quarta-feira, 16 de maio de 2018

Só cabe prisão civil para alimentos oriundos das relações de Direito de Família

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É o descumprimento dos deveres jurídicos de sustento, assistência ou amparo que dá ensejo à pretensão e à respectiva obrigação quanto aos alimentos. Ademais, deve-se observar que os alimentos visam a “preservação do que o Código Civil denomina ‘viver de modo compatível com a sua condição social’, além de atender ‘às necessidades de sua educação’. A separação dos cônjuges e companheiros nunca preserva inteiramente a ‘condição social’, inclusive quanto aos filhos, pois as despesas que antes eram compartilhadas passam a ser assumidas individualmente, o que significa queda do padrão anterior”[1].
O crescimento do número de divórcios e seus variados efeitos evidenciaram a dificuldade de efetivar a regra que obriga os pais a contribuírem, na medida de seus bens e rendimentos, ao sustento da família; mas isso não autoriza dispensar uma distribuição adequada e razoável de tais ônus. Assim, em relação aos pais, tal obrigação de assistência em relação aos filhos menores dá-se sob a forma de uma “solidariedade forçada”, que deve se realçar a partir do divórcio ou da separação[2].
A obrigação de alimentos nasce da lei e pressupõe a existência de laços familiares entre duas pessoas. É por isso que a obrigação de prestar alimentos não é autônoma, porquanto presuma a existência de outro vínculo jurídico[3]. Ovídio Baptista da Silva pondera que a obrigação alimentar normalmente encontra fundamento no Direito de Família, mas pode estar lastreada em relações jurídicas oriundas do Direito das Obrigações ou do Direito Sucessório, como se verifica no tocante aos alimentos indenizatórios, ou ainda de um negócio jurídico inter vivos ou causa mortis[4].
No Direito de Família, inclusive, além dos pais, outros parentes poderão ser obrigados a prestar alimentos a certa pessoa. Institui-se no código uma espécie de ordem, de modo que os demais parentes só poderão ser chamados a prestar alimentos na falta dos parentes inseridos em uma classe anterior. Assim, os avós, por exemplo, só poderão ser obrigados a prestar alimentos caso os pais não o possam fazer. Na prática, é raro que os alimentos sejam exigidos além do primeiro grau na linha direta (ou seja, dos pais).
Essa diversidade de causas para a imputação do dever de prestar alimentos, contudo, também implica na diferença do tratamento jurídico dispensado ao descumprimento dessa obrigação. Somente enseja a possibilidade de execução nos termos do artigo 733 do Código de Processo Civil vigente (ou seja, acompanhada do pedido de prisão civil) a obrigação alimentar nascida das relações de Direito de Família[5]. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já se manifestou diversas vezes pela interpretação restritiva do dispositivo processual, de modo a harmonizá-lo com o artigo 5º, inciso LXVII, da Constituição Federal, pois ele “atinge um direito indisponível do cidadão, a liberdade. Daí podendo ser aplicado, apenas, quando se tratar de alimentos propriamente ditos”[6].
O CPC alude ao cumprimento de sentença ou decisão interlocutória que fixa alimentos (artigo 528). Nesse caso, se “o executado não pagar ou se a justificativa apresentada não for aceita, o juiz, além de mandar protestar o pronunciamento judicial na forma do § 1º, decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses” (artigo 528, parágrafo 3º). Observe-se, pois, que o novel dispositivo faz uso de um expediente adicional à prisão civil por dívida, qual seja, o protesto da decisão judicial. Assim, ainda que a prisão civil não seja efetivada porque o devedor evadiu-se, a decisão judicial ganha efetividade com o registro do protesto, gerando uma restrição para o devedor quanto ao acesso ao crédito.
Quanto ao protesto judicial em questão, destaque-se a lição de Jones Figueirêdo Alves, decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco e renomado civilista: “A providencia de protesto do pronunciamento judicial independerá de requerimento prévio do credor, ou seja, será por ato de oficio; cabendo ao juiz, em tempo imediato ao não reconhecimento de justa causa ao inadimplemento alimentar, determinar o protesto de sua decisão sobre a mora do devedor de alimentos. Por evidente, a providência apresenta-se cogente, não dispondo o magistrado de poder discricionário de não mandar protestar o título obrigacional, para além de a mesma se apresentar cumulativa, isto é, em conjunto com o decreto judicial da prisão civil (artigo 528, c/c o seu parágrafo 3º, CPC)”[7].
Por uma questão de justiça, deve-se ressaltar que tal regramento tem como antecedente o pioneiro Provimento 03/2008, de 11 de setembro de 2008, editado por iniciativa do desembargador Jones Figueirêdo Alves quando de sua passagem pela Presidência do Tribunal de Justiça de Pernambuco[8].
Entendemos que o cumprimento de sentença ou decisão interlocutória que fixa alimentos só poderá ensejar a prisão civil por dívida quanto aos alimentos “propriamente ditos”. Isso por uma questão de interpretação do dispositivo em harmonia com a regra constitucional que restringe o manejo desse expediente jurídico. Assim, o descumprimento do legado de alimentos (artigo 1.920 do Código Civil) não acarretará a possibilidade de prisão civil do herdeiro inadimplente. Também não implicará na prisão civil por dívida o descumprimento do dever de prestar alimentos às pessoas a quem o morto os devia, no caso de homicídio (artigo 948, inciso II, do Código Civil).
Entretanto, encontra-se em uma zona cinzenta a hipótese prevista no artigo 22, inciso V, da Lei 11.340/2006. Esse dispositivo da Lei Maria da Penha relaciona, entre as medidas protetivas passíveis de aplicação pelo juízo diante da denúncia de uma possível prática de violência contra a mulher, a “prestação de alimentos provisionais ou provisórios”. O que poderia ser uma novidade em relação à prisão civil por dívida do devedor de alimentos era a previsão, ainda no projeto de novo CPC, de que o devedor de alimentos, a princípio, deveria cumprir a prisão no regime semiaberto. Somente se houvesse novo aprisionamento é que a prisão deveria observar o regime fechado. A ideia da comissão que elaborou o projeto, ao estabelecer como regra o regime semiaberto, era a de não afastar o devedor de alimentos de suas atividades profissionais, o que poderia acarretar na falta de meios para prover o sustento do alimentando e do próprio devedor e seus familiares. Contudo, tal disposição sofreu oposição da chamada “bancada feminina da Câmara dos Deputados”, por entender que a prisão no regime fechado “busca assegurar o pagamento imediato da pensão”[9]. Por isso, prevaleceu no texto final do novo CPC que “a prisão será cumprida em regime fechado” (artigo 528, parágrafo 4º), sem a alternativa do regime semiaberto.
Como o preso em razão da dívida de alimentos deve ficar separado dos presos comuns, caso não seja possível tal separação, havia previsão no projeto da possibilidade de o devedor de alimentos ficar sob prisão domiciliar. Contudo, por também entender que isso poderia reduzir a efetividade da execução de alimentos, a bancada feminina da Câmara dos Deputados expressou sua oposição a essa medida, de modo que o texto final não contemplou tal possibilidade[10].
Considere-se, ainda, a possibilidade de o executado justificar a impossibilidade de prestar os alimentos, a fim de se eximir da prisão civil por dívida e do protesto judicial. Assim, no prazo fixado pelo juízo para o pagamento do débito (de três dias), poderá o executado apresentar justificativa da impossibilidade de realizá-lo (artigo 528, caput). Todavia, somente a demonstração de fato que importe em impossibilidade absoluta de prestar alimentos justificará o inadimplemento (artigo 528, parágrafo 2º).
Mas frise-se que o comportamento procrastinatório do alimentante, no sentido de dificultar a realização do crédito do alimentando, além de atentar contra a boa-fé processual, poderá caracterizar um indício do crime de abandono material, de modo que o novo CPC estipula que o juízo — verificada a postura procrastinatória do alimentante — deverá comunicar o Ministério Público acerca dos indícios da prática do delito de abandono material (artigo 532).
Ademais, manteve-se a regra segundo a qual o débito alimentar que permite a prisão civil do alimentante compreende as três prestações que antecedem o ajuizamento da execução e as que vencerem no seu curso (artigo 528, parágrafo 7º). Também permanece a regra que fixa o valor da ação de alimentos em um montante equivalente à soma de 12 prestações mensais pedidas pelo autor, valor este que deverá constar da petição inicial ou da reconvenção (artigo 292, III).


