quarta-feira, 20 de setembro de 2017

O abandono Afetivo Gera Direito a Indenização?

Esse tema pode parecer bastante inusitado, mas é importante esclarecer que o Direito de Indenização também se faz presente no Direito de Família.

Publicado por Leão Advogados Associados

Existem hipóteses de indenização nas relações de casamento ou de união estável, inclusive é possível a sua incidência na parentalidade ou filiação, justamente, o tema que o presente artigo pretende abordar, hipóteses de indenização nas relações entre pais e filhos.

Nesse artigo, o Dr. Ivan Leão pretende analisar os últimos julgados sobre o tema e responder as seguintes questões....
O que é o abandono afetivo??
O abandono afetivo gera direito a indenização?

Bom, para respondermos essas indagações é importante destacar que o Direito de Família está diretamente atrelado a diversos aspectos da dignidade da pessoa humana.

Sabe-se que, havendo violações a dignidade humana, tem-se aí hipótese de indenização por danos morais.

Portanto, a relações familiares, como o vínculo entre pais e filhos, devem ser permeadas de cuidado e de responsabilidade, independentemente da relação entre os pais, se forem casados, se o filho nascer de uma relação extraconjugal, ou mesmo se não houver conjugalidade entre os pais, se ele foi planejado ou não.

(...) Em outras palavras, afronta o princípio da dignidade humana o pai ou a mãe que abandona seu filho, isto é, deixa voluntariamente de conviver com ele” (PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Responsabilidade Civil por abandono afetivo. In: Responsabilidade Civil no Direito de Família, ob. cit., p. 406).

Então a fundamentação jurídica para condenar o pai a pagar indenização por abandono afetivo existe.

Agora, é importante responder qual tem sido o posicionamento dos tribunais!
Agora, existem casos no Judiciário em que houve condenação?

O Tribunal de Alçada de Minas Gerais condenou um pai a pagar indenização de duzentos salários mínimos a título de danos morais ao filho, por não ter com ele convivido (Apelação Cível n. 408.550-5 da Comarca de Belo Horizonte. Sétima Câmara Cível. Presidiu o julgamento o Juiz José Affonso da Costa Côrtes e dele participaram os Juízes Unias Silva, relator, D. Viçoso Rodrigues, revisor, e José Flávio Almeida, vogal).

Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça reformou essa decisão do Tribunal de Minas Gerais, afastando o dever de indenizar no caso em questão, diante da ausência de ato ilícito, pois o pai não seria obrigado a amar o filho. Em suma, o abandono afetivo seria situação incapaz de gerar reparação pecuniária (STJ, Recurso Especial 757.411/MG, Relator Ministro Fernando Gonçalves; votou vencido o Ministro Barros Monteiro, que não conhecia do recurso. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, Jorge Scartezzini e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro relator. Data do julgamento: 29 de novembro de 2005).

Cumpre destacar que a nossa Banca de atuação em direito de família entende que existe o dever de indenizar, especialmente se houver um dano psíquico ensejador de dano moral, a ser demonstrado por prova psicanalítica.

O desrespeito ao dever de convivência é muito claro, eis que o art. 1.634 do Código Civil impõe como atributos do poder familiar a direção da criação dos filhos e o dever de ter os filhos em sua companhia.

Além disso, o art. 229 da Constituição Federal é cristalino ao estabelecer que os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores. Violado esse dever e sendo causado o dano ao filho, estará configurado o ato ilícito, nos exatos termos do que estabelece o art. 186 do Código Civil em vigor.

No ano de 2012, outra decisão do Superior Tribunal de Justiça em revisão à ementa anterior, ou seja, admitindo a reparação civil pelo abandono afetivo. A ementa foi assim publicada por esse Tribunal Superior:

“Civil e Processual Civil. Família. Abandono afetivo. Compensação por dano moral. Possibilidade. 1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. 2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/1988. 3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado –, importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. (STJ, REsp 1.159.242/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, j. 24/04/2012, DJe 10/05/2012).

Em sua relatoria, a julgadora ressalta, de início, ser admissível aplicar o conceito de dano moral nas relações familiares.

Neste mesmo sentido, a Ministra Nancy Andrighi afirma que o dano extrapatrimonial estaria presente diante de uma obrigação inescapável dos pais em dar auxílio psicológico aos filhos.
Qual tem sido o valor das indenizações que existem como exemplo?

O Tribunal de Justiça de São Paulo já fixou indenizações no valor de R$ 415.000,00 (quatrocentos e quinze mil reais).

