
Pois bem. Nos dias de hoje, mais do que nunca, essa premissa é verdadeira. Desenvolveu-se apenas uma teoria para explicá-la, que fundamenta as várias outras hipóteses já estudadas: a teoria do risco. Aliás, das modalidades de responsabilidade civil já previstas no antigo Código de 1916 e repetidas no de 2002, reside aqui a maior das mudanças empreendidas pelo novo código. Veja-se a redação do art. 1.527 do CCB/1916, verbis:
O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar: I – Que o guardava e vigiava com o cuidado preciso; II – Que o animal foi provocado por outro; III – Que houve imprudência do ofendido; IV – Que o fato resultou de caso fortuito, ou força maior.
Como explica CAVALIEIRI (op. cit., pp. 158-9), o dispositivo dividia a doutrina:
Para alguns autores, a responsabilidade pelo fato do animal é objetiva, fundada na teoria do risco (...). Nos termos do art. 1.527 do Código Civil, todavia, não há dúvida de que a nossa lei, fiel ao sistema subjetivo por ela adotado, consagra uma presunção de culpa in vigilando ou in custodiando. E assim é porque esse dispositivo permite ao dono ou detentor do animal elidir a sua responsabilidade provando que o guardava e vigiava com cuidado (...). Em que pese à grande autoridade dos autores que sustentam haver, aqui, responsabilidade objetiva, para onde caminham, aliás, a doutrina e a legislação dos outros países, à luz do Código Civil essa posição é insustentável enquanto não houver uma mudança em nossa legislação (...).
A responsabilidade pelo fato do animal, no novo código, foi colocada na seguinte redação (art. 936 do CCB/2002), simples e direta: “O dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior”. Desta forma, não há mais o que discutir: trata-se de genuína hipótese de responsabilidade objetiva, cuja obrigação de reparar o dano só se esvairá, para o guardião do animal, se incidente alguma das excludentes de responsabilidade, como força maior ou culpa exclusiva da vítima. Não o havendo, seu dono ou detentor responderá, sem que se cogite de culpa, ainda que presumida.
Sobre a responsabilidade pelo fato do animal, diz PAMPLONA (2009, pp. 169-72, passim):
Imagine, a título de ilustração, um pitbull solto – aquele simpático cãozinho cuja dentada equivale a algumas toneladas de pressão – que ataca uma criança, causando-lhe lesões irreparáveis (...). A responsabilidade pelos danos causados pela coisa ou animal há que ser atribuída àquela pessoa que, no momento do evento, detinha poder de comando sobre ele (...). Partindo-se da teoria do risco, o guardião somente se eximirá se provar quebra do nexo causal em decorrência da culpa exclusiva da vítima ou evento de força maior, não importando a investigação de sua culpa (...).
A rigor, a responsabilidade civil pelo fato do animal deveria ser estudada na responsabilidade civil pelo fato da coisa, como uma modalidade desta, pois coisa, para o Direito, pode ser animada (ou semovente) ou inanimada. Animal não se dota de vontade, sendo coisa, no mundo jurídico. Maria Helena DINIZ assim entende, e estuda o fato do animal como hipótese do fato da coisa, em sua obra (op. cit., pp. 529 e 550).
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VERÇOSA, Alexandre Herculano. Responsabilidade civil do Estado e de particulares em acidentes de trânsito provocados por animais. Análise da doutrina da responsabilidade civil e apanhado da jurisprudência nacional . Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3194, 30 mar. 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21387>.

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