[1] LÔBO, Paulo. Direito Civil: Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 346.
[2] CHOQUET, Luc-Henry. La contribution défaillante dans les familles éclatées. In: DEKEUWER-DÉFOSSEZ, Françoise (coord.). L’enfant, la famille et l’argent: Colloque du Laboratoire d’études et de recherché apliquées au droit prive, Université de Lille II. Paris: L.G.D.J, 1991, p. 121-122.
[3] GERALDES, António Santos Abrantes. Temas da reforma do processo civil, IV Volume. Coimbra: Almedina, 2001, p. 100-101.
[4] SILVA, Ovídio A. Baptista da. Curso de processo civil: processo cautelar (tutela de urgência), volume 3. 3 ed. São Paulo: RT, 2000, p. 321-322.
[5] Cf.: COSTA FILHO, Venceslau Tavares. Notas sobre a tutela do direito a alimentos no Código de Processo Civil de 2015. Revista de Direito Civil Contemporâneo, v. 10 (jan.-mar./2017). São Paulo: RT, p. 191-206.
[6] STJ – HC 34.049 – RS – 3ª T. – Rel. min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJU 6/9/2004 – p. 256.
[7] ALVES, Jones Figueirêdo. Novo CPC está mais rígido com devedor de alimentos. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2016-abr-23/jones-alves-cpc-rigido-devedor-alimentos#author. Acesso em: 2 de maio de 2018.
[8] Cf: http://www.tjpe.jus.br/noticias_ascomSY/ver_noticia.asp?id=5526. Acesso em: 2 de maio de 2018.
[9] Disponível em: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/DIREITO-E-JUSTICA/456340-BANCADA-FEMININA-QUER-BARRAR-FLEXIBILIZACAO-DA-PENSAO-ALIMENTICIA-NO-CODIGO-DE-PROCESSO-CIVIL.html. Acesso em: 10 de abril de 2015.
[10] Disponível em: http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/POLITICA/463461-NA-SEMANA-DA-MULHER,-CAMARA-MANTEM-PRISAO-FECHADA-PARA-DEVEDOR-DE-PENSAO.html. Acesso em: 10 de abril de 2015.
Venceslau Tavares Costa Filho é advogado, doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e professor da Faculdade de Direito da Universidade de Pernambuco (UPE) e da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), além de diretor da Escola Superior de Advocacia da OAB-PE.
Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2018, 6h18
https://www.conjur.com.br/2018-mai-12/venceslau-tavares-prisao-civil-nao-pagamento-alimentos
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Pai não pode impedir que filho menor de idade inclua sobrenome do padrasto

