sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

O caso Cristiane Brasil: Algumas perspectivas constitucionais

por Saul Tourinho Leal - sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

"No Direito Privado, o indivíduo pode se comportar com certo 'capricho', embora tal 'capricho' não seja o que deveria ser. Mas, no domínio do Direito Público - Direito Constitucional e Administrativo - o 'capricho' é uma doença terminal"1.

O trecho acima foi gravado na pedra da história de um povo que sabe como ninguém o que é história. Ele ilustrou a discussão travada, em 2003, na Suprema Corte de Israel, no caso "The Movement for Quality Government in Israel v. Attorney-General" (HCJ 7367/97). Tudo em Jerusalém.

Os fatos vêm a calhar. O Movimento por um Governo de Qualidade em Israel levou o Primeiro-Ministro Ariel Sharon à Suprema Corte. A razão? Uma controvertida escolha para o Ministério da Segurança Pública. Judicializou-se a indicação antes da posse do indicado ao cargo de Ministro.

Tzahi Hanebi havia sido apontado. Em 1982, jovem, ele foi condenado por se envolver numa confusão na universidade. Posteriormente, já uma figura pública, viu seu nome pululando em três investigações sem que tivesse sido condenado em nenhuma delas.

O Movimento entendia que Hanebi não poderia servir ao Governo, pois apesar de não ter sido condenado, todos os rumores que seu nome despertava estilhaçavam o cristal da confiança pública no Ministério, o que terminava gerando obstruções dos populares. Essas obstruções, somadas a toda a mídia que o indicado atraía e ao burburinho de que novas investigações poderiam surgir atrapalhavam a continuidade do serviço público prestado pelo Ministério e pareciam limitar a capacidade do próprio Hanebi de executar uma agenda com legitimidade.

O Justice Mishael Cheshin, autor do trecho que abre esta coluna, proferindo o seu voto, arrematou: "Aqueles que exercem autoridade em nome do Estado ou de qualquer outra autoridade pública - no nosso caso, o Primeiro-Ministro e o Ministro da Segurança Pública - devem estar conscientes de que suas questões não são suas. Trata-se de questões que dizem respeito a outros e eles são obrigados a conduzirem-se com justiça e integridade, em estrita conformidade com os princípios da administração pública"2. Cheshin ficou vencido ao lado de um colega.

A Suprema Corte de Israel concluiu não haver razão para impedir que Ariel Sharon empossasse Tzahi Hanebi no Ministério da Segurança Pública. Vetar a assunção ao posto sem que houvesse taxativa previsão a respeito ou, pelo menos, que o conjunto dos fatos indicasse evidências mais robustas, poderia se tornar um hábito caprichoso de juízes moralistas. Melhor não abrir essa Caixa de Pandora.

O julgamento ocorreu em 2003. Estamos em 2018. Até hoje Hanebi é Ministro de Estado. Está à frente, atualmente, da pasta de Cooperação Regional. Vida que segue.

Mas e quanto ao Brasil? Bem, o nosso país não vive o seu melhor momento. Nem o pior. Estamos numa fase de águas agitadas, ninguém sabendo muito bem o que delas vai sair. Políticos que ocupam cargos ilustres são hostilizados por populares em aeroportos, ruas, calçadas, corredores, bares, aviões..., em qualquer lugar. Nos olhos do povo vê-se revolta e um desejo de revanche. Muitos políticos estão em apuros.

Mesmo assim, o poder em Brasília segue soprando vento em direção ao fogo. Quanto mais vento sopra, mais o fogo sobe o morro. Fogo morro acima e água rio abaixo são fenômenos difíceis de conter. O ideal é pensar antes de agir. Pelo menos.

O último desses ventos foi a indicação da deputada federal Cristiane Brasil para o posto de Ministra do Trabalho. Conterrâneos da parlamentar se socorreram da instituição que a Constituição lhes entregou – o Poder Judiciário – para, se opondo à indicação, ter a chance de discuti-la publicamente. Uma ação popular3 ajuizada no Rio de Janeiro, seu estado, conseguiu a suspensão da posse da indicada4.

O presidente da República, na Praça dos Três Poderes, disse quem seria a Ministra. Advogados habituados a levar governantes aos Tribunais entendiam que a indicação não era constitucionalmente aceitável. O juiz, em Niterói, deu razão a eles.

A decisão gerou perplexidades, mas também forneceu a matéria-prima da qual qualquer República se alimenta: o debate público. Pode uma parlamentar condenada pelo Judiciário por desrespeitar direitos trabalhistas se tornar Ministra do Trabalho?

Sempre que chamado a analisar potencial violação da Constituição em razão da indicação, pelo Presidente, de um nome que se tornará Ministro de Estado, ou quando demandado a deliberar sobre as consequências de um comportamento desviante dessas autoridades, o STF antecipou que esse tipo de escrutínio judicial é excepcional. Isso não quer dizer que o Tribunal esteja impedido de conferir eficácia ao princípio constitucional da moralidade administrativa (art. 37, caput) diante de casos concretos.

Vamos puxar pela memória. No mandado de segurança 25.579 (Pleno, DJe 24/8/2007), o ministro Joaquim Barbosa, relator, anotou: "Na qualidade de guarda da Constituição, o STF tem a elevada responsabilidade de decidir acerca da juridicidade da ação dos demais Poderes do Estado. No exercício desse mister, deve a Corte ter sempre em perspectiva a regra de auto-contenção que lhe impede de invadir a esfera reservada à decisão política dos dois outros Poderes, bem como o dever de não se demitir do importantíssimo encargo que a Constituição lhe atribui de garantir o acesso à jurisdição de todos aqueles cujos direitos individuais tenham sido lesados ou se achem ameaçados de lesão".

No caso acima, a Corte definiu que o membro do Congresso que se licencia do mandato para investir-se no cargo de ministro de Estado não perde os laços com o Parlamento (art. 56, I), devendo seguir observando as vedações e incompatibilidades inerentes ao estatuto constitucional do congressista, assim como as exigências ético-jurídicas que a Constituição (art. 55, § 1º) e o que os regimentos internos das casas legislativas estabelecem como elementos caracterizadores do decoro parlamentar5.

Noutra oportunidade, a Corte definiu que "os ministros de Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; lei 1.079/1950), não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (lei 8.429/1992)". Somente o STF pode processar e julgar Ministro de Estado no caso de crime de responsabilidade e eventualmente determinar a perda do cargo ou a suspensão de direitos políticos. São incompetentes os juízos de primeira instância para processar e julgar ação civil de improbidade administrativa ajuizada contra agente político que possui prerrogativa de foro perante o STF, por crime de responsabilidade (art. 102, I, "c", da Constituição)6.

O status de ministro conferido a determinadas autoridades também chegou ao Supremo. Uma ação direta de inconstitucionalidade atacou a Medida Provisória 207/2004 (convertida na lei 11.036/2004), que alterou disposições das leis 10.683/2003 e 9.650/1998, equiparando o cargo de natureza especial de Presidente do Banco Central ao cargo de ministro de Estado, com a consequente prerrogativa de foro para o Presidente do BACEN7.

Falando em tese, o foro por prerrogativa de função aos Ministros de Estado (art. 102, I, 'c', da CF) às vezes pode virar um incentivo a mudanças casuísticas no desenho da Esplanada dos Ministérios. Se alguém que está à frente de uma pasta sem tal status sente os sussurros do sistema carcerário esquentando seus ouvidos, passa a ser sedutora a ideia de elevação do status da pasta, muitas vezes por medida provisória.

