segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Quando a Lei Maria da Penha é uma forma de alienação parental

Por  e 
Quando falamos de abuso intrafamiliar contra menor, seja ele de que tipo for, trazemos à baila nossas piores sensações e nossos mais terríveis sentimentos. Não se pode imaginar que aquele que tem o dever de cuidar, amar e educar uma criança seja capaz de causar-lhe qualquer tipo de dano.
Os preconceitos nos fazem acreditar que ninguém seria capaz de submeter a criança a mentiras que ocasionem a distorção da realidade e a criação de falsas memórias como forma de vingança.
No entanto, o que se verifica na prática é que algumas pessoas, seja após o fim da relação, ou em situações que sequer havia uma relação afetiva, como são as gravidezes circunstanciais ou inesperadas, não conseguem separar os conceitos de conjugalidade e parentalidade, utilizando os filhos comuns como objeto de vingança para atingir o outro.
Com a promulgação da Lei da Alienação Parental (Lei 12.318/2010) e uma maior conscientização dos juízes de família das práticas utilizadas por um dos genitores para denegrir a imagem do outro e afastá-lo do convívio com o filho, os mal-intencionados passaram a fazer uso de uma arma muito mais grave e poderosa, as imputações criminosas perante a Justiça criminal, na qual deve ser incluída a fase policial, que começa com a investigação criminal no seio da Polícia Judiciária.
Uma das formas de se conseguir de imediato um afastamento, sem grandes questionamentos e, na maioria das vezes, sem qualquer prova concreta, é a acusação baseada na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), que pretende combater a violência doméstica e familiar contra a mulher, por sua vez, fruto de relatório elaborado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, recomendando sua elaboração, diante da violência sistêmica contra o gênero feminino.
O mau uso da supracitada lei vem sendo percebido de forma crescente quando mães, em 73% dos casos que ocorrem alienação parental[1], com a intenção de afastar os pais de seus filhos, registram ocorrências afirmando terem sido ameaçadas ou ofendidas pelos ex-companheiros afetivos ou parceiros esporádicos, para terem o que não conseguiriam pela via das Varas de Família ou dissimuladamente sob alegação de proteção ao filho, em flagrante exercício abusivo de seu poder familiar, tolhendo o pleno exercício do poder familiar do pai, violando o artigo 1.634 do CC, introduzido pela Lei 13.058/14, conhecida como Lei da Guarda Compartilhada.
A concessão das medidas protetivas com cláusula de barreira é praticamente imediata, sendo certo que na quase totalidade das vezes a determinação é de impedimento de contato por qualquer meio de comunicação com a suposta vítima (mãe) e com seus familiares. Pensando na segurança da suposta vítima, nem sempre a autoridade responsável assegura e resguarda o direito de convivência da prole com o genitor afastado.
A utilização dessa medida como forma de afastamento parental se dá de forma bastante simples: na dúvida, proteja-se a vítima e afaste-a do “pretenso abusador”.
E assim se inicia a prática de atos de alienação parental em sua forma mais cruel: as falsas acusações.
E quem são as vítimas? Quando qualquer forma de abuso contra a criança ocorre, temos UMA vítima que deve ser protegida de forma integral, pelo núcleo familiar, pelo Judiciário e pelo Estado.
Mas temos que lembrar também que, no caso da existência de uma falsa acusação, temos ao menos DUAS vítimas: o menor, que é privado da convivência com aquele que é falsamente acusado da prática de ato criminoso que o coloque em risco, e o genitor, que, por causa da falsa acusação, é brutalmente afastado do filho e enfrenta as agruras de um procedimento criminal (e vários outros processos) para fazer prova de algo que não ocorreu.
Exemplificaremos com um caso concreto como situações banais podem transformar em um desastre o relacionamento entre pais e filhos por causa de atos de alienação.
O filho foi matriculado em um colégio pela primeira vez e, dentre as diversas atividades escolares, foi solicitado a um dos genitores, que residia com a criança, a foto da família, para que fosse desenvolvido tarefas de reconhecimento dos membros familiares.
Não obstante a criança ter pai e mãe, os mesmos nunca tiveram um relacionamento afetivo, consequentemente possuíam famílias que sequer se conheciam, situação semelhante à de crianças de pais que se separaram, sejam porque estavam em regime de casamento, companheirismo ou mesmo namorados.
Evidentemente que o colégio está acostumado a lidar com situações como essas, haja vista que o número de filhos de pais que não convivem é comum na sociedade hodierna.
No caso, um dos genitores solicitou ao outro que, se possível, fizessem uma fotografia com o filho entre os dois, já que não possuíam nenhuma foto de pai, mãe e filho para ser apresentada na atividade escolar.
