terça-feira, 19 de março de 2013

Abandono afetivo, por si só, não causa abalo moral

O distanciamento afetivo entre pais e filhos não é situação capaz de gerar dano moral, nem implica ofensa ao princípio da dignidade da pessoa humana. É mero fato da vida.

Sob esse entendimento, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por unanimidade, manteve sentença que não reconheceu dano moral por afastamento de um pai na Comarca de São Sepé. O acórdão foi lavrado dia 7 de fevereiro.

Na ação indenizatória, o autor alegou que o não-reconhecimento pelo pai lhe causou inúmeros prejuízos. Disse que permaneceu analfabeto porque precisou trabalhar desde cedo para ajudar a mãe, que foi abandonada quando tinha 15 anos de idade.

A relatora da Apelação, desembargadora Liselena Schifino Robles Ribeiro, disse que o pedido reparatório não tem nada a ver com direito de personalidade, direitos fundamentais ou com qualquer garantia constitucional, constituindo mera pretensão indenizatória, com caráter econômico.

Afirmou que, embora o pedido de reparação moral seja juridicamente possível, o dano deve ser decorrente da violação de um direito do autor. Ou seja, o Código Civil prevê a possibilidade de reparação de dano por ato ilícito, nos termos do artigo 186 do Código Civil. Mas essa violação precisa provada, e o autor não soube fazê-lo.

‘‘No caso, resta evidente, pela própria narrativa dos fatos constantes na exordial, que o réu não praticou a violação a direito algum da parte autora. E a eventual falta de atenção do pai em relação ao filho é clara decorrência dos fatos da vida, pela ruptura da relação com a mãe do autor e pelo fato de terem vivido afastados durantes longos anos’’, concluiu a desembargadora.

Clique aqui para ler o acórdão. 
Jomar Martins é correspondente da revista Consultor Jurídico no Rio Grande do Sul.
Revista Consultor Jurídico, 6 de março de 2013
 http://www.conjur.com.br/2013-mar-06/abandono-afetivo-fato-vida-tj-rs-negar-dano-moral

Pressuposições da responsabilidade civil

O Estado democrático de direito impõe à todos os indivíduos que vivem em sociedade a aceitarem as normas sociais, as obrigações impostas pela moral e pela ética, enquanto compromissos supralegais. Dessa forma, todos assumem o dever de não ofender, nem de lesar, sob pena de ter que reparar o dano causado. É um dever geral de não prejudicar ninguém, o qual o direito romano tratava em sua neminemleadere, ou não ofender ninguém.
Segundo Stoco (2004, p.120),a responsabilidade, embora apoiada no mundo fático, tem sustentação jurídica, conforme expressa:
[...] depende da prática de um ato ilícito e, portanto, antijurídico, cometido conscientemente, dirigido a um fim, ou orientado por comportamento irrefletido, mas informado pela desídia, pelo açodamento ou pela inabilidade técnica, desde que conduza a um resultado danoso no plano material ou imaterial ou moral.
Para melhor compreender a sustentação jurídica da responsabilidade, se faz necessário uma análise no campo do direito, onde a infração à norma, o nexo causal entre o infrator e a infração, o dano causado, o nexo causal, a sanção aplicável e a obrigação de reparar são elementos essenciais. Na configuração da responsabilidade civil estão necessariamente presentes três elementos fundamentais para a doutrina subjetivista: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, um dano e o nexo de causalidade entre um e outro. A compreensão desses três elementos torna-se essencial no estudo do tema, devendo ser abordado, cada um especificamente, segundo o entendimento doutrinário, para que possamos aplicar nos casos concretos.