Recentemente, o PSOL impetrou o mandado de segurança 34.615 para questionar ato do Presidente da República que, por meio da medida provisória 768/2017, conferiu o status de Ministério à secretaria-geral da Presidência da República.

Alegando ilegalidade e desvio de finalidade, o Partido requereu a nulidade da nomeação, como forma de proteger o patrimônio público e a moralidade administrativa. No mandado de segurança 34.609, a Rede Sustentabilidade encampou a iniciativa.

O Supremo também precisou definir se a nomeação de um secretário de Estado irmão do Governador que o nomeou violaria a posição da Corte contra o nepotismo (Súmula Vinculante nº 13). Julgando a reclamação 6650 MC-AgR (Min. Ellen Gracie, Pleno, DJe 21/11/2008), a Corte afastou a aplicação da citada súmula.

Há pouco tempo, o mandado de segurança 34.070 (Min. Gilmar Mendes) questionou o ato de nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de ministro chefe da Casa Civil.

O relator, ministro Gilmar Mendes, anotou na decisão monocrática que proferiu: "Nenhum Chefe do Poder Executivo, em qualquer de suas esferas, é dono da condução dos destinos do país; na verdade, ostenta papel de simples mandatário da vontade popular, a qual deve ser seguida em consonância com os princípios constitucionais explícitos e implícitos, entre eles a probidade e a moralidade no trato do interesse público 'lato sensu'".

O racional acima esteve presente na decisão da Suprema Corte de Israel no caso "Women's Lobby v. The Minister of Labor and Welfare, (HCJ 2671/98)". Ficou registrado: "Ao agir no domínio do direito público, a autoridade investida do poder de nomeação opera na qualidade de administrador público. Assim como um administrador fiduciário não possui nada próprio, também a autoridade que nomeia não possui nada dela. Deve conduzir-se à maneira do administrador: agir com integridade e equidade, considerando apenas fatores relevantes, atuando com razoabilidade, igualdade e sem discriminação"8.

No caso brasileiro, o Ministro Gilmar Mendes anotou ainda: "O princípio da moralidade pauta qualquer ato administrativo, inclusive a nomeação de Ministro de Estado, de maneira a impedir que sejam conspurcados os predicados da honestidade, da probidade e da boa-fé no trato da 'res publica'". Então, arrematou: "o argumento do desvio de finalidade é perfeitamente aplicável para demonstrar a nulidade da nomeação de pessoa criminalmente implicada, quando prepondera a finalidade de conferir-lhe foro privilegiado".

Parece haver consenso quanto à figura do desvio de finalidade no Direito Administrativo. Todavia, a nomeação foi obstada por uma decisão monocrática (“one single judge”), o que não é o ideal do ponto de vista institucional. Por zelo com a autoridade da Suprema Corte, decisões dessa magnitude devem contar com espaço na pauta de um dos colegiados do Tribunal – Turmas ou Plenário.

À luz da Constituição de 1988, a Corte chegou a ordenar a exoneração de um Ministro de Estado. Dessa vez, pelo plenário. A decisão foi unânime.

Na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 388, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes (DJe 1º/8/2016), a Corte estabeleceu a interpretação de que membros do Ministério Público não podem ocupar cargos públicos fora do âmbito da instituição, salvo o de professor e funções de magistério (art. 128, § 5º, II, "d", da CF). Derrubou-se a resolução 72/2011 do Conselho Nacional do Ministério Público.

A ordem final foi: "Outrossim, determinada a exoneração dos ocupantes de cargos em desconformidade com a interpretação fixada, no prazo de até vinte dias após a publicação da ata deste julgamento". O então Ministro da Justiça caiu.

A exoneração de um Ministro de Estado pelo fato de a sua nomeação violar a Constituição encontra a companhia da Suprema Corte de Israel. No já citado "The Movement for Quality Government in Israel v. Attorney-General" (2003), o Justice Eliezer Rivlin, relator, registrou em seu voto-vencedor: "Tanto a decisão do Primeiro-Ministro de nomear uma pessoa e sua decisão de não exonerar um indicado ao seu gabinete estão sujeitas a padrões de razoabilidade, integridade, proporcionalidade, boa-fé e ausência de arbitrariedade ou discriminação"9.

No Brasil, o presidente da República está constitucionalmente vinculado aos princípios constitucionais da Administração Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (art. 37, caput). Segundo o art. 78, o presidente e o vice-presidente tomarão posse em sessão do Congresso, prestando o compromisso de "manter, defender e cumprir a Constituição", observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil. Não há governo fora da Constituição. Simplesmente não há.

Então, o chefe do Poder Executivo nomeia para o Ministério do Trabalho uma parlamentar que foi condenada pelo Poder Judiciário por ter desrespeitado direitos dos trabalhadores. A indicada é do Partido Trabalhista Brasileiro.

Agora será apreciada, pelo STF, a reclamação 29.508, de relatoria da Ministra Cármen Lúcia (DJe 1º/2/2018), que definirá o destino do Ministério. Para a Ministra, deliberando inicialmente sozinha, "é bem sabido que não compete ao Poder Judiciário o exame do mérito administrativo em respeito ao Princípio da separação dos Poderes. Este mandamento, no entanto, não é absoluto em seu conteúdo e deverá o juiz agir sempre que a conduta praticada for ilegal, mais grave ainda, inconstitucional, em se tratando de lesão a preceito constitucional autoaplicável".

O raciocínio repete a linha da excepcionalidade. Em 2016, a Suprema Corte de Israel apreciou o caso "Movement for Quality Government in Israel v. Prime Minister" (HCJ 232/16), no qual se questionava a indicação do membro do Knesset – Parlamento israelense –, Rabbi Aryeh Machlouf Deri, para o posto de Ministro do Interior. Deri havia sido condenado por corrupção na década de 1980, entre outras coisas.

O Justice Salim Joubran anotou: "a intervenção deste Tribunal, na discricionariedade das pessoas autorizadas a remover um Ministro ou Vice-Ministro do cargo, deve ser limitada às situações em que a gravidade da infração não pode ser conciliada com a continuidade do serviço público"10.Excepcionalidade mais uma vez.

A discussão é rica. O poder que chefes do Executivo têm hoje não é nem de longe o que um dia tiveram. Esses governantes cada vez mais sofrem controles variados e não podem usar a caneta que lhe demos para fazer estripulias por aí.

Moisés Naím, especialista no tema, chegou a ser peremptório: "O poder está em degradação". Para ele, "no século XXI, o poder é mais fácil de obter, mais difícil de utilizar e mais fácil de perder". Naím explica que os governantes estão cada vez mais com dificuldades de exercer o poder que sonhavam ter. Não são absolutos, nem jamais serão. As democracias têm requerido dos poderosos mais e mais tolerância com o controle diário de seus poderes. Sua derradeira frase é: "De Chicago a Milão e de Nova Délhi a Brasília, os chefes das máquinas políticas irão prontamente admitir que têm bem menor capacidade de tomar as decisões unilaterais que seus predecessores davam como certas"11. Os Palácios precisam digerir essa pouco apetitosa realidade global.

Essa combinação entre o povo cansado e um Judiciário disposto traz à ribalta questionamentos insistentes. O que é o poder? A quem ele deve servir? À luz da Constituição, a certeza é a seguinte: o povo é o poder.

"Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição", dispõe o parágrafo único do art. 1o da Constituição. O art. 5o, XXXIV, "a", dispõe que são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas, o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder. Tanto o povo é o próprio poder como pode elevar a sua voz na defesa de direitos, contra ilegalidade ou abusos.

Naím tem razão. São inúmeros os instrumentos de controle. No Brasil, eles decorrem da Constituição e chamam o povo a participar desse tipo de obstrução republicana quando partes legitimadas levam ao Judiciário a discussão sobre temas tais como a qualidade dos nomes apresentados à comunidade, pelo Presidente, para liderar Ministérios executando uma agenda de políticas públicas.

Destoa da ideia de estado constitucional supor que o chefe do Poder Executivo é absoluto em suas escolhas. Ele está submetido à Constituição. O que não quer dizer que amanhã juízes poderão ordenar a impressão de moeda, a declaração de guerra ou a celebração da paz.

O Poder Executivo é exercido pelo Presidente, "auxiliado pelos Ministros de Estado” (art. 76 da CF). Compete-lhe privativamente: I - nomear e exonerar os Ministros de Estado; II - exercer, "com o auxílio dos Ministros de Estado", a direção superior da administração Federal (art. 84, I e II da CF)12.

Acontece que, entendendo ter havido uma escolha que compromete a confiança pública no governo ou mesmo a capacidade da indicada, em razão de fatos passados, executar uma agenda voltada ao trabalhador, parece natural que alguém levante a mão no meio da multidão e diga: "Talvez devêssemos discutir melhor essa indicação".

A massiva publicidade sobre o caso, a necessidade de justificação das decisões judiciais, os recursos bem fundamentados da Advocacia-Geral da União, as declarações oficiais do Poder Executivo, tudo isso engrandeceu o espaço público quanto a um assunto genuinamente republicano.

Indo além, não parece sábio argumentar que as altas autoridades da Administração Pública Federal não se submetem à moralidade administrativa. Como não? Basta ler a apresentação do Código da Alta Administração Federal (CCAAF): "A Constituição Federal de 1988 consagrou, no seu artigo 37, o princípio da moralidade como um daqueles a que todos os Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, devem obedecer no exercício de suas atividades administrativas". Então, o arremate: "Tendo a Constituição positivado, vale dizer, juridicizado a ética, esta deixou de ser um conjunto de normas de conduta voltadas para cada um em particular, pois no centro das considerações morais da conduta humana está o eu, conforme lição de Hannah Arendt. Passou, assim, a ética a ter status jurídico e interessar diretamente ao Estado, visto que ele está no centro das considerações jurídicas da conduta humana". Bela apresentação. Foi escrita pelo jurista Américo Lacombe, presidente da Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

Segundo o art. 3º do Código, "no exercício de suas funções, as autoridades públicas deverão pautar-se pelos padrões da ética, sobretudo no que diz respeito à integridade, à moralidade, à clareza de posições e ao decoro, com vistas a motivar o respeito e a confiança do público em geral". É a exortação a um compromisso ético que dimana do caput do artigo 37 da Constituição.

Não se deve vandalizar as indicações do Executivo, mas é preciso constitucionalizá-las. Tanto que o Ministério Público Federal – exercendo as funções institucionais que a Constituição lhe conferiu (art. 129, IX) – recomendou a troca de todos os vice-presidentes da Caixa Econômica Federal, invocando o artigo 34, o princípio republicano, o princípio da impessoalidade da Administração Pública, o artigo 173, "caput" e §1º, II, o artigo 170, IV e o artigo 219, todos da Constituição. Recomendou-se a "melhoria no processo de seleção de altos executivos" e a "troca imediata dos vice-presidentes"13. O chefe do Poder Executivo atendeu a recomendação.

A postura de atuar em harmonia com determinadas recomendações do Ministério Público não é diversa da que se vê em outros países do mundo cuja chaga da corrupção tem gangrenado uma República surrada por uma desigualdade social que envergonha coletivamente e humilha individualmente. É o caso da África do Sul.

No país, a Suprema Corte de Recursos, apreciando o caso "SABC v DA (393/2015) [2015] ZASCA 156", em outubro de 2015, contando com a Corruption Watch como amicus curiae, definiu que as recomendações da "Public Protector" - equivalente ao nosso Ministério Público – tem a mesma eficácia de uma decisão judicial. Logo, toda e qualquer autoridade tem que cumprir a recomendação. Caso entenda-a injusta, é preciso ir ao Judiciário desconstituí-la, numa corrida cara e exaustiva. A solução sul-africana, portanto, foi mais invasiva do que a brasileira.

Também não impressiona o argumento segundo o qual os autores da ação popular que combaliu a indicação da parlamentar são questionadores insistentes dos atos dos governantes. A jurisprudência da Suprema Corte de Israel foi construída graças à corajosa atuação da organização não-governamental "Movimento por um Governo de Qualidade em Israel", ou seja, um organismo que se dedica a confrontar o governo. São os micropoderes – expressão de Moisés Naím – sendo vistos em ação. Nada de errado.

Quanto à chance de haver uma avalanche de ações populares inviabilizando o próprio e necessário exercício do poder – e a guerrilha política usa essas armas – a Constituição traz mecanismos que eliminam esse risco. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental está aí, tanto que foi no bojo de uma ADPF que o Supremo ordenou, em 2016, a exoneração que alcançou o então Ministro da Justiça.

Por qual motivo o PTB não ajuizou uma ADPF incidental à ação popular (art. 1º, I, da lei 9.882/1999) para permitir que o Supremo deliberasse sobre a questão? A ADPF incidental, ao contrário da sua modalidade autônoma (art. 1º, caput, da lei 9.882/1999), existe para isso. Outras ações populares foram ajuizadas deixando clara a chance de pulverização processual deletéria da questão.

O Ministro Gilmar Mendes, recebendo a ADPF 388 – atacava diretamente o Decreto de 2 de março de 2016 da presidente da República – , anotou: "Meio eficaz de sanar a lesão é aquele apto a solver a controvérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata. Relevância do interesse público como critério para justificar a admissão da arguição de descumprimento". Eis o caminho.

Diante dos comandos da Constituição Federal, ficarmos absolutamente impedidos de controlar o poder do chefe do Executivo, mesmo em atos dessa natureza, não seria bom sinal. Quem judicializaria a indicação, por Getúlio Vargas, de Filinto Müller para o cargo de Oficial de Gabinete do Ministro da Guerra? A estabilidade judicial quanto às indicações era absoluta. Ainda assim, aquele não foi um tempo bom.

A Constituição de 1988 entregou aos cidadãos a ação popular e um Judiciário independente. Porém, alertou: "Cuidado com a má-fé!" (art. 5º, LXXIII, da CF). É dessa má-fé – cuja aferição é um tormentoso exercício – que precisamos nos precaver. Má-fé que pode motivar qualquer dos envolvidos nessas decisões que suspendem as nomeações de ministros de Estado. É preciso ter extremíssima cautela. E o nosso Judiciário tem sido, nos últimos anos, um mar mais revolto do que calmo. Também não tem fama de ser o mais cauteloso do planeta. Nem os fatos o ajudam a ser.

Isso se agrava com a utilização desenfreada, nos Tribunais, incluindo o Supremo Tribunal Federal, do padrão "one single judge" de decisão, algo que existe em modelos estrangeiros respeitáveis como a Corte Europeia de Direitos Humanos, mas não costuma ser utilizado com a intensidade que utilizamos por aqui. Decisões judiciais monocráticas pipocam na grande panela de pressão que se tornou o país. A exceção começa a rivalizar com a regra.

