quarta-feira, 21 de outubro de 2020

Julgado: Danos morais. COMPANHIA AÉREA. PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. ASSENTO ADJACENTE AO DO ACOMPANHANTE NÃO DISPONIBILIZADO.

 


JUIZADOS ESPECIAIS CONSUMIDOR. INOBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. COMPANHIA AÉREA. PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. ASSENTO ADJACENTE AO DO ACOMPANHANTE NÃO DISPONIBILIZADO. INOBSERVÂNCIA À RESOLUÇÃO 280/2013 DA ANAC. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. DANO MORAL CONFIGURADO. VALOR ADEQUADO E PROPORCIONAL. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESTA PARTE, IMPROVIDO. 1. Aduziu a autora ser portadora de necessidade especial (lesão medular nível T4 - paraplégica), necessitando de acompanhante para viajar, todavia a empresa ré descumpriu a legislação vigente ao não acomodar sua acompanhante no assento adjacente no voo de Porto Alegre/RS à São Paulo/SP, situação que lhe gerou constrangimentos. Requereu reparação por danos morais. 2. Trata-se de recurso (ID16843304) interposto pela empresa ré contra a sentença que julgou procedente o pedido inicial para condená-la a pagar à autora a quantia de R$1.500,00, a título de dano moral. 3. Nas razões recursais, sustenta que o impedimento de embarque se deu por culpa exclusiva da autora que solicitou a modificação da reserva e não adquiriu outro bilhete para seguir até Porto Alegre/RS. Alega ausência do nexo de causalidade, ante a inexistência de ato ilícito e de comprovação da ocorrência do suposto dano moral, tratando-se de mero aborrecimento. Assevera a necessidade de adequação do valor indenizatório arbitrado, em atenção ao princípio da razoabilidade e proporcionalidade e à difícil situação socioeconômica vivenciada atualmente em decorrência da pandemia causada pela COVID-19. Pugna pelo provimento do recurso para que a sentença seja reformada, a fim de julgar improcedente o pedido inicial e, subsidiariamente, reduzir o ?quantum? indenizatório. 4. A relação jurídica estabelecida entre as partes é de natureza consumerista, haja vista as partes estarem inseridas nos conceitos de fornecedor e consumidor previstos no Código de Defesa do Consumidor. Aplicam-se ao caso em comento as regras de proteção do consumidor, inclusive as pertinentes à responsabilidade objetiva na prestação dos serviços. 5. Inicialmente, cumpre destacar que o argumento que se refere ao impedimento de embarque da autora/recorrente não guardam relação lógica com os fundamentos da sentença vergastada, tampouco com os fatos narrados na exordial. Por esta razão, não deve o recurso ser conhecido nesta parte, ante a flagrante inobservância ao princípio da dialeticidade. 6. A controvérsia cinge-se tão somente em verificar se o ato praticado pela companhia aérea, consistente na não disponibilização de assento adjacente ao de seu acompanhante, configura dano moral. 7. O art. 28, parágrafo único, da Resolução nº 280/2013 da ANAC dispõe que ?O acompanhante deve viajar na mesma classe e em assento adjacente ao do PNAE que esteja assistindo?. 8. O dano moral decorre de uma violação aos direitos da personalidade, atingindo, em última análise, o sentimento de dignidade da vítima. Está ínsito na ilicitude do ato praticado e é capaz de gerar transtorno, desgaste, constrangimento e abalo emocional, que extrapolam o mero aborrecimento. 9. A inobservância da legislação vigente (art. 28, parágrafo único, da Resolução nº 280/2013 da ANAC), que confere aos portadores de necessidades especiais o direito de viajar acomodado em assento adjacente ao de seu acompanhante, configura grave falha na prestação dos serviços da companhia aérea. 10. Do conjunto probatório inserido aos autos, verifica-se que a empresa ré não se desincumbiu do ônus de comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito pleiteado (art. 373, II do CPC), tampouco demonstrou causa excludente de sua responsabilidade. 11. No caso, da falha na prestação nos serviços (indisponibilidade de assento adjacente) advieram situações que ocasionaram constrangimento, transtorno e desconforto à demandante que, por não ter equilíbrio de tronco e possuir forte incidência de espasmos nos membros inferiores, não teve o auxílio de seu acompanhante e a segurança necessária durante o voo, ficando desassistida. 12. A situação narrada evidencia descaso e extrapola o limite do mero aborrecimento, pois atinge a esfera pessoal, causando alteração no estado anímico da consumidora, motivo pelo qual subsidia reparação por dano moral. 13. Considerando os limites da responsabilidade do transportador, mas também em consonância com os balizamentos da legislação consumerista brasileira e sua compreensão pelos tribunais pátrios, é sabido que o valor arbitrado há de levar em conta a situação financeira das partes, a extensão dos acontecimentos, suas repercussões, as evidencias peculiares do caso concreto. Necessário considerar igualmente o didático propósito de provocar a mudança de comportamento no causador da lesão, de forma a evitar condutas idênticas no futuro. 14. Desse modo, em que pese a depressão econômica decorrente da pandemia ocasionada pelo vírus Sars-COV-2, o valor arbitrado pelo juízo monocrático (R$1.500,00) não se mostra excessivo, tampouco há suficiente demonstração de circunstâncias que justifiquem a redução do valor da indenização estipulado na sentença. 15. A propósito, esta Terceira Turma Recursal consolidou entendimento no sentido de que o valor da indenização é fixado na origem, pelo juiz a quem incumbe o julgamento da causa, somente se admitindo a modificação do quantum na via recursal se demonstrado que a sentença esteve dissociada dos parâmetros que ensejaram sua valoração, o que não foi comprovado na situação concreta ora sob exame. 16. Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, improvido. Sentença mantida por seus próprios fundamentos. 17. Condenada a parte recorrente ao pagamento das custas processuais. Sem honorários advocatícios, ante a ausência de contrarrazões (art. 55, Lei 9.099/95). 18. A súmula de julgamento servirá de acórdão, conforme regra dos arts. 2º e 46 da Lei 9.099/95.

(TJDF 07379043220198070016 DF 0737904-32.2019.8.07.0016, Relator: Carlos Alberto Martins Filho, Data de Julgamento: 26/08/2020, Terceira Turma Recursal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 03/09/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.)