quinta-feira, 28 de junho de 2018

A responsabilidade civil dos pais pelos atos dos filhos menores na Internet

Fernanda Kac e Douglas Guzzo Pinto

Importante que os pais se atentem às atividades dos filhos menores no ambiente digital, não somente para a própria segurança dos pequenos, mas também como forma de mitigar os riscos de responsabilização civil por eventuais atos ilícitos praticados na Internet.

quinta-feira, 28 de junho de 2018

Recentemente foi noticiado que um estudante de 16 anos foi preso nos Estados Unidos após ter utilizado ferramentas de tecnologia para alterar notas no sistema de sua escola1.

Em 2010, também nos Estados Unidos, o Washington Post já publicava notícia sobre um "mini-hacker", de apenas 9 anos, que derrubou os protocolos de segurança do sistema escolar do condado de Fairfax, na Virgínia, trocando as senhas dos professores e funcionários, além de alterar e apagar conteúdos de aulas e atividades virtuais2.

Casos como esses representam um grande alerta para que pais e educadores orientem crianças e adolescentes sobre o uso adequado e consciente da tecnologia e as repercussões jurídicas de suas ações na Internet.

Na medida em que a população mundial já ultrapassou 7 bilhões de habitantes em 2017, segundo relatórios da Organização das Nações Unidas (ONU)3, o aumento exponencial da utilização de recursos tecnológicos diariamente por pessoas de diversas faixas etárias e gerações distintas reclama um novo olhar sobre a importância da educação digital como meio de transformação da sociedade e conscientização social.

Hoje em dia não basta apenas ensinar português, matemática, física ou química aos jovens. É fundamental a formação de cidadãos que façam bom uso da tecnologia em um mundo cada vez mais conectado através de smartphones, tablets e notebooks.

Nesse aspecto, não se pode olvidar que a educação é um dever da família, da escola e da sociedade em geral, conforme estabelecido pela Constituição Federal (artigo 2274) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (artigo 4º5), ressaltando-se o papel dos pais para dirigir a educação e criação dos filhos, nos termos do artigo 1.634, inciso I do Código Civil6.

Nesse passo, embora as instituições de ensino possuam um papel importante na educação digital, os pais não devem terceirizar essa tarefa, sendo crucial a união de esforços para essa finalidade.

Ocorre que muitos dos pais não foram preparados para o universo digital. Eles são os chamados imigrantes digitais7, pois cresceram em uma época em que a Internet não estava presente na vida cotidiana e foram aprendendo a utilizá-la conforme esse recurso foi sendo difundido.

Já as crianças e os adolescentes de hoje são os chamados nativos digitais8 , visto que já nasceram e cresceram em uma época na qual tecnologias digitais já eram uma realidade e que fizeram parte de sua vivência.

Se, de um lado, é impressionante que para as crianças e adolescentes o manuseio da tecnologia venha com muita naturalidade, de outro, causa preocupação a ausência de discernimento sobre as consequências dos atos praticados online.

Algumas vezes esses jovens assumem o papel de vítimas, expostos indevidamente a conteúdos impróprios permeados de violência, ódio, preconceito, pornografia, nudez, pedofilia, jogos perigosos (como o da "Baleia Azul"9), etc.

Entretanto, muitas vezes as crianças e adolescentes acabam incorporando o papel de infratores, postando ofensas em redes sociais, participando de Cyberbullying e praticando atos ilícitos em geral na Internet.

No Brasil, verificada a prática de ato infracional por um menor de idade, surge a possibilidade de aplicação de medidas sócio-educativas em atenção ao que dispõe o artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente10.

Apesar disso, os pais podem ser responsabilizados pelos danos causados a terceiros pelos filhos menores, conforme previsão do artigo 932 do Código Civil11. Nesses casos, a responsabilidade independe da culpa dos pais, como preceitua o artigo 933 do mesmo Diploma Legal12.

Em se tratando douso da Internet, cabe lembrar que o Marco Civil da Internet (lei 12.965/14), que disciplina o uso da Internet no Brasil e garante meios para a identificação daqueles que praticam atos ilícitos na rede sob o manto do anonimato, traz disposiçõesa respeito do exercício do controle parental sobre o uso de recursos tecnológicos pelos filhos menores (art. 2913), reforçando o dever de fiscalização dos pais.

A propósito do tema, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu recentemente a responsabilidade dos pais por ato do filho menor que comprou jogos eletrônicos pela Internet utilizando cartões de crédito do pai, uma vez que disponibilizaram o acesso à conexão e ao meio de pagamento14.

Apesar dos riscos na utilização da Internet, é quase impossível e até mesmo inviável afastar-se da tecnologia, que inclusive pode ser uma grande aliada dos pais na difícil tarefa de educar.

Portanto, importante que os pais se atentem às atividades dos filhos menores no ambiente digital, não somente para a própria segurança dos pequenos, mas também como forma de mitigar os riscos de responsabilização civil por eventuais atos ilícitos praticados na Internet.

Nesse cenário, o futuro da sociedade digital dependerá dos princípios e valores educacionais ensinados para os jovens de hoje, garantindo-se cada vez mais o uso seguro, consciente e responsável da Internet.
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1 Clique aqui.
2 Clique aqui.
3 Clique aqui.
4 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
5 Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
6 Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I - dirigir-lhes a criação e a educação;
7 Termo criado pelo norte-americano Marc Prensky.
8 Idem nota anterior.
9 Clique aqui.
10 Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
I - advertência;
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
IV - liberdade assistida;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
11 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
12 Art. 933. As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.
13 Art. 29. O usuário terá a opção de livre escolha na utilização de programa de computador em seu terminal para exercício do controle parental de conteúdo entendido por ele como impróprio a seus filhos menores, desde que respeitados os princípios desta Lei e da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente.
14 AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MATERIAIS E MORAIS. Criança que adquiriu jogos pela internet utilizando cartões de crédito dos pais. Relação de consumo. Inexistência de defeito no serviço. Culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Art. 14, §3º, I e II, CDC. Responsabilidade dos pais pela fiscalização dos atos dos filhos menores. Desrespeito à restrição de idade para possuir conta Google. Acesso à internet e aos cartões de crédito permitido pelos pais. Ausência de responsabilidade da ré. Sentença mantida. Honorários advocatícios majorados. Recurso não provido, com observação.
(TJSP; Apelação 1016178-98.2017.8.26.0361; Relator (a): Fernanda Gomes Camacho; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Privado; Foro de Mogi das Cruzes - 2ª Vara da Família e das Sucessões; Data do Julgamento: 14/06/2018; Data de Registro: 14/06/2018).
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*Fernanda Kac é advogada associada do escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados Associados.
*Douglas Guzzo Pinto é advogado associado do escritório Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados Associados.

http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI282629,11049-A+responsabilidade+civil+dos+pais+pelos+atos+dos+filhos+menores+na

O DIREITO DE VISITA À ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO E A NOVA REALIDADE DO DIREITO DE FAMÍLIA

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) garantiu, por maioria de votos, o direito de visita do ex companheiro ao animal de estimação, após o rompimento de união estável entre seus donos. A decisão recente tratou de regulamentar judicialmente as visitas do ex-companheiro ao seu animal de estimação, que foi adquirido durante união estável, e com seu rompimento foi impedido de visitar o cachorro, que ficou aos cuidados da ex-companheira.

Apesar dos animais de estimação serem considerados como “coisa” no Código Civil Brasileiro, a 4º Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, no julgamento do Recurso Especial 1.713.167, considerou que eles merecem um tratamento diferente devido ao atual conceito amplo de família e a função social que ela exerce, não devendo ser tratado nem como coisa inanimada nem como sujeito de direito.

Ademais, o ministro relator Luis Felipe Salomão apontou que segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem mais famílias com gatos e cachorros (44%) do que com crianças (36%), não se tratando de futilidade o tema analisado pela corte.

As normas de Direito de Família são pautadas em regras que visam efetivar o afeto, e o afeto deve prevalecer em face das normas jurídicas, que não devem ser engessadas, mas sim, deliberadas em vista do melhor interesse das partes.