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A Lei de Registros Públicos, ao autorizar que enteados adotem o nome de família do padrasto ou da madrasta, não exige que o pai ou mãe biológicos concordem com tal acréscimo. Com esse entendimento, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve sentença que julgou procedente uma ação de retificação de registro civil.
O autor, que é menor de idade e foi representado no processo pela mãe, teve reconhecido o direito de incluir o sobrenome do padrasto. O problema é que o pai registral do menor considerava o pedido descabido, recorrendo contra a decisão da Vara dos Registros Públicos da Comarca de Porto Alegre.
Em razões recursais, ele disse que o juízo não se manifestou sobre o pedido de estudo social no núcleo familiar do menor. Afirmou ainda que não se trata apenas de simples retificação de registro, mas de um clássico caso de alienação parental.
No mérito, sustentou que o filho, pela ‘‘tenra idade’’, não tem discernimento para fazer tal pedido. Assim, somente quando atingisse a maioridade é que poderia manifestar interesse em acrescentar o patronímico do padrasto.
Dispensa de concordância
O relator no TJ-RS, desembargador Rui Portanova, negou a legitimidade do pai registral para figurar no processo, já que os autos não discutem a exclusão do sobrenome dele. ‘‘A lei não fala e nem cogita na necessidade de concordância do pai biológico com tal acréscimo, advindo daí a projeção de que a ele faltaria legitimidade para figurar neste processo, inclusive para recorrer contra a sentença’’, explicou.
Conforme Portanova, também não se pode falar em cerceamento da defesa, já que a pretensão do autor é apenas acrescentar ao nome do apelado o sobrenome do padrasto. E essa possibilidade vem expressa no artigo 57 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973), desde 2009, por mudança fixada pela Lei 11.924.
O relator citou trecho da sentença do juiz Antonio Nascimento e Silva, ao publicar a justificativa do projeto de lei que levou à alteração: a iniciativa, segundo o texto, “vem em socorro daquelas centenas de casos que vemos todos os dias, de pessoas que, estando em seu segundo ou terceiro casamento, criam os filhos de sua companheira como se seus próprios filhos fossem. Essas pessoas dividem uma vida inteira e na grande maioria dos casos têm mais intimidade com o padrasto do que com o próprio pai, que acabou por acompanhar a vida dos filhos à distância. É natural, pois, que surja o desejo de trazer em seu nome o nome de família do padrasto’’.
O voto foi seguido por unanimidade pelo colegiado, em sessão de 8 de março.

Clique aqui para ler o acórdão.
Processo 70075548818
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 12 de maio de 2018, 9h48
https://www.conjur.com.br/2018-mai-12/pai-nao-impedir-filho-menor-inclua-sobrenome-padrasto
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Você já fez o seu contrato de namoro?

Publicado por Andre Sgotti

Imagine a seguinte hipótese: um casal mantém relacionamento amoroso há anos, viaja junto, frequenta bares, restaurantes e eventos familiares e, até mesmo, possui conta conjunta, porém ambos os apaixonados residem em casas separadas e não possuem interesse em constituir um núcleo familiar.

Diante dessa situação, que, por sinal, tem se tornado cada vez mais comum em nossa sociedade em razão dos contornos liberais e revolucionários que as relações de afeto assumiram nas últimas décadas, surge a dúvida se vínculos similares ao da hipótese acima poderiam se enquadrar como união estável.

Ora, esse questionamento é muito pertinente, tendo em vista que a lei não exige prazo mínimo para a constituição de união estável, tampouco a coabitação dos companheiros, fazendo surgir uma zona cinzenta e desconfortável para esses namorados modernos.

Alguns casais, por exemplo, independentes, reconhecidos socialmente como namorados, possuindo domicílios distintos, convivem quase que diariamente sob o mesmo teto, fazendo as refeições juntos e compartilhando parte da rotina diária, mas o envolvimento amoroso se esgota nisso, isto é, não há a menor intenção de constituírem família.

Essa proximidade entre o que se convencionou denominar de namoro qualificado e a união estável causa um sentimento de insegurança, pois, ao contrário do namoro, o segundo instituto, elevado ao posto de entidade familiar pela Constituição Federal, gera efeitos patrimoniais e pessoais.

Sendo assim, receosos de que uma despretensiosa relação de namoro, por mais aberta e liberal que seja, possa ensejar obrigações de ordem patrimonial na infeliz hipótese de rompimento do vínculo afetivo, alguns casais são levados a celebrar um contrato de namoro com a finalidade de afastar essa responsabilização caso uma das partes busque o reconhecimento de união estável perante o Judiciário.

Então você deve estar se perguntando: “O que estou esperando para fazer um contrato de namoro e afastar o risco de que minha relação se transforme em união estável?”

Nessa altura, preciso lhe dizer que tal contrato, por si só, não é capaz de descaracterizar a união estável, haja vista que se trata de uma situação de fato, regulada por normas de ordem pública, ou seja, uma vez que, no caso concreto, o juiz entenda que os requisitos legais (art. 1.723, CC) estejam preenchidos, declarará a união estável, independentemente da existência de um prévio contrato de namoro estabelecendo que o relacionamento não se fundamenta sob o vínculo familiar conjugal.