3.1    DANO, CULPA E RESPONSABILIDADE

Diversos doutrinadores asseveram que não há responsabilidade sem prejuízo. O prejuízo ocasionado pelo agente é o dano. Neste entendimento, segundo (MATIELO, 1995) o dano é componente essencial e indispensável à responsabilização do agente. Essa responsabilização poderá ainda ser originada de ato lícito ou não e ainda de inadimplemento contratual, seja de forma subjetiva ou objetiva, como será discutido adiante.Com o dano, nasce a obrigação de reparar.
No que se refere ao termo “culpa”, o Código Civil Brasileiro adotou um entendimento lato sensu abrangendo o dolo ou pleno conhecimento do mal e perfeita intenção de o praticar, e a culpa em sentido estrito (stricto sensu ou aquiliana) onde ocorre a violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, ou seja, configuração do elemento da previsibilidade.
 Há ainda que se falar em homo medius como elemento fundamental na conceituação de culpa. Para Gonçalves (2009) um homem-padrão, criado in abstracto pelo julgador, não incorreria em um comportamento causador de dano por imperícia, imprudência ou negligência. Segundo o insigne doutrinador, se, da comparação entre a conduta do agente causador do dano e o comportamento de um homem médio (homem-padrão in abstracto) ficar concluso que o dano decorreu de uma imprudência, imperícia ou negligência do primeiro, nas quais não incorreria o homem-padrão, estaria aí caracterizada a culpa.
O previsível da culpa se mede pelo grau de atenção exigível do homo medius. A conduta imprudente consiste em agir o sujeito sem as precauções necessárias implicando em importância inadequada pelos interesses de outrem. A negligência é a falta de atenção, a ausência de reflexão necessária onde o agente deixa de prever o resultado que poderia ser previsto. A imperícia consiste na falta de preparo técnico adequado e proporcional à complexidade do ato executado.
O art. 944 do CC/2002 preceitua que “a indenização mede-se pela extensão do dano”, o que permite entender que se não há dano, não há obrigação de indenizar, ou seja, não há responsabilização do agente pelo resultado. Daí entende-se que o dano é pressuposto da obrigação de indenizar. Dessa forma, no âmbito cível, a extensão ou o quantum do dano é quem dá a dimensão da indenização. Em outras palavras, estabelece parâmetro para se pleitear uma valor pecuniário indenizatório pelo indivíduo que se sentir lesado em seu direito ou para arbitragem pelo juiz da causa. Assim, entende-se que o dano é o elemento objetivo da obrigação de indenizar.

3.2 NEXO DE CAUSALIDADE

O conceito de nexo causal não é jurídico, segundo Cavalieri Filho (2001), pois deriva das leis naturais, estabelecendo apenas o liame, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Não é satisfatório que o agente tenha praticado um ato ilícito ou erro de conduta, não basta ainda que a vítima sofra um dano, é imprescindível que se estabeleça uma relação de causalidade entre o fato antijurídico e o mal causado.
A complexidade envolvendo o entendimento do nexo causal abrange diversas teorias, sendo considerado por muitos doutrinadores como o elemento da responsabilidade civil mais difícil de ser determinado, pois se antepõe à duas questões importantes: a dificuldade de sua prova e a identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano, principalmente em se tratando de multicausalidades, onde nem sempre se tem condições de assinalar qual a causa direta do dano (STOCO, 2004).
A teoria da equivalência das condições, da equivalência dos antecedentes ou da conditio sinequa non foi defendida por Julius Glasser e desenvolvida por MaximilianVon Buri o qual afirma que tudo o que concorrer para o resultado é causa dele(PAGLIUCA, 2004). Como exemplo de aplicabilidade desse conceito no ordenamento jurídico brasileiro, o art. 13 do Código Penal brasileiro assevera que “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. Trata-se de uma teoria que simplifica de forma prática a relação causal, porém inadequada em diversas situações fáticas na esfera cível.
Segundo essa teoria, para determinar se uma condição é causa de um evento ou resultado, procede-se eliminando abstratamente essa condição. Se, ainda assim, o resultado persistir, essa condição não será a causa. Por outro lado, se o resultado não se constatar ao eliminar a condição prévia, então pode-se concluir que esta deu causa ao evento. Em caso de múltiplas condições, essa teoria atribui a todas o mesmo valor, de modo que se equivalem, não estabelecendo qual condição foi preponderante, sendo este entendimento alvo de críticas pela doutrina, por não atender adequadamente às aplicações nos casos concretos, principalmente relacionados ao direito civil.
A teoria da causalidade adequada é um aperfeiçoamento da teoria da equivalência, tendo surgido no século XIX por Johanes Von Kries, filósofo alemão, onde segundo ele, causa será o antecedente não só necessário, mas ainda adequado à produção do resultado (SOTOCO, 2004). Dessa forma, nem todas as condições poderão ser entendidas como causa, mas tão somente aquela que for mais adequada a produzir o resultado ou efeito, de forma mais conveniente à concretização do evento danoso. Estabelece-se então um juízo de probabilidades ao ser analisado pelo julgador, a fim de estabelecer, dentre os antecedentes, aquele que efetivamente contribuiu para o resultado.
Como exemplo no ordenamento jurídico brasileiro, citamos o art. 403 do atual Código Civil brasileiro, in verbis: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”. Este artigo encontrava equivalência no art. 1.060 do Código Civil de 1916. Na área penal, o § 1° do art. 13 onde afirma que “A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produz o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”.
Para Stoco (2004) se faz necessária a identificação do agente cujo comportamento seja considerado causa eficiente para a ocorrência do resultado. O referido autor cita o art. 186 do Código Civil atual, o qual dispõe que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Ainda segundo o doutrinador, existe uma causa eficiente para a eclosão do evento, ainda que outras tenham se inserido em ocasião precedente ou posterior. Com essa interpretação o autor defende que o referido Código Civil adotou uma teoria da causa eficiente, sendo esta considerada por ele como mais precisa e pertinente do que a teoria da causalidade adequada.