Os animais tornaram-se membros não humanos do grupo familiar, sendo tratados de forma bastante afetiva. A relação que foi criada com os animais de estimação vai além da relação proprietário-objeto.

A decisão não tem o condão de humanizar o animal de estimação, os animais, mesmo com todo afeto merecido, continuarão sendo não humanos e, por conseguinte, portadores de demandas diferentes.

O relator do caso reconheceu os animais de estimação como um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos, voltado para a proteção do ser humano, e seu vínculo afetivo com o animal.

Países como Suíça, Alemanha, Áustria, e França não consideram os animais como coisas ou objetos, mas como seres sencientes, atribuindo-lhes a capacidade de emoções positivas e negativas.

O reconhecimento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do direito de visita à animais de estimação é uma forma de adequar o direito brasileiro à nova realidade das relações afetivas do Direito de Família.

Fonte: Isabela Perella é advogada do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados

http://lexprime.com.br/o-direito-de-visita-a-animais-de-estimacao-e-a-nova-realidade-do-direito-de-familia/

Direito de visitas a animal de estimação

Marina Lima Pelegrini Oliveira

Cabe lembrar que o princípio constitucional da dignidade humana aponta para a tutela jurídica do interesse e afeto das partes, e não do animal.

quinta-feira, 28 de junho de 2018

A 4º turma do STJ julgou, no último dia 19, caso que aborda a possibilidade jurídica de regulamentação de visitas a animais de estimação a partir do fim do enlace afetivo do casal (decisão ainda não publicada). O caso em exame foi proposto por um homem impedido pela ex-companheira de conviver com a cadela do casal após o término da união estável, fato que gerou angústia em razão da ligação afetiva estabelecida com o animal.

Segundo noticia o STJ em seu site, a ação de regulamentação de visitas foi ajuizada para assegurar o acesso do ex-companheiro à cadela, que teria permanecido com a mulher. A discussão de fundo parece ter sido a aplicação, por analogia, do instituto da guarda de menores para regulamentar a relação entre as pessoas e animais domésticos, ao menos até que a legislação seja adequada à nova realidade.

A decisão inédita da Corte Superior, tomada por maioria de votos, manteve o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, para fixar as visitas do ex-companheiro à cadela em períodos como fins de semana e feriados. O julgado prestigiou a disposição contida no Código Civil, que classifica os animais como bens semoventes, mas buscou uma releitura do instituto baseada no afeto e na preservação da dignidade dos donos do animal.

O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, esclareceu que o caso concreto justificou o emprego da medida de regulamentação de visitas, pois foi demonstrado o vínculo afetivo do ex-companheiro com o animal, relação que mereceria proteção, ainda que por um lapso de tempo, para "atender os fins sociais e a própria evolução da sociedade. (...) Reconhece-se, assim, um terceiro gênero, em que sempre deverá ser analisada a situação contida nos autos, voltado para a proteção do ser humano e seu vínculo afetivo com o animal.". Destaque-se que o STJ não aplicou o instituto da guarda de filhos, à medida que deixou claro que os animais domésticos não são sujeitos de direito segundo nosso ordenamento.

Discussões similares são travadas nas Cortes de todo o país, e têm como pano de fundo o status de coisa atribuído aos animais pelo Código Civil (artigo 82) versus a intensa transformação sofrida na composição e formato dos núcleos familiares. Diante do interesse de ambas as partes em permanecer com o animal, não há previsão legal que disponha sobre sua titularidade e guarda.

Coisas são institutos jurídicos que possuem cunho econômico, sujeitos a serem simplesmente possuídos e partilhados, prerrogativas que não correspondem aos anseios da sociedade atual em relação aos animais domésticos, considerados como integrantes por muitas famílias.

Os defensores da tese destacam que os "pets" não podem ser tratados como objetos, pois são dotados de sensibilidade e ocupam espaço relevante na dinâmica das famílias atuais. É o que a doutrina nomeia de "animais sencientes", partindo da premissa de que possuem sensibilidade e percepção consciente de si próprios e do ambiente ao redor.

Há um projeto de lei em curso no Brasil sobre a matéria (PL 6799/13), para que os animais deixem de ser tratados como coisas, e passem a ser classificados como sujeitos de direitos despersonificados. A mudança de paradigma é pleiteada não somente pelos donos de pets, mas por associações defensoras dos animais, que acreditam que a medida minimizaria situações de maus-tratos e abandono.

O movimento é de escala mundial: países como a França, Áustria, Suíça, Alemanha e Nova Zelândia promoveram alteração em suas legislações para que os animais sejam tratados como seres sencientes, e não mais na categoria de bens móveis (semoventes). O assunto da classificação dos animais como sujeitos de direito atípicos é pauta de debates em muitos outros países.

Cabe lembrar que o princípio constitucional da dignidade humana aponta para a tutela jurídica do interesse e afeto das partes, e não do animal. Ainda que surjam outras decisões favoráveis, na esteira do caso mencionado acima (como resposta à urgente demanda social), repensar o tratamento normativo dispensado aos animais é medida que se impõe.

Em que pese parte da doutrina considerar a afetividade como princípio jurídico implícito1, decorrente da dignidade humana, uma segunda corrente2 a considera como valor, desprovido de caráter judiciário. O afeto há que ser considerado no plano da ética, e não das obrigações jurídicas. Conforme bem explica Lenio Streck, ao fazer o paralelo entre ativismo e judicialização3, novas realidades precisam ser acomodadas, desde que assegurada a segurança jurídica e em alinhamento com a ordem constitucional.
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1 LOBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 49.

2 VIEGAS, Claudia Mara de Almeida Rabelo; POLI, Leonardo Macedo. Os efeitos do abandono afetivo e a mediação como forma de solução de conflitos paterno-filiais. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XVI, n. 110, mar 2013. Disponível em: <Clique aqui> Acesso em 20 jun. 2018.

3 STRECK, Lenio Luiz. Entre o ativismo e a judicialização da política: a difícil concretização do direito fundamental a uma decisão judicial constitucionalmente adequada. Revista Espaço Jurídico, Santa Catarina, vol. 17, Editora Unoesc, 2016, Pp 721-732.
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*Marina Lima Pelegrini Oliveira é advogada do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados.

http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI282624,21048-Direito+de+visitas+a+animal+de+estima%C3%A7%C3%A3o

Homem deve indenizar ex-noiva em R$ 200 mil por acidente que a deixou tetraplégica

Decisão é da juíza de Direito Débora Kleebank, da 15ª vara Cível de Porto Alegre/RS.

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Um homem foi condenado a indenizar em R$ 200 mil, por danos morais e estéticos, a ex-noiva em razão de um acidente de trânsito que a deixou tetraplégica. A decisão é da juíza de Direito Débora Kleebank, da 15ª vara Cível de Porto Alegre/RS.

Em 1993, o então casal viajava quando sofreu um acidente após o homem perder o controle do veículo. A mulher foi lançada para fora do carro depois que o cinto de segurança se rompeu, sofrendo fraturas nas vértebras. Por causa do ocorrido, a mulher, que à época tinha 22 anos de idade, ficou tetraplégica e se aposentou por invalidez. Dois anos após o sinistro, o casal se separou.

Por causa do ocorrido, a mulher ingressou na Justiça contra o ex-noivo, alegando que chovia no momento do acidente e que o infortúnio teria sido causado por culpa do homem. A autora pleiteou indenizações por danos morais e estéticos em razão das lesões irreversíveis sofridas por ela.

Ao analisar o caso, a juíza Débora Kleebank considerou que, a partir dos depoimentos das testemunhas e dos documentos juntados aos autos, é possível concluir que chovia muito no local do acidente. A magistrada pontuou que o fato de ter água na pista é presumível quando chove e, por si só, não afasta a responsabilidade do motorista pela aquaplanagem na pista de rolamento.