Agora, você, um pouco confuso e frustrado, faz a seguinte observação: “Sendo assim, desisto de pactuar um contrato de namoro, pois que vantagem teria?”

E eu, como não poderia ser diferente, lhe respondo tecendo algumas considerações.

Pois bem. Sem adentrar nos acirrados debates doutrinários sobre o tema, importa ressaltar que, embora alguns renomados doutrinadores considerem nulo o referido instrumento, ele pode, sim, surtir alguns efeitos práticos, funcionando como importante elemento de prova na descaracterização da união estável alegada pela parte contrária.

Melhor esclarecendo, o contrato de namoro será muito útil na defesa de casos em que existe uma inarredável dúvida, pois, conforme mencionado, atualmente existe uma penumbra na diferenciação entre namoro qualificado e união estável.

Em casos tais, o juiz, em detida análise do caso concreto e somadas outras provas, deverá levar em consideração a boa-fé objetiva dos envolvidos, uma vez que o contrato foi subscrito por partes plenamente capazes no exercício da autonomia privada.

Por fim, vale lembrar que, diferentemente do casamento, a união estável não possui data e hora designadas para sua constituição, ela simplesmente acontece no decorrer do tempo. Por essa razão, não raro, um relacionamento de namoro qualificado evolui naturalmente para uma união estável.

Sendo assim, a fim de eliminar qualquer risco de ingerência estatal no patrimônio caso fique configurado esse estreitamento de vínculo, há quem entenda ser possível que os pombinhos, ao celebrarem contrato de namoro, estabeleçam que, se este namoro vier a evoluir, transformando-se em união estável, esta será regida pelo regime da separação total de bens, ou outro modelo especificado.

Diante disso, sou eu que lhe pergunto – O que você está esperando para celebrar seu contrato de namoro?

Achou interessante? Surgiu alguma dúvida? Descorda do posicionamento adotado sobre o tema? Deixe seu comentário. O Direito nos permite debater ideias.

Publicado originalmente em https://www.linkedin.com/in/andr%C3%A9-sgotti-072091138/

https://andresgoti.jusbrasil.com.br/artigos/577348137/voce-ja-fez-o-seu-contrato-de-namoro?utm_campaign=newsletter-daily_20180515_7070&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Chegou a hora de revisitar a legítima dos descendentes e ascendentes

