sábado, 7 de abril de 2018

Contrato oneroso de cessão temporária uterina, por quê não?

Publicado por Sara Próton

Se as coisas são inatingíveis… ora! Não é motivo para não querê-las… - Mario Quintana

Nos últimos anos o planejamento familiar em muito se alterou, tanto no retardamento da concepção dos filhos, quanto pela escolha em não tê-los. Entretanto, a vontade subjetiva de diversos casais caminha em torno da perpetuação dos seus genes, numa espécie de continuidade da própria existência, bem como do amor expandido pelos companheiros.

Biologicamente e por vezes alguma condição física impede a realização do sonho de ter filhos, o que gera frustrações e danos a harmonia conjugal. Em 1963, no Japão, encontram-se os primeiros relatos clínicos sobre o empréstimo de útero, em casos de mulheres com histerectomia decorrente de câncer, mas a cessão uterina se tornou conhecida apenas em 1988, com o caso “Baby M”, que ocorreu nos Estados Unidos. William e Elizabeth Stern, casal de cientistas, assinaram um contrato de locação de útero com Mary Beth Whitehead, cuja valor era de 10.000 dólares somados a 2.000 de despesas. Porém, mesmo diante do contrato, Mary não quis entregar a criança. O casal recorreu à justiça e a sentença lhes foi favorável, porquanto as condições financeiras seriam mais benéficas a criança.

O empréstimo de útero perpassa histórias, épocas, religiões e culturas, até mesmo a Bíblia, no livro de Gêneses retrata esse ajuste, quando Sarai (Sara), esposa de Abrão, pede que Hagar, sua criada, engravide de seu marido, para lhe conceber um filho, por encontrar-se incapaz de gerar. Diversos países, como Israel, Índia, Rússia e Ucrânia legalizaram o empréstimo de útero, enquanto no Brasil, apenas o Conselho Federal de Medicina regulamenta o procedimento, em casos específicos e isento de qualquer segurança jurídica, vez que a lei é omissa.

Mas afinal, o que é a cessão temporária uterina? Também chamada de cessão temporária de útero ou maternidade de substituição, é uma técnica de reprodução humana assistida (RHA) homóloga ou heteróloga, de inseminação artificial ou in vitro (FIV), em que o material genético é implantado na receptora, cujo procedimento é equivocadamente conhecido como barriga de aluguel.
Processo mediante o qual uma mulher gesta embriões não relacionados geneticamente com ela, gerados através de técnicas de fecundação in vitro, com gametas de um casal que serão os pais biológicos. (FINI e DAMOTA, 2003, p. 147)

Existem duas modalidades de empréstimo, na primeira a mulher é a receptora ou portadora, emprestando o seu útero, e na segunda modalidade, é mãe de substituição, pois além de emprestar o útero, cede os seus óvulos, espécie vedada pelo Código de Ética Médica (Resolução CFM 1.358/92, 
IV – DOAÇÃO DE GAMETAS OU PRÉ-EMBRIÕES atualizada pela Resolução CFM 2.168/2017).

A receptora poderá acolher o material genético da mãe, caso ela forneça o óvulo, ou de doadora anônima; o material genético pode ser do pai, ou também de um anônimo; ambos, óvulo e espermatozoide podem ser de anônimos; o material genético pode ainda decorrer de reprodução póstuma(quando colhido antes da morte, desde que autorizada e registrada previamente, a vontade do homem, mulher ou ambos) e inúmeras possibilidades.

Apesar dessas combinações genéticas abundantes, o empréstimo de útero no Brasil tem caráter exclusivamente médico e previsto apenas na Resolução 2.121 de 2015 do Conselho Federal de Medicina. Entre as hipóteses permissivas da citada resolução, encontram-se a infertilidade por ausência de útero congênita ou adquirida, empecilhos uterinos para manter o feto, contraindicações médicas (exemplo, diabetes com alta taxa de glicemia), transmissão de doença grave a criança, incapacidade de findar a gravidez e, dilatado a casais homoafetivos. Restringe ainda, à gratuidade e parentesco entre as partes até o quarto grau (antes da Resolução CFM 2.168/2017, limitava-se ao segundo grau).