"Em suma, se o motorista não é cauteloso, e permite a aquaplanagem do veículo (circunstância previsível), pratica conduta culposa e responde por eventual acidente decorrente do fenômeno."

A juíza considerou ainda os sofrimentos infligidos à autora por causa do acidente e o estado de tetraplegia no qual ela se encontra. Com isso, condenou o réu ao pagamento de indenizações por danos morais, no valor de R$ 100 mil, e por danos estéticos, no mesmo valor, totalizando R$ 200 mil de indenização à autora.

"Como bem colocado pela autora, talvez se tivesse o demandado reduzido a velocidade ou se tivesse parado o veículo, o infortúnio não tivesse ocorrido. Portanto, ao preferir conduzir o seu automóvel naquela chuva e na pista complemente alegada, deu causa ao sinistro, porque assumiu o risco do resultado, devendo responder pelos danos experimentados pela autora."
Processo: 0367036-07.2012.8.21.0001

Confira a íntegra da sentença.

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282649,71043-Homem+deve+indenizar+exnoiva+em+R+200+mil+por+acidente+que+a+deixou

Noivo que desistiu do casamento 15 dias antes deve indenizar a ex

Juízo de 1º grau condenou o homem ao pagamento de danos morais e materiais.

quinta-feira, 28 de junho de 2018

Romper promessa de casamento é motivo para indenização por danos morais e materiais; pelo menos é o que o juiz de Direito Adhemar Chúfalo Filho, do JEC de Porto Nacional/TO, achou ao condenar um noivo a indenizar a ex após desistir do casamento faltando 15 dias para a cerimônia.

A mulher ajuizou ação contra o ex-companheiro argumentando que namoraram por mais de 10 anos e cerca de 15 dias antes do casamento, o noivo desistiu do matrimônio de forma injustificada. A mulher pediu então o pagamento de danos materiais, a fim de compensar o valor pago pela recepção dos convidados, e de danos morais.

Consta nos autos que o noivo teve oportunidade de defesa, porém não o fez, não comparecendo a audiência de instrução e julgamento, embora regularmente citado e intimado para tanto.

Após constatar a revelia, o juiz reconheceu o ato ilícito e nexo de causalidade entre a conduta do homem e os danos sofridos pela noiva, em razão rompimento matrimonial, e entendeu que a situação enseja o dever indenizatório.

Assim, condenou o ex-companheiro ao pagamento de R$ 1.894,21, por danos materiais, e de R$ 3 mil por danos morais.

"A mulher agravada em sua honra, pela promessa de casamento, tem direito a reparação do dano sofrido, visto que os danos morais são inferidos pela circunstância do caso concreto, apresentado, estando eles apresentados na dor, vergonha, o incômodo e transtorno suportado perante seus familiares, amigos; entendendo-se, assim, que houve conduta inadequada pela reclamada."
Processo: 0001112-84.2018.8.27.2737

Veja a decisão.

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282676,101048-Noivo+que+desistiu+do+casamento+15+dias+antes+deve+indenizar+a+ex

Doação remuneratória para a viúva deve preservar direitos dos sucessores

Por 
Embora os cuidados dispensados ao cônjuge não sejam passíveis de remuneração ou indenização, o marido pode reservar bens para ajudá-la na sobrevivência, mesmo quando o regime for de separação total dos bens, desde que os herdeiros fiquem com 50%.
Com esse fundamento, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul reconheceu parcialmente um termo de ‘‘doação remuneratória’’ a uma viúva, a título de gratificação, assinado pelo marido antes de morrer. Os bens se resumem à cessão de valores de precatórios que o homem havia ganhado em ações contra o estado e a Previdência gaúcha (Ipergs).
A controvérsia reside no fato de que o homem só poderia dispor de 50% dos seus bens, já que deixou uma filha, considerada sua única e legítima herdeira diante do casamento sob o regime de separação total de bens. Conforme o artigo 1.846 do Código Civil, pertence aos herdeiros necessários, de pleno direito, a metade dos bens da herança.
O juiz Dalmir Fraklin de Oliveira Júnior, da 1ª Vara Cível da Comarca de Passo Fundo, no entanto, não viu erros na formatação do documento, que atende a redação do artigo 288 do Código Civil. O dispositivo diz que a cessão de crédito por instrumento particular é eficaz com relação a terceiros se estiver em conformidade com o parágrafo 1º do artigo 654 do mesmo Código. Além disso, no corpo do documento, consta que se trata de uma ‘‘doação remuneratória’’, o que também seria válido, na medida em que a doação admite instrumento particular, conforme o artigo 541.
Apesar de não observar a meação de 50%, o documento não foi declarado nulo. O julgador disse que poderia ser aproveitada a parte que garante o ‘‘máximo de realização da vontade do falecido’’, destinando 50% dos bens – como autoriza a lei – à viúva, para garantir-lhe segurança financeira. E a outra metade seria destinada à filha, que é herdeira legítima.
‘‘Dito isso, se torna desnecessária a análise da existência de patrimônio comum decorrente do regime de bens do casamento (separação obrigatória de bens, artigo 258, § único, II, CC/1916, vigente ao tempo da celebração do matrimônio) a ser objeto de meação, já que o valor é de direito da viúva pela cessão de crédito realizada’’, determinou no despacho.
A decisão não agradou à viúva, que interpôs recurso no TJ-RS. Ela alegou, entre outros argumentos, que os valores fixados em ‘‘doação remuneratória’’, para compensar os serviços prestados ao longo da vida do casal, não poderiam ser incorporados como ‘‘colação de bens’’ ao inventário. 
Lado a lado
O relator no TJ-RS, desembargador Luiz Felipe Brasil Santos, manteve o entendimento. Ele destacou que, independentemente de qual seja o regime de bens a vigorar no casamento, o artigo 1.566 do Código Civil estabelece deveres de ambos os cônjuges, entre os quais a mútua assistência e a consideração mútua. 
Santos afirmou que a doação remuneratória visa a pagar algo que alguém prestou ao doador graciosamente, sem que houvesse regra legal impositiva. No entanto, cuidados eventualmente prestados ao cônjuge derivam do dever matrimonial. Daí, não se possível falar em remuneração ou mesmo indenização. ‘‘A circunstância de a agravante estar ao lado do marido, prestando-lhe amparo quando já debilitado, constitui dever inerente ao casamento’’, concluiu o relator.
‘‘Muito mais, ao que parece, pretendeu o falecido contemplar a agravante [viúva] com algum valor, porquanto o casamento se deu pelo regime da separação de bens. Há que se preservar os direitos da filha herdeira em 50% daqueles valores, que representam a totalidade do patrimônio deixado pelo de cujus’’, definiu o desembargador, em voto seguido por unanimidade.
Clique aqui para ler o acórdão.
Processo 1.15.0005286-0
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2018, 9h48
https://www.conjur.com.br/2018-jun-26/doacao-remuneratoria-viuva-preservar-sucessores

