sexta-feira, 13 de abril de 2018

A possibilidade de prisão em segunda instância, a decisão do STF e o caso Lula

Pedro Magalhães Ganem - 10 de Abril de 2018 - 6 minutos de leitura

Sei que muitos já falaram sobre esse tema, mas, tamanha sua relevância, impossível deixar de tocar no assunto.

Como devem saber, o STF, em análise ao habeas corpus preventivo do ex-presidente Lula, decidiu ser possível a prisão após decisão em segunda instância.

Antes de prosseguir, preciso ser claro quanto a inexistência de opinião política nesse texto. Não sou adepto a nenhum partido, tampouco simpatizante de algum político. O texto objetiva trazer uma análise acerca da situação jurídica em si e não da situação política do(s) envolvido(s).

Voltando à decisão do STF, trata-se de verdadeira antecipação do cumprimento da pena, realizado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, sob o argumento, dentre outros, de que o STJ e o STF não reanalisam os fatos, não adentrando ao mérito da demanda em si.

Portanto, caso o Tribunal de segunda instância mantenha a condenação de Primeiro Grau, não haveria mais que se falar em reanálise meritória pelas Superiores instâncias, de modo a possibilitar o entendimento de que o réu já seria “culpado”, mesmo sem o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

A presunção de inocência ou de não culpabilidade seria invertida, passando a se presumir, dessa vez, a culpa.

Mas por qual razão é tão importante assim o tal “trânsito em julgado de sentença penal condenatória”?

A nossa Constituição, em seu artigo 5º, inciso LVII, estabelece que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória“.

Logo, em tese, segundo determinação expressa da constituição, a formação da culpa somente poderá ocorrer posteriormente ao trânsito em julgado da sentença e não após o julgamento do recurso pela Segunda Instância.

Além do mais, temos o artigo 283 do Código de Processo Penal, o qual possui o seguinte teor:Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

O CPP, então, não trata da formação de culpa, mas da possibilidade de prisão, sendo claro que a pessoa somente poderá ser presa se for em flagrante ou por decisão da autoridade judiciária competente, seja pelo trânsito em julgado de sentença condenatória (tratando da prisão definitiva) ou no curso da investigação ou do processo (tratando das prisões temporária e preventiva).

O interessante é que o caso do julgamento do STF nos embargos de declaração do ex-presidente Lula não se trata de prisão preventiva, mas de antecipação da prisão definitiva, a qual, como visto, somente poderá ocorrer após o trânsito em julgado.

Fiz menção ao Código de Processo Penal apenas para contextualizar o cenário das prisões no nosso Ordenamento Jurídico, mas o foco é o texto constitucional, pois ao STF cabe a análise da Constituição e não de Leis Federais, como é o caso do CPP, que fica a cargo do STJ.

Assim, temos na Constituição, como já dito, a afirmação de que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória“.

Logo, dois termos chamam a atenção e merecem destaque, quais sejam: “considerado culpado” e “trânsito em julgado“.

O Professor de Direito Penal e Mestre em Direitos e Garantias Fundamentais, Israel Domingos Jorio, em uma publicação na rede social Facebook, de forma brilhante, destaca que:

As dissidências não recaem sobre todas as palavras ou expressões do texto. Restringem-se, na verdade, a dois pontos específicos: “considerado culpado” e “trânsito em julgado”. Logo de início, um maremoto de críticas se abateu sobre a interpretação dada pelo STF porque ele simplesmente teria rabiscado a expressão “trânsito em julgado” e sobrescrito “segunda instância”.

Como, de fato, onde se lê “trânsito em julgado de sentença penal condenatória” ainda não se pode interpretar “decisão condenatória em segunda instância”, o discurso dos defensores da imposição da pena de prisão antes do esgotamento total dos recursos precisou se sofisticar um pouco. A tese que está na moda desvia o foco do “trânsito em julgado” para “será considerado culpado”.

O referido Professor prossegue sua análise:

Dizem, agora, que não está escrito que “ninguém será preso antes do trânsito em julgado” e que não há vedação expressa para a “execução provisória da sentença que impõe pena privativa da liberdade”.

Em suma: por esta linha de interpretação, prender uma pessoa condenada a uma pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado não significa que ela esteja sendo considerada culpada.

Isso é bem questionável, é claro.

Certamente, inocente é que não está. Mas quando se invoca o princípio basilar da presunção se inocência, atrai-se uma saraivada de outras polêmicas, e quero evitar isso.