Como os pais dessa criança nunca tiveram laços afetivos, entendeu um dos genitores que o ideal seria a foto da família paterna com a criança e seu genitor, dela com os avós, a madrasta, tios, primos e seus irmãos, e do lado materno os mesmos registros, para que a atividade fosse desenvolvida no sentido de que a criança possuía uma família de pais que não conviviam, porém, não deixariam de ser sua família porque moravam em lugares diferentes, e que o amor familiar haveria, independentemente da configuração familiar existente.
A partir daí um dos genitores informou ao genitor que se ele não permitisse ser fotografado com ela e a criança em um mesmo registro fotográfico iria enviar ao colégio fotos somente dela com o padrasto, para que ficasse configurado que o núcleo familiar da criança seria somente o que ela possui com a genitora, tendo sido retrucado pelo outro que se isso acontecesse tomaria as providências necessária para comunicar as autoridades competentes o que estava ocorrendo, e prometeu processar o genitor “por alienação parental”.
A genitora, em resposta revanchista ao genitor, por não atender sua imposição de registro fotográfico da forma que imaginara, se dirigiu a Delegacia de Atendimento à Mulher e comunicou que estava sendo ameaçada pelo genitor sob o argumento de que o mesmo iria atacá-la após desentendimento por telefone, bem como teria sido ofendida com palavras de baixo calão.
Neste momento percebemos as fraturas de nosso sistema e o quanto existem profissionais despreparados para lidar com essas situações para agir com cautela.
A genitora faz o registro, informa que pode provar tudo por e-mail, porém esse documento não é juntado, e com base nessa alegação procura o plantão judiciário, que lhe concede medida protetiva para que o genitor não possa entrar em contato com a mesma ou seus familiares, além do genitor se manter distante por 500 metros. O Ministério Público, que opinou a favor da medida, sequer requisitou o documento, ainda que após o deferimento da medida, para que restasse demonstrada a materialidade da ameaça, já que teria sido feita por escrito.
Com a decisão, o pai sequer poderia visitar a criança no colégio, tendo em vista que o mesmo se situava à 100 metros de sua residência.
A Lei da Alienação Parental não prevê crime pela prática dessa conduta, mas prevê um rol exemplificativo no artigo 2º, parágrafo único da Lei 12.318/10, nas quais se adéqua perfeitamente falsas imputações ao genitor.
Os atos de alienação parental que implicam em falsas imputações que por si só podem ser ilícitos penais têm preferência o alienador em narrar fatos falaciosos que engendrem crime de ameaça, constrangimento ilegal, injúria, difamação, calúnia, denunciação caluniosa, falsa comunicação de crime, entrega arbitrária, sonegação de incapazes e subtração de incapazes.
No caso concreto, por exemplo, poderia ser considerado crime de constrangimento ilegal a promessa de que, se o genitor não se permitisse fotografar, o outro apresentaria uma foto com o padrasto e não do pai?
Em primeiro lugar ninguém é obrigado a realizar registro fotográfico. Em segundo, não temos dúvidas de que a exclusão da figura paterna em uma atividade escolar de apresentação da família seja um mal à criança, mas poderia ser considerada uma grave ameaça para efeitos de configuração dessa elementar normativa?
A grave ameaça significa violência moral ou uma intimidação que possa causar temor ou medo capaz de anular a liberdade de escolha do genitor. Essa intimidação consiste em uma promessa de um mal atual ou futuro e determinado.
Assevera Bittencourt[2] diz que o “a injustiça do mal não se encerra em si mesma”, como ocorre no crime de ameaça. E prossegue: “Mas deverá relacionar-se ao fim pretendido e à forma de consegui-lo. O mal pode ser justo, mas o fundamento que leva o agente a prometê-lo ou o método utilizado podem não sê-los”.
Na alegação em sede policial para restar configurado o crime de ameaça, é necessária a constatação da promessa de um mal injusto e grave e, neste jaez, a promessa de que irá adotar as providências judiciais ou processar alguém não configura um mal injusto, e sim, dependendo da perspectiva, um mal justo ao alienador.
Assim, fica bem configurado o de constrangimento ilegal e não de ameaça como muitos poderiam pensar.
Para alguns autores, também seria ameaça a promessa de mal atual ou futuro, no entanto, a grave ameaça que consta como elemento normativo do tipo do artigo 146 do CP (constrangimento ilegal) deve estar presente o especial fim de agir ou, como denomina Zaffaroni, de elemento subjetivo do tipo distinto do dolo, para que a vítima, especificamente, faça algo que a lei não manda, ou deixe de fazer o que a lei manda, no caso, registro fotográfico ao lado da genitora.
Nesse sentido, leciona Greco[3] ao distinguir o crime de ameaça com o de constrangimento ilegal:
