terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Ativismo e desjudicialização

por Vitor Frederico Kümpel
terça-feira, 20 de fevereiro de 2018


É inegável que o Poder Judiciário tem sido atacado diuturnamente e que não está em alta com a opinião pública. É também inegável que a cultura da judicialização reina no Brasil e que o país tem quase um processo para cada dois cidadãos, lembrando que hoje temos 208 milhões de habitantes.
Diante deste quadro, em que este poder da República é acusado de morosidade e falta de credibilidade, tem-se juntado uma outra crítica bastante pertinente, que é a discricionariedade das decisões, famoso 'ativismo judicial'.
Em texto brilhante, neste mesmo Migalhas, o professor Ovídio Rocha Barros Sandoval relaciona o ativismo judicial ao Movimento do Direito Livre, que pregava que o legislador não tinha a exclusividade da criação do Direito, além do fato de o juiz ter a necessidade de ser um sociólogo, ou seja, um investigador dos fatos sociais. Como bem define o autor do texto mencionado, o ativismo judicial impregna o Judiciário de subjetivismo e faz do juiz um criador livre do Direito.
Visando mitigar essa série de mazelas atribuídas ao Poder Judiciário, surgiu o fenômeno da desjudicialização, que consiste em retirar atribuições do Poder Judiciário com a expectativa na redução da litigiosidade e do número de demandas. Outros atores passaram a ser considerados relevantes nesse cenário, entre os quais: árbitros, mediadores, conciliadores e, por que não dizer, notários e registradores.
Além das demandas, por hora, não diminuírem, passou a ocorrer um fenômeno bastante interessante e que podemos denominar: "ativismo administrativo". Nesta nova figura jurídica, o mesmo Poder Judiciário, porém na esfera administrativa, passou a criar regras ao arrepio de leis e súmulas. Decisão administrativa, normas de serviço, resoluções e provimentos passaram a "revogar" leis e súmulas consolidadas, caminhando na mesma direção do ativismo judicial, porém na esfera administrativa.
Além de gerar insegurança, diante dessa livre criação do Direito na seara administrativa, naquela ideia já mencionada por Barros Sandoval de que o "novo" sempre aparenta ser melhor que o "velho", diante de subjetivismo do juiz na esfera administrativa, certamente gerará maior litigiosidade.
É possível citar, como exemplo, ato administrativo e decisão administrativa que admitem ser afastada a incidência da súmula 377 do STF por meio de pacto antenupcial. Não se negue que a referida súmula é anacrônica e que buscou, à época de sua edição, resolver distorção do Código Civil de 1916, que só garantia a comunicação dos aquestos para o regime da separação total convencional. A súmula passou a garantir a comunicação dos aquestos para a separação total obrigatória. O Código foi revogado e a súmula se manteve. A decisão e o ato administrativo passaram a admitir o afastamento da súmula por meio de pacto antenupcial, principalmente para a hipótese daquele que casa com mais de 70 anos.
O grande problema não está no caráter moral ou ético da decisão, e sim no fato de que a administração pública está criando e revogando leis e súmulas consolidadas. Ademais, quem é que garante que o eventual prejudicado (marido ou mulher) não venha questionar, no Poder Judiciário, a validade do ato administrativo modificador de súmula.
Por mais que se diga que a desjudicialização é um fenômeno importante, só deve ser admitido dentro de um balizamento legal, lembrando que o sistema administrativo se subordina, dentro dos limites legais, à jurisdição.
Não faz muito tempo que alguns estudiosos do Direito intentaram modificar o art. 204 da Lei dos Registros Públicos, buscando dar caráter jurisdicional à dúvida registral. Diz o dispositivo legal: "A decisão da dúvida tem natureza administrativa e não impede o uso do processo contencioso competente". O referido artigo transcrito deixa bem claro que todo o sistema registral está subordinado à jurisdição e que as decisões judiciais, por mais "incorretas" que sejam, têm plena aplicabilidade em toda a esfera registral. Dar caráter jurisdicional à dúvida registral é criar uma autonomia à administração que ela não tem diante da jurisdição.
A dúvida registral é apenas um mecanismo de depuração da esfera administrativa. Nela, o juiz, investido de função administrativa, decide se o título ingressa ou não no assento registral (registro civil, de imóveis, títulos e documentos, pessoas jurídicas etc.). A parte insatisfeita com a decisão pode retomar a discussão na via jurisdicional. Transformar a dúvida em instrumento de jurisdição é subverter todo o sistema processual, além de trazer, à atividade notarial e registral, um caráter que ela não possui, sendo um aparato fundamental, porém burocrático e de apoio ao Poder Judiciário.
Se não houver uma retomada de rumos, um maior cumprimento às leis e o próprio Poder Judiciário passar a observar estritamente o seu papel, os tempos serão ainda mais trabalhosos, como bem descreve o apóstolo Paulo na epístola a Timóteo, quando se refere ao tempo do fim (II Timóteo 3:1-5).
http://www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI274625,71043-Ativismo+e+desjudicializacao