Enquanto o STJ tem julgados com a condenação de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).

Existem entendimentos em sentido contrário?

Sim, é importante destacar que ainda não se trata de uma unanimidadeo dever de indenizar por abandono afetivo.

[alert type="info" close="false"]Isso porque há argumentos no sentido de não haver nenhuma possibilidade de reparação, porque não há ato ilicito, portanto não há como reconhecer o abandono afetivo como dano passível de reparação” (TJMG, Apelação Cível n. 1.0647.15.013215-5/001, Rel. Des. Saldanha da Fonseca, julgado em 10/05/2017, DJEMG15/05/2017).[/alert]

Na mesma linha, sem prejuízo de muitas outras ementas de negação do ilícito: “a pretensão de indenização pelos danos sofridos em razão da ausência do pai não procede, haja vista que para a configuração do dano moral faz-se necessário prática de ato ilícito. Beligerância entre os genitores” (TJRS, Apelação Cível n. 0048476-69.2017.8.21.7000, Teutônia, Sétima Câmara Cível, Rel. Des. Jorge Luís Dall’Agnol, julgado em 26/04/2017, DJERS04/05/2017). De todo modo, pode ser notada certa confusão técnica no último decisum, pois não é o ilícito que é elemento do dano moral, mas vice-versa.

Por outra via, concluindo pela ausência de prova do dano, entendeu o Tribunal de Justiça de São Paulo que “a jurisprudência pátria vem admitindo a possibilidade de dano afetivo suscetível de ser indenizado, desde que bem caracterizada violação aos deveres extrapatrimoniais integrantes do poder familiar, configurando traumas expressivos ou sofrimento intenso ao ofendido. Inocorrência na espécie” (TJSP, Apelação n. 0006195-03.2014.8.26.0360, Acórdão n. 9689092, Mococa, Décima Câmara de Direito Privado, Rel. Des. J. B. Paula Lima, julgado em 09/08/2016, DJESP 02/09/2016).

Em complemento, e mais recentemente, o Tribunal gaúcho aduziu que “o dano moral exige extrema cautela no âmbito do direito de família, pois deve decorrer da prática de um ato ilícito, que é considerado como aquela conduta que viola o direito de alguém e causa a este um dano, que pode ser material ou exclusivamente moral. Para haver obrigação de indenizar, exige-se a violação de um direito da parte, com a comprovação dos danos sofridos e do nexo de causalidade entre a conduta desenvolvida e o dano sofrido, e o mero distanciamento afetivo entre pais e filhos não constitui, por si só, situação capaz de gerar dano moral” (TJRS, Apelação Cível n. 0087881-15.2017.8.21.7000, Porto Alegre, Sétima Câmara Cível, Relª Desª Liselena Schifino Robles Ribeiro, julgado em 31/05/2017, DJERS 06/06/2017). Na pesquisa que realizei, em junho de 2017, constatei que muitos julgamentos seguem a última frase da ementa, segundo a qual o mero distanciamento físico entre pai e filho não configura, por si só, o ilícito indenizante.

Diante desse panorama recente, o nosso escritório que tem por objetivo instruir bem nossos clientes na tomada de decisões, recomendamos que as ações sejam muito bem fundamentadas, principalmente, com provas robustas sobre os efeitos traumáticos, os efeitos lesivos, o resultado negativo do abando e o nexo de causalidade entre a conduta do pai e os danos suportados pelo filho.

Em síntese, para se ganhar a ação não basta a prova da simples ausência de convivência para que caiba a indenização.

Acrescente-se que no próprio Superior Tribunal de Justiça existem acórdãos recentes que não admitem a reparação de danos por abandono afetivo antes do reconhecimento da paternidade. Desse modo, julgando “alegada ocorrência de abandono afetivo antes do reconhecimento da paternidade. Não caracterização de ilícito. Precedentes” (STJ, AREsp 1.071.160/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, DJE 19/06/2017). Ou, ainda, “a Terceira Turma já proclamou que antes do reconhecimento da paternidade, não há se falar em responsabilidade por abandono afetivo” (STJ, Agravo Regimental no AREsp n. 766.159/MS, Terceira Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, DJE09/06/2016).
Conclusão

Em suma o que pode se afirmar é que a doutrina construiu uma boa argumentação jurídica apta a permitir à admissão da reparação imaterial por abandono afetivo, contudo, no âmbito da jurisprudência, ainda há numerosos julgados que afastam a indenização.

Artigo Elaborado por Ivan Leão, advogado Especialista em Direito de Família

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