Diz-se que o princípio não é da “presunção de inocência”, mas da “não culpabilidade”; que a presunção de inocência é relativa e, com condenação confirmada em segunda instância, essa presunção se inverte, embora ainda seja relativa; e que prisão não é incompatível com presunção de inocência, haja vista a constitucionalidade das prisões cautelares.

O que se vê, portanto, é que há uma busca para interpretar a Constituição de acordo com o que nela não está contido. Ou seja, é uma tentativa de adequar o texto, trazendo para ele informações e determinações não contidas, para, desse modo, atender os anseios “populares”.

Só que isso trás um risco incalculável, pois, se podemos “moldar” a Constituição conforme nossa “vontade”, pra que a Constituição? Por qual razão é preciso ter normas se podemos interpretá-las do jeito que achamos conveniente?

A Constituição, ao dizer que “ninguém será considerado culpado” realmente não diz que “ninguém poderá ser preso”, mas é inegável que prender alguém para cumprimento (antecipado) de pena é um dos efeitos da condenação e, consequentemente, de se considerar culpado alguém.

Não só é um dos efeitos como é o principal e mais drástico dos efeitos.

O Professor Israel, com brilhantismo, se manifestou sobre isso:

Em síntese: considerar alguém culpado é dar-lhe o tratamento de “culpado em definitivo”. É aplicar-lhe todos os efeitos da condenação. Se suspendemos todos os efeitos menos gravosos e impomos exatamente aquele que é o principal e mais drástico, é flagrante falácia dizer que o provisoriamente condenado continua a não ser considerado culpado, e que se trata de uma “execução provisória da pena”.

Ademais, é desleal querer comparar a prisão em segunda Instância, como decidido pelo STF no caso Lula, com a execução provisória da pena.

No caso da execução provisória, o réu foi condenado enquanto estava preso provisoriamente. Isto é, respondeu ao processo preso preventivamente, foi condenado, a sua prisão (preventiva) foi mantida, diante do teórico preenchimento dos requisitos legais, e, para evitar que essa prisão seja superior e mais gravosa que a definitiva, passa-se a cumprir provisoriamente a pena, possibilitando, inclusive, a adequação ao regime inicialmente fixado e a progressão para regime mais benéfico.

No caso da prisão em segunda Instância como forma de dar cumprimento (antecipado) à condenação, não há que se falar em execução provisória da pena, pois o réu respondeu ao processo em liberdade, não estando preenchidos os requisitos para a sua prisão cautelar, demonstrando que os dois tipos de “execução da pena” são totalmente diferentes, sendo impossível comparar um com o outro.

É claro que não posso deixar de mencionar que o entendimento que predominou desde a Constituição de 1988 até o ano de 2009 era no sentido de que “A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência (Súmula 9 do STJ).

Todavia, essa era uma visão que não encontrava respaldo na Constituição de 1988, estando engessada e enraizada nas disposições legais anteriores.

Por tal razão, em 2009, no julgamento do HC 84.078, o STF se posicionou pela inconstitucionalidade da “execução antecipada da pena”, adequando-se à Constituição. Vejamos a ementa:HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA "EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA". ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

Por fim, faço minhas as palavras do Professor Israel, concluindo da seguinte forma:

Sinceramente, com o perdão dos colegas criminalistas, não creio que seria absurdo forçar o início do cumprimento da pena após uma confirmação de condenação em segunda instância. Mas isso só seria possível mediante a alteração do texto constitucional. É preciso mudar a Constituição, e não violentá-la para que signifique aquilo que desejarmos momentânea ou casuisticamente. Isso, leitor, é como forçar a cadeira a uivar como o lobo. É como chamar o preto de branco, e vice-versa, na expectativa de que todos os interlocutores (que são titulares da mesma garantia a ser violada, e que, sem saber, não raras vezes a deploram ou reprovam) aceitem com naturalidade uma tomada de decisão que deflui do puro arbítrio de quem a toma. É a definição da arbitrariedade. Enquanto cadeiras não uivam, e enquanto o preto ainda é a ausência de luz, e o branco, a mistura de todas as cores, a antecipação do encarceramento é inconstitucional. Ou aguardamos uma mutação constitucional lenta, talvez quase inexequível, tendo em vista a longitude dos resultados pretendidos pelos que defendem a execução provisória, ou emendamos a Constituição.