Ao caminhar a margem dos parâmetros comuns, diversas discussões e hipóteses são arguidas e poucas são respondidas pelo ordenamento jurídico pátrio. A ausência de regulamentação jurídica, que não acompanha a evolução da biomedicina, permite maiores vulnerabilidades aos casais que anseiam pela chegada do filho, bem como abusos e má-fé pela receptora, o que pode ocasionar aliás, responsabilidade civil do Estado por ato legislativo, quer dizer, omissão legislativa.
Inobstante a validade dos contratos gratuitos, é necessário pontuar que os contratos onerosos são mais seguros para aqueles que os realizam a fim de que os prejuízos sejam evitados, afinal, o legislador quer acautelar quem poderá sofrer um prejuízo injusto e não aquele que eventualmente será privado de um ganho. (FARIAS e ROSENVALD, 2015, p. 239)

O contrato oneroso da cessão temporária de útero viabiliza soluções adequadas quando normatizado, e a sua expansão para outras circunstâncias, por exemplo, mulheres que passaram por abortos anteriores e por traumas e medo de uma nova perda, não querem gerar; histórico familiar de graves desconfortos na gravidez; fobia de cesárea, vez que fisiologicamente não é possível assegurar que o parto será natural; sofrimentos hormonais e sexuais que afligem a vida conjugal do casal durante a gravidez, dentre outros.

Não há que se falar em violação ao princípio da dignidade humana, vez que a onerosidade do contrato não é pela criança, mas pelos infortúnios suportados durante a gestação e a utilização do útero alheio, ou seja, o objeto do contrato é a capacidade reprodutiva. Também não há que se falar em vedação constitucional sob o viés comercial, comparando o empréstimo de útero com a venda de órgão, pois o pagamento é destinado ao serviço de carregar em seu corpo um filho para terceiros, cuja mera utilização não gera problemas, assim como a concordância com contrato continuaria uma faculdade da receptora.
Quanto a não poder haver remuneração pelo aluguel do útero, não podemos comparar a utilização de uma parte do corpo com a doação de um órgão do corpo humano; a simples utilização do útero da mulher saudável não causa problemas, mas a doação de um rim de pessoa viva pode causar problemas no futuro, porque o rim que não foi retirado ficará sobrecarregado, e além do mais, retira-se um órgão de pessoa viva ou morta para salvar uma vida ou amenizar, acabar com o sofrimento de alguém. Já o aluguel do útero é para satisfazer o desejo de um casal, não é um motivo vital, relevante para a saúde de alguém, um casal pode muito bem não ter filhos como também para satisfazer este desejo pagar por isso, ou adotar. (ALMEIDA, 2000, p.105)

A Lei 11.804/2008 assegura a receptora, ainda que gratuita, alimentos gravídicos e auxílio financeiro do casal, logo, não se pode verificar inteiramente o caráter altruísta de toda e qualquer cessão uterina. Qualquer valor recebido é ínfimo perto da alegria de ser mãe, cujo suceder do pagamento é um mero símbolo de gratidão e troca pelos ônus suportados durante meses, com limites e consequências profissionais, alimentares, sexuais, físicas, estéticas, hormonais e psicológicas.
Tal como ocorre em qualquer outra profissão, a locadora do útero seria uma profissional, com direito à recompensa. O fato de a remuneração ser feita no ato de entrega do bebê não significa que o mesmo esteja comprado, é próprio de um serviço com certas especificidades. (HRYNIEWICZ e SAUWEN, 2008, p. 108)

Faz-se mister ressaltar ainda, que o Estatuto da Criança e do Adolescente não proíbe o contrato oneroso de cessão temporária de útero, mas a entrega do próprio filho ou pupilo a terceiro, mediante recompensa (artigo 238, Lei 8.069/90). A natureza jurídica é amplamente discutida, mas o presente contrato, não se encontra entre os de locação e tampouco de comodato.
O princípio da beneficência representa ao mais que o hipocrático primum non nocere, ou seja, o princípio do não maléfico, pois não comporta somente abster-se de prejudicar, mas implica, sobretudo, o imperativo de promover a beneficência. (SGRECCIA, SP, p. 167)

