terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Breve histórico da união estável

A relação de convivência extra matrimonial entre pessoas de sexos diferentes sempre existiu nas sociedades.
A propósito, o casamento formal no Brasil remonta ao ano de 1.890, quando foi instituído através do Decreto nº.181, de 24 de janeiro de 1.890. A partir daí passou o casamento civil a ser o único meio de constituição de família legítima.
As uniões de fato eram desprezadas pelo direito, sendo, inclusive, tratada pelo Código Civil revogado, Lei nº. 3.071/1.916, apenas com o objetivo de proteger a família constituída pelo casamento formal, como são exemplos: art.248, inciso IV(que legitima a mulher casada para reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos pelo marido à concubina), art. 1.177 (proíbe a doação do cônjuge adúltero ao seu cúmplice) e art.1.719, III (impede que a concubina seja nomeada herdeira ou legatária do testador casado, ou o concubino de testadora casada) etc.
Anteriormente ao casamento formal, a união entre um homem e uma mulher reconhecida pela sociedade era aquela formada pelo casamento religioso, uma vez que era considerado pela Igreja Católica como um sacramento, sendo esse o ensinamento doutrinário que pregava.
Após o advento do Decreto nº. 181/1.890, que estabeleceu o casamento formal, tanto as famílias que eram constituídas por mera convivência duradoura dos cônjuges, bem como as famílias que se formavam pelo casamento religioso eram consideradas como famílias compostas por concubinos, tidas como famílias ilegítimas.
Com o passar do tempo, a jurisprudência brasileira passou a reconhecer a existência no mundo jurídico daquela relação de convivência entre o homem e a mulher não impedidos de casar, que era o considerado “concubinato puro”.
Pacificando a jurisprudência, o Supremo Tribunal Federal acabou editando quatro súmulas a respeito dessas relações não formais como o casamento, mas sem impedimento para a sua realização. São as súmulas número: 35; 380; 382 e 447.[2]
A Súmula nº. 35 previa o direito da concubina, em caso de acidente do trabalho ou de transporte, ser indenizada pela morte do amásio, se entre eles não havia impedimento para o matrimônio.
A Súmula nº. 380 trata da dissolução da sociedade de fato, reconhecendo direito à partilha dos bens adquiridos na constância da união e pelo esforço de ambos os conviventes, como segue: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.
A Súmula nº382 trouxe inovação na relação concubinária, ao estabelecer que a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é elemento essencial à caracterização do concubinato.
Por fim, a Súmula 447, cujo teor é: “É válida a disposição testamentária em favor do filho adulterino do testador com a sua concubina”.
No período intermediário entre a edição do Código Civil Revogado (1.916) e a entrada em vigor da Constituição de 1988, decretos e leis foram editados, que, de alguma forma, davam destaque ao concubinato.