STJ reconhece cessão de locação de imóvel ante silêncio de locador notificado

A cessão de locação de um imóvel pode ocorrer a partir da notificação extrajudicial ao locador, mesmo que não haja manifestação de anuência. Com esse entendimento, os ministros da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça conheceram e deram provimento a um recuso especial, declarando ineficaz um contrato de aluguel.
Nos autos, dois sócios locaram um imóvel para a instalação de um bar em 2002. Em 2005, um dos membros, que tinha colocado seus pais como fiadores no aluguel, deixou a sociedade. O estabelecimento continuou no mesmo endereço até que, em 2008, o locador ajuizou ação de despejo por falta de pagamento contra o ex-sócio.
A ministra Nancy Andrighi afirmou que o locador teve 30 dias para se posicionar contra a saída do ex-sócio do contrato de locação conforme declarado em notificação extrajudicial. 
Divulgação
A ação foi extinta sem resolução do mérito por causa da purgação da mora efetuada por terceiro. O locatário, então, notificou extrajudicialmente o dono do imóvel sobre seu afastamento da relação locatícia. Sem resposta, ajuizou ação pedindo a declaração de insubsistência da relação e a inexistência das obrigações cobradas.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, porém, manteve a sentença confirmando a relação jurídica por ser o contrato válido e eficaz. De acordo com a decisão na corte estadual, o silêncio dos envolvidos não torna a relação locatícia inexistente, da mesma forma que o pagamento do aluguel por terceiro não implica a formação de novo contrato.
Com um recurso especial no STJ, o ex-sócio pediu o reconhecimento judicial da cessão de locação. Seu pedido foi acatado pela 3ª Turma, que seguiu por unanimidade o relatório da ministra Nancy Andrighi no sentido de dar provimento ao pedido e confirmar o fim do acordo de locação com base nos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato.
“É indiscutível que o contrato foi inicialmente celebrado com o recorrente, pessoa natural, com a finalidade de viabilizar a instalação da pessoa jurídica por ele constituída. De outro lado, é do mesmo modo indiscutível que a literalidade das cláusulas contratuais há muito não corresponde à realidade estabelecida entre os sujeitos do processo”, apontou a ministra.
Para Andrighi, ainda que o contrato exista e seja válido, a partir da notificação extrajudicial que afirmava ao locador a relação do ex-sócio dentro do acordo, ele passa a ser ineficaz em relação ao recorrente, passando a responsabilidade para a pessoa jurídica. A ministra destacou também que o dono do imóvel tinha o prazo de 30 dias para se manifestar sobre a mudança do contrato, mas não o fez.
“A ausência de qualquer oposição à notificação extrajudicial promovida pelo locatário, aliada à permanência da pessoa jurídica no imóvel, inclusive pagando os aluguéis, e à purgação da mora por terceiro estranho ao contrato, tudo isso com o pleno conhecimento do locador, criaram no recorrente a expectativa concreta de ter-se consolidado a cessão da locação em favor daquela, legitimando-se, assim, a situação de fato vigente”, concluiu a relatora. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Clique aqui para ler a decisão.
REsp 1.443.135
Revista Consultor Jurídico, 26 de junho de 2018, 10h36
https://www.conjur.com.br/2018-jun-26/stj-reconhece-cessao-locacao-imovel-silencio-locador

quarta-feira, 27 de junho de 2018

A indenização por revenge porn no Direito de Família brasileiro (Flávio Tartuce)

quarta-feira, 27 de junho de 2018

No último dia 18 de maio de 2018, tive a feliz oportunidade de palestrar no X Encontro Nacional de Direito Civil e Processo Civil, realizado na cidade de Salvador e promovido pela Múltipla Eventos, sob a coordenação geral de Francisco Salles. Foi-me atribuído um tema desafiador, relacionado à proteção de dados pessoais na internet, tendo eu analisado, entre outras situações fáticas da atualidade, a "pornografia de vingança" ou revenge porn.

No âmbito do Direito de Família, tal conduta está presente quando um ex-cônjuge ou ex-companheiro expõe em ambientes virtuais vídeos ou fotos da intimidade do casal, com o objetivo de vingança pelo fim do relacionamento. Cite-se, também, a situação em que um dos ex-consortes filma o momento da traição, como aconteceu no caso conhecido como do "Gordinho da Saveiro". Outra situação fática que se tornou comum é a propagação de nudes do ex-cônjuge ou ex-companheiro após o fim da relação.

Trata-se de grave desrespeito à intimidade, que deve ser sancionado com o dever de indenizar, inclusive com o seu caráter de desestímulo. Como se sabe, a lei 12.737/2012, conhecida como Lei Carolina Dieckmann, trata de tipos penais presentes em situações similares às descritas. A norma introduziu o art. 154-A no Código Penal, estabelecendo que se trata de crime o ato de invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança, e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. A pena prevista para tal conduta é de detenção de três meses a um ano, e multa. O § 1º do comando estabelece que na mesma pena incorre quem produz, oferece, distribui, vende ou difunde dispositivo ou programa de computador com o intuito de permitir a prática da conduta acima mencionada. Além disso, aumenta-se a pena de um sexto a um terço se da invasão resulta prejuízo econômico (art. 154-A, § 2º, do CP). Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido, a pena passa a ser de reclusão de seis meses a dois anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave (art. 154-A, § 3º, do CP). Também está ali previsto que a pena é aumentada de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos (art. 154-A, § 4º, do CP). Por derradeiro, aumenta-se a pena de um terço à metade se o crime for praticado contra: a) Presidente da República, governadores e prefeitos; b) Presidente do Supremo Tribunal Federal; c) Presidente da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Assembleia Legislativa de Estado, da Câmara Legislativa do Distrito Federal ou de Câmara Municipal; ou d) dirigente máximo da administração direta e indireta federal, estadual, municipal ou do Distrito Federal.

Não se olvide que a responsabilidade civil independe da criminal, conforme enuncia o art. 935 do Código Civil, consagrador da conhecida divisão das instâncias ou órbitas da ilicitude. Todavia, a lei penal pode servir como roteiro para a configuração inicial das condutas ilícitas civis, pela violação de deveres legais. Presente o dano, há o enquadramento privado nos arts. 186 e 927 do Código Civil, surgindo daí o correspondente dever de indenizar. Tratando de situações similares, não relacionadas ao casamento ou à união estável, mas com mesma conclusão sobre a responsabilidade civil, vejamos três ementas estaduais:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DIVULGAÇÃO DE FOTOGRAFIAS ÍNTIMAS. Provada a conduta ilícita, a autoria, o dano e o nexo de causalidade, há de ser mantida a sentença que condenou o apelante ao pagamento da indenização arbitrada em favor da autora, em razão da divulgação indevida de fotos íntimas" (TJMG, Apelação n. 1.0180.11.004047-4/001, Rel. Des. Wagner Wilson, julgado em 13/11/2013, DJEMG 22/11/2013).

"RESPONSABILIDADE CIVIL. Danos morais. Partes que tiveram relacionamento amoroso. Hipótese em que o réu passou a ameaçar a autora, publicando mensagens desabonadoras na internet, fotos íntimas do casal e espalhando panfletos pelo bairro, afirmando que a autora era garota de programa. Fato de ter a autora tornado público o relacionamento entre as partes, na constância do casamento do réu, que configura risco originado da conduta do próprio réu. Danos morais devidos. Fixação da indenização em R$ 10.000,00. Valor razoável, que não merece sofrer redução. Decisão mantida por seus próprios fundamentos, nos termos do art. 252 do novo Regimento Interno deste Tribunal. Recurso desprovido" (TJSP, Apelação n. 0003141-93.2007.8.26.0224, Acórdão n. 7138060, Guarulhos, Primeira Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rui Cascaldi, julgado em 29/10/2013, DJESP 19/11/2013).

"APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. RECONVENÇÃO. Divulgação de fotos íntimas de relação sexual dos autores. Réu ex-namorado da autora. Prova da propagação das informações por ato do demandado. Procedência do pleito indenizatório. Critérios de fixação da indenização por danos morais. Majoração. Adequação aos parâmetros normalmente observados pela câmara. Apelação cível desprovida. Recurso adesivo provido" (TJRS, Apelação cível n. 341337-66.2012.8.21.7000, Tramandaí, Nona Câmara Cível, Rel. Des. Marilene Bonzanini Bernardi, julgado em 14/11/2012, DJERS 21/11/2012).