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O herdeiro necessário é um privilegiadíssimo personagem do Direito das Sucessões, cuja existência impede o autor da herança de dispor integralmente do seu patrimônio, reduzindo ou retirando a quota a que faz jus esse herdeiro privilegiado.
No ordenamento jurídico brasileiro atual, a qualidade de herdeiro necessário encontra-se expressamente atribuída a determinadas pessoas pelo artigo 1.845[1] do Código Civil.[2] Existem, assim, três classes de herdeiros necessários, conforme a ordem da sucessão legítima: a primeira classe, constituída pelos descendentes; a segunda classe, formada pelos ascendentes; e a terceira, integrada pelo cônjuge sobrevivente.[3]
Somente a lei pode retirar esse título privilegiado dos descendentes, dos ascendentes e do cônjuge sobrevivente. Não pode o autor da herança, ainda que proprietário em vida de todo o patrimônio, excluir nenhum desses herdeiros de sua sucessão, salvo nas estreitas hipóteses que autorizam a deserdação.
Herdeiros necessários, reservatários, forçados ou legitimários, ensina Luiz Paulo Vieira de Carvalho, são aqueles que se apresentam “como um sucessor universal privilegiado, por força do ofício de piedade (officium pietatis), isto é, da afeição presumida e do dever de amparo que o autor da herança deve ter em relação a seus familiares mais próximos, aqueles a quem a lei garante uma quota mínima da herança (Princípio da Reserva)”.[4]
Diz a doutrina que o fundamento da legítima está no vínculo familiar e que o princípio da intangibilidade da quota necessária efetiva a especial proteção que o Estado dispensa à família, além de concretizar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade familiar, na medida em que, segundo Ana Luiza Maia Nevares, “preconiza uma distribuição compulsória dos bens entre os membros mais próximos da comunidade familiar, em virtude da morte de um deles”.[5]
A legítima dos descendentes derivaria da obrigação natural dos pais de não deixar abandonados e desarmados no meio da sociedade aqueles a quem deram o sangue e a vida, enquanto a legítima dos ascendentes se assenta na compensação dos sacrifícios feitos com a educação dos descendentes. Itabaiana de Oliveira se refere aos vínculos “que fazem presumir qual seria a vontade do de cujus se tivesse disposto de seus bens, pela afeição e amor que se supõe existirem entre ele e seus conjuntos, e em que se funda a vontade de beneficiar; porque o homem não tem objeto mais amado do que os seus filhos, por ser a sua causa eficiente, nem mais sagrada do que os pais, a quem deve o ser”.[6]
Será que essa é uma realidade atual?[7]
Em tempos de afetos líquidos, de vínculos fluidos e de instituições familiares rarefeitas pela informalidade e pelo descompromisso, ampliar a liberdade testamentária não incentivaria mais uma solidariedade familiar autêntica, fundada no afeto em direção a uma herança conquistada em substituição a uma transmissão hereditária forçada?
Não é de hoje que esse argumento é invocado pela doutrina. Carlos Maximiliano já mencionava que, com o progresso cada vez mais amplamente avassalador do individualismo, a expansão da faculdade de dispor do patrimônio próprio, causa mortis, fortificaria nos progenitores a consciência da responsabilidade pelo futuro dos filhos e que a “limitação demasiada de tal franquia fomenta o egoísmo; tolhida em seus anseios de satisfazer as próprias inclinações e vaidades, a maioria se apressa a despender, indiferente, descuidosa, em vida o produto do próprio labor, e este se torna menos persistente”.[8] Conclui, citando Le Play, que da supressão da faculdade de testar resulta o enfraquecimento dos laços de família e da iniciativa individual.
No Projeto de Código Civil de Coelho Rodrigues chegou a ser proposta a supressão por completo da quota necessária, afirmando-se, entre outros argumentos, ser imoral fazer do filho um credor dos seus pais, pois “tal sistema desmoraliza a autoridade paterna e corrompe a mocidade com o luxo, a inação, o vício” e que ao “limitar a faculdade de dispor do patrimônio, a lei diminui o estímulo para o trabalho, o aperfeiçoamento da produção, a economia”.[9]
É verdade que a grande maioria dos povos ligados ao direito romano-germânico mantém uma quota hereditária destinada à transmissão obrigatória a determinados herdeiros. Mas será que essa realidade não se desgastou em razão da evolução da sociedade e do próprio pensamento jurídico que normalmente lhe vem a reboque? Para Jorge Duarte Pinheiro, em um contexto em que se proclamam os princípios da igualdade de oportunidades e da liberdade de disposição, mostra-se discutível a previsão da sucessão legitimaria. E questiona: “Por que razão uma pessoa está impedida de determinar, de forma relativamente incondicionada, o destino da generalidade dos bens que lhe pertencem? Por que motivo certas pessoas em regra, obtêm forçosamente o direito a adquirirem patrimônio independentemente do mérito e graças a um vínculo familiar (de parentesco ou conjugal) que têm com o de cujus? Não seria suficiente, após a morte do de cujus, uma proteção imperativa da família que se refletisse em obrigações de alimentos exigíveis à herança e em legados legais tendo como objeto a casa de morada da família e o respectivo recheio? Nesta época, em que a riqueza é sobretudo fruto do trabalho e de decisões individuais de aplicação do capital, em que a família perdeu a sua antiga função de unidade de produção, será pertinente entender a sucessão mortis causa como uma contrapartida justa da colaboração prestada pelos familiares ao de cujus na formação do patrimônio”?[10]
A discussão torna-se cada dia mais atual, mostrando-se premente uma reavaliação do instituto, tanto no que se refere a quais membros da família se quer proteger, como aos próprios limites da proteção.
Os pretextos antilegitimistas (desfavoráveis à reserva hereditária) tradicionais, outrora baseados na autonomia da vontade e na concepção individualista do direito de propriedade, se transformaram. De fato, não cabe mais se falar em fortalecimento da autoridade paterna ou em prevalência ilimitada da liberdade de testar, fonte de injustiças e que “pode servir de instrumento de instituições aristocráticas e obsoletas”, como pontua Orosimbo Nonato: “Falso, é, pois, o colorido democrático que se pretende emprestar a um instituto transformável em meio para restauração da grandeza e poderio das classes”.[11]
Os argumentos antilegitimistas hoje são outros. Fala-se em ineficácia, inutilidade e inconveniência da legítima, em razão da transformação sociológica e jurídica da família, da existência de outros mecanismos protetórios da família fora do direito sucessório, a exemplo do direito securitário, da longevidade crescente da população, aliada à queda de natalidade, afastando, progressivamente, a utilidade e a eficácia da legítima em face dos descendentes, que se tornarão herdeiros efetivos normalmente quando já financeiramente independentes e, finalmente, descabendo invocar o princípio de solidariedade familiar em desfavor do autor da sucessão quando os herdeiros legitimários não necessitam daqueles bens para seu sustento.[12]
Refletindo à luz desse novo contexto, poderíamos indagar se a limitação da liberdade de testar, forçada pela intangibilidade da legitima, mantém a sua adesão social? Ou, ainda que a mantenha, se guardaria o mesmo vigor de outrora?
Observa com muita propriedade Oliveira Ascensão que não obstante a função do Direito das Sucessões seja a de servir à continuidade através das gerações, frequentemente a sucessão se traduz em ruptura, fazendo eclodir dramas familiares decorrentes de disputas patrimoniais.[13] Essa realidade de ruptura torna-se especialmente dramática quando as regras legais cogentes se encontram dissociadas dos anseios sociais, afastando-se de uma expectativa geral que concilie a vontade presumida do autor da herança com os interesses e aspirações dos herdeiros.[14]
No Brasil isso ocorre principalmente em relação à chamada sucessão necessária. Entendemos, assim, que o momento atual é de revisitação da legítima. E não apenas a legítima do cônjuge (e eventualmente) do companheiro, foco central das maiores discussões, mas também a legítima dos descendentes e ascendentes.[15]