3.3 IMPUTABILIDADE E CAPACIDADE

A capacidade de discernimento é o componente necessário para que alguém que pratique um ato ilícito seja obrigado a repará-lo. Assim define o art. 186 do Código Civil o qual a imputabilidade está relacionada à existência da livre determinação de vontade do agente. Essa vontade pode ser expressa, inclusive, por omissão voluntária resultando em dano, ainda que exclusivamente moral.
A imputabilidade se configura nas circunstâncias que impõem ao profissional a capacidade para responder pelas consequências da sua prática profissional. A regulamentação das profissões traz, por um lado, direitos e garantias ao indivíduo que se qualificou para o seu exercício, mas também uma presunção de capacidade natural de realizar prognósticos de condutas e medida dos atos que perpetra, conforme os conhecimentos científicos e habilidades técnicas adquiridas. Essa capacidade é aperfeiçoada pela ciência que possibilita um juízo mais preciso do exercício profissional.
Conforme pode-se observar no art. 186 C.C. o qual estabelece uma ligação entre a imputabilidade do agente para a existência do ato ilícito, entende-se que aqueles que estavam incapacitados de entender ou querer o resultado danoso não poderiam responder por suas consequências. Assim, não incorreria em culpa o incapacitado sendo,portanto, considerados irresponsáveis pela conduta.Uma vez considerado habilitado para o exercício de profissão regulamentada, a capacidade civil é inquestionável e o agente assume todas as responsabilidades inerentes à sua prática. Aos órgãos reguladores e fiscalizadores da profissão compete o zelo à boa prática profissional, protegendo a sociedade.

OLIVEIRA, Rauirys Alencar de; BENTO, Cléa Mara Coutinho. Responsabilidade civil do fisioterapeuta nos procedimentos dermatofuncionais com fins estéticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3547, 18 mar. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23975>. Acesso em: 19 mar. 2013.

