputados aponta um erro flagrante no texto em circulação que revela a falsidade da mensagem. Se fosse, de fato, aprovada em 2017, o número da lei devia terminar com o referido ano ("/17") e não com "/08", como aponta o texto.

O PL 2786/2008 propunha a alteração da lei 10.741, de 1º de outubro de 2003, o chamado Estatuto do Idoso, para proibir a cobrança de estacionamento a condutores idosos. O Estatuto do Idoso não foi modificado neste sentido.

Veja o que diz a notícia falsa:

Lei 2786/08 foi aprovada dia 06/8 de 2017 Pessoas idosas, acima de 60 anos, não pagam estacionamento nos shoppings. Faça valer o seu direito. Leve o ticket ao balcão de pagamento juntamente com sua carteira de identidade, e peça o carimbo de isenção. Repassem para todos os seu contatos... idosos ou não.



Fonte: G1

https://examedaoab.jusbrasil.com.br/noticias/488195393/lei-que-isenta-idosos-de-pagar-estacionamento-em-shoppings-foi-aprovada-na-camara-nao-e-verdade?utm_campaign=newsletter-daily_20170815_5832&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Coparentalidade abre novas formas de estrutura familiar

Por 

Há pessoas que querem se casar, ou viver em união estável, mas não querem ou não podem ter filhos, formando apenas uma família conjugal. Há pessoas que querem ter filhos, mas sem conjugalidade, ou sem sexualidade, ou seja, querem apenas constituir uma família parental.
Esse cenário começou na década de 1960, com a liberação dos costumes, surgindo então as “produções independentes”. Com a evolução da engenharia genética isso ficou mais fácil com os bancos de sêmen. E a partir daí não foi mais necessário sexo para haver reprodução.
Até a década de 1980, a mulher que traía o marido perdia a guarda do filho. O Direito de Família sempre foi determinado por essa moral sexual. E continua sendo, mas hoje bem menos. A partir da década de 1990, a doutrina e a jurisprudência começaram a entender que uma mulher mesmo infiel ao marido poderia ser uma boa mãe. E foi assim que começamos a separar o joio do trigo, ou melhor, começou-se a separar conjugalidade de parentalidade.
Se a parentalidade não está necessariamente vinculada à conjugalidade, ou à sexualidade, é preciso ver essa realidade despida dos preconceitos que a tradicional família patriarcal trazia consigo e que, aliás, estabelecia muito mais uma relação de dominação do que de afetividade.
Com a compreensão do afeto como valor e princípio jurídico, a família perdeu sua preponderância patrimonialista e hierarquizada. Passou a ser o locus do amor, do afeto e da formação do sujeito, independentemente das escolhas ou preferências sexuais de seus membros e forma de reprodução.
Família parental é a que se estabelece a partir dos vínculos de parentescos, sejam consanguíneos, socioafetivos ou por afinidade. Família parental é o gênero que comporta várias espécies, tais como, anaparental, extensa, adotiva, ectogenética, multiparental, homoparental e coparental (CUNHA PEREIRA, Rodrigo. Dicionário de Direito de Família e Sucessões – Ilustrado. Ed. Saraiva, p. 310).