Sei que o tema é polêmico e possibilita discussões para todos os lados, mas temos que interpretar a nossa Constituição da melhor forma possível e não conforme nós “queremos” que ela seja interpretada.

Imagem: Heuler Andrey/AFP
Pedro Magalhães Ganem - Assessor de Juíza Criminal (ES)

https://canalcienciascriminais.com.br/prisao-segunda-instancia-stf/

Sírio-Libanês deve indenizar em R$ 577 mil médica acusada de vazar exames de Marisa Letícia

JT também reverteu dispensa por justa causa.

TERÇA-FEIRA, 10/4/2018

A juíza do Trabalho Isabel Cristina Gomes, da 16ª vara de SP, reverteu a justa causa aplicada à médica acusada de ter vazado exames da ex-primeira dama Marisa Letícia e condenou o Hospital Sírio-Libanês a pagar R$ 577 mil de indenização por danos morais à profissional.

A médica foi dispensada em fevereiro de 2017 por supostamente compartilhar dados sigilosos sobre o estado de saúde de Marisa em um grupo de WhatsApp horas depois dela ser internada em São Paulo.

De acordo com a decisão, as informações passadas pela autora ao grupo, formado exclusivamente por médicos, não eram do hospital, não dependiam de acesso ao prontuário ou a outros exames realizados em Marisa, no Sírio-Libanês.

Além disso, segundo a juíza, a imagem do laudo realizado em outro hospital, no qual a ex-primeira dama foi atendida antes de ser encaminhada ao Sírio, já estava circulando em várias redes sociais.

A magistrada afirma ainda que o plantão da médica no dia em que Marisa foi admitida no hospital foi encerrado às 20h, antes mesmo de ser colocado no prontuário dela o laudo e as imagens dos exames feitos, que somente ficaram prontos depois das 22h.

Neste contexto, a juíza também concluiu que, quando das mensagens da médica, o fato de a paciente já estar internada era público, uma vez que o Dr. Kalil, médico de Marisa no Sírio, já havia anunciado à imprensa, por volta das 18h20, que a ex-primeira dama estava no hospital.

Em relação aos danos morais, a magistrada pontuou que houve culpa do hospital ao divulgar de maneira “tão acintosa e imprudente e indevida, a conduta atribuída à autora.”Para ela, era altamente recomendado que houvesse uma investigação mais apurada dos fatos antes de se imputar a culpa à reclamante.

"Um empregador diligente, cuidadoso, teria tomado todas as medidas necessárias para a efetiva e irresistível apuração dos fatos de maneira a não deixar dúvidas sobre a autoria, enquadramento legal da conduta e grau de culpa da autora."

A juíza também explicou que a médica juntou vasta documentação comprovando as ameaças que injustamente recebeu, bem como a enorme repercussão junto à imprensa nacional na época dos fatos.

"Com efeito, a culpa do empregador fica caracterizada pela conduta desidiosa na condução da apuração e divulgação dos fatos, nas notas à imprensa e sendo certo que a reclamada não adotou as medidas que razoavelmente se espera daquele que desenvolve atividade econômica vinculada à saúde, recebendo personagem reconhecidos nacionalmente, como é o caso da ex-primeira dama."

A magistrada declarou a nulidade da rescisão por justa causa, com a reversão para dispensa imotivada e condenou o hospital ao pagamento de verbas rescisórias a serem apuradas em liquidação de sentença e dos danos morais no montante de R$ 577.200,00 (cerca de 20x o salário último da reclamante, R$ 20.862,00).
Processo: 1000590-16.2017.5.02.0023

Migalhas não divulga a decisão na íntegra porque respeita o inexplicável segredo de Justiça que se decretou no feito.

http://m.migalhas.com.br/quentes/278168/siriolibanes-deve-indenizar-em-r-577-mil-medica-acusada-de-vazar

“T.D.A”: e agora, quem poderá nos defender?

Bernardo José Drumond Gonçalves

Essa modalidade de procedimento (T.D.A.) permite que a própria pessoa deficiente tenha a iniciativa de voluntariamente dar vazão a esse tipo de providência, que é revogável (§9º), evitando ter de depender que terceiros o façam, por meio da curatela, na qual, por sua vez, não há coparticipação na definição de algumas questões afetas ao seu direito.

TERÇA-FEIRA, 3/4/2018

De acordo com o artigo 1.783-A do Código Civil, introduzido pela Lei 13.146 de 2015, vulgo Estatuto da Pessoa com Deficiência, a resposta à questão será: quem Você, portador de alguma deficiência, vier a escolher.

