sábado, 7 de março de 2020

Idade núbil


Segundo os juristas Pablo G. Stolze e Rodolfo Pamplona Filho em sua obra "Manual de Direito Civil - volume único" (2017, p.1.113):

"Quando ainda estão na faixa da incapacidade relativa (entre 16 anos completos e 18 anos incompletos), os nubentes necessitam da autorização dos seus representantes legais ou, se for o caso, do próprio Juiz de Direito para casar.

A autorização parental é conjunta, ou seja, dada pelos pais, ou por um deles na falta do outro (se um dos genitores é falecido, por exemplo).

Já a autorização judicial poderá ser necessária, se houver divergência entre os pais, a teor do já transcrito parágrafo único do art. 1.517.

 Caso um deles ou ambos deneguem a autorização, nada impede, a teor do art. 1.519 do CC/2002 176, o recurso à via judicial, para o suprimento do consentimento, havendo justificativa razoável, podendo o procedimento ser instaurado, em nosso sentir, pelo próprio Ministério Público, a pedido dos nubentes incapazes (que não teriam capacidade processual para iniciar, sozinhos, a postulação).

Importante aspecto a ser considerado ainda é que, a teor do art. 1.518 do CC/2002 177, até a celebração do casamento, podem os pais, tutores ou curadores revogar a autorização dada. Cuida-se, pois, de um direito potestativo, cujo exercício encontra o seu termo final no momento da formalização do ato.

Vale também registrar que, na forma do art. 1.537 do CC/2002, o “instrumento da autorização para casar transcrever-se-á integralmente na escritura antenupcial”, preceito legal que mantém a diretriz do sistema anterior.

A partir dos 18 anos, finalmente, por haver sido atingida a maioridade, não se exige mais, por óbvio, autorização alguma." 

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Equiparação do casamento religioso ao civil

O casamento religioso é aquele em que a cerimônia é presidida por autoridade religiosa. Para ter efeitos civis, isto é, o casal ser considerado casado pelo ordenamento jurídico, o Código Civil dispõe em seu art. 1.515 que: "O casamento religioso, que atender às exigências da lei para a validade do casamento civil, equipara-se a este, desde que registrado no registro próprio, produzindo efeitos a partir da data de sua celebração". 

Então, conforme a lei civil, sabe-se que as prescrições legais indispensáveis ao reconhecimento de efeito civil ao casamento religioso são a habilitação dos contraentes e a inscrição do ato religioso, a requerimento do casal, no registro próprio.

#direitodefamília #casamentoreligiosocomefeitoscivis

Casamento avuncular


O casamento avuncular é o que se dá entre parentes colaterais de terceiro grau, isto é, entre tio(a) e sobrinho(a). De acordo com o art. 1.521, IV, do Código Civil, este casamento é proibido. No entanto, sobre o assunto, há o Enunciado n. 98 da Jornada de Direito Civil, promovida pelo STJ que assim dispõe: "o inciso IV do art. 1.521 do novo Código Civil deve ser interpretado à luz do DL 3200/41 no que se refere à possibilidade de casamento entre colaterais de terceiro grau.". Esse Decreto-Lei permitiu o casamento avuncular, desde que os nubentes submetam-se a prévio exame médico e tenham a devida autorização judicial. Os juristas concordam que não houve revogação do Decreto-Lei de forma expressa e nem incompatibilidade com a previsão do Código Civil, restando possível a exceção naquele trazida.

“Casamento. Tio e Sobrinha. Autorização Judicial. Extinção do feito sob o fundamento de impossibilidade jurídica do pedido. Dicção do Artigo 1.521, IV do C.C. Coexistência do Decreto–Lei nº 3.200/41. Prosseguimento para realização do exame por médicos de confiança do Juízo. Recurso provido em parte”. (TJ-SP, Ap. Cível 414.053.4/0, 4ª C. Cível,Rel. Des. Francisco Casconi, J. 26/04/2006).