Exemplo disso: o Decreto-Lei nº. 4.737, de 24 de setembro de 1942, que permitiu o reconhecimento dos filhos “naturais” ou “ilegítimos” após o desquite; a Lei nº. 883, de 24 de outubro de 1949, que ampliou as hipóteses de reconhecimento de filhos “ilegítimos”, em qualquer caso de dissolução da sociedade conjugal; a Lei nº.5.890/73, que atribuiu redação ao inciso I do art.11 da Lei Orgânica da Previdência Social – LOPS, Lei nº.3.807, de 26/08/1.960, incluiu a companheira mantida há mais de cinco anos como dependente dos segurados da previdência social urbana; a Lei n. 6.515/77, cujo art. 51 atribuiu nova redação ao art.1º da Lei nº.883, possibilitou o reconhecimento de filho havido fora do casamento durante a vigência da sociedade conjugal, desde que se fizesse por intermédio de testamento cerrado, aprovado antes ou depois do nascimento do filho e, nessa parte, irrevogável; a Lei nº. 6.015/73 (art.57 e parágrafos), com redação da Lei 6.216/75, atribuiu direito a concubina de adotar o nome do companheiro com vida em comum por, no mínimo, cinco anos, ou se houver filhos em comum, desde que haja impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de qualquer das partes ou de ambas; Lei nº. 4.069/62, cujo artigo 5º, §§ 3º e 4º previu que a concubina seria a beneficiária da pensão deixada por servidor civil, militar ou autárquico, solteiro, desquitado ou viúvo, que não tenha filhos capazes de receber o benefício e desde que haja subsistido impedimento legal para o casamento; Lei nº. 4.284/63, onde a concubina seria beneficiária de congressista falecido no exercício do mandato, cargo ou função; Lei nº. 4.103-A/62, que a concubina fosse beneficiária de advogado; a Lei nº. 7.087/82 que regulamentava ser a companheira dependente do segurado perante o Instituto de Previdência dos Congressistas - IPC; o Decreto nº. 73.617/74, que estabeleceu ser a companheira dependente do trabalhador rural; e a Lei nº. 7.210/84, que instituiu a Lei de Execução Penal, permitiu o direito de visita pela companheira ao preso e autoriza este a sair do estabelecimento em caso de falecimento dela.
Finalmente, após o advento da Carta Política Pátria, que reconheceu a união extra matrimônio como entidade familiar, batizando-a de União Estável e elevando-a ao patamar de entidade familiar e após, a edição da Lei n. 8.971/94, que regula o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão, cujo art. 1º concedeu à companheira ou ao companheiro, na união estável (concubinato puro), após a convivência de cinco anos ou a existência de prole, o direito a alimentos, nos moldes da Lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade, iniciando, assim, os efeitos patrimoniais da união estável.
No campo doutrinário, Maria Helena Diniz (2003: p.109-116), ao tecer comentários acerca do §3º do art.226 da CF/88, afirma que a citada norma constitucional não teria eficácia imediata, portanto, é norma com eficácia relativa complementável de princípio institutivo, sendo que esse princípio seria o de que a união estável é entidade familiar. Logo, não é auto - aplicável. É norma cuja aplicação depende de outra posterior, que dê corpo à instituição a que aquela se refere. Para a renomada autora, enquanto a norma posterior não for editada, a norma constitucional não produz efeitos positivos, mas apenas paralisa os efeitos de normas contrárias a ela.
E regulamentando o §3º do art.226 da Lei Máxima Pátria, foi editada a Lei n. 9.278/96 que passou a estabelecer um regime de bens básico para as uniões estáveis, adotando o regime semelhante ao da comunhão parcial, em que os companheiros amealhavam um patrimônio comum, sendo presumida a colaboração mútua durante a união. O artigo 5º dessa lei estabelece que em não havendo estipulação em contrato escrito, os bens móveis e imóveis adquiridos, onerosamente, por um ou por ambos os concubinos durante a convivência, são considerados fruto do trabalho e da colaboração comum, pertencendo a ambos, em condomínio e em partes iguais, mas para isso, a união tem que ser duradoura, notória, pública, contínua e tenha sido estabelecida com objetivo de constituição de família. O parágrafo único desse dispositivo concede ao companheiro sobrevivente o direito real de habitação, relativamente ao imóvel destinado à residência da família, porém, passando a ser extinto referido direito quando o seu titular contrair nova união ou se casar.
Ainda essa última lei editada em 1.996 veio atribuir aos conviventes/companheiros idênticos direitos e deveres como no casamento formal, quais sejam respeito e consideração mútua, a assistência moral e material recíprocas, a guarda, o sustento e a educação dos filhos comuns, de forma partilhada.
Como a Lei nº.9.278/96 veio para regulamentar o §3º do art.226 da CF/88, o seu artigo 9º estabelece a competência para julgar as questões relativas ao concubinato, como sendo das Varas de Família, admitindo que possa ser adotado o segredo de justiça, modificando o art.155, inciso II do Código de Processo Civil.