Desde que entrou em vigência a referida legislação, está regulamentada a Tomada de Decisão Apoiada (“T.D.A”), um novo instrumento processual por meio do qual as pessoas identificadas com alguma deficiência capaz de obstruir, a longo prazo, sua participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas, podem livremente eleger pelo menos 2 pessoas idôneas, com as quais mantenha algum vínculo e gozem de sua confiança, para lhes prestar apoio na tomada de decisão sobre os atos de sua vida civil.

Conjugado ou não com o "Testamento Vital" – meio pelo qual pode ser antecipadamente prevista a escolha e forma de atuação desses futuros apoiadores, certo é que deve ser apresentado, no pedido da Tomada de Decisão Apoiada, um termo em que constem os limites e condições do suporte a ser prestado e o compromisso dessas pessoas com o deficiente, além de eventual prazo de vigência, direitos e obrigações cabíveis a cada um.

Essa modalidade de procedimento (T.D.A.) permite que a própria pessoa deficiente tenha a iniciativa de voluntariamente dar vazão a esse tipo de providência, que é revogável (§9º), evitando ter de depender que terceiros o façam, por meio da curatela, na qual, por sua vez, não há coparticipação na definição de algumas questões afetas ao seu direito. Ou seja, a legitimidade para propositura desta medida é exclusiva do deficiente – pessoa mais interessada no desfecho do assunto – e consequentemente prejudicial ao pleito formulado por terceiros. Por sua vez, a atuação dos apoiadores também é voluntária e passível de desligamento, por exclusão (§10º).

Decerto que, mesmo sendo requerido pelo próprio deficiente, a participação do representante do Ministério Público deste processo é inafastável, sobretudo em questões conflitantes ou capazes de trazer risco ou prejuízo relevante à pessoa apoiada, assim como de equipe multidisciplinar, a exemplo de psicólogos e médicos, além das pessoas eleitas para o auxílio em questão.

No que disser respeito à repercussão ao direito de terceiros, para que o deferimento dessa medida tenha validade e eficácia, o §4º do referido artigo indica que imprescinde de delimitação expressa das condições correlatas no termo em que se basear o pedido da T.D.A.

Já o §7º traz importante ressalva, no sentido de que, se o apoiador agir com negligência, de forma repudiável (pressionando indevidamente) ou inadimplente quanto às obrigações assumidas, tanto a pessoa apoiada, quanto qualquer outra pessoa interessada poderá acionar por denúncia ao Ministério Público ou, até mesmo, diretamente ao Poder Judiciário. Após exame desse relato, o juiz poderá destituir o apoiador, substituindo-lhe, se houver interesse do apoiado, que deverá ser previamente ouvido. Independentemente disso, o dever de prestar contas compõe o múnus a ser desempenhado pelo apoiador.

A exemplo do que já está consolidado na França com a similar sauvegarde de justice, resta saber se a T.D.A. será utilizada pela sociedade brasileira e como deve ser agasalhada pela jurisprudência pátria.
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*Bernardo José Drumond Gonçalves é sócio do escritório Homero Costa Advogados.

http://m.migalhas.com.br/depeso/277376/tda-e-agora-quem-podera-nos-defender

Fonte da imagem: https://pixabay.com/pt/grupo-pessoa-inclus%C3%A3o-418449/

Matrimônio e união estável celebrados no exterior

Vladmir Silveira

O matrimônio contraído entre pessoas de diferentes nacionalidades, para que goze da proteção do Estado, isto é, dos benefícios daí advindos, precisam observar os requisitos legais.

QUARTA-FEIRA, 4/4/2018

Em um mundo globalizado como o atual, não são somente as barreiras comerciais e financeiras que se abrem. Cada vez mais é crescente a transposição de obstáculos também afetivos. Nesse sentido, nos deparamos com um aumento de casais com diferentes nacionalidades, que almejam o casamento ou a constituição de uma união estável.

Com isso, alguns aspectos precisam de atenção, notadamente porque o matrimônio, aos olhos da legislação vigente brasileira, é um instituto jurídico solene, ou seja, certas formalidades devem ser observadas para validade do ato.

A união estável, por sua vez, é reconhecida tanto pela CF de 19881 quanto pela legislação infraconstitucional2, muito embora alguns doutrinadores e parte da jurisprudência a entenda como uma sociedade de fato regida pelo Direito das Obrigações e não pelo Direito da Família. É, portanto, para estes desprovida da necessidade de requisitos objetivos, apoiando-se em pressupostos de ordem subjetiva, pendentes de produção de provas, tal como, dentre outros, a continuidade e a notoriedade do relacionamento, bem como o desejo de constituir família.