Mais recentemente, já abordando a questão do revenge porn, colaciona-se, do Tribunal Fluminense, diante do compartilhamento e divulgação de vídeos em redes sociais:

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIVULGAÇÃO DE VÍDEO ÍNTIMO. REVENGE PORN. PEDIDO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DO RÉU. PRETENSÃO RECURSAL DE EXCLUSÃO OU REDUÇÃO DOS DANOS MORAIS. (...) Pedido autoral de pagamento de indenização de danos morais decorrentes da divulgação de vídeo capturando um momento de intimidade sexual entre as partes. Sentença de procedência. Condenação ao pagamento de indenização no valor de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) para compensar os danos morais sofridos pela parte autora. Pedido recursal de exclusão da condenação ou, ainda, sua redução. Réu/apelante que insiste em negar a autoria do envio do vídeo para o grupo na rede social conectada pelo aplicativo “Whatsapp”. Recorrente que admite ter a mensagem partido de seu aparelho celular, apesar de não ter visto ninguém além da autora na ocasião em que a mensagem foi enviada. Elementos de prova conclusivos no sentido de que o apelante empreendeu esforços para tentar camuflar a realidade e assim esquivar-se de sua responsabilidade, chegando a noticiar falsamente. Como depois veio a admitir. O roubo de seu celular (responde o apelante pelo crime de falsidade ideológica nos autos do Processo nº. 0000302-66.2016.8.19.0033). Autoria suficientemente demonstrada. Presentes os demais elementos da responsabilidade civil subjetiva, notadamente a lesão, que na espécie é eminentemente extrapatrimonial. Recorrida que se viu submetida a intensa exposição, consequência que se exaspera, tendo em vista que a autora trabalha no comércio (ou seja, com atendimento ao público) numa cidade pequena, onde sobra pouco espaço para o anonimato e os vínculos com a coletividade tendem a assumir importância maior. Prova oral convincente no sentido de que o vídeo foi compartilhado até entre grupos de adolescentes, gerando irreversível processo difamatório de repercussão devastadora na vida da apelada. (...)" (TJRJ, Apelação n. 0000445-89.2015.8.19.0033, Miguel Pereira, Vigésima Primeira Câmara Cível, Rel. Des. André Emilio Ribeiro Von Melentovytch, DORJ 25/8/2017, p. 574).

O último julgado traz em sua fundamentação comentários sobre a realidade de um "sensacionalismo machista", que supostamente atuaria como um mecanismo de pressão social e coletiva, na censura à liberdade sexual da mulher. Dessa forma, essa suposta sanção social "definitivamente lesou a recorrida, que se viu prejudicada em inúmeros setores de sua vida pessoal, do familiar ao profissional". Reconheceu-se, assim, a existência do nexo de causalidade entre a gravação do vídeo e suas replicações e os prejuízos imateriais suportados pela autora. Como igualmente consta do voto do Relator, houve uma "reprovabilidade do ato que se acentua na medida em que o recorrente, no intuito único de dar vazão à sua fanfarronice, traiu a confiança depositada pela recorrida ao se deixar registrar num momento de intimidade, destruindo a reputação dela com a divulgação do vídeo". Há, por fim, menção ao caráter punitivo da indenização moral, fixada em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais). (TJRJ, Apelação n. 0000445-89.2015.8.19.0033, Miguel Pereira, Vigésima Primeira Câmara Cível, Rel. Des. André Emilio Ribeiro Von Melentovytch, DORJ 25/8/2017, p. 574).

Outro acórdão, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, e ainda mais recente, considerou haver violência moral contra a mulher nos casos de divulgação de material íntimo, a gerar a aplicação da Lei Maria da Penha, o que é um caminho jurídico correto, na minha opinião. Nos termos exatos do acórdão, que entendeu pela presença de danos morais presumidos, "a divulgação via whatsapp e Facebook para conhecidos e desconhecidos, de imagens de companheira nua consubstancia violência moral contra a mulher no âmbito de relação íntima de afeto, a qual foi prevista pelo legislador nacional no art. 5º, III, c/c art. 7º, V, da lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), ensejando a reparação por dano moral in re ipsa" (TJDF, Apelação cível n. 2016.16.1.009786-5, Acórdão n. 108.2311, Quinta Turma Cível, Rel. Des. Ângelo Passareli, julgado em 14/3/2018, DJDFTE20/3/2018).

Entendo que, em situações de pornografia de vingança relacionadas às entidades familiares, a competência para apreciar tais danos deve ser da Vara da Família, diante da presença de um nexo de causalidade que decorre da relação familiar, podendo tal pedido ser formulado na própria ação de divórcio ou de dissolução da união estável que assuma a feição contenciosa (arts. 693 e seguintes do CPC/2015).

Entretanto, em se tratando de mero relacionamento fugaz – como no caso de "ficantes", crushes ou com "amizade colorida", por exemplo –, de um namoro ou noivado, a competência para apreciar a demanda reparatória por pornografia de vingança é da Vara Cível. A propósito, outra hipótese fática contemporânea, situação já analisada pela jurisprudência, diz respeito ao envio de fotos íntimas na iminência do casamento, o que gerou a sua não realização e a responsabilidade civil do noivo:

"Violação da intimidade. Apelante que enviou e-mails, inclusive com conversas e fotos íntimas, a diversas pessoas do círculo dos apelados, em data próxima ao casamento destes. Teorias dos círculos concêntricos. Violação da intimidade. Esfera íntima da vida privada que merece proteção. Notório intuito desabonador" (TJSP, Apelação n. 0015045-05.2012.8.26.0073, Acórdão n. 8848480, Avaré, Segunda Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rosangela Telles, julgado em 29/9/2015, DJESP 6/10/2015).

Como palavras finais, pontue-se que o envio de nudes, por fotos ou vídeos, tornou-se uma prática corriqueira e perigosa entre as gerações mais novas. Cientes disso, alguns julgadores têm resolvido a questão da propagação de fotos e vídeos pela internet a partir da presença da culpa exclusiva da vítima, como se extrai da seguinte ementa: "a propagação de imagens que violam a intimidade da parte é capaz de ensejar indenização por danos morais, quando não há autorização para tanto, nos termos do artigo 20 do CC. O fato de a parte ter produzido e remetido a foto íntima para outrem caracteriza sua culpa exclusiva pela propagação das imagens acostadas nos autos". (TJMT, Apelação n. 105148/2015, Barra do Garças, Rel. Des. Maria Helena Gargaglione Póvoas, julgado em 13/4/2016, DJMT 20/4/2016, p. 99).

Talvez, como a prática é geracional, essa forma de julgar seja alterada substancialmente no futuro, ou seja, não haverá mais o enquadramento da conduta na culpa ou fato exclusivo da vítima, mas no fato concorrente de todos os envolvidos, a gerar a fixação do quantum debeatur de acordo com as contribuições das partes.

Flávio Tartuce é doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC/SP. Professor titular permanente do programa de mestrado e doutorado da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (FADISP). Professor e coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensu da Escola Paulista de Direito. Professor do G7 Jurídico, em cursos preparatórios para as carreiras jurídicas. Diretor do IBDFAM – Nacional e vice-presidente do IBDFAM/SP. Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico.

http://www.migalhas.com.br/FamiliaeSucessoes/104,MI282544,81042-A+indenizacao+por+revenge+porn+no+Direito+de+Familia+brasileiro

Cartórios não podem registrar uniões poliafetivas, decide CNJ

Para os conselheiros, esse tipo de documento implica o reconhecimento de direitos garantidos a casais ligados por casamento ou união estável.

quarta-feira, 27 de junho de 2018

O CNJ decidiu nesta terça-feira, 26, que os cartórios brasileiros não podem registrar uniões poliafetivas, formadas por três ou mais pessoas, em escrituras públicas. Por maioria, os conselheiros consideraram que esse tipo de documento atesta um ato de fé pública e, portanto, implica o reconhecimento de direitos garantidos a casais ligados por casamento ou união estável – herança ou previdenciários, por exemplo.

Os conselheiros julgaram pedido formulado pela ADFAS - Associação de Direito de Família e das Sucessões, que requereu a proibição do registro das uniões poliafetivas após tomar ciência que dois cartórios de comarcas paulistas, em São Vicente e em Tupã, lavraram escrituras de uniões estáveis poliafetivas. Pela decisão, o CNJ determinou que as corregedorias-gerais de Justiça proíbam os cartórios de seus respectivos estados de lavrar escrituras públicas para registar uniões poliafetivas.

O voto do relator, ministro João Otávio de Noronha, pela procedência do pedido foi acompanhado por outros sete integrantes do CNJ. Para o ministro, a emissão desse tipo de documento, de acordo com o ministro Noronha, não tem respaldo na legislação e nem na jurisprudência do STF, que reconhece direitos a benefícios previdenciários, como pensões, e a herdeiros apenas em casos de associação por casamento ou união estável.