Essa Lei nº. 9.278/96 gerou controvérsia por haver redefinido a união estável sem ter atribuído lapso temporal ou exigir a existência de prole para o seu reconhecimento, diferentemente do que estabelecia a Lei nº. 8.971/94, no seu art. 1º. Como se percebe a modificação veio a revogar o art. 1º da Lei nº. 8.971/94 e, por conseguinte, resultou em que a caracterização da união estável dependa das circunstâncias do caso concreto.
Tem-se conhecimento de que, após a edição dessas leis, foi criado um Projeto de Lei, n. 2.686 de 1996, Estatuto da União Estável, de autoria do então Ministro da Justiça, Nelson Jobim, objetivando sistematizar a União Estável, entanto foi vetado.
No art.1º do referido projeto, estava estabelecido que: “É reconhecida como união estável a convivência, por período superior a cinco anos, sob o mesmo teto, como se casados fossem, entre um homem e uma mulher, não impedidos de realizar matrimônio ou separados de direito ou de fato dos respectivos cônjuges.” Tal norma, sendo de caráter geral, deveria se sobrepor ao Código Civil Brasileiro.
Hoje, a mais recente norma legal que regula a União Estável é o Novo Código Civil com vigência a partir de 01/01/2003, que dedicou o Título III exclusivamente à União Estável dentro do Livro IV - Do Direito de Família, regulando-a na forma da Carta Política Pátria e da Lei nº. 9.278/96.
O art.1.723 do Código Civil reconhece como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir uma família, não se configurando, no entanto, se presentes os impedimentos legais do casamento, aqueles previstos no art.1.521 da Lei Civil, excetuando-se o caso em que a pessoa casada se ache separada de fato ou judicialmente.
Como na Lei nº.9.278, o art. 1.724 do Código Civil enumera os deveres recíprocos aos companheiros, que são os deveres de respeito e assistência, e o de guarda, sustento e educação dos filhos, inovando com o dever de lealdade, que nada mais é que a fidelidade estabelecida no inciso I do art.1.566 do Código Civil como um dever do casamento.
Em relação aos efeitos patrimoniais decorrentes da União Estável, o art.1.725 do CC estabelece o regime de comunhão parcial de bens, onde serão partilhados entre eles os bens adquiridos durante a constância, ressalvando o caso em que haja contrato escrito pelos companheiros.
Seguindo as prescrições constitucionais do §3º do art.226 da Constituição Federal/88, o art. 1.726 do CC dita que a união estável possa ser convertida em casamento por meio de pedido formulado pelos companheiros ao juiz, como o respectivo assento no Registro Civil.
Por fim, encerrando os regramentos acerca da União Estável, o art. 1.727 do Novo Código Civil diferencia a união estável do concubinato, que era denominado pela doutrina de “concubinato impuro”, estabelecendo que as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato, portanto, não constituem união estável.
De todo o exposto, conclui-se que para a União Estável se configurar é mister que estejam presentes requisitos como a união entre homem e mulher, que ambos convivam, portanto, o dever de coabitação, que também existe no casamento, embora a doutrina e a jurisprudência admitam domicílios separados, a teor do disposto na Súmula nº382 do STF, ao estabelecer que a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é elemento essencial à caracterização do concubinato, e que essa convivência seja pública, contínua e duradoura.
Ressalte-se que a doutrina majoritária admite que a coabitação é elemento essencial para a configuração da união estável, uma vez que esta deve ter aparência de casamento, embora não negue eficácia à citada Súmula 382, refletindo uma situação de exceção.
Encerrando o tema, o que se percebe é que a corrente mais literal de interpretação da união estável exige três condições básicas para a sua configuração: a notoriedade, a fidelidade e a continuidade da relação.

SILVA, Ivete Sacramento de Almeida. A sentença declaratória de união estável como prova plena da condição de dependente perante a previdência social. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3479, 9 jan. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23422>. Acesso em: 12 fev. 2013.

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