É possível que haja julgamentos que, a despeito de moralizarem as desgraças da política, terminem por comprometer elementos essenciais da própria democracia. Por isso, é de fundamental importância resistir à tentação de tudo poder.

Até porque uma hiper-judicialização dos atos de governo poder ser algo artificializado, sem legitimidade. Não são exatamente populares querendo discutir a qualidade das escolhas das autoridades. Pode ser, em alguns casos, apenas a guerra da política num país dado a golpes abaixo da linha da cintura no vale tudo do poder.

Na Tailândia, a Corte Constitucional entendeu, em 2008, por unanimidade, que o então Primeiro-Ministro Samak Sundaravej havia violado a Seção 267 da Constituição, que veda às autoridades também serem empregadas privadas. O julgamento implicou no fim do seu mandato e derrubou todo o gabinete de ministros14.

Mas qual a grave acusação para justificar um resultado dessa natureza? O Primeiro-Ministro havia apresentado um programa de culinária antes da posse – era o ganha-pão dele no passado – e recebido o salário por isso quando já exercia o posto de Primeiro-Ministro. A Corte Constitucional argumentou que alguns programas podiam ter sido gravados durante o exercício do cargo.

A literatura especializada não se orgulha do precedente acima. Pelo contrário. Retrata-o como um ato autoritário que, passando por cima da Constituição e abusando imensamente dos poderes da Corte Constitucional, ultimou o mandato de um agente eleito simplesmente por entender que o seu tempo tinha acabado.

A queda precipitou tumultos sociais e a democracia tailandesa seguiu seu caminho entre sopapos fortes e solavancos persistentes. O país teve vinte Constituições em menos de um século. Desde 1932, sofreu onze golpes militares bem-sucedidos e sete tentativas de golpe. Que tal?

Ninguém é tolo para ouvir algo tipo "independência dos poderes" ou "as instituições estão funcionando" sem fazer um juízo de valor mais acurado quanto ao contexto no qual decisões derrubando autoridades são tomadas.

Na Tailândia, uma elite provinciana dada a golpismos exortou a independência dos poderes para reverter, com a linguagem jurídica dos acórdãos, o resultado singelo – e para alguns indigesto - das urnas. É a metástase da democracia.

Quando esse tipo de coisa acontece, quem é gravemente penalizada é a parcela mais vulnerável da população. Como diz um ditado africano: "Quando os elefantes brigam é a relva que sofre".

Portanto, feito esse registro quanto à necessária cautela no exame judicial excepcional das indicações do Presidente da República para a chefia de Ministérios, e retomando o objeto da coluna – o "caso Cristiane Brasil" -, é sim, importante, que o Supremo, pelo seu colegiado, responda se a condenação de uma parlamentar, pela Justiça do Trabalho, por violação aos direitos de um trabalhador, a inabilita, à luz da Constituição, a assumir o posto de ministra do Trabalho.

O contexto prova que o debate é necessário. O art. 21, XXIV da Constituição diz competir à União organizar, manter e executar a inspeção do trabalho. Há menos de um ano, numa inspeção, o Ministério do Trabalho flagrou 118 crianças, com idades de 3 a 17 anos, em condições degradantes de trabalho em feiras públicas, no lixão, em ruas e em carvoarias. Foi em Boa Vista. O exemplo ilustra o papel do Ministério do Trabalho.

Numa nação coberta pela vergonha de saber que muitas de suas crianças têm suas esperanças e chances de felicidade queimadas em carvoarias, calcular mal o relevo de uma pasta como a do Trabalho é convidar os cidadãos a obstruírem qualquer escolha que não reflita as legítimas expectativas por uma agenda que, além de ter vasto amparo constitucional, é socialmente fundamental.

Por isso, a controvérsia judicial instalada não é mera artilharia inconsequente de uma batalha política de baixa qualidade. O Ministério do Trabalho foi criado em 1930. Logo mais será uma pasta centenária. Além disso, o "trabalho" é a base da Constituição de 1988, que veio colorida por esse sistema. Será bom ao país discutir, por meio da sua Suprema Corte, questões ligadas ao princípio republicano, à confiança pública no governo, à moralidade administrativa, ao controle dos atos do Executivo e às condições necessárias, numa democracia contemporânea, para se conseguir uma boa-governança numa pasta das mais relevantes. Mal não fará. Acreditem.

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1 Consta do parágrafo 24 (p. 400) do acórdão: "Within the area of private law the individual can behave with a measure of the "capriche", though such "capriche" is not what it used to be, nor should it be. But in the realm of public law – constitutional and administrative law – caprice is a terminal illness".
2 Consta do parágrafo 24 (p. 400) do acórdão: "Those exercising authority on behalf of the state or any other public authority – in our case, the Prime Minister and the Minister of Public Security – must constantly be aware that their affairs are not their own. They are dealing with matters that concern others and are obligated to conduct themselves with fairness and integrity, in strict compliance with the principles of public administration". A íntegra da célebre decisão da Suprema Corte está disponível em:
3 Art. 5º, LXXIII: "Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência".
4 A Ação Popular 001786-77.2018.4.02.5102 foi ajuizada com o objetivo de impedir os efeitos da nomeação, pelo Presidente da República, e a subsequente posse da deputada federal Cristiane Brasil Francisco no cargo de Ministra de Estado do Trabalho. O fundamento seria o fato de, em processos da Justiça do Trabalho, ter sido provado que a indicada havia "fraudado normas trabalhistas em pelo menos duas oportunidades, seja deixando de promover formalização de vínculos de emprego, seja submetendo os trabalhadores a jornadas exaustivas". O Juízo da Quarta Vara Federal da Seção Judiciária de Niterói/RJ antecipou os efeitos da tutela invocando, como fundamento, o princípio da moralidade administrativa, em seu artigo 37, caput. O Juiz suspendeu a eficácia do decreto de nomeação, bem como sua posse.
5 O Ministro de Estado, que era parlamentar, havia sido acusado – e constou dos autos – de haver usado de sua influência para levantar fundos junto a bancos "com a finalidade de pagar parlamentares para que, na Câmara dos Deputados, votassem projetos em favor do Governo" (Representação 38/2005).
6 Rcl 2138, Min. Gilmar Mendes, Pleno, DJe 18/4/2008.
7 ADI 3289, Min. Gilmar Mendes, Pleno, DJ 3/2/2006.
8 Consta do parágrafo 24 do acórdão: "When acting in the domain of public law, the appointing authority operates in the capacity of a public trustee. Just as a trustee possesses nothing of his own, so too, the appointing authority possesses nothing of its own. It must conduct itself in the manner of the trustee: acting with integrity and fairness, considering only relevant factors, acting with reasonableness, equality, and without discrimination". A íntegra está disponível no seguinte endereço.
9 No parágrafo 17 do acórdão consta: "Therefore, both the Prime Minister’s decision to appoint a person and his decision not to remove one from office are subject to the accepted standards of reasonableness, integrity, proportionality, good faith, and the absence of arbitrariness or discrimination". Disponível em.
10 Consta do parágrafo 28 do voto-vencedor no acórdão: "(...) the boundaries of the Court’s intervention in appointments is limited to those instances in which an appointment might seriously harm the standing of the institutions of government and the public’s confidence in them'. Disponível em.
11 Naím, Moisés. O fim do poder: nas salas da diretoria ou nos campos de batalha, em Igrejas ou Estados, por que estar no poder não é mais o que costumava ser?/ Moisés Naím; tradução Luis Reyes Gil. – São Paulo: LeYa, 2013.
12 "Compete aos Ministros de Estado, pelo menos: I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República" (art. 87, parágrafo único, da Constituição).
13 Recomendação 87/2017, do Ministério Público Federal (Força-Tarefa Greenfield).
14 A esse respeito, Verapat Pariyawong publicou a dissertação "Three-Course Recipe for the Court’s Cookery: A Critique on Thai Democracy and Judicial Review", pela Harvard Library.