"(Nesse julgamento) eu não discuto se é possível uma união poliafetiva ou não. O corregedor normatiza os atos dos cartórios. Os atos cartorários devem estar em consonância com o sistema jurídico, está dito na lei. As escrituras públicas servem para representar as manifestações de vontade consideradas lícitas. Um cartório não pode lavrar em escritura um ato ilícito como um assassinato, por exemplo."

O conselheiro Luciano Frota foi o único a votar pela improcedência absoluta do pedido, sendo totalmente favorável à união poliafetiva, inclusive, considerando-a união estável.

Delimitação do debate

A presidente do CNJ e do STF, ministra Cármen Lúcia, fez uma ressalva para delimitar o objeto da discussão.

"O desempenho das serventias [cartórios] está sujeito à fiscalização e ao controle da Corregedoria Nacional de Justiça. Por isso exatamente que o pedido foi assim formulado. Não é atribuição do CNJ tratar da relação entre as pessoas, mas do dever e do poder dos cartórios de lavrar escrituras. Não temos nada com a vida de ninguém. A liberdade de conviver não está sob a competência do CNJ. Todos somos livres, de acordo com a constituição."

Processo: 0001459-08.2016.2.00.0000
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282599,41046-Cartorios+nao+podem+registrar+unioes+poliafetivas+decide+CNJ

7 indagações mais comuns de quem promove ou quer promover a Ação de Divórcio ou de Dissolução da União Estável

Existem questionamentos que não estão relacionados diretamente com a lei, são corriqueiros e, sendo saneados, proporcionam o conhecimento e melhoram o relacionamento entre o(a) Advogado(a) e o(a) Cliente.

Publicado por Alan Dias


Como em qualquer tipo de processo, em relação ao Divórcio ou à União Estável, observações surgem desde a primeira entrevista com o (a) cliente, persistem durante toda a fase processual e, em determinadas situações, extrapolam a finalização daquele.

Constatam-se os seguintes questionamentos:

1 - “Doutor, vale a pena? Qual a vantagem?”

Estas perguntas estão relacionadas a qualquer tipo de processo, principalmente ao Divórcio e à dissolução da União Estável. Sim, vale a pena.

Quando não há qualquer tipo de reconciliação e a parte esta decidida, uma definição judicial proporciona vantagens jurídicas e econômicas, dado que, depois, evita-se a confusão patrimonial, cada parte poderá adquirir o seu bem sem ter que partilhar, depois, com o (a) esposa (o) ou companheiro (a); participar de sociedades e fazer qualquer tipo de investimento sem ficar “preso” ao outro que não mantem qualquer vínculo afetivo, ou seja, o processo proporciona a segurança jurídica/econômica e define os direitos e as obrigações. Portanto, é concretizado um divisor de águas, já que se evita a eternização de um relacionamento e seus efeitos que, em muitas situações, não tem qualquer embasamento afetivo, emocional que, antes, existia.

2 – “Doutor, não entendo como funciona o processo.”

Questionamento normal. O processo pode se resumir desta forma:

1º - após a entrevista com o Advogado, este concretiza um documento formal, a Petição Inicial que apresenta o histórico que foi relatado pelo cliente, os argumentos e pedidos jurídicos que serão apreciados pelo (a) Juiz (a) que resolverá a lide/o conflito existente entre as partes;

2º - com a Petição Inicial, o Advogado da entrada no processo que será sorteado para uma de Vara Família ou Cível;

3º - quando o processo é recebido no Cartório da Vara, é formalizado um ato processual, Mandado de Citação/Intimação com a finalidade de convocar a parte para comparecer à Audiência de tentativa de Conciliação. Se nesta as partes quiserem fazer acordo, este é homologado através de uma Sentença e se resolve o processo. Se não fizerem acordo, segue o processo para a instrução processual, em que existirá a colheita das provas e, depois, uma Sentença que o (a) Juiz (a) decidirá o processo, ou seja, manifestará quem tem razão e determinará como resolver o litígio.

4º - Após a Sentença, se a (s) parte (s) não concordar (em), esta (s) recorre (m) para o Tribunal que é composto por Desembargadores (Juízes (as) de hierarquia superior) que poderão reformar totalmente ou em parte a Sentença ou mantêm-la.

3 – “Para que a audiência de Conciliação? Eu NÃO QUERO voltar a MORAR COM ELE (A)! Isto é impossível!”

Confusão geral.

A primeiro momento, a parte entende que a Audiência é para a reconciliação conjugal. Isto é muito difícil de ocorrer, mas não é impossível. Contudo, na prática, o intuito da lei é estimular a formalização de um acordo para resolver o processo no mais breve lapso de tempo, em que ambas as partes renunciam alguns pedidos, partes dos pedidos, modificam ou acrescentam direitos e obrigações, ou seja, conseguem ajustar os pontos comuns, as vontades comuns. Detalhe: ninguém é obrigado a fazer acordo ou conciliar.

4 – “O meu processo não anda, mas o da minha amiga”...

Acrescentando o que foi dito no ítem de n.2, quando todo e qualquer processo é distribuído em uma comarca que existe mais uma Vara de Família ou Cível, esse é sorteado para uma delas. Após o sorteio para determinada Vara, o processo pode ser distribuído entre o Juiz (a) titular ou o (a) substituto (a) da Vara. Cada Vara de Família ou Cível tem um cartório em que vários (as) serventuários (as) movimentam os processos. Tem processo que foi formalizado fisicamente e, depois, foi digitalizado, passou para o meio eletrônico/virtual. A depender da Comarca, tem Promotor (a) que exerce as suas funções em 2, 3 varas, ou seja, em muitas situações, a movimentação processual depende, também, do exercício daquele que tem um número excessivo de processos para emitir pareceres, manifestações. Ademais, existe a atuação dos peritos, oficiais de justiça, interposição de recursos judiciais, incidentes etc. Portanto, são inúmeros os fatores que influenciam a tramitação do processo, salientando que é impossível relatar todos.

5 – “Ele não quer visitar o (a) filho (a). O que fazer?”

O Amor não pode ser imposto. O Amor é um sentimento único que cada um manifesta da forma que sabe, ou seja, quando tem Amor, doa este com o seu jeito pessoal, sem querer nada de volta. O Direito não pode impor o Amor. O Direito pode garantir alguns meios que proporcionam o contato entre os filhos (as), pais e mães: guarda compartilhada, direito de visitas.

6 – “Os (as) meus (minhas) filhos (as) precisa (m) saber ou não?”

Se não contar para os (as) filhos (as), outros contarão e, algumas vezes, estes últimos, alteram a verdade dos fatos, em face do motivos pessoais de cada um.

Acredito que é melhor falar para os descendentes do que estes saberem primeiro através de terceiros.

Se resolver informar a existência do Divórcio ou Dissolução da União Estável, não precisar expor os detalhes, as motivações emocionais ou jurídicas do processo.

Se você fosse o (a) filho (a) do casal, gostaria de ser o último a saber através de terceiros?

7 – “Como será a minha vida depois do Divórcio ou Dissolução da União Estável?”

A tendência é a melhoria da qualidade de vida. Se um não quer ou os dois não querem ficar juntos, por que a eternização de um relacionamento emocionalmente falido?

Somente a parte pode responder aquela pergunta com exatidão, visto que a mesma será o destinatário final do processo.

O (a) Advogado (a) não substitui a parte, portanto apenas a representa perante o Poder Judiciário.

Ademais, se a pessoa quer, realmente, mudanças; antes, tem que se definir e, depois, ter a iniciativa de procurar um Advogado e promover o processo.

Portanto, estimado (a) leitor (a), se tem indagações, pergunte, se foi questionado (a), responda, visto que, quando aquelas são saneadas, o processo é compreendido e, com a consequente divulgação do conhecimento, o relacionamento entre o (a) Advogado e o (a) Cliente é aprimorado.