A insegurança jurídica não deve ser aceita, nem a inércia do legislativo um impeditivo à realização de sonhos e efetivação dos direitos reprodutivos, tal qual um fluido planejamento familiar.
Artigo completo pendente de publicação

REFERÊNCIAS:
ALMEIDA. Aline Mignon. Bioética e Biodireito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2000.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Famílias. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2015.
FINI, Paulo; DAMOTA, Eduardo Leme Alves. Útero de Substituição. Reprodução Humana Assistida. São Paulo: Atheneu, 2003
HRYNIEWICZ, Severo; SAUWEN, Regina Fiuza. O direito “in vitro”: da bioética ao biodireito. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008
SPGRECIA, Elio. Manual de Bioética. São Paulo: Layola, 1996

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Adoção: amor puro

Publicado por Guilherme de Souza Nucci

A adoção encontra-se prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, permitindo criar laços jurídicos entre pais e filhos, quando, antes, eram estranhos uns aos outros. Esses laços equiparam, para os fins legais, o filho biológico e o filho adotivo. Então, sob os auspícios da lei, a adoção estabelece liame familiar definitivo entre adotantes e adotados.

Porém, parcela considerável da sociedade brasileira ainda não compreende o ato de adoção. Por isso, surgem questionamentos e conclusões errôneas tomadas por leigos e por operadores do Direito. Pior, ainda, quando os profissionais da psicologia e da assistência social demonstram deficiência nítida para tratar do instituto da adoção.

No mundo extralegal, a adoção deve significar um ato de amor. Puro amor. Adotar como familiar alguém que é estranho significa a abertura de coração para o acolhimento do semelhante com a intensidade dos laços de profundo afeto e carinho. Pais adotivos, no entanto, ouvem, várias vezes, cumprimentos pelo gesto de caridade, referente à adoção. Não se trata de caridade, no sentido estrito do termo, pois se cuida de um ato para a vida toda. Nunca foi uma contribuição temporária ou momentânea a uma instituição assistencial; abrigar em família um ser humano é muito mais que isso.

O segundo equívoco é representado pela insistência de promotores e juízes, cercados de psicólogos e assistentes sociais de curta visão, em manter na família biológica os filhos já rejeitados e abandonados. Há imenso abismo entre pobreza e indiferença; entre incapacidade econômica e abandono. Muitos profissionais das Varas de Infância e Juventude insistem por anos a fio na mantença do laço biológico entre o filho, que já se encontra em abrigo, e o (s) pai (s) que o abandonou (aram) e continuam a manter comportamento estranho e dissociado do ânimo de ter uma família. São pais drogados, alcoólatras, autores de agressões domésticas, ociosos, criminosos, dentre outros fatores, cuja paternidade não lhes representa absolutamente nada de relevante. O filho foi concebido pelo simples prazer sexual momentâneo. De que adianta manter em abrigo uma criança por anos a fio para que o (s) pai (s) seja (m) reeducado (s)? Não se busca o melhor interesse da criança? Esta pessoa quer, como todas, amor e carinho, pouco interessando se tenha origem em parentesco biológico ou legal.

O terceiro engano de quem não compreende a adoção, porque lhe parece algo inusitado e esquisito, é questionar os pais adotivos acerca dos laços mantidos com determinada criança, porque, fisicamente, não se parecem. Perguntam, para saciar pura curiosidade, acerca da origem daqueles laços, algo que não se faz quando há semelhança física. Observa-se que a aparência é mais importante, para muitos, do que o âmago das pessoas humanas.