A responsabilidade civil

A responsabilidade civil por muitos anos tem sido um dos temas mais abordados no mundo jurídico brasileiro, principalmente após a edição do Código de Defesa do Consumidor, trazendo novas garantias na prestação de serviços.
A sociedade brasileira tem cada vez mais se preocupado com os cuidados de saúde e estética corporal, buscando serviços profissionais diversificados para atender aos seus anseios, seja pelo processo de envelhecimento ou pelo aumento de seu poder aquisitivo, possibilitando a contratação desses serviços. As profissões de saúde tradicionais, como a medicina, não conseguem mais isoladamente atender às necessidades sociais. Esse fato, além do desenvolvimento científico que possibilitou novas abordagens diagnósticas e terapêuticas, possibilitou o surgimento de novas profissões na área da saúde no mundo todo.
Os indivíduos economicamente ativos, por outro lado, perceberam que a qualificação profissional é o melhor caminho para melhorar o seu poder aquisitivo. Desta forma, esse público vem cada vez mais buscando centro de formação profissional em nível técnico, tecnológico e universitário, o que justifica o surgimento indiscriminado de escolas, muitas com qualidade de formação questionáveis.
O exercício das atividades liberais, especificamente na área da saúde, o processo de formação profissional e a regulamentação das profissões são aspectos que merecem ser discutidos para se chegar ao objetivo de melhor entender a responsabilização desses profissionais por eventuais danos causados a seus clientes. Essa discussão se justifica pelo papel social dos operadores do direito e dos órgãos de fiscalização de classe na proteção da sociedade.
Nos últimos anos testemunhou-se uma grande revolução científica com avanços consideráveis nos campos tecnológicos. Juntamente com esses avanços, os conceitos de saúde, bem como a grande diversidade de recursos diagnósticos e terapêuticos criaram a necessidade de formação de profissionais em diversas especialidades. As profissões mais tradicionais como a medicina e a enfermagem já não atendiam mais às necessidades de uma sociedade cada vez mais preocupada com a qualidade de vida, prevenção de doenças e cura de problemas de saúde até há pouco tempo incuráveis.
Essa necessidade de uma alta especialização e desenvolvimento de novos recursos de promoção de saúde tornou imperativo o surgimento de novas carreiras técnicas, tecnológicas e universitárias, com uma maior especificação de atuação prática e um maior grau de exigência de formação. Desta forma, a diversidade de profissões, especificamente na área da saúde, ampliou-se, diversificando o rol de profissões consideradas liberais e ensejando novos processos de regulamentação legal dessas práticas.
A democratização do acesso da população a cursos de formação experimentada pelo Brasil nos últimos anos sejam eles técnicos, tecnológicos ou universitários, facilitou o ingresso de classes menos favorecidas ao ensino como forma de ascensão social. O aumento no poder aquisitivo, a melhor distribuição de renda e o crescimento econômico do país, são fatores que propiciaram esse crescimento, tanto do ponto de vista de aumento da demanda da população e sua preocupação em investir na promoção de sua saúde e em beleza como os tratamentos estéticos.
Nos últimos anos ocorreu uma verdadeira medicalização da beleza. O Brasil é considerado um dos países que mais realiza cirurgias plásticas no mundo além de ter uma proliferação de clínicas voltadas para o tratamento estético. Entre os profissionais que trabalham especificamente com estética corporal estão os médicos cirurgiões plásticos, dermatologistas, cosmiatrase os fisioterapeutas especialistas em fisioterapia dermato-funcional.
A análise do ponto de vista jurídico e técnicodos serviços prestados por esses profissionais, em especial o fisioterapeuta dermato-funcional,é o elemento desse estudo de revisão literária. Tem como fonte o entendimento doutrinário, a jurisprudência dos tribunais brasileiros e a legislação pátria,essenciais para o entendimento da responsabilidade civil que esses profissionais têm na prestação dos seus serviços e para as garantias de segurança e resultado aos seus clientes. Por outro lado, o profissional informado de suas responsabilidades terá maior segurança jurídica na prestação de um serviço adequado e, consequentemente, maior satisfação de seus clientes. Nesse entendimento, o presente estudo objetiva analisar até que ponto se estende a responsabilização civil nos procedimentos fisioterapêuticos, especificamente no que se refere aos métodos exclusivamente estéticos, além de caracterizar o tipo de responsabilidade civil aplicável, dentro da perspectiva do direito brasileiro.

OLIVEIRA, Rauirys Alencar de; BENTO, Cléa Mara Coutinho. Responsabilidade civil do fisioterapeuta nos procedimentos dermatofuncionais com fins estéticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3547, 18 mar. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23975>. Acesso em: 19 mar. 2013.

Litigância de má-fé: Parte não prova suspeição de juiz e é condenada

Se não ficar comprovado o comprometimento do juiz com qualquer das partes em litígio e nem seu interesse pessoal no deslinde da causa, não se pode considerá-lo suspeito para o julgamento. Com esse entendimento, a 20ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul derrubou Exceção de Suspeição contra o titular da 10ª Vara Cível do Foro Central de Porto Alegre, Alexandre Schwartz Manica.
A parte autora da ação, empresa que está sendo executada pela Central Sicredi (Sistema de Crédito Cooperativo) do Rio Grande do Sul, alegou que o juiz era associado do Sicredi Ajuris, ligado ao complexo financeiro cooperativista. Logo, teria interesse na ação, segundo a peça ajuizada.

A relatora do recurso, desembargadora Walda Maria Melo Pierro, entendeu que a hipótese levantada pela autora não se enquadra nas elencadas pelo artigo 135 do Código de Processo Civil. Além disso, afirmou que não há nenhuma indicação de que o juiz possua interesse no julgamento da causa em favor de qualquer das partes, ‘‘mesmo porque, consoante por ele alegado, sequer é cooperado do Sicredi’’.