Família conjugal é que se forma a partir da conjugalidade, ou seja, a sexualidade é o seu elemento vitalizador (ou desvitalizador), seja homo ou heteroafetiva, a exemplo do casamento, união estável, simultâneas, poliafetivas etc.
Coparentalidade, ou famílias coparentais, são aquelas que se constituem entre pessoas que não necessariamente estabeleceram uma conjugalidade, ou nem mesmo uma relação sexual. Apenas se encontram movidos pelo interesse e desejo em fazer uma parceria de paternidade/maternidade. Na maioria das vezes o processo de geração de filhos se vale de técnicas de reprodução assistida.
No mundo globalizado e de transnacionalidades, proporcionado pela internet, e associado à distinção entre famílias conjugais e parentais, têm aumentado o número de filhos que nascem dessas novas famílias. Não há nenhuma ilegalidade ou ilegitimidade nessas relações.
Não há mais filhos ou famílias ilegítimas desde a Constituição da República de 1988. Essas parcerias de paternidade/maternidade têm remetido ao mundo jurídico a elaboração de uma nova espécie de pactos, que são os “contratos de geração e filhos”. Nada melhor do que deixar claro, de antemão, as regras decorrentes desta parceria que gerará um filho, tais como, o nome do(a) filho(a), guarda, convivência, sustento etc.
Fazer filhos, planejados ou não, desejados ou não, e independentemente da forma que foi gerado, significa antes de tudo, responsabilidade, um dos mais importantes princípios do Direito de Família, que necessariamente está atrelado ao princípio da afetividade.
Em um Estado laico, as pessoas devem ser livres para escolher seguir os caminhos do seu desejo e constituir a família como bem entender. O Estado só deve interferir se essas constituições ferirem direitos alheios. Mas em quê as famílias diferentes das tradicionais interferem ou prejudicam terceiros? Em nada, absolutamente nada, a não ser o incômodo que elas provocam ao estamparem a liberdade de uma escolha, que provavelmente mexe com os desejos e fantasias de quem está incomodado.
Novas estruturas parentais e conjugais estão em curso. Muitas outras, que ainda nem conseguimos imaginar, virão. Não precisamos temê-las, se vêm em nome do amor. E, se o amor é o que dá sentido à nossa existência, estimula nossa vida psíquica, moral, espiritual, ter filhos sem um amor conjugal é tão legítimo quanto ter um amor conjugal sem ter filhos.
Os filhos decorrentes da coparentalidade serão felizes, ou infelizes, como quaisquer outros filhos de famílias tradicionais. Sofrerão bullyng como qualquer outra criança ou adolescente.
Infelizes são os filhos de pais infelizes, que brigam eternamente, que manipulam, são violentos, fazem alienação parental etc. Os filhos, independentemente de sua origem, serão felizes é na medida do amor e dos limites que receberem dos seus pais.
Rodrigo da Cunha Pereira é advogado e presidente nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), mestre (UFMG) e doutor (UFPR) em Direito Civil e autor de livros sobre Direito de Família e Psicanálise.
Revista Consultor Jurídico, 13 de agosto de 2017, 8h01
http://www.conjur.com.br/2017-ago-13/processo-familiar-coparentalidade-abre-novas-formas-estrutura-familiar