Intervenção branca: RJ tem atuação das Forças Armadas desde a década de 90

Medidas menores, chamadas de “intervenção branca”, já aconteceram inclusive em outros Estados brasileiros.

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Não é a primeira vez que o Estado do Rio de Janeiro tem as Forças Armadas entrando em cena na segurança pública, embora a intervenção Federal seja a primeira formal desde 1988. Após a redemocratização, com a CF, há registros de que o Rio já experimentou intervenções do Exército, com medidas menores, pelo mesmo motivo: a tensão social na segurança pública.

Na última sexta-feira, 16, Temer assinou um decreto de intervenção Federal que aciona o Comando Militar do Leste (CML) para a responsabilidade do comando da Secretaria de Segurança, Polícias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros e do sistema carcerário no Estado do Rio. O texto já tem a aprovação da Câmara dos Deputados. Com um placar de 340 votos favoráveis, 72 votos contrários e 1 abstenção, o texto seguiu para o Senado Federal.

O CML já apareceu no cenário carioca, em 1993, quando o então governador do Rio de Janeiro, Leonel Brizola, autorizou as ações do Exército no Estado. O estopim do pedido de Brizola aconteceu após um conflito na favela do Coroado, em Acari, que resultou em uma sucessão de chacinas e um embate sangrento entre traficantes e policiais.

A autorização do governador permitia que o exército cedesse armas de alto poder de destruição e oferecesse um treinamento à PM, a fim de que os policiais não ficassem em uma situação inferior aos traficantes.

"A guerra ao crime organizado passa, assim, a ser conduzida por uma força conjunta formada pelo Exército e pelas polícias Militar, Civil e Federal" (trecho retirado da matéria "Brizola autoriza ações do Exército no Estado)
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 1993)

Assim como o decreto de Temer dividiu opiniões sobre a eficácia para a resolução do problema no Estado, o mesmo aconteceu naquela época. Maurício Corrêa, quando ministro da Justiça, defendeu que era necessário evitar ferir a autonomia do Estado. O próprio Itamar Franco, então presidente da República, também tinha ressalvas quanto à medida, mas acabou assinando o convênio.

No ano seguinte, uma nova medida foi tomada. No dia 31 de outubro de 1994, as Forças Armadas foram novamente invocadas para que um general estivesse na secretaria de segurança. O motivo foi similar: um confronto entre policiais e traficantes, dessa vez na favela Nova Brasília, no complexo do Alemão, que ocasionou mais mortes. A atuação do Exército foi do mês de novembro até janeiro.

(Clique na imagem para ver a íntegra)
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 1994)
Os jornais já chamavam a atuação do exército de "Intervenção militar", que inclusive teve apoio da OAB/RJ na época. Em 1994, o Conselho Seccional da OAB decidiu, por unanimidade, apoiar a decretação do estado de defesa no Rio. O apoio veio com um adendo: de que a medida não se transformasse em um pretexto para a violação dos direitos humanos.

"Agora há um clamor público e uma situação sem precedente no Rio, cujo aparato policial não consegue mais fazer-se respeitar." (Presidente da OAB/RJ – Sérgio Zveiter)
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 1994)
Em 2018, 24 anos depois, a OAB/RJ também se posicionou sobre o recente decreto de Temer. Em nota oficial, a seccional do Estado divulgou que vai criar um grupo de acompanhamento da execução da intervenção, a fim de garantir a transparência do processo e o diálogo com a população.

Nota oficial

A intervenção federal no Rio de Janeiro exige profunda reflexão sobre a crise do Estado. E, mais urgentemente, demanda uma linha de ação que atue no sentido de sanar os problemas sociais sem ferir o compromisso com o Estado democrático de Direito.
(...)
Assim, a OAB/RJ convida entidades da sociedade civil organizada para a criação de um grupo de acompanhamento da execução da intervenção federal, a fim de garantir a devida transparência do processo e o diálogo com a população. A primeira reunião de trabalho do grupo, com a presença do presidente do Conselho Federal da OAB, Claudio Lamachia, está prevista para o início de março, tão logo a intervenção seja votada nas duas casas do Congresso Nacional.