“Contudo, devemos ter cuidado no que diz respeito a ameaça condicional, quando a realização do mal prometido depender da pratica de algum comportamento - positivo ou negativo - da vítima, uma vez que poderá se configurar, nessa hipótese, no delito de constrangimento ilegal, sendo a ameaça, nesse caso, considerada tão somente um elemento que integra aquela figura típica. Assim, por exemplo, se o agente disser à vítima: ‘Se voltar amanhã a escola eu acabo com você!’, não estará praticando o delito de ameaça, mas, sim, o de constrangimento ilegal, pois estará, por meio da ameaça, constrangendo a vítima a não fazer o que a lei permite, isto e, de estudar normalmente no local onde se encontra regularmente matriculada”.
As questões penais relacionadas ao fato de ter o alienador inventado fatos que deram ensejo à instauração de inquérito por ameaça e injúria não ficam impune, pois caracterizam o crime de denunciação caluniosa prevista no artigo 339 do Código Penal, que consiste em “dar causa à instauração de investigação policial, (....) contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”, na qual prevê uma pena elevada de reclusão de 2 a 8 anos.
Quando o alienador narra falsamente fato definido como crime a alguém sabendo ser inocente, não seria crime de calúnia previsto no artigo 138 do Código Penal? A distinção entre este e a denunciação caluniosa reside no princípio da especialidade, e seu principal viés divisório é a ofensa ao bem jurídico tutelado, cujo entendimento doutrinário define prevalecer a violação à administração da Justiça, quando a narrativa do fato criminoso a alguém que se sabe inocente dá ensejo à utilização dos instrumentos estatais de persecução, seja na via penal (por exemplo, inquérito policial), administrativa (processo administrativo disciplinar) ou civil (inquérito civil).
E qual seria a distinção entre dar ensejo a procedimento criminal sabendo o alienador ser o fato uma mentira ao crime de falsa comunicação de crime ou contravenção previsto no artigo 340 do CP?
Enquanto a movimentação dos instrumentos de Justiça ocorre para a persecução de uma pessoa, que o alienador sabe inocente, na falsa comunicação de crime narra fato descrito como um ilícito penal que se sabe inexistente. No primeiro, a mentira diz respeito a alguém determinado, e no segundo a mentira diz respeito ao fato, sem relacioná-lo a determinada pessoa.
Uma outra forma muito comum de alienação é o artigo 2º, parágrafo único, I da Lei 12.318/10, que consiste em “realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da paternidade ou maternidade” por meio das redes sociais, atingindo a honra do mesmo. Sem esquecer que determinadas postagens, dependendo do aplicativo utilizado, poderão ser localizadas por qualquer motor de busca, e o filho, ao ler, poderá ter contato com as adjetivações negativas que um genitor propala em relação ao outro, podendo acarretar sentimento de culpa na criança e, consequentemente, uma série de danos psicológicos inimagináveis a ela.
Nesse caso, a conduta poderá dar ensejo aos crimes contra a honra, como a calúnia, difamação ou injúria. Na calúnia (138, CP), quando a campanha implicar em narrar fato definido como crime, imputando-o falsamente ao genitor, sabendo não ser este o autor ou pelo fato inexistir, como, por exemplo, informar que todas as vezes que a criança sai com o genitor uma peça de roupa é furtada.
A difamação (139, CP) também é a narrativa de um fato, no entanto, não criminoso, como, por exemplo, divulgar em redes sociais que a criança quando volta dos cuidados do genitor esteja suja e sem alimentação. Neste caso, não importa se o fato seja falso ou verdadeiro, pois o legislador quis foi evitar que a reputação da pessoa fosse atingida com narrativa de fatos inadequados à honra do mesmo, primando pela privacidade da relação de parentalidade.
Já na injúria não é necessário narrativa de um fato, mas a simples adjetivação negativa ou pejorativa às qualidades morais do genitor, como, por exemplo, “pai desnaturado” ou “mãe descuidada”.
No caso concreto, os pais não possuíam contato que não fosse por telefone para avisar que estava indo buscar a criança para seu convívio. A decisão precipitada de afastamento somente produziu efeitos para qualificar o injusto distanciamento do genitor com seu filho.
Como se pode observar é extenso o elenco de condutas delituosas praticadas por um genitor com o profícuo propósito de fazer campanha desqualificadora, dificultar ou até mesmo impedir o exercício da parentalidade, e em se tratando de alienador do gênero feminino, ocorre com muita frequência a utilização da Lei Maria da Penha para se buscar medidas de urgência, aproveitando-se da previsão legal da desnecessária notificação para oitiva do outro genitor, e com isso, o alienador utiliza a Justiça como instrumento da mais qualificada injustiça.