http://www.migalhas.com.br/ConversaConstitucional/114,MI274186,71043-O+caso+Cristiane+Brasil+Algumas+perspectivas+constitucionais

STJ: Comprador de boa-fé que adquirir imóvel de parte de união estável deve ser protegido

Decisão é da 3ª turma do STJ ao julgar caso de terceiro que comprou imóveis adquiridos durante união estável sem consentimento de ex-companheira do vendedor.
sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Dispensa de contrato registrado em cartório como requisito para validade da união estável implica na proteção de terceiro de boa-fé que adquire imóvel de um dos conviventes sem o consentimento da outra parte. A decisão é da 3ª turma do STJ, que julgou caso de terceiro que adquiriu imóvel obtido por casal durante regime de união sem o conhecimento da ex-companheira do vendedor.

Ao ingressar com a ação de nulidade de escritura pública, a autora afirmou que os imóveis adquiridos na constância da união estável deveriam ter sido submetidos à partilha logo após a dissolução da união. Mas, ao invés disso, os bens foram alienados pelo ex-companheiro sem o consentimento da autora.
Ao julgar o caso, o TJ/PR considerou que não havia o reconhecimento da união estável no momento da aquisição dos imóveis e de sua alienação, o que confirma a validade do negócio jurídico. A Corte, então, julgou improcedente o pedido de nulidade feito pela autora.
Inconformada, a autora interpôs RE no STJ, afirmando que a união estável e a aquisição dos bens durante o período de convivência haviam sido devidamente comprovadas nos autos, e que o ex-companheiro não poderia ter outorgado a escritura de compra e venda sem seu consentimento.
Formalidade
Em análise do recurso, o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do caso, lembrou que o artigo 1.647 do Código Civil determina que nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, alienar bens imóveis, exceto em casos de regime de separação absoluta. O ministro também ponderou que, embora o texto legal cite apenas cônjuges, a proteção patrimonial se aplica às famílias oriundas de uniões estáveis, já que ambas as entidades são reconhecidas pelo ordenamento jurídico, apesar da existência de divergência jurisprudencial sobre o tema.
O ministro também ressaltou que as uniões estáveis admitem um nível de informalidade no vínculo entre os conviventes, pois se trata de situação que não exige documento tal como ocorre no casamente, em que há ato formal cartorário. Ele também afirmou que, no caso em questão, não havia o registro formal em cartório da união, e que o vendedor do imóvel se apresentava perante a sociedade como solteiro, além de ser o único proprietário do bem, o qual estava apenas em seu nome.
Decisão
Em razão disso, o ministro considerou que a falta de averbação da união estável em cartório afasta a ciência de terceiro sobre a convivência. Com este entendimento, o ministro entendeu que o comprador de boa-fé não poderia ser prejudicado em razão da compra de imóvel adquirido daquele que aparentava ser seu único proprietário, e reconheceu a validade do negócio jurídico celebrado. A decisão foi unânime.
"Não havendo registro imobiliário em que inscritos os imóveis objetos de alienação em relação à copropriedade ou à existência de união estável, tampouco qualquer prova de má-fé dos adquirentes dos bens, impõe-se o reconhecimento da validade dos negócios jurídicos celebrados, a fim de proteger o terceiro de boa-fé, assegurando-se à recorrente o direito de buscar as perdas e danos na ação de dissolução de união estável c.c partilha, a qual já foi, inclusive, ajuizada."
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI274184,51045-Comprador+de+boafe+que+adquirir+imovel+de+parte+de+uniao+estavel+deve

Dona de Clube de Turismo pode ser processada por falha no serviço de hotel (Situação ocorrida com cliente da Bancorbrás)

A 4ª turma do STJ mandou que Justiça estadual decida ação de consumidora que se hospedou em resort abandonado.
quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

A 4ª turma do STJ, em decisão unânime, reconheceu a legitimidade passiva da Bancorbrás para figurar em ação de cliente participante de Clube de Turismo por falha no serviço de resort.
A autora foi com a família para Canoa Quebrada, no Ceará, passar uma temporada e, uma vez lá, viu que o hotel estava abandonado. Inclusive um dos quartos em que foi alocada com sua filha de 4 meses havia passado por dedetização poucas horas antes, o que causou náuseas e outras consequências.
Os juízos de 1º e 2º grau extinguiram a ação por falta de legitimidade da Bancorbrás, que promove o Clube de Turismo, por entenderem que a falha na prestação do serviço foi do resort.
Promessa publicitária

O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, destacou no voto o fato de que a responsabilidade em concreto da Bancorbrás será analisada, de fato, nas instâncias ordinárias.
Contudo, entende, não há como afastar a responsabilidade solidária da empresa, já que o Clube de Turismo, que está há mais de 30 anos no mercado, oferta títulos aos consumidores para utilizarem os fornecedores previamente selecionados pela empresa.
No anúncio publicitário, ressaltou o ministro, há a promessa de segurança e conforto uma vez que a Bancorbrás se utiliza de critérios financeiros e também qualitativos para credenciamento dos fornecedores que atenderão os clientes do Clube.
A exigência de parâmetro qualitativo guarda conexão com a promessa publicitária do Clube. A Bancorbrás não funciona como mera intermediadora. A mera intermediação seria se o contrato fosse fundado na livre escolha do consumidor, sem direcionamento da Bancorbras. Ao revés, a escolha fica limitada aos estabelecimentos pré-selecionados e conveniados.”
Segundo Salomão, há no caso a incidência do art. 34 do CDC, não podendo a situação ser tratada como culpa exclusiva de terceiro.
O reconhecimento da legitimidade para responder por defeito ostenta a mesma ratio da orientação da Corte de que planos de saúde respondem pelos serviços de hospitais e médicos. Cria uma expectativa [o Clube] de que a promessa publicitária de conforto e segurança será cumprida.”
Assim, determinou a remessa dos autos ao 1º grau para que o julgamento da causa tenha prosseguimento. A decisão da turma foi unânime.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI274135,71043-Dona+de+Clube+de+Turismo+pode+ser+processada+por+falha+na+prestacao

Do apadrinhamento: Breve análise da lei portuguesa e do projeto de lei brasileiro