Em decisão monocrática do dia 7 de março, a desembargadora não só confirmou o entendimento de primeiro grau que negou a Exceção de Suspeição, como manteve a multa por litigância por má-fé arbitrada pelo juiz Manica contra a parte que levantou a suspeição.
(...)
‘‘O autor visa procrastinar o feito, pois não foi diligente em verificar se este magistrado é cooperado do Sicredi, o que não é. O ato é temerário e atentatório contra a dignidade da justiça’’, disparou o juiz Alexandre Schwartz Manica, no despacho assinado no dia 29 de janeiro do corrente.
(...)
Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2013-mar-18/parte-nao-comprova-motivo-suspeicao-juiz-condenada-ma-fe

Relação paralela a casamento não dá direito de família

Na VI Jornada de Direito Civil, ocorrida entre os dias 11 e 12 de março deste ano, ficou evidenciada a rejeição quanto às ideias de institucionalização da poligamia.

Foram rejeitadas todas as propostas de atribuição de efeitos de direito de família às uniões paralelas ou simultâneas, ou seja, às uniões que uma pessoa casada ou que viva em união estável mantém concomitantemente com o seu amante ou a sua amante.

Argumentos supostamente baseados em amor, como se a família brasileira não estivesse sujeita a normas legais, como se o ordenamento jurídico não devesse colocar limites no comportamento humano, como se a autonomia fosse absoluta nas relações familiares, foram superados pelos fundamentos efetivamente jurídicos, com o indispensável bom senso, na VI Jornada de Direito Civil.

Uma relação paralela a um casamento ou uma união estável não tem efeitos de direito de família, a essa união não podem ser atribuídos os direitos à pensão alimentícia e à presunção do esforço comum nas aquisições patrimoniais. Essa é a interpretação da VI Jornada de Direito Civil.

O artigo 1.723, parágrafo 1º do Código Civil, que condiciona a existência de união estável à exclusividade no núcleo, ou seja, que não admite a união estável se um de seus partícipes mantiver, no plano jurídico e dos fatos, comunhão de vidas no casamento com outra pessoa, ou união estável com outrem, é constitucional e deve ser preservado nas decisões judiciais. Essa é a interpretação da VI Jornada de Direito Civil.

As relações concorrentes com casamento em que haja comunhão de vidas, isto é, em que não ocorreu a separação de fato, são havidas como concubinato e não como união estável, nos termos do artigo 1.727 do Código Civil. Essa é a interpretação da VI Jornada de Direito Civil.
(...)
Leia a íntegra em: http://www.conjur.com.br/2013-mar-18/regina-silva-relacao-paralela-casamento-nao-direito-familia

Comércio eletrônico

Outro decreto, mas também relacionado ao tema, é o que regulamenta o Código de Defesa do Consumidor para incluir obrigações às empresas do ramo do comércio eletrônico. O Decreto 7.962/2013 obriga as companhias, por exemplo, a prestar assistência técnica a seus clientes, se responsabilizar por informações prestadas de forma errada.

As empresas também ficam obrigadas a informar os consumidores sobre “os meios adequados e eficazes para o exercício do direito de arrependimento”. Ainda de acordo com o decreto, as empresas do chamado e-commerce que não cumprirem com os prazos, preços e condições de compra serão punidas de acordo com as sanções previstas no CDC.

Na opinião do advogado Márcio Cots, o decreto vai “diminuir a desconfiança dos consumidores em relação ao comércio eletrônico”. Ele acredita que a nova regulamentação vai trazer mais transparência ao setor, o que deve levar ao crescimento econômico às empresas.

Em contrapartida, Cots, que é especialista em Direito Digital, afirma que as companhias terão de investir mais em tecnologia e na criação de mais canais de comunicação com os consumidores, como mecanismos de troca de produtos dentro dos prazos estipulados no decreto.