[1] ANDRADE, Mariana Cunha de e NOJIRI, Sergio. Alienação parental e o sistema de Justiça brasileiro: uma abordagem empírica. Revista de Estudos Empíricos em Direito Brazilian Journal of Empirical Legal Studies. vol. 3, n. 2, jul 2016, p. 190.
[2] BITTENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Vol. 2. 12ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 988.
[3] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal, parte especial, Vol II, 10ªed. Niterói: Impetus, p. 499
Alexandra Ullmann é advogada e psicóloga, sócia do escritório Ullmann e Advogados Associados.
Ruchester Marreiros Barbosa é delegado da Polícia Civil do Rio de Janeiro, doutorando em Direitos Humanos na Universidad Nacional de Lomas de Zamora (Argentina), professor de Processo Penal da Emerj, da graduação e pós-graduação de Direito Penal e Processual Penal da Universidade Estacio de Sá (RJ) e do curso CEI. Membro da International Association of Penal Law e da Law Enforcement Against Prohibiton.
Revista Consultor Jurídico, 24 de janeiro de 2018, 13h44
https://www.conjur.com.br/2018-jan-24/quando-lei-maria-penha-forma-alienacao-parental

Adoção "intuitu personae": É ilegal. Mas pode ser regularizada

Publicado por Dra Vanessa Perpetuo Simonassi

Adoção intuitu personae acontece quando a mãe biológica manifesta o interesse em entregar a criança a pessoa conhecida, sem que essa conste no Cadastro Nacional de Adoção. Trata-se a princípio de medida ilegal porque este ato é realizado sem passar pelos trâmites legais, por não atender à regra absoluta da habilitação prévia exigida pela Lei 8.069/90.

A adoção intuitu personae além de não ser permitida pela Lei 8.069/90, pode ainda configurar a prática do crime previsto no artigo 242 do código penal , com pena de reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, se houver o registro do filho adotado pelo casal adotante como se fosse filho biológico, caracterizando dessa forma, crime contra estado de filiação.

A regra é que todos aqueles que desejam adotar devem seguir os trâmites do procedimento de habilitação.

A Lei 8.069/90 estabelece de forma taxativa no art. 50 § 13 as únicas e exclusivas hipótese de adoção em que é dispensado o procedimento de habilitação. E não consta a possibilidade dos pais ou mãe biológica escolher a quem será entregue seu filho em adoção sem observar tal regramento.

Embora considerada ilegal, atualmente tendo em vista a aplicabilidade do princípio do melhor interesse da criança, norma basilar e norteadora de todo o sistema protecionista do menor, encontra-se diversas decisões judiciais excepcionando a regra legal, na hipótese de existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não tenha realizado o procedimento de habilitação e não constem do Cadastro Nacional de Adoção. Trata-se de uma excepcionalidade do sistema, que tem por primazia a valorização da afetividade, permitindo a regularização de uma adoção à princípio ilegal quando já comprovado a existência de forte vínculo afetivo consolidado entre adotante e adotado, e não havendo indícios de maus-tratos, negligência ou abuso. Nesse sentido: REsp. 837.324/RS, REsp. 1.172.067/MG, REsp. 1.328.389/MS.

Atualmente tramita Projeto de Lei 7.632/14 que visa alterar a Lei 8.069/90, dentre suas alterações a proposta visa, uniformizar e regulamentar os procedimentos de adoção intuitu personae. O Projeto prevê ainda prazo máximo de 360 dias para conclusão do procedimento de adoção.

https://vanessaperpetuosilva.jusbrasil.com.br/artigos/539121475/adocao-intuitu-personae-e-ilegal-mas-pode-ser-regularizada?utm_campaign=newsletter-daily_20180129_6595&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Plano de saúde NÃO pode negar tratamento prescrito por recomendação médica.