Outras indagações são também frequentes: “quando terão seus próprios filhos?”; “vocês conhecem os pais verdadeiros?”. Exclui-se a sensibilidade – e até boa educação – para saciar a curiosidade e reverenciar a própria ignorância. Afinal, quem adota já tem o (s) seu (s) próprio (s) filho (s). Os adotantes são os pais verdadeiros; em verdade, ilegítimos passam a ser os biológicos, que abandonaram seu (s) descendente (s). Se haverá uma gestação para o futuro da mãe adotiva é questão concernente à intimidade do casal, desinteressante a terceiros, salvo os que não fazem ideia do que significa uma adoção.

Situação comum é estabelecer a presunção de que a adoção é uma simples alternativa aos casais inférteis; daí por que se costuma dizer que a mãe adotiva, depois de encontrar seu filho pelos laços jurídicos, termina ficando grávida. Seria o mesmo que dizer que a adoção é um eficiente método para sanar defeitos ou falhas de concepção. Seria o mesmo que considerá-la um laço de segunda categoria ou mesmo um instrumento para chegar ao objetivo maior e mais importante: a paternidade/maternidade biológica. Tolice pura. Se alguns adotantes assim agem constituem a minoria esmagadora dos casos de adoção. Quem adota, em primeiro lugar, entregou seu coração ao amor puro e recebe aquele filho com uma alegria imensurável, sem nem mesmo pensar em filiação biológica.

Outros ficam contentes porque determinado casal branco conseguiu adotar uma criança branca e até fisicamente parecida com eles. Soa como um presente, como uma sorte grande. Se o casal branco adota uma criança negra, os que não compreendem o instituto da adoção chegam a questionar, quase impugnando a atitude.

O que dizer dos familiares contrários à adoção? São os avós, os tios, os sobrinhos, os primos, dentre outros. Se os que adotam, seja um casal ou uma só pessoa, estiverem convictos do amor que sentem, a resposta é simples: tolerância e indiferença às críticas. Não nos parece compreensível deixar de adotar porque a família extensa é contrária ao ato. Porém, alguns profissionais de apoio nas Varas da Infância e Juventude levam a sério a oposição feita por outros, que não os candidatos a pais adotivos.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, além de várias outras normas, prevê o célere trâmite processual (prioritário) de casos de adoção. No entanto, nem mesmo as Varas especializadas da Infância e Juventude cumprem a lei. Os processos se arrastam por anos a fio e os laudos e entrevistas são feitas com distância absurda de um para o outro. Ilustrando, casos em que os pais biológicos nem mesmo contestam a ação de perda do poder familiar levam anos para o julgamento final. Primeiro, os juízes querem verificar a perda do poder familiar, com trânsito em julgado (?), em nítida contrariedade à lei, que menciona não haver efeito suspensivo ao recurso interposto contra a sentença de destituição do referido poder familiar. Em segundo, os tribunais demoram a julgar o recurso do pai ou da mãe biológica destituída do poder familiar. Em terceiro, mesmo que finda a longa novela da destituição do poder familiar, inicia-se a via-crúcis da ação de adoção, com mais uma série de exames e exigências.

Os fatos têm demonstrado que o tempo é inimigo das crianças abrigadas; um dia a mais no abrigo significa um dia a menos de amor e carinho. Mas esses elementos parecem não sensibilizar os operadores do Direito, que trabalham nessa área. Os processos envolvendo crianças ou jovens são tratados como outros quaisquer e tramitam em igualdade de condições diante de outros feitos cíveis ou criminais. Uma lástima da realidade brasileira.

Os questionários das Varas da Infância e Juventude não estimulam a adoção por amor, mas por escolha de sexo, cor, estado de saúde e outros tantos requisitos, terminando por significar um autêntico mercado de produtos, pois tudo é selecionável. Os candidatos à adoção podem almejar o bebê perfeito, que, segundo estatísticas, é a “menina branca com menos de um ano de idade e totalmente saudável”. Se possível, “com olhos e cabelos claros”. Este candidato permanece na fila, em primeiro lugar, quando chega a este posto, eternamente, se for o caso; vale dizer, até surgir aquela menina de ouro. O correto seria chegar ao primeiro lugar da fila e, se desprezar a criança que lhe for apresentada, ser deslocado para o final da fila, pois não está adotando, mas escolhendo um filho que possa satisfazer seu ego.