Casamento em sogradio


Leiam a clara explicação do desembargador decano do TJ-PE e Diretor nacional do IBDFAM, Jones Figueirêdo Alves (Artigo: Uniões impedidas, as invalidades – 17/10/2016 - Clipping nº 220 - Sinoredi-Ce):

"(ii) "Casamento em sogradio' – A lei proíbe o casamento de parentes afins em linha reta (art. 1.521, inciso I, CC). Extinto o vínculo conjugal ou convivencial por divórcio ou ruptura da união estável, os cônjuges ou companheiros colocam-se no pretérito, seguindo-se, então, a vida de um e de outro. Entretanto, segundo a lei, tal fato jurídico não faz cessar a relação parental (por afinidade) entre genro e sogra ou entre nora e sogro (art. 1.595, § 2º, Código Civil). Assim se diz que, por isso mesmo, os sogros serão sempre legítimos, as afinidades não se extinguem e eles continuarão sendo sogros, vida afora.

Perceba-se: a tanto que a cada união, o homem haverá de acumular sogras, em perfeita harmonia intertemporal, e bem por isso, divorciado ou viúvo da primeira esposa, não poderá casar com a mãe daquela ou com qualquer outra que se lhe seguir como sogra. Assim, a doutrina assinala: “há um vínculo perpétuo que configura o impedimento matrimonial do art. 1.521, II, do Código Civil”. (Flávio Tartuce, 2011)."

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Diferença de 54 anos entre marido e mulher não anula recebimento de pensão

Instituto de previdência alegou que houve má-fé no casamento devido a elevada diferença de idade.
quinta-feira, 5 de março de 2020

Uma mulher de 35 anos receberá pensão após a morte de seu companheiro, de 89 anos. O Instituto previdenciário teria negado o benefício alegando má-fé no casamento, com base na diferença de idade entre o casal. A decisão foi da 1ª câmara de Direito do TJ/SC, ao confirmar sentença inicial.
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A mulher alegou que ficou casada com o falecido por 2 anos e até a data de sua morte e que, como sua esposa, tem direito ao benefício. Contestou, ainda, que a má-fé não pode ser presumida, deve ser comprovada e apresentou os documentos de óbito e casamento. Finalmente, ressaltou ser desnecessária a comprovação de que era financeiramente dependente, pois, sendo cônjuge do falecido, há presunção legal do estado de dependência.
Em contrapartida, o instituto arguiu que houve má-fé por parte da mulher quando o casamento foi consumado, pois o casal tinha elevada diferença de idade de 54 anos. Alegou, ainda, ser evidente que a mulher teria se casado apenas visando à pensão previdenciária do marido.
Os testemunhos de parentes garantiram que a condição de saúde do homem na ocasião do matrimônio era regular e que ninguém podia, naquele momento, prever sobre quanto tempo de vida ainda lhe restava.
Diante disso, o relator, desembargador Luiz Fernando Boller, confirmou a decisão de 1º grau, entendendo ser evidente o vínculo matrimonial e o direito à pensão do falecido.
“Em nenhum momento foi aventada eventual incapacidade para que o finado não pudesse ter exprimido sua vontade para casar, sobressaindo que a irresignação do IPREV mostra-se baseada, tão somente, na diferença de idade e a breve duração da relação.”
Confira o acórdão.

O problema da guarda compartilhada de animais

Danilo Porfírio de Castro Vieira e Kelly Araújo Batista de Carvalho
A legislação civil cuida do animal como um bem indiviso, e permite aos compossuidores o exercício dos atos possessórios, garantindo a igualdade de direitos entre eles.
sexta-feira, 6 de março de 2020