Laudo médico deve prevalecer sobre o rol de procedimentos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde.

Publicado por João Leandro

O Superior Tribunal de Justiça vem, de forma reiterada, decidindo de maneira favorável aos consumidores em assuntos relacionados à saúde.

Há uma nova tendência - que nada mais é do que a efetivação dos direitos enunciados na CRFB/88 -, de ressaltar os fatores benéficos ao consumidor nas demandas concernentes a sua saúde em detrimento do lucro inescrupuloso por parte das entidades que fornecem planos de saúde.

Essa efetivação dos direitos sociais, como a vida, a saúde e a dignidade humana, é demonstrada nas mais recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça - STJ, dispondo que "o médico ou o profissional habilitado - e não o plano de saúde - é quem estabelece, na busca da cura, a orientação terapêutica a ser dada ao usuário acometido de doença coberta."

Ademais, o mesmo tribunal assevera que nas situações em que houver recusa indevida ao tratamento prescrito pelo profissional habilitado, é notória, e deste modo, presumida, a ocorrência de dano moral, não se tratando de mero dissabor, porquanto nesses casos, a condição física e mental do paciente já se encontra bastante precarizada.

Deve-se deixar claro que a decisão não se refere à ampliação da cobertura de infortúnios contratados, mas sim na utilização de todos os métodos recomendados para o tratamento daquilo estritamente previsto no contrato.

Deste modo, você, consumidor, advogado e cidadão, faça valer seu direito à saúde, que é o pilar da vida próspera e da dignidade inerente à condição humana!
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REFERÊNCIAS
STJ, REsp 1645762 (ACÓRDÃO) Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA DJe 18/12/2017 Decisão: 12/12/2017

STJ, AgInt no REsp 1688812 (ACÓRDÃO) Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA DJe 19/12/2017 Decisão: 12/12/2017

STJ, AgInt no REsp 1385638 (ACÓRDÃO) Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO DJe 05/12/2017 Decisão: 28/11/2017
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https://joaoleandrolongo.jusbrasil.com.br/artigos/539210014/plano-de-saude-nao-pode-negar-tratamento-prescrito-por-recomendacao-medica?utm_campaign=newsletter-daily_20180129_6595&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Negativa dos planos de saúde para tratamento médico e a alta forçada

Publicado por Lorena Lucena Tôrres

Este é um artigo retirado de um caso concreto (real) para que vocês tenham uma melhor compreensão de seus direitos, principalmente na área da saúde, e, para que possam saber como proceder em face de abusos.

Desta forma, reuni alguns casos para trazer ao debate e para que vocês vejam na prática como as coisas acontecem. Esta ideia surgiu após uma procura de um cliente, que estava com o pai internado em estado grave, com cirrose hepática avançada e o hospital onde ele estava internado, juntamente com o médico que o acompanhava, estavam forçando a sua alta, para que o leito fosse desocupado.

Agradeço imensamente à minha querida amiga, parceira, Dra. Rafaela Dantas, que ao trazer o caso para trabalharmos juntas, me deu uma enorme ideia: escrever para vocês relatando o cotidiano de abusos no Direito à Saúde!

Pois é, pasmem, mas essa situação é mais corriqueira do que imaginamos. Por isso, fiquem atentos!

Dica prática 1

Internação por cirrose hepática, em estágio avançado, em rede hospitalar particular. Paciente traqueostomizado, sondado e dependendo de cuidados médicos específico. Durante a internação adquiriu uma bactéria, fez o tratamento com antibióticos, mas continuava necessitando de transplante com urgência.

Por já estar internado a alguns meses, o hospital conversou com a família para que o paciente fosse levado para casa, pois o internamento causava ainda mais problemas, como exposição à bactérias e perigo de nova infecção.

Todavia, o paciente necessitava de cuidados especiais, então, foi solicitado home-care, e o plano de saúde negou (https://lucenatorres.jusbrasil.com.br/artigos/538641934/negativa-de-assistência-médica-domiciliar-pelo-plano-de-saúde-ilegalidade). Então fica a indagação: como liberar um paciente de alto risco, que necessita de aspiração e troca de traqueóstomo, para ser tratado em casa, por pessoas leigas?

Após inúmeros embates, o hospital, juntamente com o médico que acompanhava o paciente (médico responsável), procederam com a alta e o paciente ficou internado de forma particular, ou seja, todos os gastos com a nutrição parenteral ficaram por conta da família, além dos gastos com fisioterapia, fonoaudióloga e todos os procedimentos necessários para a manutenção da vida do paciente.