[1] Artigo 1.845. São herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge.
[2] No código anterior (CC/1916), o título legitimário posto como restrição à liberdade de testar estava previsto no artigo 1.721, com a seguinte redação: “O testador que tiver descendente ou ascendente sucessível, não poderá dispor de mais da metade de seus bens; a outra pertencerá de pleno direito ao descendente e, em sua falta, ao ascendente, dos quais constitui a legítima, segundo o disposto neste Código (arts. 1.603 a 1.619 e 1.723)”.
[3] Já escrevi que que o cônjuge é herdeiro da terceira classe. Apesar de concorrer, nas hipóteses em que a lei estabelece (artigo 1.829, incisos I e II), com descendentes (herdeiros da 1ª. classe) ou com ascendentes (sucessores de 2.ª classe), o cônjuge permanece na 3.ª classe. Concorre excepcionalmente com herdeiros de 1.ª e 2.ª classes, mas é sucessor da 3.ª classe. Quando o Código fala que o cônjuge concorre com descendentes ou com ascendentes é exatamente porque não o considera integrante daquelas classes. “Concurso”, no caso, significa o chamamento de pessoas com qualificações jurídicas diversas (DELGADO, Mário Luiz. Controvérsias na sucessão do cônjuge e do convivente. Uma proposta de harmonização do sistema. In: Mário Luiz Delgado; Jones Figueirêdo Alves (org.). Questões controvertidas no direito de família e das sucessões, vol. 3. São Paulo: Método, 2005, pp. 417-446).
[4] VIEIRA DE CARVALHO, Luiz Paulo. Direito das sucessões. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 464.
[5] NEVARES, Ana Luiza Maia. O princípio da intangibilidade da legítima. In: MORAES, Maria Celina Bodin de. Princípios do direito civil contemporâneo. Rio de Janeiro: Renovar, 2006, p. 538. Segundo a autora não se pode conceber a solidariedade constitucional em seu caráter essencialmente beneficente, não se podendo exigir que alguém sinta algo de bom pelo outro, mas que se comporte como se o sentisse”.
[6] Tratado de direito das sucessões. Vol. II. Da sucessão testamentária. São Paulo: Max Limonad, 1952, p. 625.
[7] No início do século passado, Lacerda de Almeida já contestava a presunção de afeição como fundamento da legítima, ao afirmar que ela “pode ser desmentida pela realidade, nem está nas mãos do legislador suprir de modo completo as intenções do defunto” (LACERDA DE ALMEIDA, Francisco de Paula. Successões. Rio de Janeiro: Typ, 1915, p. 194).
[9] MAXIMILIANO, Carlos. Direito das sucessões, cit., p. 366.
[10] DUARTE PINHEIRO, Jorge. O direito das sucessões contemporâneo. 2ª ed. Lisboa: AAFDL, 2017, p. 178.
[11] Estudos sobre sucessão testamentária. Vol. II. Rio de janeiro: Forense, 1957, p. 367. O autor afirma que esses argumentos servem de motivos a surtos e raptos oratórios, citando a seguinte passagem de Joaquim Costa: “Ao cabo de tantos anos de indecisão e de porfia o fiel da balança pende para a liberdade... Morreu o despotismo e não ressurgirá ao terceiro dia, nem ao terceiro ano, nem ao terceiro século: está chegando ao seu término a generosa cruzada que vai resgatar o sepulcro onde, há tantos anos, jaz oprimia a liberdade”.
[12] Ver, por todos, Ioanna Kondyli, citada por Ana Luiza Maia Nevares (NEVARES, Ana Luiza Maia. O princípio da intangibilidade da legítima, cit., p. 540).
[13] “À volta da herança suscitam-se dramas familiares; assiste-se à dissolução precoce da coesão da família de sangue; e criam-se bloqueios no próprio fluir das relações patrimoniais” (ASCENSÃO, José de Oliveira. O herdeiro legitimário. Texto de conferência proferida em 6.12.1996 no Ciclo de Homenagem ao Dr. João António Lopes Cardoso, promovida pela Ordem dos Advogados do Porto, p. 6 . Disponível em: https://portal.oa.pt/upl/%7B9010dcad-dac4-472e-81e6-a36e1435dbc5%7D.pdf. Acesso: 7.12.2017).
[14] Para Ascensão, “a lei não se mostra adequada para atalhar a este estado de coisas; talvez não esteja sequer interessada em fazê-lo. As soluções mais simples não são facilitadas. Tudo para gáudio da burocracia” (ASCENSÃO, José de Oliveira. O herdeiro legitimário, cit., p. 6).
[15] Na França, a partir da reforma de 2006, os ascendentes deixaram de ser herdeiros necessários.

Revista Consultor Jurídico, 13 de maio de 2018, 8h00
https://www.conjur.com.br/2018-mai-13/processo-familiar-preciso-revisitar-legitima-descendentes
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Declaração de união estável em cartório não prova relação de fato, diz TJ-RS

