A nova redação dada à Constituição Federal de 1988, com a Emenda do
divórcio, ocasionou a extinção tanto das causas subjetivas (culpa)
quanto das objetivas (lapso temporal), no que diz respeito ao divórcio.
Não obstante, segundo Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 580),
“a culpa permanecerá em seu âmbito próprio: o das hipóteses de anulabilidade do casamento, tais como os vícios de vontade aplicáveis ao casamento, a saber, a coação e o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge”.
Por conseguinte, afora essas hipóteses em que a culpa subsistirá, o
Estado não poderá mais interferir na vida privada das famílias
brasileiras, no que diz respeito à intimidade do casal que pretende se
divorciar, ou, em outras palavras, saber qual o motivo, bem como quem
deu causa ao divórcio.

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - SENTENÇA PROLATADA APÓS A EC Nº 66/2010 - EXTINÇÃO DO VÍNCULO CONJUGAL E REALIZAÇÃO DA PARTILHA DE BENS - PLEITO DE ALIMENTOS INDEFERIDO POR ALEGADA INCOMPATIBILIDADE DE PROCEDIMENTO - INSURGÊNCIA DO VARÃO, QUE AFIRMA TER DEPENDIDO ECONOMICAMENTE DA EX-ESPOSA NO PERÍODO DE 40 (QUARENTA) ANOS EM QUE PERMANECERAM CASADOS, NÃO POSSUINDO CONDIÇÕES DE ATUALMENTE PROVER O SUSTENTO PRÓPRIO - CASAL SEPARADO DE FATO POR LAPSO SUPERIOR A 4 (QUATRO) ANOS - POSSIBILIDADE DE A VERBA ALIMENTÍCIA SER FIXADA NA AÇÃO DE DIVÓRCIO - PRECARIEDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO APRESENTADO NA ESPÉCIE - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO BINÔMIO NECESSIDADE-POSSIBILIDADE - INEXISTÊNCIA DE CONTROVÉRSIA ACERCA DE QUE O RECORRENTE ERA QUEM FAZIA AS TAREFAS DOMÉSTICAS E CUIDAVA DA PROLE, ENQUANTO A CÔNJUGE VIRAGO EXERCIA ATIVIDADE REMUNERADA - ALEGAÇÃO DA RECORRIDA NO SENTIDO DE QUE O EX-CONSORTE TRABALHAVA NO COMÉRCIO INFORMAL DE COISAS E ANIMAIS, AUFERINDO, AINDA, COM EXCLUSIVIDADE, O FRUTO DA LOCAÇÃO DOS BENS AMEALHADOS NA CONSTÂNCIA DO CASAMENTO - DÚVIDA QUANTO AO MEIO DE SUBSISTÊNCIA DO APELANTE NO PERÍODO DA SEPARAÇÃO DE FATO - PRETENSÃO QUE DEVE SER RENOVADA EM PROCEDIMENTO AUTÔNOMO, ACOMPANHADA DA RESPECTIVA PROVA - SENTENÇA REFORMADA ANTE A VIABILIDADE DA CUMULAÇÃO DO PEDIDO DE DIVÓRCIO E ALIMENTOS - PLEITO EXAMINADO EM GRAU RECURSAL, MAS, CONTUDO, JULGADO IMPROCEDENTE - RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Após a alteração promovida pela Emenda Constitucional 66/2010, o divórcio passou a constituir rompimento do vínculo da sociedade conjugal independente da discussão de culpa pelo fim do relacionamento afetivo, dispensando-se o prévio afastamento dos consortes e, inclusive, anterior declaração judicial acerca da respectiva dissolução, de modo que não há impedimento para que, juntamente com a partilha de bens e definição da guarda dos filhos, seja fixada obrigação alimentar em benefício do cônjuge que fizer prova do seu estado de necessidade, desde que igualmente demonstrado que aquele contra quem se formula o pedido pode responder pelo encargo sem prejuízo do seu sustento próprio ou de seus familiares. (TJ/SC, 696740 SC 2011.069674-0, Relator: Luiz Fernando Boller, Data de Julgamento: 24/02/2012, Quarta Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação Cível nº , da Capital / Estreito).
Como se pode observar, o caso supracitado se trata de um cônjuge varão
que dependia economicamente do cônjuge virago, situação esta incomum no
Brasil, tendo em vista a sociedade ainda ter resquícios de machismo e
patriarcalismo. Dessa forma, após a dissolução do vínculo matrimonial,
aquele solicitou judicialmente alimentos a seu favor, independentemente
de discussão a respeito de culpa, sendo necessário, somente, a
demonstração do binômio necessidade-possibilidade.
Assevera-se que, doutrinariamente, a maioria dos autores defende que a
Emenda do divórcio revogou tacitamente os dispositivos que versavam a
respeito da culpa no Código Civil de 2002, quais sejam: o art. 1.702 e
1.704. Não obstante, com fulcro no artigo 1.708 do referido código, se o
credor contrair novo matrimônio, união estável, concubinato, ou mesmo
se tiver qualquer procedimento indigno em relação ao devedor,
cessar-se-á seu direito de receber os alimentos.
Quanto aos filhos, deve-se alegar, contudo, que o divórcio não vai
modificar em nada a prestação alimentícia devida a eles, mantendo,
estes, o direito ao seu recebimento, bem como não se modificará a
relação entre pais e filhos, como se encontra expresso no artigo 1579 do
Código Civil de 2002, in verbis: “o divórcio não modificará os direitos
e deveres dos pais em relação aos filhos”. Uma das principais
justificativas para isso seria que os filhos não podem ser prejudicados
por atos que dizem respeito apenas a seus pais. Em outras palavras, as
consequências decorrentes do divórcio devem atingir apenas os
ex-cônjuges, não sendo motivo, porém, para quebra de vínculos familiares
entre pais e filhos.
No contexto do divórcio, deve-se ressaltar que a extinção do
pressuposto “culpa” na decretação daquele e dos alimentos dele advindos,
portanto, tem como uma das finalidades diminuir a interferência do
Estado no âmbito familiar, resguardando, assim, o direito à intimidade e
à privacidade do casal em litígio, não sendo mais necessário expor
motivos ao rompimento matrimonial em juízo.
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