O plano de saúde era da mesma linha do hospital (mesma rede)!

Assim, a representante legal do paciente (haja vista que o mesmo não tinha condições de decisões), nos procurou e ficou representando provisoriamente o esposo. Neste caso entramos com uma ação de obrigação de fazer, com pedido liminar de urgência, para que o plano de saúde arcasse com todas as despesas médicas, até a remoção do paciente.

Além disso, a remoção só aconteceria quando o hospital se comprometesse a encontrar um outro leito para o paciente, e fizesse a remoção do mesmo.

Ficam aqui alguns fundamentos legais para vocês entenderem o direito:

Ofensa ao art. , III da Constituição Federal, e arts. , I e III e , I do Código de Defesa do Consumidor.

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
I - a proteção da vida, saúde e segurança contra os riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços considerados perigosos ou nocivos;

Dicas dos documentos necessários para iniciar a ação:
1. Prontuário médico;
2. Declaração do médico que acompanha o paciente antes da internação, atestando o estado de saúde do mesmo - laudos;
3. Declaração de outros profissionais da saúde: fisioterapeutas, fonoaudiólogos, dentre outros que comprovem o estado do paciente - laudos;
4. Exames antigos e novos que possam demonstrar o estágio da doença;
5. O cartão do plano de saúde;
6. O último pagamento;
7. Documentos pessoais (RG, CPF, Comprovante de endereço atualizado);
8. Procuração: neste caso, se o paciente se encontra em condições que não possa assinar, será nomeado um representante. Isso deverá constar na petição e o vício deverá ser sanado após, ou com uma ação de interdição, ou, com a melhora do paciente e este apresentando nova procuração nos autos;
9. Dentre outros.

Por se tratar de relação obrigacional tutelada pela Lei nº. 8.078/90 (Súmula 469 do E. STJ), qualquer instrução ou interpretação restritiva à própria natureza do Contrato (assistência suplementar à saúde) é passível de anulação pelo Poder Judiciário. Ademais, além de alancear o Código de Defesa do Consumidor, a negativa de cobertura sustentada pela Ré desatende à própria legislação de regência dos planos de saúde, fundamentação que será abordada mais adiante.

Assim, para quem não sabe, esta relação é de consumo, onde irei agora trazer algumas informações importantes para vocês:

1. Da relação de consumo

O caso em tela decorre de uma relação de consumo firmada entre o beneficiário a Ré, por meio do contrato de plano de saúde. Para tais situações, inquestionável é a aplicação da Lei nº. 8.078/90, entendimento solidificado na Súmula 469 do Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 469, STJ - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidoraos contratos de plano de saúde.

Nesta senda, pertinente invocar os termos do artigo 51, inciso IV, § 1º, incisos II e III, do referido Diploma, que dão estribo à postulação do Promovente:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
[...];
IV – estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;
[...];
§ 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:
I – ofende os princípios fundamentais do sistema jurídico a que pertence;
II – restringe direitos ou obrigações fundamentais inerentes à natureza do contrato, de tal modo a ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual;
III – se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. Grifos nossos.

É hialino que o consumidor, ao contratar os serviços prestados pelo plano de saúde (operadora de saúde), possui a legítima expectativa de que lhe será provida integral assistência até o completo restabelecimento da sua saúde, sem que precise efetuar o pagamento de quantias extraordinárias.

Por fim, a esta família do primeiro caso só restou procurar guarida ao judiciário, necessitando contratar os serviços jurídicos do escritório, para que seu ente querido tivesse o tratamento adequado, além dos seus direitos resguardados.

Acompanhem o caso prático 2, onde irei trazer o problema de um paciente que necessitou realizar um procedimento e o plano de saúde não possuía profissional credenciado para o tratamento!
www.lucenatorresadv.com

https://lucenatorres.jusbrasil.com.br/artigos/539403767/negativa-dos-planos-de-saude-para-tratamento-medico-e-a-alta-forcada?utm_campaign=newsletter-daily_20180129_6595&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Legitimidade do MP para propor ação de exclusão do sucessor por indignidade