Alan Dias – Advogado em Salvador - Bahia - alandiasadv@gmail.com
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O imóvel responde pelas dívidas de quem possui o seu registro – o proprietário

Publicado por Fiama Souza

Imagem da internet

Em transações imobiliárias é comum se deparar com situações em que o comprador questiona o vendedor se ele possui ou não a escritura de aquisição do imóvel, como se fosse essa a prova cabal da propriedade. O que muita gente não sabe é que a escritura pública, enquanto não registrada, não comprova a efetiva transferência da propriedade. Ao menos, não perante terceiros.

Um dos desdobramentos da máxima “quem não registra não é dono” diz respeito ao fato de que se a escritura pública não estiver registrada no Cartório de Registro de Imóveis competente, a transferência da propriedade não ocorreu efetivamente.

Dessa forma, o imóvel responderá pelas dívidas de seus proprietários, ou seja, responderá pelas dívidas de quem possui o seu registro. Como forma de melhor elucidar essa situação, vejamos o exemplo: se o comprador não registrar a escritura pública, o vendedor continua a ser o proprietário, então, os credores do vendedor poderão pedir que o imóvel seja penhorado e leiloado para pagamento das dívidas.

Outro fato importante, poderá o vendedor do imóvel, que é ainda o proprietário, vender novamente o bem para outra pessoa, outorgando a ela outra escritura de compra e venda. O registro do título no cartório imobiliário é ato, portanto, constitutivo do direito de propriedade.

Dessa forma, tem-se que o registro que dará a segurança jurídica. Bastante comum é a crença de pessoas que pensam serem “proprietárias” de um imóvel apenas porque pagaram ao proprietário determinada quantia e dele receberam algum tipo de recibo, instrumento particular ou contrato. Na verdade, essas pessoas possuem um direito (obrigacional) contra o proprietário, pois pagaram o preço, mas não possuem um direito de propriedade sobre o imóvel.

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Proibição dos cartórios de lavrarem escritura de união poliafetva


Conhecidas como uniões poliafetivas, os relacionamentos entre mais de duas pessoas não poderão ser reconhecidos como uniões estáveis nos cartórios de todo o país. A decisão saiu nesta terça-feira (26/06), durante a 48ª sessão extraordinária doConselho Nacional de Justiça (CNJ) pela procedência do pedido – ou seja, pela proibição dos cartórios de lavrarem este tipo de escritura.


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terça-feira, 26 de junho de 2018

Apontamentos sobre a pessoa jurídica como titular da posse

Nathália Mendes

O ordenamento jurídico português segue a mesma linha do brasileiro no que se refere à possibilidade da pessoa jurídica ser titular da posse e ao tratamento da posse como matéria complexa que não encerra o seu estudo pela leitura dos dispositivos legais.

terça-feira, 26 de junho de 2018

Como se sabe, o ordenamento jurídico brasileiro admite a pessoa jurídica como titular da posse. Tal assertiva não gera qualquer dúvida ou controvérsia.

A posse é um direito que é garantido à pessoa jurídica e que é visível no seu dia a dia pelo exercício de alguns dos direitos inerentes à propriedade. Qualquer entendimento diverso desse seria desarrazoado e inviável ao exercício da própria atividade social.

Nesse sentido, o Código Civil respalda essa assertiva no seu I do artigo 1.2051, que permite a aquisição pela pessoa individual e pela pessoa jurídica,2 bem como por "(...) entes despersonalizados: espólio, massa falida e coletividade de possuidores (...)", conforme assinala Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald.3

Contudo, apesar da redação simplista e ampla do Código Civil, nota-se que essa é resultado de estudos complexos sobre a posse.

Assim, para compreender o direito de a pessoa jurídica ser titular da posse é necessário recorrer às teorias que justificam a sua existência. Dentre as diversas teorias existentes, a teoria da realidade técnica ou realidade que defende a concepção da pessoa jurídica como idêntica ao ser humano, excetuando-se o que é incompatível pela sua natureza é adotada pela doutrina majoritária.4

Logo, a pessoa jurídica tem direito de atuar como possuidora, tal como uma pessoa natural, uma vez que nas palavras de Wilson Melo da Silva: "Para tal doutrina, a pessoa jurídica existe de fato, no Direito não como ficção (como pretendia Savigny), não como realidade corporal, mas como realidade ideal, como necessidade."5

Mas se a pessoa jurídica não detém de corporalidade, como essa pode exercer tal direito, considerando o fato de que a posse é visível e é a exteriorização dos direitos de propriedade?

Isso ocorre, pois a posse é exercida pelos representantes da pessoa jurídica, que por sua vez, executam a decisões tomadas pelos seus órgãos deliberativos, formados pela coletividade de pessoas.6 Tais decisões expressam a vontade da pessoa jurídica, conforme é elucidado por Paulo Lôbo:

O titular de órgão da pessoa jurídica (gerente, administrador, dirigente e gestor) não é detentor. No exercício de suas atribuições, seus atos não seus, mas da própria pessoa jurídica, que é a possuidora. Os órgãos não representam, mas sim apresentam a pessoa jurídica.7

É interessante observar que essa reflexão também é feita Direito Português, conforme esclarece Manuel Rodrigues e Fernando Luso Soares: "(...) nunca se pos em dúvida que as pessoas jurídicas pudessem adquirir a posse por intermédio dos seus órgãos e prepostos."8

Contudo, o Código Civil Português surpreende por não dispor expressamente a capacidade de pessoa jurídica adquirir a posse, apesar da matéria não gerar discussão.

Nota-se que, por opção legislativa, o artigo 1226 do seu Código optou por reproduzir o texto do Código Civil Português de 1867 e que esse, na verdade, não disciplinou exaustivamente os sujeitos capazes de adquirir a posse, conforme transcrito abaixo:

Art. 1266. (Capacidade para adquirir a posse). Podem adquirir posse todos os que têm o uso da razão, e ainda os que não têm, relativamente às coisas susceptíveis de ocupação.

De todo modo, o ordenamento jurídico português segue a mesma linha do brasileiro no que se refere à possibilidade da pessoa jurídica ser titular da posse e ao tratamento da posse como matéria complexa que não encerra o seu estudo pela leitura dos dispositivos legais.
____________

1 BRASIL. Congresso Nacional. Código Civil. Brasília. 10.01.2002. "Art. 1.205. A posse pode ser adquirida: I - pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante; II - por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação."

2 Nesse mesmo sentido dispõe Francisco Eduardo Loureiro: "Podem adquirir a posse, segundo o inciso do I do artigo em exame, a própria pessoa que a pretende, ou o seu representante. No caso da própria pessoa, podem adquirir tanto a pessoa natural como a pessoa jurídica, esta mediante atuação de seus órgãos". LOUREIRO, Francisco Eduardo. PELUSO, Antônio Cezar (org). Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. 11ª Ed. São Paulo: Manole, 2017, p. 1.095.

3 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: volume 5: direitos reais. 10ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014 p.140.

4 SILVA, Wilson Melo da. Pessoas jurídicas. Belo Horizonte: Revista da Faculdade de Direito da UFMG, 1966, p.98.

5 SILVA, Wilson Melo da. Pessoas jurídicas. Belo Horizonte: Revista da Faculdade de Direito da UFMG, 1966, p.96.

6 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições do Direto Civil. Introdução ao direito civil; teoria geral de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.310, 312, 313 e 314.

7 LÔBO, Paulo. Direito Civil das coisas. São Paulo: Saraiva, 2015, p.56.

8 RODRIGUES, Manuel; SOARES, Fernando Luso. A posse: estudo de direito civil português. Coimbra: Almedina, 1996, p.191.
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AZEVEDO, Antônio Junqueira de; CARVALHOSA, Modesto. Comentários ao Código Civil: parte especial: do direito de empresa. São Paulo: Saraiva, 2005.

BESSONE, Darcy. Direitos reais. São Paulo: Saraiva, 1988.