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O ativismo judicial nasceu no direito americano, ramo do sistema jurídico anglo-saxão ou common law, relacionando-se à atuação da Suprema Corte quando da presidência de Earl Warren, entre os anos de 1954 e 1969. O ativismo judicial está ligado a uma atuação mais ampla da função judiciária na consubstanciação dos fins e valores constitucionais, tendo uma ação decisiva na esfera de atuação das demais funções do Poder, quais sejam, executiva e legislativa. Desse modo, desempenha um papel criador por parte do Judiciário, trazendo uma significativa contribuição para o desenvolvimento do direito, decidindo a partir da análise do caso concreto, e formando precedentes que se antecipam, muitas das vezes, à produção legislativa.
É desse conceito que entendemos o ativismo judicial como uma postura, um modo de agir escolhido pelos magistrados na busca de uma hermenêutica jurídica expansionista, tendo como finalidade a concretização dos valores normativo-constitucionais, visando garantir os direitos da pessoa de modo mais célere, e atendendo às especificações do caso concreto e suprindo as necessidades advindas da omissão ou morosidade legislativa e, até mesmo, executiva. No Brasil, a partir da promulgação da Carta Magna de 1988 e de sua fundamentação programática e principiológica, o ativismo jurídico começa a tomar corpo.
O ativismo judicial é realista, com dimensão política, pois separa a atuação mais distribuidora da justiça, da manutenção e garantia da ordem e paz social. Assim, a figura do juiz distribuidor de justiça se revela, principalmente, quando o direito é negligenciado pela lei, e o magistrado cria no ordenamento, utilizando-se das diversas técnicas hermenêuticas. A finalidade, em tese, não é outra senão a de tornar realidade os objetivos delineados pela Constituição Federal.
O sistema processual contemporâneo está permitindo uma atuação mais ativa dos julgadores, estabelecendo que ao magistrado não cabe mais a mera missão de ser uma mera boca da lei, ponderando valores e princípios compreendidos nas causas sujeitas a seu crivo e isso implica uma atitude menos inertes nas conduções dos processos. A questão é que o ativismo no Brasil não se assenta numa tradição judicativa sólida, ou numa ratio hermenêutica (ratio iuris), entregando o julgado ao decisionismo e ao casuísmo.
Exemplo disso é a solução dada para a convivência entre ex-casais com seus animais de domésticos. As cortes jurisdicionais do país posicionam-se acerca da guarda compartilhada de animais não humanos domesticáveis. O Superior Tribunal de Justiça, por meio do julgamento do RESP 1.713.167/SP, reconheceu a possibilidade da concessão de guarda compartilhada à animais, sob o argumento de que “os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimo de seus donos, totalmente diversos de qualquer outro de propriedade privada”. O STJ ainda acrescentou que a legislação brasileira relativa aos bens não vem se mostrando capaz para resolver satisfatoriamente as contendas familiares envolvendo pets, em razão de não se tratar de discussão envolvendo mera posse e/ou prioridade.
Ante de uma crítica mais aprofundada, necessário, primeiramente, entendermos o que é o instituto da guarda compartilhada. Sabe-se que a guarda é um atributo do poder familiar. Nesse sentido, o fim do relacionamento amoroso dos genitores não pode ser um fator que comprometa a continuidades dos vínculos parentais, porquanto o exercício daquele poder em nada tem a ver com o fato separação.
Ora, como o exercício do poder familiar pode desembocar na figura de um dono? Não se pressupõe a existência de um vínculo pessoal entre todos os envolvidos? Vale destacar que quando da análise da guarda, o que se leva em consideração é o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, princípio esse retirado da própria dignidade humana. Trata-se de guarda co-responsável, com a finalidade de consagração dos direitos das crianças e dos adolescentes, pondo freio na irresponsabilidade parental e incentivando as atividades habituais de afeto e cuidado dos pais para com os filhos.
Sendo assim, diferentemente do que acontece com os animais não humanos, a guarda de uma criança não pode ser oriunda exclusivamente da vontade de seus pais, porque se leva em consideração, com prioridade, o bem estar da prole, devendo esse atender aos superiores interesses do menor (ECA, art. 129, III).
Diante dessa breve análise, observa-se que a guarda compartilhada é um instituto do direito civil (especificamente direito de família) criado em prol do bem estar e superior interesse da criança e do adolescente, ou seja, uma pessoal natural e, consequentemente detentora de personalidade jurídica. Personalidade jurídica é a máscara que potencializa o exercício decisório do homem, portador de vontade, condição para a titularidade de direitos, garantindo isonomia e deveres no contexto fático-jurídico.
Quando o STJ afirma que “os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente – dotados de sensibilidade, sentido as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem estar considerado” não estaria se antecipando ao legislador e concedendo, em certa medida, personalidade jurídica aos animais inumanos?