De toda sorte, o matrimônio contraído entre pessoas de diferentes nacionalidades, para que goze da proteção do Estado, isto é, dos benefícios daí advindos, precisam observar os requisitos legais. Consideram-se capazes para o casamento no Brasil, as pessoas que atingiram a maioridade civil, exceto se autorizado pelos pais a partir dos 16 anos de idade (artigo 1.517 do CC).

É imprescindível também a manifestação de vontade dos nubentes de estabelecer vínculo conjugal perante o juiz (artigo 1.514 do CC). Posteriormente, faz-se necessário o registro no cartório competente (artigo 1.536 do Código Civil). Se, por ventura, o casamento de brasileiro for celebrado no exterior, o registro deve ser realizado "perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros", devendo também ser registrado no prazo de 180 dias "contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio ou, em sua falta, no 1° Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir" (artigo 1.544 do CC). No mesmo sentido, o artigo 323 da lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973, que dispõe sobre os registros públicos.

Todavia o aspecto legal mais importante para a validade do casamento, é justamente o registro que imprimirá não somente segurança jurídica ao ato (porquanto dará eficácia do ato no território brasileiro e, via de consequência, produzirá efeitos no país), mas também disciplinará a questão do regime de bens e de sucessão hereditária. Entretanto, há decisões judiciais do TJ/SP que passaram a entender dispensável o registro, argumentando que "é indispensável apenas para a oponibilidade erga omnes do matrimônio, sendo irrelevante – por óbvio – entre os cônjuges, atrelados à sua eficácia inter partes".

Assim, desde que realizado de acordo com as leis locais do país do matrimônio, ainda que sem registro no território brasileiro, o matrimônio realizado no exterior constitui ato jurídico perfeito válido, na qual o cidadão brasileiro será considerado casado e, portanto, não poderá contrair novas núpcias sem antes proceder com eventual pedido de divórcio, sob pena de incorrer em crime previsto no CP4.
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1 Nos termos do artigo 226, § 3° da CF/88, "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento".

2 Com vistas a regulamentar referido artigo constitucional, a lei 9.278, de 10 de maio de 1996 estabeleceu que "é reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família" (artigo 1°). Na mesma linha, o Código Civil prescreveu, em seu artigo 1.723, que "é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família".

3 Dispõe referido artigo que: "os assentos de nascimento, óbito e de casamento de brasileiros em país estrangeiro serão considerados autênticos, nos termos da lei do lugar em que forem feitos, legalizadas as certidões pelos cônsules ou quando por estes tomados, nos termos do regulamento consular".

4 Nesse sentido, o artigo 235 do referido Código prescreve que: "contrair alguém, sendo casado, novo casamento: pena - reclusão, de dois a seis anos. § 1º - Aquele que, não sendo casado, contrai casamento com pessoa casada, conhecendo essa circunstância, é punido com reclusão ou detenção, de um a três anos. § 2º - Anulado por qualquer motivo o primeiro casamento, ou o outro por motivo que não a bigamia, considera-se inexistente o crime".
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*Vladmir Silveira é sócio da Advocacia Ubirajara Silveira.


http://m.migalhas.com.br/depeso/277506/matrimonio-e-uniao-estavel-celebrados-no-exterior

Fonte da imagem: https://pixabay.com/pt/menino-noiva-desenhos-animados-2027880/

Comodato verbal não se sobrepõe a testamento na transmissão de imóvel a descendente

A 11ª câmara Cível do TJ/RJ julgou caso de neta que morava desde 1995 em imóvel deixado informalmente por avó.

TERÇA-FEIRA, 3/4/2018

A 11ª câmara Cível do TJ/RJ negou provimento ao recurso interposto por uma mulher que pretendia continuar morando em imóvel de sua avó herdado por meio de comodato verbal.

A mulher ingressou com ação na Justiça contra o espólio da avó, pleiteando a manutenção da posse do bem. Na inicial, a autora alegou que a transmissão havia sido feita informalmente por meio de comodato verbal e que ela vivia pacificamente no imóvel desde 1995, arcando com todos os impostos e benfeitorias do bem.