Quando Lula era presidente da República, mais uma vez a intervenção federal foi cogitada para atuar no Rio de Janeiro. O ministro-chefe da segurança institucional da época, general Jorge Armando Félix, preparou o plano, mas Lula preferiu agir de maneira menos drástica.

As razões que levaram o ex-presidente a não assinar o decreto são as mesmas que levaram Michel Temer a dizer que vai cessar a intervenção: o impedimento do congresso em aprovar as emendas à Constituição, o que atrasaria o andamento das reformas. Em 2003, a previdência também constava no rol das reformas em andamento.
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 2003)
No restante do Brasil

A segurança pública não é um problema apenas para o Rio de Janeiro. Em 1989, um advogado ingressou com petição na PGR solicitando a intervenção federal no Estado do Rio Grande do Sul. A motivação do pedido foi a greve dos delegados da polícia.
(Fonte: O Liberal, 1989)
Em 1993, o Estado de Alagoas assistiu ao exército intervir na PM. O ato definido por Itamar Franco foi configurado como uma "intervenção branca", aquela que não é a oficial, por meio do decreto, como aconteceu recentemente.

O Estado do Espírito Santo quase chegou a ter uma intervenção federal, em 2002, para combater a corrupção e o crime organizado. O Conselho dos Direitos da Pessoa Humana, do ministério da Justiça, aprovou a decretação de intervenção. Entretanto, o pedido foi arquivado e o ministro da Justiça da época, Miguel Reale Júnior, pediu demissão do cargo. Fernando Henrique Cardoso, presidente da República na época, ao invés de decretar a intervenção, criou uma força-tarefa de segurança pública no Espírito Santo nos moldes do Rio de Janeiro.
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 2002)
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 2002)
Em fevereiro de 2010, o procurador-geral da República da época, Roberto Gurgel, pediu intervenção federal no DF após a prisão do então governador do DF, José Roberto Arruda. Por 7 a 1, o STF rejeitou pedido.
(Fonte: O Estado de S. Paulo, 2010)
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI274670,31047-Intervencao+branca+RJ+tem+atuacao+das+forcas+armadas+desde+a+decada

Jovem com paralisia cerebral é aprovado na OAB

A conquista de Werner de Albuquerque Lopes o deixa mais próximo de seu sonho na magistratura.
terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Werner de Albuquerque Lopes recebeu, nesta semana, a notícia de que é o mais novo advogado do país. A conquista, já tão difícil para muitos estudantes, fica ainda mais especial com o adendo de que Werner teve um obstáculo a mais em seu caminho: o jovem de 26 anos tem paralisia cerebral.


O rapaz de Manaus foi diagnosticado com poliomielite, quando era criança, o que acabou por comprometer o movimento dos membros inferiores. Alguns médicos acreditavam que o movimento das pernas e braços do jovem, além do poder cognitivo, não teriam evolução.
Mesmo com algumas limitações físicas, Werner conseguiu o título de bacharel em Direito em janeiro deste ano, na Uninorte, universidade localizada em Manaus. A cerimônia de colação de grau da turma, foi realizada no auditório da OAB/AM, e houve muita emoção durante o juramento. "Eu juro com toda a minha honra", Werner comemorou com outros alunos.
Ainda na cerimônia, o jovem fez um agradecimento especial ao amigo que o ajudou durante todo o curso. Tiago Cid, o colega do rapaz, comentou que foi uma experiência indescritível ter estudado com Werner. "Por mais que tenha toda a dificuldade locomotora dele, mas é uma pessoa de um coração enorme, de um cognitivo excepcional. Eu que fico agradecido por ele, por ter mandado essa mensagem para mim".
Segundo o depoimento da mãe do rapaz, Werner fazia questão de enfatizar que ele não era diferente dos demais alunos. "Para ele, não tem barreira", comentou Genir de Albuquerque Lopes.
Conforme relatou ao portal G1, o causídico já tem os próximos passos bem definidos: "Meu objetivo é advogar três anos e prestar concurso para a magistratura."

"Aqui está todo mundo feliz e até agora eu ainda estou sem acreditar que eu consegui. Foi suado. Só quem faz sabe o quanto é complicado, mas eu consegui. Vamos comemorar e manter o ritmo de estudos, que não pode parar"
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI274719,81042-Portador+de+paralisia+cerebral+e+aprovado+na+OAB