Pedro Canário é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 18 de março de 2013
http://www.conjur.com.br/2013-mar-18/governo-federal-publica-decretos-regulamentam-defesa-consumidor

Princípio da boa-fé objetiva é consagrado pelo STJ em todas as áreas do direit

Um dos princípios fundamentais do direito privado é o da boa-fé objetiva, cuja função é estabelecer um padrão ético de conduta para as partes nas relações obrigacionais. No entanto, a boa-fé não se esgota nesse campo do direito, ecoando por todo o ordenamento jurídico.
“Reconhecer a boa-fé não é tarefa fácil”, resume o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Humberto Martins. “Para concluir se o sujeito estava ou não de boa-fé, torna-se necessário analisar se o seu comportamento foi leal, ético, ou se havia justificativa amparada no direito”, completa o magistrado.
Mesmo antes de constar expressamente na legislação brasileira, o princípio da boa-fé objetiva já vinha sendo utilizado amplamente pela jurisprudência, inclusive do STJ, para solução de casos em diversos ramos do direito.
A partir do Código de Defesa do Consumidor, em 1990, a boa-fé foi consagrada no sistema de direito privado brasileiro como um dos princípios fundamentais das relações de consumo e como cláusula geral para controle das cláusulas abusivas.
No Código Civil de 2002 (CC/02), o princípio da boa-fé está expressamente contemplado. O ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseverino, presidente da Terceira Turma, explica que “a boa-fé objetiva constitui um modelo de conduta social ou um padrão ético de comportamento, que impõe, concretamente, a todo cidadão que, nas suas relações, atue com honestidade, lealdade e probidade”.
Ele alerta que não se deve confundi-la com a boa-fé subjetiva, que é o estado de consciência ou a crença do sujeito de estar agindo em conformidade com as normas do ordenamento jurídico.

Contradição
Ao julgar um recurso especial no ano passado (REsp 1.192.678), a Terceira Turma decidiu que a assinatura irregular escaneada em uma nota promissória, aposta pelo próprio emitente, constitui “vício que não pode ser invocado por quem lhe deu causa”. O emitente sustentava que, para a validade do título, a assinatura deveria ser de próprio punho, conforme o que determina a legislação.
Por maioria, a Turma, seguindo o voto do ministro Sanseverino, aplicou o entendimento segundo o qual “a ninguém é lícito fazer valer um direito em contradição com a sua conduta anterior ou posterior interpretada objetivamente, segundo a lei, os bons costumes e a boa-fé”. É o chamado venire contra factum proprium (exercício de uma posição jurídica em contradição com o comportamento anterior do exercente).
No caso, o próprio devedor confessou ter lançado a assinatura viciada na nota promissória. Por isso, a Turma também invocou a fórmula tu quoque, de modo a impedir que o emitente tivesse êxito mesmo agindo contra a lei e invocando-a depois em seu benefício (aquele que infringiu uma regra de conduta não pode postular que se recrimine em outrem o mesmo comportamento).

Seguro de vida
O STJ já tem jurisprudência firmada no sentido de que a seguradora não pode extinguir unilateralmente contrato renovado por vários anos. Num dos casos julgados na Terceira Turma em 2011 (REsp 1.105.483), os ministros entenderam que a iniciativa ofende o princípio da boa-fé. A empresa havia proposto à consumidora, que tinha o seguro de vida havia mais de 30 anos, termos mais onerosos para a nova apólice.
Em seu voto, o ministro Massami Uyeda, hoje aposentado, concluiu que a pretensão da seguradora de modificar abruptamente as condições do contrato, não renovando o ajuste anterior nas mesmas bases, ofendia os princípios da boa-fé objetiva, da cooperação, da confiança e da lealdade que devem orientar a interpretação dos contratos que regulam as relações de consumo.
O julgamento foi ao encontro de precedente da Segunda Seção (REsp 1.073.595), relatado pela ministra Nancy Andrighi, em que os ministros definiram que, se o consumidor contratou ainda jovem o seguro de vida oferecido pela seguradora e o vínculo vem se renovando ano a ano, o segurado tem o direito de se manter dentro dos parâmetros estabelecidos, sob o risco de violação ao princípio da boa-fé objetiva.
Neste caso, a Seção estabeleceu que os aumentos necessários para o reequilíbrio da carteira têm de ser estabelecidos de maneira suave e gradual, mediante um cronograma, do qual o segurado tem de ser cientificado previamente.

Suicídio
Em 2011, a Segunda Seção também definiu que, em caso de suicídio cometido durante os dois primeiros anos de vigência do contrato de seguro de vida, período de carência, a seguradora só estará isenta do pagamento se comprovar que o ato foi premeditado (Ag 1.244.022).
De acordo com a tese vencedora, apresentada pelo ministro Luis Felipe Salomão, o novo Código Civil presume em regra a boa-fé, de forma que a má-fé é que deve sempre ser comprovada, ônus que cabe à seguradora. No caso analisado, o contrato de seguro de vida foi firmado menos de dois anos antes do suicídio do segurado, mas não ficou provado que ele assinara o contrato já com a intenção de se matar e deixar a indenização para os beneficiários.