Nesses casos, necessária a análise e interpretação integradas do ordenamento jurídico. Por mais que seja criticável que a natureza jurídica dos animais seja equiparada a das coisas, sendo tratados como objetos destinados a circulação de riquezas (CC, art. 445, § 2º), servindo para garantir dívidas (CC, art. 1444) ou, até mesmo, para estabelecer responsabilidade (CC, art. 936), não é função do judiciário se antecipar a tais questões, na medida em que a composse regulamenta tranquilamente a celeuma relativa à partilha da guarda dos animas domésticos.
Considerando a tradição jurídica romano-germânica, os animais domésticos são tratados como propriedade, bens semoventes infungíveis e indivisíveis, com certa intangibilidade. No direito romano, o animal doméstico era tratado como um bem sujeito a afinidade ou afeição. Neste sentido, deve-se reconhecer o condomínio deste animal e em nome da convivência, regular o regime de composse. A composse se verifica quando duas ou mais pessoas exercem, ao mesmo tempo, poderes possessórios sobre a mesma coisa. O art. 1999 do Código Civil revela que “duas ou mais pessoas possuírem coisa indivisa, poderá cada uma exercer sobre ela atos possessórios, contando que não excluam os dos outros compossuidores.
A composse também admite a espécie pro indiviso e a simples. Aquela permite que todos os compossuidores exercerem, ao mesmo tempo e sobre a totalidade da coisa, os poderes de fato. Já a composse simples é aquela que casa um dos compossuidores pode exercer por si só poder de fato sobre o bem, sem que haja prejuízo dessa prerrogativa pelos demais compossuidores.
Logo, não há a necessidade de se aplicar teratologicamente a guarda compartilhada para animais, pois existem institutos próprios que propiciam os mesmos efeitos perseguidos.
Acrescenta-se que a matéria referente à guarda compartilhada de animais de companhia ainda não foi decidida pelo Congresso Nacional, dado que se trata de uma legítima opção do legislador. A legislação civil cuida do animal como um bem indiviso, e permite aos compossuidores o exercício dos atos possessórios, garantindo a igualdade de direitos entre eles.
Em suma, sob a ótica argumentativa aqui trazida, observa-se a desnecessidade de a função judiciária avançar irrestritamente em uma temática que não se encontra em completa lacuna, como vemos nas decisões que vem sendo prolatadas nas cortes do país. Como vimos, a guarda, regulamentada na parte do direito de família, é instituto destinado à promoção do bem estar da criança e do adolescente, quer dizer, um ente dotado de personalidade jurídica.
Em outras palavras, a guarda e a respectiva regulamentação de visitas são institutos civis aptos a garantir a efetividade de um importante direito fundamental, qual seja, a dignidade da pessoa natural. Já a composse, instituto muito similar a guarda, serve para garantir aos compossuidores a igualdade no exercício dos direitos sobre a coisa.
Conclui-se, portanto, que o ativismo judicial é uma ferramenta deveras importante, mas que deve ser utilizada com ponderação pelos juízes e tribunais, evitando-se a criação de normas que ainda não estão aptas a dar uma efetiva resposta a problemática sub judice.
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ALVES, José Carlos Moreira. Posse. Rio de Janeiro: Forense, 1985
DIAS, Edna Cardozo. Os animais como sujeitos de direito. Revista Brasileira de Direito dos Animais. Salvador. Vol. 1, n.1 p. 120, jan. 2006.
FACHIN, Luiz Edson. A função social da posse e a propriedade contemporânea: uma perspectiva da usucapião imobiliária rural. Porto Alegre: Fabris, 1988.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil: volume 5 : direitos reais. 13. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2017
FIUZA, César. Direito civil: curso completo. 18. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015.
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodrigo Pamplona. Manual de direito civil. São Paulo: Saraiva, 2017.
GRISARD FILHO, Waldyr. Guarda compartilhada: um novo modelo de responsabilidade parental. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013
LINHARES, José Manuel Aroso. A ética do continuum das espécies e a resposta civilizacional do direito. Boletim da Faculdade de Direito. Coimbra: v. LXXIX, 2003.
MEDEIROS, Fernanda Luíza Fontoura de. Direito dos animais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2013
RAMOS, Patrícia Pimentel de Oliveira Chambers. O poder familiar e a guarda compartilhada novos paradigmas do direito de família. 2. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2016
ROSA, Conrado Paulino da. Nova lei da guarda compartilhada. São Paulo: Saraiva, 2015.
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*Danilo Porfírio de Castro Vieira é doutor em Ciências Sociais pela UNESP/FCLAR; Mestre em Direito pela UNESP; Membro da ADFAS - Associação de Direito de Família e das Sucessões e advogado em Direito de Família, professor de direito pelo IDP.
*Kelly Araújo Batista de Carvalho é advogada em Direito de Família, graduada e pos-graduanda pelo IDP.