Por Flávio Tartuce - quarta-feira, 27 de julho de 2016

Entre os dias 1º e 2 de junho de 2016, promoveu-se em Portugal o I Encontro IBDFAM-CDF, realizado pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família e pelo Centro de Direito da Família, ligado à secular Universidade de Coimbra. O evento teve a coordenação dos professores José Fernando Simão, pelo Brasil, e Guilherme de Oliveira, por Portugal, contando com a participação de mais de cinquenta especialistas; entre os brasileiros, os professores Zeno Veloso, Giselda Hironaka, Rodrigo Toscano de Brito, Rodolfo Pamplona Filho, Giselle Groeninga, João Ricardo Brandão Aguirre, Fernanda Tartuce, Mariana Chaves e Rui Carvalho Piva.
Um dos temas abordados no evento, especialmente pelos juristas portugueses, foi o apadrinhamento civil, tratado em terras lusitanas pela lei 103, de 11 de setembro de 2009, que teve como um dos seus elaboradores justamente o professor Guilherme de Oliveira. Este breve texto pretende trazer algumas reflexões iniciais sobre o instituto, na esteira dos debates que ocorreram naquele encontro em Portugal, confrontando a categoria dos patrícios com o projeto de lei 171, de 2013, aprovado recentemente pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado Federal Brasileiro.
O apadrinhamento civil português traz amplos efeitos jurídicos aos envolvidos, definindo o art. 2º da lei 103/2009 que o instituto é "uma relação jurídica, tendencialmente de carácter permanente, entre uma criança ou jovem e uma pessoa singular ou uma família que exerça os poderes e deveres próprios dos pais e que com ele estabeleçam vínculos afectivos que permitam o seu bem-estar e desenvolvimento". Ainda nos termos do mesmo comando, o apadrinhamento civil deve ser constituído por homologação ou decisão judicial, sujeita a registro civil.
No que diz respeito à capacidade das partes, podem apadrinhar pessoas maiores de 25 anos, previamente habilitadas para tanto, dando-se preferência aos seus familiares; a pessoas idôneas ou a famílias de acolhimento a quem a criança ou o jovem tenha sido confiado em processo de promoção e proteção; ou mesmo a eventuais tutores (arts. 4º e 11, item n. 5, da lei 103/2009).
Na outra ponta, quanto à capacidade para ser apadrinhado, o art. 5º da lei 103/2009 estabelece que, desde que o apadrinhamento civil apresente reais vantagens para a criança ou o jovem, e desde que não se verifiquem os pressupostos da confiança com vista à adoção, pode ser apadrinhada qualquer criança ou jovem menor de 18 anos que a) esteja a beneficiar-se de uma medida de acolhimento em instituição; b) esteja a beneficiar-se de outra medida de promoção e proteção; c) encontre-se em uma situação de perigo confirmada em processo de uma comissão de proteção de crianças e jovens ou em processo judicial; d) para além dos casos previstos anteriormente, seja encaminhado para o apadrinhamento civil por iniciativa das pessoas ou das entidades previstas na mesma lei. Em complemento, está previsto que também pode ser apadrinhada qualquer criança ou jovem menor de 18 anos que esteja a beneficiar-se de confiança administrativa, confiança judicial ou medida de promoção e proteção de confiança a instituição com vista a futura adoção ou a pessoa selecionada para a adoção quando, depois de uma reapreciação fundamentada do caso, se mostre que esta é inviável.
O apadrinhamento civil português somente pode ser concedido uma vez, regido pela regra da unicidade, expressa no art. 6º da lei 103/2009. Enuncia a norma que enquanto subsistir um apadrinhamento civil não pode constituir-se outro quanto ao mesmo afilhado. O preceito estabelece como exceção a hipótese em que os padrinhos vivem em família, seja por casamento ou união de facto (a união estável portuguesa).
A existência de amplos efeitos decorrentes do instituto é clara pelo que consta do art. 7º da Lei n. 103/2009, que determina a existência de responsabilidades parentais dos padrinhos, o que corresponde, pelo menos em parte, à nossa ideia de poder familiar; ou de autoridade parental, como querem alguns. Nesse contexto, os padrinhos exercem amplamente as responsabilidades parentais, ressalvadas as eventuais limitações previstas no compromisso de apadrinhamento civil ou na decisão judicial. Aplicam-se, no que couber, algumas regras da tutela, constantes entre os arts. 1936º e 1941º, 1943º e 1944º do Código Civil Português; os dois últimos no caso de falecimento, de inibição do exercício da responsabilidade parental pelos pais ou de serem estes incógnitos. Em complemento, cabe a intervenção do Ministério Público para a proteção dos interesses do menor.
Os pais biológicos do apadrinhado, em regra, beneficiam-se dos direitos expressamente consignados no compromisso de apadrinhamento civil, a saber: a) conhecerem a identidade dos padrinhos; b)disporem de uma forma de contatar os padrinhos; c) saberem o local de residência do filho; d) disporem de uma forma de contatar o filho; e) serem informados sobre o desenvolvimento integral do filho, a sua progressão escolar ou profissional, a ocorrência de fatos particularmente relevantes ou de problemas graves, nomeadamente de saúde; f) receberem com regularidade fotografias ou outro registro de imagem do filho; g) visitarem o filho, nas condições fixadas no compromisso ou na decisão judicial, designadamente por ocasião de datas especialmente significativas, caso dos aniversários de todos (art. 8º da lei 103/2009). Em suma, quem passa a exercer a guarda fática da criança ou do adolescente são os padrinhos, havendo um direito de amplo acesso físico e informacional por parte dos pais biológicos.
Com a finalidade de concretizar o instituto, as relações entre pais e padrinhos são regidas pelos princípios do mútuo respeito; da preservação da intimidade da vida privada e familiar, do bom nome e da reputação do afilhado; e da cooperação na criação de condições adequadas ao bem-estar e desenvolvimento do apadrinhado (art. 9º da lei 103/2009).
Por fim, com relevo para esta breve análise, geral e comparativa, no que diz respeito aos alimentos, o art. 13 da norma lusitana considera os padrinhos ascendentes em primeiro grau do afilhado, para efeito da obrigação de lhe prestar alimentos. Porém, são precedidos pelos pais deste em condições de satisfazer tal encargo. O afilhado, por seu turno, é considerado descendente em primeiro grau dos padrinhos para efeito da obrigação de lhes prestar alimentos, mas é precedido pelos filhos destes em condições de satisfazer este encargo. Em outras palavras, padrinhos e afilhados são tratados como pais e filhos para os devidos fins alimentares, mas de maneira subsidiária.
Na verdade, o projeto de lei brasileiro sobre apadrinhamento legal, na denominação que consta da proposta, é bem mais restrito do que o tratamento previsto na norma lusitana. Cinge-se a projeção a tratar apenas de consequências alimentares decorrentes do vínculo que une os padrinhos aos apadrinhados. Na verdade, trata-se de prática que já acontece no Brasil há muito tempo, especialmente no que diz respeito aos conhecidos "padrinhos de batismo", existentes em algumas religiões. É bem comum, em nosso País, que os padrinhos arquem com alguns custos de seus afilhados, como aqueles relacionados com a formação intelectual dos últimos.
O projeto de lei 171/2013 pretende tratar da questão no Estatuto da Criança e do Adolescente (lei 8.069/1990), incluindo os arts. 52-E a 52-I no diploma legal. Frise-se que os efeitos são apenas alimentares, sem qualquer interferência no exercício do poder familiar ou das responsabilidades parentais (segundo os portugueses).
Nesse contexto, está previsto que se entende por apadrinhamento legal a situação jurídica de quem voluntariamente assume o dever de sustento de criança ou adolescente (art. 52-E, § 1º, da projeção). A categoria é dividida em duas modalidades, a saber: a) apadrinhamento total, presente quando o dever de sustento da criança ou do adolescente é assumido integralmente; e b) apadrinhamento parcial, quando o padrinho assume obrigação de prestar contribuições mensais em favor da criança ou do adolescente ou contribuições de bens ou serviços com o fim de atender a proteção integral consagrada pelo ECA (art. 52-E, § 2º, no PL n. 171/2013).
Além da ausência de qualquer interferência no exercício do poder familiar, guarda ou tutela, o apadrinhamento legal não impõe ao padrinho qualquer dever de fiscalização ou de reparação de possíveis danos causados pelo apadrinhado, nem qualquer outro dever atribuído ao representante legal do afilhado (proposta de art. 52-E, §§ 3º e 4º, do PL 171/2013).
Os valores pagos são tratados de maneira equiparada à pensão alimentícia para os devidos fins de impenhorabilidade (art. 52-E, § 5º). Todavia, não cabe prisão civil pela falta do seu pagamento (art. 52-E, § 8º). Com os fins de evitar eventuais fraudes, o apadrinhado não é considerado dependente do padrinho para efeitos previdenciários (art. 52-E, § 9º).
O caráter alimentar presente no apadrinhamento total é ressaltado pela proposta de inclusão do art. 52-F no ECA, determinando a norma a incidência do art. 1.694 do Código Civil Brasileiro. Nesse contexto, devem os alimentos ser fixados de acordo com as necessidades indispensáveis à subsistência do apadrinhado, ou seja, têm o caráter de alimentos necessários. A norma possibilita, ainda, o pagamento in natura dos alimentos, como na hipótese em que o padrinho cede um imóvel de sua propriedade para residência do afilhado adolescente. O número de apadrinhados limita-se a dois, nessa modalidade, salvo se forem irmãos. Veda-se, também, o apadrinhamento total da mesma criança ou adolescente simultaneamente por mais de uma pessoa, salvo se os padrinhos forem casados ou viverem em união estável devidamente comprovada. Em casos tais, ambos os cônjuges ou companheiros são solidariamente responsáveis pelas prestações alimentares.
No apadrinhamento parcial, o padrinho assume a obrigação de prestar as contribuições que foram previamente estipuladas, facultando-se a ele o direito de, a qualquer tempo, cumprir com as suas obrigações de maneira in natura, assim como ocorre na modalidade de apadrinhamento totalPorém, ao contrário dessa última, no apadrinhamento parcial o afilhado não é considerado dependente alimentar do padrinho, constando todas essas regras na proposta de inclusão do art. 52-G no ECA, pelo PL 171/2013.
Por derradeiro, no que diz respeito à sua formalização, o apadrinhamento legal depende de escritura pública a ser lavrada no Tabelionato de Notas, subscrita pelo padrinho e pelo responsável legal do apadrinhado, só produzindo efeitos após o seu registro no Cartório de Registro das Pessoas Naturais (proposta de inclusão do art. 52-H no ECA). Sucessivamente, a norma prevê a instauração de um procedimento administrativo perante o último cartório, com a oitiva do Ministério Público. Eventual conflito suscita decisão pelo juízo competente. Louva-se a desjudicialização do procedimento, como regra, na tendência consagrada pelo Novo Código de Processo Civil Brasileiro.
Essas são as diretrizes gerais do projeto, o que confirma a afirmação segundo a qual o projetado apadrinhamento legal brasileiro é bem mais restrito do que o apadrinhamento civil português, limitando-se ao pagamento de verbas alimentares e não interferindo no poder familiar. Quando expliquei a projeção brasileira brevemente nos debates em Portugal, ouvi da Professora Ana Rita Alfaiate, da Universidade de Coimbra, que não se tratava propriamente de um apadrinhamento civil.