Plano de saúde
Em outubro do ano passado, a Terceira Turma apontou ofensa ao princípio da boa-fé objetiva quando o plano de saúde reajusta mensalidades em razão da morte do cônjuge titular. No caso, a viúva era pessoa de 77 anos e estava vinculada à seguradora como dependente do marido fazia mais de 25 anos (AREsp 109.387).
A seguradora apresentou novo contrato, sob novas condições e novo preço, considerado exorbitante pela idosa. A sentença, que foi restabelecida pelo STJ, considerou “evidente” que o comportamento da seguradora feriu o CDC e o postulado da boa-fé objetiva, “que impõe aos contratantes, desde o aperfeiçoamento do ajuste até sua execução, um comportamento de lealdade recíproca, de modo a que cada um deles contribua efetivamente para o atendimento das legítimas expectativas do outro, sem causar lesão ou impingir desvantagem excessiva”.
Em precedente (Ag 1.378.703), a Terceira Turma já havia se posicionado no mesmo sentido. Na ocasião, a ministra Nancy Andrighi afirmou que, se uma pessoa contribui para um seguro-saúde por longo tempo, durante toda a sua juventude, colaborando sempre para o equilíbrio da carteira, não é razoável, do ponto de vista jurídico, social e moral, que em idade avançada ela seja tratada como novo consumidor. “Tal postura é flagrantemente violadora do princípio da boa-fé objetiva, em seu sentido de proteção à confiança”, afirmou.

Defeito de fabricação
No ano passado, a Quarta Turma definiu que, independentemente de prazo contratual de garantia, a venda de um bem tido por durável (no caso, máquinas agrícolas) com vida útil inferior àquela que legitimamente se esperava, além de configurar defeito de adequação (artigo 18 do Código de Defesa do Consumidor), evidencia quebra da boa-fé objetiva que deve nortear as relações contratuais, sejam de consumo, sejam de direito comum (REsp 984.106).
“Constitui, em outras palavras, descumprimento do dever de informação e a não realização do próprio objeto do contrato, que era a compra de um bem cujo ciclo vital se esperava, de forma
legítima e razoável, fosse mais longo”, concluiu o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso.

Bem de família em garantia
Contraria a boa-fé das relações negociais o livre oferecimento de imóvel, bem de família, como garantia hipotecária. Esta é a jurisprudência do STJ. Num dos precedentes, analisado em 2010, a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, entendeu que o ato equivalia à entrega de uma garantia que o devedor, desde o início, sabe ser inexequível, esvaziando-a por completo (REsp 1.141.732).
Por isso, a Terceira Turma decidiu que o imóvel deve ser descaracterizado como bem de família e deve ser sujeitado à penhora para satisfação da dívida afiançada. No caso, um casal figurava como fiador em contrato de compra e venda de uma papelaria adquirida pelo filho. Os pais garantiram a dívida com a hipoteca do único imóvel que possuíam e que lhes servia de residência.

Comportamento sinuoso
O princípio da boa-fé objetiva já foi aplicado diversas vezes no STJ no âmbito processual penal. Ao julgar um habeas corpus (HC 143.414) em dezembro passado, a Sexta Turma não reconheceu a ocorrência de nulidade decorrente da utilização de prova emprestada num caso de condenação por tráfico de drogas. Isso porque a própria defesa do réu concordou com o seu aproveitamento em momento anterior.
A relatora, ministra Maria Thereza de Assis Moura, lembrou que a relação processual é pautada pelo princípio da boa-fé objetiva e invocou a proibição de comportamentos contraditórios. “Tendo em vista o primado em foco, por meio do qual à ordem jurídica repugna a ideia de comportamentos contraditórios, tendo em vista a anuência fornecida pela defesa técnica, seria inadequado, num plano mesmo de eticidade processual, a declaração da nulidade”, concluiu a ministra.
Em outro caso (HC 206.706), seguindo voto do ministro Og Fernandes, a Sexta Turma reconheceu haver comportamento contraditório do réu que solicitou com insistência um encontro com o juiz e, após ser atendido, fora das dependências do foro, alegou suspeição do magistrado em razão dessa reunião.