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Em tempos de pouco cuidado com as categorias jurídicas, em tempos em que se cativa a plateia por meio da principiologia, ainda que em afronta ao texto expresso de lei, em tempos em que o Supremo Tribunal Federal é aplaudido quando nega a aplicação da Constituição, em tempos em que o politicamente correto é a tônica no debate jurídico, que amordaça os docentes e empobrece o debate nas universidades, não recebi com surpresa a Lei 13.532, de 2017, que acresceu o parágrafo 2º ao artigo 1.815 do CC:
“§ 2º Na hipótese do inciso I do art. 1.814, o Ministério Público tem legitimidade para demandar a exclusão do herdeiro ou legatário”.
Do que se trata a questão? Uma breve digressão se faz necessária para explicar a alteração do Código Civil.
O sistema brasileiro, em matéria sucessória, vive um dilema criado por suas matrizes: o Direito romano e o Direito germânico. O Direito romano tomava por base a liberdade de testar em matéria patrimonial. Era a autonomia privada que norteava o sistema sucessório. A premissa romana era simples: se a pessoa amealhou seu patrimônio, cabe a ela e só a ela decidir o destino de seus bens. O Direito germânico, ao contrário, prestigiava a proteção da família, do grupo de pessoas que estava próximo ao testador, e, portanto, limitava a liberdade de testar. A existência da legítima, ou seja, de uma quota indisponível destinada aos herdeiros necessários ou legitimários é decorrência da tradição germânica.
O espírito de compromisso, nas palavras de Antonio Junqueira de Azevedo, pretende conciliar dois valores antagônicos: liberdade de testar (autonomia privada) e não liberdade de testar (intervenção do Estado para restringir a autonomia privada).
É da tradição luso-brasileira a existência da legítima em favor dos herdeiros necessários. Na vigência das Ordenações Filipinas, a legítima em favor de ascendentes e descendentes era de 2/3 dos bens do testador. Assim vejamos:
Livro IV - Título 91. “E falecendo filho ou filha com testamento (...) deve necessariamente deixar as duas partes de seus bens a seu pai ou sua mãe se os tiver e da terça parte poderá ordenar como lhe aprouver”.
“Livro IV - Título 92. E não havendo filhos legítimos herdarão os naturais todos os bens da herança de seu pai, salvo a terça parte, se o pai a tomar, da qual poderá dispor como lhe aprouver”.
No Brasil, a legítima, que sempre foi fixa, quer seja em favor de descendentes ou ascendentes, teve uma redução com a Lei Feliciano Penna em 1907[1]. O Código Civil de 1916 e o Código Civil de 2002 mantiveram a legítima em 50%, com uma diferença: houve um aumento do rol de herdeiros necessários, pois o artigo 1.845 do atual CC incluiu o cônjuge como herdeiro necessário.
De acordo com o espírito de compromisso, a sistemática germânica tem ganhado espaço, ou seja, a limitação à liberdade de testar tem prevalecido sobre a autonomia privada.
Pois bem. Se a legítima é a maior restrição à autonomia privada em matéria testamentária, a forma de privar o herdeiro necessário da legítima é a deserdação. O testador pode, desde que indicando uma das causas previstas nos artigos 1.814, 1.962 ou 1.963 do Código Civil, por testamento, afastar o herdeiro necessário da sucessão. Trata-se de numerus clausus, ou seja, não haverá deserdação se não nas hipóteses legais.
Mesmo ocorrendo a deserdação, por testamento, esta deve ser confirmada por ação a ser proposta pelos interessados após morte do testador[2].
Além da deserdação, da exclusão do herdeiro por vontade do testador, temos também a figura da indignidade. Ocorrendo uma das causas do artigo 1.814 do CC, podem os interessados, após a morte do testador, propor a ação de indignidade para afastar o herdeiro, necessário ou facultativo, da sucessão. Essa ação pode ser proposta no prazo de quatro anos contados da abertura da sucessão[3].
Note-se que indignidade e deserdação são formas de exclusão do herdeiro ou legatário da sucessão, quer seja por ação de indignidade, quer seja por deserdação posteriormente confirmada por ação.
Em conclusão, indignidade e deserdação abrandam, suavizam, a proteção dos herdeiros necessários e são decorrência da autonomia privada, aumentando a liberdade de testar.
Quem pode propor a ação de indignidade ou a ação confirmatória da deserdação? Apenas aqueles beneficiados pelo afastamento do indigno ou deserdado da sucessão. Exemplos simples ajudam a compreender a questão.