Passageiro será indenizado por sofrer racismo em avião

A indenização, a título de danos morais, foi fixada em R$ 10 mil.
sexta-feira, 6 de março de 2020

Um homem receberá indenização de companhia aérea após ser vítima de racismo velado durante um voo. A juíza de Direito Liliana Regina de Araújo Heidorn Abdala, do JEC de Boituva/SP, fixou indenização, a título de danos morais, em R$ 10 mil.
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O passageiro alega que pagou um valor adicional de R$ 39,99 para sentar-se em um assento ‘confort’ e foi abordado por uma comissária, informando-o que ele não poderia portar nada em mãos e nem fazer uso de dispositivos eletrônicos naquela poltrona. Entretanto, ao aceitar mudar para um assento convencional, notou que um casal utilizava normalmente seus eletrônicos em poltronas ‘confort’, sem receberem qualquer alerta da equipe de comissários.
Em outro momento da viagem, o requerente solicitou uma batata e um refrigerante e a comissária ao entregar os produtos indagou: “o senhor quer que eu traga um copo a mais para dividir com ele?”, referindo-se ao outro passageiro, negro, que estava sentado próximo a ele. O autor da ação acredita ter sido vítima de discriminação racial, ainda que velada, sentindo-se totalmente ofendido em sua dignidade e humilhado, infringindo os direitos da personalidade.
Para a juíza Liliana Regina de Araújo Heidorn Abdala, a conduta da comissária de bordo em restringir o uso do aparelho eletrônico do autor, sem, contudo, restringir para outros passageiros sentados no mesmo tipo de assento “é claramente uma forma de privilégio, transcendendo o mero aborrecimento”.
Na concepção da magistrada, “tratar o comportamento da funcionária da empresa como prática normal é fomentar o racismo velado”. A juíza ainda considerou o depoimento da comissária ao ser indagada se saberia identificar alguma prática inserida no conceito de racismo estrutural, ao que respondeu apenas “de maneira genérica”, segundo a magistrada, que a empresa proíbe qualquer tipo de prática discriminatórias.
Sobre o segundo episódio, a juíza ressalta que, em nenhum momento, os dois passageiros mantiveram contato que pudesse indicar que se conheciam.
“O fato de ter uma pessoa negra utilizando um transporte deveras “elitizado” pode causar um certo espanto, ainda que inconsciente em determinados grupos de pessoas. Quando há duas pessoas negras dentro de um mesmo voo, presume-se que sejam parentes ou que se conheçam. Tal fenômeno, faz parte de narrativa discriminatória, presente no inconsciente coletivo, que sempre colocam as minorias em locais de subalternidade”.  
Veja a sentença.

Folha de S.Paulo indenizará vítima do maníaco da agulha por divulgar nome em reportagem

7ª câmara de Direito Privado do TJ/SP julgou procedente o pedido da vítima de majoração. Valor foi fixado em R$15 mil.
sexta-feira, 6 de março de 2020