Por 
A simples existência de uma escritura pública de declaração de união estável é insuficiente para provar que esse tipo de relacionamento ocorreu na vida real. Com esse entendimento, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul rejeitou ação declaratória de reconhecimento de dissolução de união estável que tramita na comarca de Tramandaí, no litoral gaúcho.
O juízo de origem disse que a escritura pública não afirma, automaticamente, a existência do relacionamento. Declarou ainda que o autor, no curso da instrução processual, não conseguiu demonstrar relação capaz de se equiparar a um casamento de fato.
O autor recorreu, afirmando que a ex-companheira se encontra em lugar incerto há pelo menos três anos, desde que abandonou o lar, deixando de comparecer ao cartório para fazer a devida averbação. Assim, como tem novo relacionamento e planeja se casar, precisa do reconhecimento de dissolução.
Embora não tenha filhos ou bens a partilhar, o homem alegou temer que a escritura pública firmada com a ex lhe cause ainda mais problemas, tanto na esfera cível como na criminal.
Sem durabilidade
O desembargador relator Ricardo Moreira Lins Pastl rejeitou os argumentos. Primeiro, porque o reconhecimento da união estável, nos moldes do artigo 1.723, do Código Civil, depende da demonstração de seus elementos caracterizadores essenciais: publicidade, continuidade, estabilidade e objetivo de constituição de família. No caso concreto, entendeu, o relacionamento não foi pautado com essas características.
‘‘É que essa relação, não pode passar despercebido, perdurou por curtíssimo período de tempo, apenas seis meses, conforme afirmado pelo autor na peça inicial, o que, por si apenas, consagra o desatendimento aos pressupostos de durabilidade, estabilidade e seriedade inerentes ao objetivo de constituir família.’’
Em segundo lugar, segundo o relator, a escritura pública de declaração de união estável, por si só, não tem força absoluta de prova. É que seu conteúdo declaratório pode ser desconsiderado quando não retrata a verdade dos fatos ou, mesmo retratando-a, quando estes fatos, como no caso dos autos, não consagram a relação com a natureza pretendida.
‘‘Como é sabido, a declaração, por si mesma, não é bastante à afirmação da relação como união estável, já que união estável é fato, que, repriso, não foi provado durante a instrução do feito, pois, embora instado para tanto, o autor manifestou-se pela desnecessidade de produção de qualquer outra prova’’, declarou no acórdão.
Clique aqui para ler o acórdão.
Processo 073/1.14.0018914-6

 é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 15 de maio de 2018, 8h28
https://www.conjur.com.br/2018-mai-15/declaracao-uniao-estavel-cartorio-nao-prova-relacao-fato
Fonte da imagem: https://pixabay.com/pt/aperto-de-m%C3%A3o-m%C3%A3os-3382503/

Não pagar pensão alimentícia a ex-cônjuge pode dar prisão

“A lei não faz distinção, para fins de prisão, entre a qualidade da pessoa que necessita de alimentos – maior, menor, capaz, incapaz, cônjuge, filho, neto –, mas, tão somente, se o débito é atual ou pretérito”. Com esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decretou a prisão de um homem que se negou a pagar uma dívida acumulada de pensão alimentícia a ex-cônjuge. 

O relator do processo entendeu que, ainda que a mulher seja maior e capaz, possui idade avançada e problemas de saúde, e não teria condições de se recolocar no mercado de trabalho.

🍽️ Saiba mais sobre a decisão: http://bit.ly/SemPensaoComPrisao


https://www.facebook.com/cnj.oficial/photos/a.191159914290110.47167.105872382818864/2043286182410798/?type=3&theater

Punição para quem cometer abandono afetivo

Além dos deveres de sustento, guarda e de educação dos filhos menores, a proposta altera o Estatuto da Criança e do Adolescente para também atribuir aos pais os deveres de convivência e assistência material e moral. Esse aspecto passará a ser considerado nas decisões judiciais de destituição de tutela e de suspensão ou destituição do poder familiar.
O projeto já foi aprovado pelo Senado e está emanálise na Câmara dos Deputados, onde recebeu o número PL 3212/2015. Veja a tramitação:http://bit.ly/2bbSZpN.

https://www.facebook.com/SenadoFederal/photos/a.176982505650946.49197.150311598318037/2193307914018385/?type=3&theater