Mitigar o prejuízo
Outro subprincípio da boa-fé objetiva foi invocado pela Sexta Turma para negar um habeas corpus (HC 137.549) – o chamado dever de mitigar a perda (duty to mitigate the loss). No caso, o réu foi condenado a prestar serviços à comunidade, mas não compareceu ao juízo para dar início ao cumprimento, porque não foi intimado em razão de o endereço informado no boletim de ocorrência estar incorreto.
O juízo de execuções ainda tentou a intimação em endereço constante na Receita Federal e na Justiça Eleitoral, sem sucesso. Por isso, a pena foi convertida em privativa de liberdade. A ministra Maria Thereza de Assis Moura, ao analisar a questão, invocou a boa-fé objetiva. Para ela, a defensoria pública deveria ter informado ao juízo de primeiro grau o endereço correto do condenado.
“A bem do dever anexo de colaboração, que deve empolgar a lealdade entre as partes no processo, cumpriria ao paciente e sua defesa informar ao juízo o endereço, para que a execução pudesse ter o andamento regular, não se perdendo em inúteis diligências para a sua localização”, afirmou a magistrada.

Boa-fé da administração
O princípio da boa-fé permeia a Constituição e está expresso em várias leis regedoras das atividades administrativas, como a Lei de Licitação, Concessões e Permissões de Serviço Público e a do Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos.
A doutora em direito administrativo Raquel Urbano de Carvalho alerta que, se é certo que se exige boa-fé do cidadão ao se relacionar com a administração, não há dúvida da sua indispensabilidade no tocante ao comportamento do administrador público.
E quando impõe obrigações a terceiros, “é fundamental que a administração aja com boa-fé, pondere os diferentes interesses e considere a realidade a que se destina sua atuação”. Para a doutrinadora, é direito subjetivo público de qualquer cidadão um mínimo de segurança no tocante à confiabilidade ético-social das ações dos agentes estatais.

Desistência de ações
A julgar mandado de segurança impetrado por um policial federal (MS 13.948), a Terceira Seção decidiu que a conduta da administração atacada no processo ofendeu os princípios da confiança e da boa-fé objetiva. No caso, o ministro da Justiça exigiu a desistência de todas as ações antes de analisar os pedidos de apostilamento do policial e, posteriormente, indeferiu a pretensão ao fundamento de inexistência de provimento judicial que amparasse a nomeação.
Conforme destacou o ministro Sebastião Reis Júnior, relator do caso, a atitude impôs prejuízo irrecuperável ao servidor: “Apesar da incerteza quanto ao resultado dos requerimentos, o pedido de desistência acarretou a extinção dos processos, com resolução do mérito, inclusive da demanda que lhe garantia a nomeação ao cargo, ceifando qualquer possibilidade de o impetrante ter um julgamento favorável, pois a apelação não havia, ainda, sido julgada.”
Em seu voto, o ministro ainda destacou doutrina que invoca como justificativa à proteção da boa-fé na esfera pública a impossibilidade de o estado violar a confiança que a própria presunção de legitimidade dos atos administrativos traz, agindo contra factum proprium.

Verbas a título precário
A Lei 8.112/90 prevê a reposição ao erário do pagamento feito indevidamente ao servidor público. O STJ tem decidido neste sentido, inclusive, quando os valores são pagos aos servidores em decorrência de decisão judicial de característica precária ou não definitiva (REsp 1.263.480).
No julgamento do AREsp 144.877, a Segunda Turma determinou que um servidor público que recebeu valores indevidos, por conta de decisão judicial posteriormente cassada, devolvesse o dinheiro à Fazenda Pública.
Essa regra, contudo, tem sido interpretada pela jurisprudência com alguns temperamentos, principalmente em decorrência de princípios como a boa-fé. Sua aplicação, por vezes, tem impedido que valores que foram pagos indevidamente sejam devolvidos. É o caso, por exemplo, do recebimento de verbas de boa-fé, por servidores públicos, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da administração.
“Objetivamente, a fruição do que foi recebido indevidamente está acobertada pela boa-fé, que, por sua vez, é consequência da legítima confiança de que os valores integravam o patrimônio do beneficiário”, esclareceu o ministro Humberto Martins, no mesmo julgamento.

Fonte: Superior Tribunal de Justiça