Todavia, a realidade demonstra que a nossa prática de apadrinhamento é realmente esta que o projeto de lei 171/2013 traz como conteúdo. Como palavras finais, estou filiado à projeção, pois ela acaba regulando algo que já acontece de forma espontânea na prática brasileira, concretizando a solidariedade estampada no art. 3º, inciso I, da Constituição Federal de 1988.
Flávio Tartuce é doutor em Direito Civil pela USP. Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC/SP. Professor titular permanente do programa de mestrado e doutorado da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo (FADISP). Professor e coordenador dos cursos de pós-graduação lato sensu da Escola Paulista de Direito. Professor do G7 Jurídico, em cursos preparatórios para as carreiras jurídicas. Diretor do IBDFAM – Nacional e vice-presidente do IBDFAM/SP. Advogado em São Paulo, parecerista e consultor jurídico.
http://www.migalhas.com.br/FamiliaeSucessoes/104,MI242915,91041-Do+apadrinhamento+Breve+analise+da+lei+portuguesa+e+do+projeto+de+lei

Entenda a diferença entre adoção, apadrinhamento e acolhimento

Segunda-feira, 20 de Março de 2017

Existem no Brasil mais de 46 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento, ou seja, que vivem atualmente em quase 4 mil entidades acolhedoras credenciadas junto ao Judiciário em todo o país, de acordo com o Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Nem todas as crianças acolhidas, no entanto, estão “disponíveis” para adoção. Conforme demonstra o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), da Corregedoria do CNJ, há cerca de 7,2 mil crianças cadastradas para adoção no país, ou seja, cujos genitores biológicos perderam definitivamente o poder familiar. 

Acolhimento e suspensão da guarda

O artigo 7º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) assegura à criança e ao adolescente o direito a um desenvolvimento sadio e harmonioso, bem como o direito de serem criados e educados no seio de sua família. No entanto, quando esses direitos são interrompidos por alguma razão, pode haver a suspensão, perda ou extinção do poder familiar. E o próprio ECA prevê as regras processuais quando proposta uma ação de suspensão ou perda do poder familiar, aplicando-se, subsidiariamente, as normas do Código de Processo Civil.

A criança ou o adolescente é encaminhado a um serviço de acolhimento quando se encontra em situação de risco e foram esgotadas as possibilidades que permitiriam colocá-lo em segurança. Quase sempre o acolhimento ocorre quando o Conselho Tutelar entende necessário o afastamento do convívio familiar e comunica o fato ao Ministério Público, prestando esclarecimento sobre os motivos de tal entendimento e sobre as providências já tomadas no sentido da orientação, apoio e promoção social da família. O afastamento da criança ou do adolescente do convívio familiar é de competência exclusiva da autoridade judiciária.

Direito de visita

Os pais cujos filhos estejam sob acolhimento podem exercer o direito de visita, desde que este contato não seja prejudicial à criança ou adolescente. O objetivo deste contato é manter os vínculos afetivos com a família de origem, diante de uma possível reintegração familiar. No caso de genitores dependentes do uso de bebidas alcoólicas ou substâncias entorpecentes, ou, ainda, portadores de distúrbios psicológicos ou psiquiátricos diagnosticados, as visitas poderão se dar sob supervisão dos guardiões ou de terceiros, podendo ser suspensa. O direito de visitas é extinto caso a adoção seja julgada procedente, o que determinará o rompimento com todos os vínculos da família biológica, inclusive o de visitas.

Adoção

A adoção é a colocação da criança ou adolescente, sempre tendo em vista o melhor interesse destes, em uma família substituta. A adoção atribui a condição de filho para todos os efeitos, desligando-o de qualquer vínculo com pais biológicos. Pode haver alteração do nome, se houver desejo do adotante ou adotado, sendo criança ou adolescente.