CORDEIRO, António Menezes. A posse: perspectivas dogmáticas actuais, 3ª Ed. Coimbra: Almedina, 2005.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: volume 5: direitos reais. 10ª Ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

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PELUSO, Antônio Cezar (org.). Código Civil Comentado: doutrina e jurisprudência. 11ª Ed. São Paulo: Manole, 2017.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições do Direto Civil. Introdução ao direito civil; teoria geral de direito civil. Rio de Janeiro: Forense, 2007.

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RODRIGUES, Manuel; SOARES, Fernando Luso. A posse: estudo de direito civil português. Coimbra: Almedina, 1996.

SILVA, Wilson Melo da. Pessoas jurídicas. Belo Horizonte: Revista da Faculdade de Direito da UFMG, 1966.

BRASIL. Lei 10.406, de 17 de dezembro de 1908. Disponível em <Clique aqui>. Acesso em: 22.11.17.

PORTUGAL. Decreto-Lei 47 344, de 25 de novembro de 1966. Disponível em: <Clique aqui>. Acesso em: 20.11.2017.
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*Nathália Mendes é advogada do escritório Chenut Oliveira Santiago Advogados.

http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI282446,101048-Apontamentos+sobre+a+pessoa+juridica+como+titular+da+posse

Estado de SP deve indenizar por bullying sofrido em escola pública

Decisão é da 2ª câmara de Direito Público do TJ/SP.

terça-feira, 26 de junho de 2018

A 2ª câmara de Direito Público do TJ/SP condenou a Fazenda Pública do Estado de São Paulo a indenizar, por danos morais, uma menina – menor de idade – que sofreu bullying em uma escola estadual.

De acordo com os autos, a estudante, que apresenta leve deficiência mental e transtornos hipercinéticos, sofria preconceito dos colegas de classe, além de enfrentar diversas agressões físicas e psicológicas. O auge dos constrangimentos teria ocorrido quando outros alunos da classe fizeram um abaixo-assinado para que a estudante fosse transferida para outra sala, fazendo com que ela chorasse na ocasião. A ocorrência foi confirmada pelo professor que estava na sala de aula, o qual teria recolhido a lista feita pelos alunos.

Por causa das ocorrências, a mãe da estudante matriculou-a em outra escola e ingressou na Justiça contra o Estado, pleiteando indenização por danos morais. Em 1º grau, o pedido foi julgado procedente, e a Fazenda do Estado de SP recorreu da decisão.

Ao julgar recurso, o relator na 2ª câmara de Direito Público do TJ/SP, desembargador Alves Braga Junior, entendeu que houve falha do Poder Público, tendo em vista a ausência de medidas, por parte do estabelecimento escolar, em proteger e resguardar o direito à integridade física, moral e psicológica da estudante. "Durante o período de aula, é dever do Estado, por meio dos educadores e dirigentes, zelar pela integridade física, moral e psicológica dos alunos", pontuou.

O relator votou por negar provimento ao recurso e condenar o Estado ao pagamento de R$ 8 mil de indenização por danos morais à mãe da estudante. O voto foi seguido à unanimidade pelos desembargadores que compõem a 2ª câmara de Direito Público do TJ/SP.

O número do processo não será divulgado em razão de segredo de Justiça.

Informações: TJ/SP.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282529,11049-Estado+de+SP+deve+indenizar+por+bullying+sofrido+em+escola+publica

Professora será indenizada por perder chance de obter novo emprego

A 3ª turma do TRT da 11ª região entendeu que a dispensa ocorreu fora do período de contratações, prejudicando oportunidade de novo emprego.

terça-feira, 26 de junho de 2018

Uma professora universitária que foi dispensada após o início do semestre será indenizada por danos materiais. Decisão é da 3ª turma do TRT da 11ª região, que negou provimento ao recurso interposto por faculdade e considerou que a dispensa fora da época de contratações prejudicou as chances da trabalhadora de obter um novo emprego.

Consta nos autos que a professora foi dispensada no mês de setembro após voltar de férias nos meses de julho e agosto, uma das quais foi concedida antes do período concessivo. Em razão da dispensa um mês após o início do semestre letivo, a professora ingressou na Justiça contra a faculdade, requerendo, entre outros pedidos, a condenação da instituição ao pagamento de indenização por danos materiais.

Em 1º grau, o juízo condenou a faculdade a pagar à professora o equivalente ao valor dos salários de outubro a dezembro - meses que faltaram para a conclusão do semestre, totalizando cerca de R$ 29,5 mil. Contra a decisão, a faculdade interpôs recurso no TRT da 11ª região.

Ao analisar o caso, a relatora do recurso na 3ª turma, desembargadora Ormy da Conceição Dias Bentes, entendeu que a dispensa um mês após o início do semestre letivo, por si só, não implica em prática de ato ilícito, "uma vez que a autora não detinha nenhuma garantia de emprego e não há sequer alegação de que decorreu de ato discriminatório".

No entanto, a relatora pontuou que, no caso, há peculiaridades, e que restou provada a legítima expectativa da autora em manter a continuidade do contrato de trabalho. Para a magistrada, a concessão de férias à trabalhadora fora do período concessivo, confessa a intenção da faculdade de prejudicar a professora.

Em razão disso, a relatora negou provimento ao recurso da instituição de ensino, mantendo condenação dada em 1º grau. A decisão foi seguida à unanimidade pela 3ª turma do TRT da 11ª região.

Outras condenações

Além da condenação decorrente da dispensa fora de época, a faculdade ainda foi condenada, em R$ 10 mil, por danos morais por causa de atrasos no pagamento de salários à docente. A 3ª turma do TRT da 11ª região ainda condenou a instituição ao pagamento de multa por litigância de má-fé por entender que a faculdade faltou com verdade em sua defesa.
Processo: 0001954-57.2017.5.11.0001

Confira a íntegra do acórdão.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282520,101048-Professora+sera+indenizada+por+perder+chance+de+obter+novo+emprego

Namoro sem intuito de constituir família não configura união estável

A 1ª câmara Cível do TJ/PB reformou sentença que havia reconhecido relacionamento entre as partes como união estável.

sábado, 23 de junho de 2018

A 1ª câmara Cível do TJ/PB reformou sentença que havia reconhecido como união estável post mortem um namoro entre mulher e homem já falecido. Para a 1ª câmara, não se confirma a assertiva de que as partes mantinham relacionamento afetivo com convivência contínua, pública e duradoura e com o inafastável objetivo de constituir família.

A companheira do homem ajuizou ação pedindo o reconhecimento e dissolução de união estável post mortem alegando que teve uma relação contínua e duradoura por cerca de cinco anos. O juízo de 1º grau reconheceu e dissolveu a união estável.

Diante da sentença, a ex-esposa do homem e mais algumas pessoas da família apelaram da decisão sob o argumento de que a mulher não era considerada companheira do falecido e que, no máximo, manteve um namoro em um curto espaço de tempo. Alegaram que a mulher nunca foi apresentada à família e aos amigos como companheira e, sim como namorada.

Ao analisar o caso, o desembargador Leandro dos Santos, relator, deu razão à família. Para ele, o relacionamento da mulher com o falecido não cumpriu os requisitos para sua declaração de união estável como notoriedade, durabilidade/continuidade, unicidade e o objetivo de constituição de família.

O magistrado observou o depoimento das testemunhas e concluiu que o relacionamento mantido entre as partes, apesar de ser público, não passava de namoro.

"Assim sendo, a prova colhida não revela a alegada união estável, pois essa relação, que não teve as características que a Demandante pretende emprestar, foi seguramente um relacionamento afetivo, mas não se revestiu das características de entidade familiar, daí o desacerto da Sentença recorrida."

Assim, a 1ª câmara, por unanimidade, julgou improcedente o pedido inicial de reconhecimento e dissolução de união estável entre a autora e o falecido.
Processo: 0811694-77.2016.8.15.0001

Confira a íntegra do acórdão.

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI282112,61044-Namoro+sem+intuito+de+constituir+familia+nao+configura+uniao+estavel

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