Quem não tem autêntica disposição de adotar, como regra, impõe vários obstáculos e exige muito da criança ou jovem abandonado. Por que tais candidatos mantém a sua preferência para adotar? Simplesmente porque o corpo operacional da Vara da Infância e Juventude não altera seus conceitos primários e antiquados, lastreados na permissão de eleição de um filho. A desculpa é sempre a mesma: para dar certo. Noutros termos, se o candidato à adoção quiser o protótipo do filho adotivo (menina clara e bebê saudável) pode ficar em primeiro lugar da fila do cadastro quantos anos forem necessários.

Há muito erro no contexto da adoção, motivo pelo qual há várias crianças e jovens disponíveis em número menor do que o de candidatos à adoção, algo surpreendente e questionável. Se o número de candidatos é maior do que o de crianças e adolescentes aptos à adoção, a conclusão natural seria o esgotamento integral dos infantes e jovens adotáveis. Mas não é. A permissão à seletividade do ser humano é chancelada pelas Varas da Infância e Juventude, sem encontrar respaldo legal para isso.

Finalmente, o número de crianças e jovens abrigados, distantes da família biológica, mas também distantes de pais adotivos, é imenso. Onde está o ponto errático? Em nosso entendimento, concentra-se em duas bases: a) insistência desmedida e antiproducente de manter os laços biológicos com a família original; b) trâmite arrastado dos processos da infância e juventude, pouco importando o que preceitua a lei.

Como resolver? É preciso uma fiscalização rigorosa das Corregedorias de Justiça e do Conselho Nacional de Justiça, além de haver, em lei, uma responsabilidade pessoal do promotor e do juiz que permitam o prolongamento do andamento dos feitos sem justa causa, evidenciada, comprovada e fundamentada nos autos.

Além de tudo, mudar a mentalidade da sociedade brasileira a respeito da adoção ajudará – e muito – na solução de casos tristes relativos ao abandono sentimental de muitos infantes e jovens.

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Quero pagar, mas não querem receber!

#BreveIntroito - Por Guilherme Aranega (advogado)

INTROITO FÁTICO

Apesar de aparentemente incomum, é sutilmente corriqueiro deparar-se com a situação de dificuldade ou impedimento de cumprir uma obrigação, qualquer que ela seja, de realizar pagamento, entregar ou fazer algo, e até mesmo deixar de fazer (apesar de que bastante abstrato para este último).

No caso de uma obrigação na modalidade de pagamento de quantia ou entrega de coisa (que são os focos deste artigo) destaca-se que, a dificuldade em realizar o pagamento pode gerar certa confusão, com a probabilidade de acarretar em aparência de inadimplemento proposital, ou seja, interesse ou vontade de não pagar, esquiva de cumprimento da obrigação, e ainda locupletamento ilícito.

As consequências podem ser bastante incômodas e até mesmo desastrosas, assim como juros moratórios, correção/atualização monetária, multas, vencimentos antecipados, ações judiciais, entre outros.

As dificuldades ou empecilhos em cumprir com o pagamento podem ocorrer nos seguintes casos:
a) se o credor não puder ou sem justa causa recusar o recebimento;
b) quando o credor obrigado a buscar o pagamento não o faz;
c) credor incapaz de receber, desconhecido, ausente, residir em local incerto ou perigoso e de difícil acesso (alteração de residência por ex.);
d) se ocorrer dúvida quanto a quem deve receber o objeto do pagamento;
e) se pender litígio sob o objeto do pagamento (ex: após o pacto, a coisa em que consiste o pagamento vem a ser disputada, tornando incerto seu destino e propriedade).
Portanto... O QUE FAZER?

Inicialmente procure um advogado capacitado, especialista da área civil, e preferencialmente de sua confiança.

Em segundo plano, a título de solver a indagação acima, tem-se que: a legislação brasileira viabiliza um procedimento por meio de uma ação judicial (processo) que permite resolver todas essas questões e impedir qualquer imputação de mal pagador, o procedimento de Consignação em Pagamento.