O jornal Folha de S.Paulo deverá indenizar uma mulher após associar o nome dela à uma reportagem veiculada na internet sobre ataques com seringa no metrô de SP no ano de 2016. Decisão é da 7ª câmara de Direito Privado do TJ/SP que também determinou que o jornal retire o nome da vítima da publicação. Valor da indenização foi fixado em R$ 15 mil.
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A mulher cujo nome foi divulgado na reportagem acionou a Justiça pleiteando danos morais e pedindo que seu nome fosse retirado do texto jornalístico. O juízo de 1º grau julgou parcialmente procedente a ação de obrigação de fazer com indenização por danos morais, com pedido de antecipação de tutela e multa diária e condenou a ré ao pagamento de R$ 5 mil por danos morais. A autora da ação recorreu pedindo majoração.
O jornal, ao se defender, alegou que a reportagem não traz qualquer conteúdo inverídico ou mal apurado, tanto que a veracidade de seu conteúdo. Ainda, defendeu que a imposição para retirar o nome da autora da matéria configura censura.
Ao analisar o caso, o desembargador Miguel Brandi, relator, asseverou que, ainda que o teor da matéria seja verídico e de interesse público, a divulgação do nome da vítima era efetivamente desnecessária.
“Não há que se falar em censura apenas pela determinação de retirada do nome da autora da reportagem, tendo em vista que o teor dela permanecerá integralmente mantido.”
Por essa razão o colegiado entendeu ser cabível a majoração da indenização pelos danos morais sofridos pela autora para o valor de R$ 15 mil.
O advogado Roberto Montanari Custódio atuou no caso em defesa da vítima.
  • Processo: 1074022-76.2018.8.26.0100
Veja o acórdão

Ministro Raul liberta devedor de pensão por morosidade na ação revisional de alimentos

Para ministro, a morosidade não pode prejudicar o alimentante.
quinta-feira, 5 de março de 2020

O ministro Raul Araújo, do STJ, concedeu liminar para homem preso por dívida de pensão alimentícia para com os filhos de mais de R$ 600 mil.
O pai propôs ação revisional de alimentos, e alega que, embora ajuizada em 2017, os alimentandos não foram citados, nem foi examinada a liminar que pretende readequar a prestação alimentícia às possibilidades financeiras do paciente. Na execução de alimentos foi determinado, sob pena de prisão, o pagamento da dívida desde dezembro/2015.
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Ao analisar o caso, o ministro Raul Araújo consignou que em despacho - datado de 3/2/20 - o juiz de 1º grau afirmou que analisará a liminar na revisional após o "(...) aperfeiçoamento da relação processual, com contestação e réplica, inclusive pelo completo desconhecimento acerca da situação em que vive o filho menor, já que o outro, a despeito de maior, é estudante universitário”.
Para o ministro Raul, esse cenário sugere que não ocorreu a referida citação, e ao mesmo tempo, a cada mês aumenta o valor da dívida alimentar objeto da execução.
O eg. Tribunal a quo a um só tempo entende que a demora na prestação jurisdicional na revisional de alimentos é inócua para a discussão quanto aos alimentos devidos/executados, também afirma que o habeas corpus não é o instrumento processual adequado para discutir tais valores.”
Na avaliação de S. Exa., tal entendimento mostra-se contraditório:
Com efeito, se a ação revisional de alimentos é o instrumento processual adequado para discutir o valor destes, a eventual demora no trâmite processual desta ação pode prejudicar o alimentante. Mormente porque, como dito, mês a mês, a dívida aumenta. A morosidade no iter processual da revisional alimentos pela falta de qualquer decisão judicial e, no caso concreto pela ausência até mesmo de citação, se não beneficia, tampouco pode prejudicar o alimentante, ora paciente.”
Dessa forma, explicou o relator, se ocorrer demora no trâmite processual da ação de revisão dos alimentos e o ato apontado como coator afirmar que não se pode rever tais valores em sede de habeas corpus, “o paciente fica sem instrumento processual adequado para rever a dívida executada - que aumenta mensalmente - e, ao mesmo tempo, fica sujeito à ameaça em sua liberdade de ir e vir”.
Tais circunstâncias sugerem um quadro em que o inadimplemento não pode ser tido por inescusável e voluntário, tal como prevê a Constituição Federal, em seu art. 5º, LXVII, para admitir, excepcionalmente, a prisão civil do devedor de alimentos.”
Assim, concedeu a liminar para determinar a urgente expedição de alvará de soltura em favor do paciente, até o julgamento do presente HC ou posterior manifestação nesses autos.
O paciente é representado pelo escritório Diógenes e Advogados Associados.
Veja a decisão.