Ditado errado: Achar objeto perdido ou esquecido e não devolvê-lo ao dono é crime

Ao contrário do que proclama a expressão popular “achado não é roubado”, o Código Penal entende como crime apropriar-se de bem perdido. Segundo o artigo 169 do diploma legal, cabe, a quem achar um objeto, devolver ao dono legítimo ou a autoridades competentes.
Dessa forma, a Justiça recebeu denúncia de um funcionário de cinema que, ao encontrar um celular perdido nas poltronas da sala de exibição, não comunicou à gerência da empresa e levou o aparelho para casa. Dias depois, o réu vendeu o telefone ao tio que, mesmo sabendo da origem ilícita, aceitou comprar, por valor inferior ao do mercado. O comprador foi, por sua vez, acusado de receptação.
De acordo com a lei, comete infração penal quem acha coisa alheia perdida e dela se apropria, total ou parcialmente, deixando de devolver ou entregar à autoridade competente em até 15 dias. A pena prevista é detenção, de um mês a um ano, ou multa. Crimes como esse são de competência dos Juizados Especiais Criminais, por serem considerados de menor potencial ofensivo.
Titular da 2ª unidade judiciária de Goiânia, o juiz Wild Afonso Ogawa, esclarece a tipificação do delito. “Na legislação antiga, apropriar-se de bem alheio perdido para proveito próprio era equiparado ao furto, em sua gravidade”, conta. Hoje, a conduta ainda se assemelha à subtração de bem para fins de dosimetria penal, com base no artigo 155 do CP, que versa, justamente, sobre furtos. “Se o bem perdido for de pequeno valor e o réu, primário, é possível substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar, somente, multa”, elucida o magistrado,
No caso em discussão, o tio do empregado do cinema foi acusado pelo Ministério Público de Goiás de receptação de mercadoria ilícita. Tal circunstância é possível de ocorrer, conforme explica Ogawa. “A receptação é um crime acessório, isto é, precisa da condenação do primeiro delito de roubo ou furto, para ser cabível”.
O processo tramita em segredo de Justiça na 8ª Vara Criminal de Goiânia. Segundo a ação, o dono do aparelho perdido chegou a ir à seção de achados e perdidos do centro comercial e a pedir imagens das câmeras de monitoramento, mas não encontrou nada.
A vítima não cancelou o número e percebeu que a pessoa detentora do celular perdido estava fazendo telefonemas interurbanos. Ele relatou que tentou ligar e mandou mensagens a quem estava utilizando o bem, mas não obteve resposta. Fez ainda um boletim de ocorrência policial e rastreou o equipamento. Dessa forma, foi descoberto, então, o paradeiro junto ao tio do funcionário do cinema, que havia comprado o produto por R$ 200 — cerca de R$ 600 mais barato em comparação ao valor da nota fiscal. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-GO.
Revista Consultor Jurídico, 12 de agosto de 2017, 7h50
http://www.conjur.com.br/2017-ago-12/achar-objeto-perdido-ou-esquecido-nao-devolve-lo-dono-crime

Reconhecimento póstumo de paternidade não invalida negócio jurídico

O reconhecimento póstumo de paternidade não invalida negócio jurídico celebrado dentro das regras. Com base nesse entendimento, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento, por unanimidade, a recurso especial que pretendia anular a venda de cotas societárias de uma empresa, feita de pai para filho, em virtude do reconhecimento de uma filha ocorrido posteriormente.
O relator do caso é o ministro Luis Felipe Salomão. A autora ajuizou ação contra o irmão para anular a transferência das cotas sociais da empresa da qual seu genitor era sócio. Alegou que, quando tinha três anos, o pai alterou o contrato da sociedade da empresa, transferindo todas as cotas para o irmão, com o objetivo único de excluí-la de futura herança, o que caracterizaria negócio jurídico simulado.
Segundo a mulher, o pai nunca se afastou da empresa, e o irmão, menor de 21 anos, foi emancipado às vésperas da alteração societária, com o objetivo de burlar a lei. Além disso, afirmou que ele não tinha condições financeiras de adquirir as cotas sociais transferidas para seu nome. Na abertura do inventário dos bens deixados pelo genitor, o irmão pleiteou e obteve a exclusão das referidas cotas sociais.
Na primeira instância, foi julgado procedente o pedido da autora, para declarar a anulação da alteração contratual que aconteceu antes que ela fosse reconhecida como filha do empresário. Porém, a decisão foi reformada no recurso julgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Segundo o acórdão, a mulher não conseguiu provar a simulação e que, quando feita a alteração contratual, pai e filho não conheciam a autora nem sabiam da sua condição de filha e irmã. Dessa forma, ela não poderia postular a nulidade da venda das cotas da sociedade porque na época não era exigível seu consentimento.
O entendimento do TJ-DF foi ratificado pelo ministro Luis Felipe Salomão. Para ele, a autora ainda não figurava como filha legítima, o que só aconteceu após a morte do genitor, quando o contrato da sociedade foi alterado para a venda das cotas. “Dadas tais circunstâncias, o seu consentimento não era exigível, nem passou a sê-lo em razão do posterior reconhecimento de seu estado de filiação”, disse o ministro. Segundo Salomão, não foi demonstrada má-fé ou outro vício qualquer no negócio jurídico. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
REsp 1.356.431
Revista Consultor Jurídico, 14 de agosto de 2017, 13h44
http://www.conjur.com.br/2017-ago-14/reconhecimento-postumo-paternidade-nao-invalida-negocio-juridico