Traçam-se abaixo as considerações técnicas básicas do funcionamento.

DA AÇÃO DE CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO (art. 539 a 549 do CPC)

Generalidades: O devedor possui direito ao adimplemento, e não apenas o credor a exigi-lo. Caso existam empecilhos à realização do pagamento caberá a ação em questão.

Hipóteses: art. 335 do CC.
a) se o credor não puder ou sem justa causa recusar o recebimento;
b) quando o credor obrigado a buscar o pagamento não o faz;
c) credor incapaz de receber, desconhecido, ausente, residir em local incerto ou perigoso e de difícil acesso (alteração de residência por ex.);
d) se ocorrer dúvida quanto a quem deve receber o objeto do pagamento;
e) se pender litígio sob o objeto do pagamento (ex: após o pacto, a coisa em que consiste o pagamento vem a ser disputada, tornando incerto seu destino e propriedade).

Função: adimplemento indireto; forma de extinção da obrigação; evitar a constituição em mora; presta-se para pagamento de quantia ou entrega de coisa.

Legitimidade ativa: devedor principal; ou terceiro interessado ou não na extinção da obrigação.

Legitimidade passiva: credor; em havendo mais de um promove-se a ação contra todos.

Competência: o foro competente é o lugar do pagamento. A regra é o domicílio do devedor (art. 327 do CC), mas nada obsta pactuação diversa. Havendo dúvida a quem pagar ajuíza-se no domicílio de qualquer dos réus (§ 4º art. 46 NCPC).

* prestação relativa à imóvel é no local onde se encontra o bem (art. 328 CC), e também para consignação de aluguéis (art. 58, II, Lei 8245/91)

Depósito bancário (Consignação Extrajudicial): de acordo com a lei 8.951/1994, quando se tratar de obrigação pecuniária, é autorizado o depósito bancário/extrajudicial, não necessitando assim de ação judicial para a mesma função da ação de consignação em pagamento (art. 539, § 1º). O credor será cientificado do depósito por carta, se aceitar ou permanecer inerte, o devedor está livre da obrigação. Se recursar deve ser ajuizada a ação de consignação no prazo de 1 mês.

Prestações periódicas: é possível o depósito de valores de acordo com o negócio jurídico que estipulou o pagamento parcelado, não sendo necessário pedido expresso na inicial visto que o negócio jurídico já assim estipula (por meio de contrato ou cheques). Os depósitos das prestações podem ser feitos até 5 dias de seu vencimento.

Procedimento:
- Petição inicial: requisitos do art. 319 NCPC (= 282, CPC-73), devendo conter o pedido de depósito da quantia ou coisa devida no prazo de 5 dias contado do deferimento, e a citação do réu para levantar o valor ou oferecer defesa (art. 542 NCPC); se antes houver sido feito depósito bancário basta a juntada do comprovante.
- Contestação: o prazo segue a regra geral de 15 dias;
> Matérias alegáveis (art. 544 NCPC): a) que não houve recusa ou mora do recebimento (defesa de mérito direta, negando o fato constitutivo do direito do autor - recusa); b) que a recusa foi justa (defesa de mérito indireta, confirma a recusa, mas justifica; Ex: valor incompleto, lugar do pagamento, forma do pagamento); c) que o depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento; d) que o depósito não é integral (deve expressar o valor que entende devido);
- Julgamento antecipado: ocorre no caso de revelia ou aceite do depósito. Procedência do pedido. Condena o réu em custas e honorários (art. 546 do NCPC).

Dúvida quanto a quem pagar art. (547, CPC): é cabível a ação de consignação quando não se sabe perante a quem deve ser cumprida a obrigação. Ex: quando um título cambial venha a sofrer sucessivas transferências e possa causar dúvida; no caso de pagamento a ser feito a herdeiros do de cujus que anteriormente havia pactuado com o devedor (ex: aluguéis). Nestes casos não haverá mora do credor, pois não houve recusa. A dúvida autoriza a ação protegendo o devedor de eventuais riscos de pagamento indevidos, bem como em relação à mora. (Art. 548 NCPC descreve detalhes de procedimento – inciso I combinar com art. 744 e 745 do NCPC).