Sendo dois irmãos os herdeiros, se um for excluído da sucessão, o outro recebe toda herança. Assim, há interesse na exclusão da sucessão. Por outro lado, se o excluído da sucessão tiver filhos, o irmão não tem interesse na propositura da ação, pois os beneficiados são os filhos do indigno ou deserdado que herdam por representação.
Qual é o conceito de interessado em sentido jurídico? A ação conduz a um benefício: receber quinhão ou bem que o autor da ação não receberia ou aumentar a quota-parte do herdeiro ou legatário sobre certo bem ou quinhão.
Dessa nota óbvia percebe-se que o MP não pode nem poderia propor a ação em questão, pois estará defendendo direito patrimonial e disponível de terceiro. Frise-se: patrimonial e disponível de um particular.
Poucas notas indicarão que a legitimidade do MP é fruto exclusivamente do politicamente correto, de uma resposta ao caso Richthofen e da vontade sanguinária e punitiva que reina nos corações de parte dos brasileiros neste quarto do século XXI.
a) O direito à herança é puramente patrimonial. Não há qualquer razão para o MP se intrometer em matéria patrimonial em que não há interesse de incapaz nem cuida de mínimo existencial.
b) O direito à herança é disponível. Ninguém é obrigado a ser herdeiro. Não só é possível a renúncia abdicativa como também a equivocadamente chamada renúncia translativa ou in favorem.
Quais são as consequências disso? Se, contra a vontade do herdeiro beneficiado pelo reconhecimento da indignidade, o MP propuser a ação e esta for julgada procedente, basta ao beneficiado efetivar a doação ao indigno da quota que lhe foi retirada. Não há expressa vedação, o que indica que o legislador nunca imaginou que alguém, que não o beneficiado, poderia propor a demanda.
Ainda, se o MP propuser a ação, como aparentemente indica a lei, e o beneficiado pela indignidade se opuser expressamente, teremos uma situação esdrúxula: o MP poderia prosseguir com a demanda? A resposta por óbvio é negativa. Seu resultado seria inútil e não desejado.
Tratar o Direito Civil como o Direito Penal, dando-lhe caráter punitivo, revela desvio de função da categoria e desconhecimento do Direito Privado.
Alguns afirmam que se trata de uma questão de ética. O Direito Civil não pode e não resolverá os dilemas éticos da humanidade. É forma de regular as relações particulares e resolver as questões concretas.
Por fim, Ana Luiza Nevares indica (em mensagem ao autor) que o correto seria, nessa hipótese, que se reconhecendo a indignidade por meio de ação proposta pelo MP, contra a vontade do herdeiro ou legatário beneficiado, o quinhão fosse destinado a um fundo especial. A sugestão é de lege ferenda. Atualmente, isso não é possível.
Se o sistema reformado fosse coerente, deveria o MP ser legitimado também para propor a ação que confirma a deserdação. Nem isso o legislador fez.
Em suma: quais os efeitos da legitimidade do MP para propor a ação de indignidade?
a) O MP não poderá propor a ação se os beneficiados forem maiores e capazes. A ação só pode ser proposta se os beneficiários pela indignidade forem menores ou incapazes.
b) A ação proposta pelo MP será extinta se o herdeiro ou legatário se opuser a ela. Assim, proposta a ação, antes da citação do réu ou réus, caberá ao juiz intimar os demais herdeiros beneficiados. Se todos se opuserem, a ação é extinta de imediato por manifesta inutilidade.
c) Se houver propositura pelos herdeiros ou legatários beneficiados, o MP não participará da demanda a qualquer título.
Outras interpretações atendem ao desejo punitivo e sanguinário que sobeja em parte dos brasileiros. Contudo, juridicamente, o Direito Civil resta agredido pela mudança inútil e perigosa.


[1] Artigo 2º, Decreto 1.839 de 31 de dezembro de 1907.
[2] Art. 1.965. Ao herdeiro instituído, ou àquele a quem aproveite a deserdação, incumbe provar a veracidade da causa alegada pelo testador.
Parágrafo único. O direito de provar a causa da deserdação extingue-se no prazo de quatro anos, a contar da data da abertura do testamento.
[3] Redação original do parágrafo único do artigo 1.815 do CC (atual parágrafo primeiro): “O direito de demandar a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão”.
José Fernando Simão é advogado, diretor do conselho consultivo do IBDFAM e professor da Universidade de São Paulo e da Escola Paulista de Direito.
Revista Consultor Jurídico, 28 de janeiro de 2018, 8h05
https://www.conjur.com.br/2018-jan-28/processo-familiar-legitimidade-mp-acao-exclusao-sucessor-indignidade