Empresa de transporte responde por assédio sexual de passageiro, decide STJ

Assédio sexual dentro dos transportes coletivos é caso fortuito interno, de responsabilidade objetiva da transportadora de passageiros. Assim entendeu a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, nesta terça-feira (15/5), ao determinar que a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos indenize em R$ 20 mil uma mulher vítima de ato libidinoso praticado por outro usuário, dentro do trem.
O caso, inédito na corte, envolve uma mulher que sofreu assédio sexual dentro de uma estação, em 2014. Ela contou que “foi importunada por um homem que se postou atrás da mesma, esfregando-se na região de suas nádegas”, e que ao se queixar com o agressor constatou que o homem estava com o órgão genital ereto. A vítima relatou ainda que, por ter reclamado do ato, outros usuários do trem a chamaram de “sapatão”.
CPTM é condenada a pagar R$ 20 mil de indenização a uma mulher vítima de assédio sexual dentro do trem. 
Reprodução
O juízo de primeira instância havia rejeitado o pedido de indenização por danos materiais e morais, por entender que a CPTM não poderia responder por ato praticado por terceiros.
De acordo com a sentença, a transportadora não quebrou nenhum dever de vigilância e segurança e, naquele dia, deteve o autor dos atos após reclamação da vítima e o encaminhou à autoridade policial, conforme boletim de ocorrência. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve o entendimento.
Já a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o dano integra os riscos inerentes ao transporte, mesmo causado por terceiro. É dever da ré, segundo a relatora, zelar pela incolumidade do passageiro, levando-o, a salvo e em segurança, até o local de destino.
“Embora a recorrida – em cumprimento de seu dever – tenha localizado e conduzido o agressor à delegacia, nada mais fez para evitar que esses fatos ocorram. Há uma plêiade de soluções que podem talvez não evitar, mas ao menos reduzir a ocorrência deste evento ultrajante, tais como a disponibilização de mais vagões, uma maior fiscalização por parte da empresa, etc”, disse Nancy. 
Nancy Andrighi afirmou que empresa poderia conter episódios como esse com mais vagões e aumento da fiscalização.
Sergio Amaral
“Mais que um simples cenário ou ocasião, o transporte público tem concorrido para a causa dos eventos de assédio sexual. Em tal contexto, a ocorrência desses fatos acaba sendo arrastada para o bojo da prestação do serviço de transporte público, tornando-se assim mais um risco da atividade, a qual todos os passageiros, mas especialmente as mulheres, tornam-se sujeitos”, afirmou.
A ministra apontou que o assédio sexual tem crescido no estado de São Paulo, conforme dados da Secretaria da Segurança Pública: entre janeiro e dezembro de 2017, houve  aumento de 35% no número de ocorrências registradas, em relação ao mesmo período de 2016.
Problema histórico
A ministra disse ainda ser necessário proteger a “incolumidade físico-psíquica” das mulheres que sofrem assédios em transportes públicos no Brasil. “O ciclo histórico que estamos presenciando exige um passo firme e corajoso, muitas vezes contra uma doutrina e jurisprudência consolidadas. É papel do julgador, sempre com olhar cuidadoso, tratar do abalo psíquico decorrente de experiências traumáticas ocorridas durante o contrato de transporte”, disse Andrighi.
“Atos de caráter sexual ou sensual alheios à vontade da pessoa a quem se dirige – a exemplo de 'cantadas', gestos obscenos, olhares, toques não consentidos, entre outros – revelam manifestações de poder do homem sobre a mulher, mediante a objetificação sexual de seus corpos. Em que pese tenham natureza lasciva, esses atos servem, também, para a reafirmação da masculinidade e poder”, destacou a relatora.
A decisão desta terça-feira foi por maioria de votos. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio Bellizze, presidente da 3ª Turma. 
Clique aqui para saber mais
sobre o TJ-SP, no Anuário da
Justiça São Paulo
.
Questão controversa
A discussão sobre a responsabilidade objetiva do transportador, julgada agora pelo STJ, é recorrente no Judiciário paulista.
Das 16 câmaras do Direito Privado que julgaram recentemente o tema, só 6 reconhecem o dever de indenizar quando isso ocorre, conforme levantamento do Anuário da Justiça São Paulo.
Clique aqui para ler o voto da relatora.
REsp 1.662.551
Revista Consultor Jurídico, 15 de maio de 2018, 15h54
https://www.conjur.com.br/2018-mai-15/empresa-transporte-responde-assedio-passageiro-stj

Destituição do poder familiar em adoção ilegal requer estudo social

A adoção irregular, por si só, não é suficiente para afastar o poder familiar. Nesses casos, é necessário que antes se faça um estudo social para definir qual a melhor solução para o caso, do ponto de vista dos interesses da criança.

O entendimento é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao anular sentença de destituição do poder familiar de uma mãe biológica e do pai registral proferida com o fundamento de que a ocorrência de adoção irregular seria suficiente para a medida. 
O relator do recurso, ministro Moura Ribeiro, afirmou não ser razoável, a título de coibir a chamada adoção à brasileira, retirar uma criança da convivência de seus guardiões de fato desde o nascimento até os seis meses de vida “sem ao menos proceder a um competente e indispensável estudo psicossocial”, sendo que o Ministério Público não apontou a existência de situação de risco ou abandono.
O MP alegou que a condição de pai biológico, declarada pelo pai registral, seria falsa, tanto que ele se recusou a fazer o exame de DNA. O juízo de primeiro grau suspendeu o poder familiar da mãe biológica e do pai registral e determinou que a criança (que vivia com o pai registral e outra mulher) fosse recolhida a um abrigo.
Moura Ribeiro destacou que o estudo psicossocial, como condição prévia para a destituição do poder familiar, não é negado mesmo nos casos de crianças abandonadas em local público ou até mesmo em lixeiras, “de modo que não se poderia negar igual direito no caso em tela, em que a criança não foi simplesmente largada na rua, mas sim entregue para o suposto pai como guardião de fato, para ser cuidada e educada”. A medida de destituição, segundo o relator, pressupõe a existência de um processo com contraditório e ampla defesa.
O voto foi acompanhado pelos demais ministros da turma, com o entendimento de que a ocorrência da adoção irregular não torna a realização do estudo psicossocial, com avaliação de todos os envolvidos, prescindível para a eventual destituição do poder familiar.
Segundo o ministro, o Ministério Público cita de forma abstrata que a mãe biológica não estaria preocupada com a menor, mas não há provas nos autos de tal situação. Moura Ribeiro disse que o trâmite processual demonstra o oposto, ou seja, que a mãe está, sim, preocupada com o bem-estar da criança, pois vem lutando na Justiça para reverter a decisão inicial.
Moura Ribeiro destacou ainda que, à época dos fatos, não havia a Lei 13.509/17, a qual estabelece como uma das causas possíveis para a perda do poder familiar a ocorrência de adoção irregular, nos casos em que os pais escolhem uma nova família para a criança, desrespeitando o cadastro regular de adotantes.
“Por oportuno, cabe frisar que a comprovação da prática da adoção à brasileira tem por consequência, em regra, a possibilidade de condenação penal e a nulidade do registro civil do adotado, mas não a destituição do poder familiar, pelo menos ao tempo do ajuizamento da presente ação”, observou o ministro. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 15 de maio de 2018, 10h50
https://www.conjur.com.br/2018-mai-15/destituicao-poder-familiar-adocao-ilegal-requer-estudo-social