Cadastro mais eficaz

O Cadastro Nacional de Adoção, ferramenta digital de apoio aos juízes das Varas da Infância e da Juventude na condução dos processos de adoção em todo o país, foi lançado em 2008 pela Corregedoria Nacional de Justiça. Em março de 2015, o CNA foi reformulado, simplificando operações e possibilitando um cruzamento de dados mais rápido e eficaz. Com a nova tecnologia, no momento em que um juiz insere os dados de uma criança no sistema, ele é informado automaticamente se há pretendentes na fila de adoção compatíveis com aquele perfil. O mesmo acontece se o magistrado cadastra um pretendente e há crianças que atendem àquelas características desejadas.

Apadrinhamento afetivo


O apadrinhamento de crianças em situação de acolhimento ou em famílias acolhedoras pode ser afetivo ou financeiro, sendo este último caracterizado por uma contribuição financeira à criança institucionalizada, de acordo com suas necessidades. Já o apadrinhamento afetivo tem o objetivo de promover vínculos afetivos seguros e duradouros entre eles e pessoas da comunidade que se dispõem a ser padrinhos e madrinhas. As crianças aptas a serem apadrinhadas têm, quase sempre, mais de dez anos, e, portanto, chances remotas de adoção.

Uma das intenções do apadrinhamento afetivo, por exemplo, é que a criança possa conhecer como funciona a vida em família, vivenciando situações cotidianas. Os padrinhos, que geralmente passam por capacitação, precisam ter disponibilidade de partilhar tempo e afeto com esses menores e colaborar com a construção do projeto de vida e autonomia de adolescentes. A ideia é possibilitar um vínculo afetivo fora da instituição de acolhimento. Para isso, os padrinhos podem, por exemplo, passar os finais de semana e as férias com o afilhado. É preciso reforçar que o apadrinhamento não é o mesmo que adoção – geralmente uma das condições para ingressar no programa de apadrinhamento é não estar na fila para adoção – e os voluntários para apadrinhamento afetivo são avaliados por meio de um estudo psicológico.

Informações da Agência CNJ de Notícias

http://justificando.cartacapital.com.br/2017/03/20/entenda-diferenca-entre-adocao-apadrinhamento-e-acolhimento/

CNJ: Campanha estimula apadrinhamento de crianças maiores em Porto Velho

10/05/2017 - 08h05

Um passeio especial para crianças e adolescentes de três unidades acolhedoras de Porto Velho (RO). Além da oportunidade de sair do ambiente de abrigo, o grupo foi atração de um número musical pra lá de especial. Trata-se da campanha "Por que não eu?” de mobilização pelo apadrinhamento e adoção de crianças maiores e adolescentes, uma parceria do Poder Judiciário com Ministério Público e Prefeitura de Porto Velho.
Após ensaios comandados pelo coral da Faculdade São Lucas, o grupo se apresentou entre 17h e 19h, em dois locais do shopping, a praça de alimentação 2 e no hall de entrada, próximo ao stand montado para divulgar a campanha.
A campanha busca informar, desmitificar e quebrar os preconceitos com relação à adoção, e ter oportunidade de demonstrar que crianças e adolescentes que estão em situação de acolhimento institucional precisam ter a chance de uma convivência familiar.
O coral das crianças e adolescentes, reforçado por servidores das instituições além de próprios componentes do coral São Lucas, apresentou as canções “Trem Bala” e “Ser Criança”, emocionando o público presente.
A atividade contou também com algumas surpresas. As adolescentes foram maquiadas pelas funcionárias de uma loja de cosméticos (“Quem, disse Berenice?)”, o que trouxe satisfação e valorização da autoestima das meninas.
Várias emissoras de TV compareceram ao local para dar visibilidade à campanha. Muitas delas entrevistaram os representantes das instituições parceiras e também das crianças e adolescentes disponíveis para adoção, crianças e adolescentes que são apadrinhadas dentro do projeto "Apadrinhando uma História", ou ainda famílias que já adotaram, pois a ação é apoiada pela associação Acalanto de apoio à adoção.
"O afeto é a questão mais importante, que envolve o ser humano. ´É o que determina o fim de guerras, reúne pessoas de raças diferente, de religiões diferentes. Quando você tem vínculo afetivo, você consegue quebrar preconceito e fazer diferença na vida das pessoas", destacou a juíza da Infância e Juventude.
Para a magistrada o trabalho do 2º Juizado não se resume a área jurídica. "É importante a consciência que as questões sociais são responsabilidade de todos. Nos países mais desenvolvidos temos pessoas muito empenhadas, se voluntariado nas questões sociais. Ninguém transfere só para o governo as questões que demandam atenção da sociedade. Você pode fazer um pouquinho ou muito, desde que você faça alguma coisa. Nós podemos ajudar de qualquer forma, basta que nós tenhamos essa vontade e que tenhamos o coração aberto para esse projeto, para essa situação, que é tão singular e tão importante", finalizou.
“Nós sabemos que essas crianças que estão em situações de acolhimento institucional acabam ficando segregadas da sociedade. Na verdade, elas ficam naquela unidade e por mais que tenham alimentação, educação, carinho, sabemos que é difícil ofertar esse convívio comunitário, convívio familiar, a inserção delas na sociedade", acrescentou Landa Elaisa Lemos, coordenadora do Saim (Serviço de Acolhimento Institucional).
A campanha de adoção e apadrinhamento de crianças maiores e adolescentes vai até o final de maio, no dia 28 ocorrerá a Caminhada da adoção, no espaço alternativo.

Apadrinhamento

No Stand disponível no shopping, foi possível realizar o cadastro no projeto “Apadrinhamento Legal”. O projeto incentiva o apadrinhamento de crianças e adolescentes abrigadas, tem dois anos e meio de duração e ótimos resultados.
“São eventos como esse que permitem sensibilizar a população com o olhar voltado para aquelas crianças e aqueles adolescentes que por algum motivo ou outro, não estão disponíveis para adoção", ressalta do juiz coordenador da CEJA (Comissão Estadual Judicial de Adoção), Áureo Virgílio, que chama atenção ainda a oportunidade de contribuir para o desenvolvimento de uma criança e um adolescente, como padrinho seja afetivo, provedor ou prestador de serviço . "Sou um padrinho, patrocino um curso de natação para a minha afilhada Samara, o que traz benefícios não só pra ela como pra mim. Mensalmente tenho contato com ela, avalio e acompanho o seu desenvolvimento e estabeleço com ela, além dessa ajuda provedora, um laço de padrinho e afilhada.”
O projeto foi pensado visando estabelecer uma nova experiência de filiação, possibilitando a quebra do sentimento de abandono e a recuperação da autoestima de crianças e adolescentes, pela oportunidade de ter sido eleito por alguém como depositário de investimento de afetos e cuidados. Foi idealizado pelas equipes do 2º Juizado de Infância e da Juventude, Serviço de Acolhimento Institucional (SAIN), da Secretaria de Assistência Social do Município de Porto Velho, Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude do Ministério Público e da CEJA.
A iniciativa tem o objetivo de sensibilizar e captar pessoas com interesse e disponibilidade de tornarem-se “padrinhos e madrinhas” de crianças e adolescentes em situação de acolhimento institucional, cujos vínculos com as famílias de origem encontram-se total ou parcialmente rompidos e que estejam numa faixa etária avançada, com doenças crônicas, deficiências físicas e mentais, soropositivas, etc., características que reduzem as possibilidades de inserção em família substituta.
Fonte: TJRO
http://www.cnj.jus.br/noticias/judiciario/84735-campanha-estimula-apadrinhamento-de-criancas-maiores-em-porto-velho