Em 1º grau, no entanto o pedido foi negado, em razão da comprovação, por parte de outros herdeiros, da existência de um testamento por escrito no qual não constava o nome da autora como receptora do imóvel. O juízo determinou a desocupação do imóvel no prazo de 30 dias sob pena de expedição de mandado de desocupação e autorização do uso de força policial em caso de descumprimento.

Em recurso ao TJ/RJ, a mulher requereu a anulação da sentença, argumentando que a decisão do juízo violava o direito à moradia, o devido processo legal, a função social da posse e o dever de fundamentação em decisões judiciais, tendo em vista a sua longa posse de boa-fé sobre o imóvel.

Ao analisar o recurso, a 11ª câmara Cível considerou que as provas testemunhais apresentadas pela autora não se sobrepõem ao testamento deixado pela falecida. O colegiado ainda pontuou que através do conjunto probatório analisado pelo juízo de origem, "se conclui que o imóvel objeto da lide foi entregue à demandante em comodato verbal, e se extinguiu com o falecimento da sua avó, então comodante".

O colegiado ainda salientou que a decisão de 1º grau seguiu o entendimento da Corte, segundo o qual a doação de imóvel de elevado valor não é negócio jurídico de forma livre. Com essas considerações, negou provimento ao recurso interposto pela autora e manteve a sentença. A decisão foi unânime.

"Os documentos apontados pela apelante no recurso, assim como a prova testemunhal por ela, não se sobrepõem ao testamento deixado pela falecida, que em sua última vontade, livre e desimpedida, não doou o imóvel à neta, como bem asseverado pelo juízo de origem."

O espólio da avó foi patrocinado na causa pelo advogado Eduardo Augusto Florêncio, do escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha, Lopes e Freitas Advogados.
Processo: 0349680-53.2012.8.19.0001

Confira a íntegra do acórdão.
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http://m.migalhas.com.br/quentes/277692/comodato-verbal-nao-se-sobrepoe-a-testamento-na-transmissao-de-imovel

Acessibilidade: Condomínio é condenado por proibir porteiros de ajudarem moradora que é cadeirante

Ministra Maria Isabel Gallotti, do STJ, manteve danos morais de R$ 20 mil.

QUARTA-FEIRA, 11/4/2018

Um condomínio foi condenado por proibir que porteiros ajudassem uma moradora cadeirante a subir a rampa de acesso aos elevadores. Em decisão monocrática, a ministra Maria Isabela Gallotti, do STJ, manteve os danos morais em R$ 20 mil, além da obrigação da instalação de uma plataforma elevatória para que a moradora, e outras pessoas com necessidade, possam acessar o local livremente.

Em virtude de limitações físicas decorrentes de acidente automobilístico, a funcionária pública faz uso de cadeira de rodas, necessitando de auxilio para acessar os elevadores do prédio. Os porteiros chegaram a prestar auxílio à ela, mas, por uma "questão de natureza privada", foram proibidos após deliberação condominial.

Os moradores alegavam que foram construídas rampas de acesso para os elevadores, e que a cadeirante poderia circular livremente. Contudo, a moradora conta que a rampa foi construída de forma íngreme, sem padrões técnicos específicos, dificultando o acesso e exigindo esforço excessivo.

Princípio da dignidade

Em 1ª instância, o condomínio foi condenado a pagar R$ 25 mil por danos morais, além da obrigação de instalar plataforma elevatória vertical para acesso aos elevadores. A administração condominial recorreu da sentença.

No TJ/MG, o juízo pontuou que o condomínio, ao negar ajuda, violou o princípio da dignidade da pessoa humana assegurado pela Constituição. Entendendo que o valor arbitrado pela sentença era excessivo, o TJ minorou a quantia para R$ 20 mil. O condomínio recorreu ao STJ pleiteando a anulação do acórdão.

Para a ministra Maria Isabel Gallotti, a decisão de origem analisou de forma fundamentada as questões alegadas pela administração condominial, e o reexame da prova seria inequívoco, mediante súmula 7 da Corte.

"Não prospera o pedido de redução do valor da indenização por danos morais, eis que é certo que o STJ considera excepcionalmente cabível o reexame do valor arbitrado a título de danos morais, quando for ele excessivo ou irrisório."

Com isso, manteve dano moral em R$ 20 mil.
Processo: ARESp 1.224.296
Confira a íntegra da decisão.

http://m.migalhas.com.br/quentes/278207/condominio-e-condenado-por-proibir-porteiros-de-ajudarem-moradora-que