Insuficiência de depósito (art. 545, CPC): alegada na contestação e verificada a insuficiência o autor terá o prazo de 10 dias para complementar; caso não o faça a sentença será de improcedência do pedido inicial, devendo constar o valor a ser complementado, sendo que servirá de título executivo para o réu; o valor incontroverso pode ser levantado de prontidão pelo réu.

Sentença: declaratória da extinção da obrigação do devedor. A cognição é exauriente e faz coisa julgada material. Cabe apelação no duplo efeito (art. 1012 NCPC)

https://aranega.jusbrasil.com.br/artigos/554757224/quero-pagar-mas-nao-querem-receber?utm_campaign=newsletter-daily_20180406_6930&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Mãe e filha que perderam imóvel por falta de repasse de pensão serão indenizadas

O fato de um homem descumprir acordo de pagar parcelas de financiamento de imóvel à ex-mulher e à filha, motivando o leilão do bem, gera dever de indenizar. Assim entendeu o juiz Renato Antônio de Liberali, da 11ª Vara Cível de Campo Grande, ao condenar um réu a pagar R$ 108,7 mil de danos materiais e R$ 15 mil a cada uma das autoras por danos morais.
Em dezembro de 2001, o antigo casal firmou acordo para pagamento de pensão alimentícia, no qual ele ficaria responsável por arcar com os custos da mensalidade escolar da filha e das prestações do apartamento onde as duas moravam.
Elas alegaram, no entanto, que o homem deixou de fazer os repasses sobre o financiamento. Devido à inadimplência, o apartamento foi levado a leilão e obrigou que mãe e filha desocupassem o imóvel, que valia R$ 95 mil, e se mudassem para São Paulo, gastando R$ 1,7 mil com a mudança e aluguel de outro local, no valor de R$ 400.
Por isso, as duas moveram ação contra o homem, pedindo o pagamento de indenização por danos materiais e morais. O pai foi citado, mas não contestou a ação, sendo decretada sua revelia.
O juiz Renato Antônio de Liberali afirmou que o homem se responsabilizou por arcar com as parcelas do apartamento, mas não cumpriu sua obrigação. Assim, para o julgador, ficou demonstrado o dano material no valor de R$ 95 mil pela perda do bem. Além disso, o juiz entendeu serem válidas as provas dos gastos com mudança e aluguel.
Ele também apontou que a situação gerou “aflição psicológica” às mulheres. “Conforme o relato das testemunhas, as autoras residiam no imóvel do qual foram obrigadas a abandonar. Ou seja, após o inadimplemento por parte do réu, viram-se desabrigadas, o que, por si só, por óbvio, ocasiona abalos psicológicos significativos. Ainda mais no caso dos autos, onde a mãe viu-se em situação de desabrigo acompanhada da sua filha”, disse Liberali.
O juiz também observou que as testemunhas relataram o desespero da mãe ao saber que perderia a residência e informaram que ela necessitou da ajuda de terceiros para sua sobrevivência e da filha.
“O fato ultrapassa o mero aborrecimento, demonstrando abalo psicológico e moral justificando indenização por danos morais”, concluiu. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-MS.
Processo 0001871-72.2011.8.12.0001
Revista Consultor Jurídico, 31 de março de 2018, 8h45

https://www.conjur.com.br/2018-mar-31/mae-filha-perderam-bem-falta-pensao-serao-indenizadas

Fonte da imagem: https://pixabay.com/pt/moedas-saco-de-dinheiro-fortuna-1857222/

Pensão alimentícia e sobre a sua cobrança de acordo com o CPC


Saiba mais sobre a pensão alimentícia e sobre a sua cobrança de acordo com as normas do novo Código de Processo Civil (CPC):http://bit.ly/2kKkqQ5.