quarta-feira, 29 de maio de 2013

É possível a alienação, por procuração, de bem imóvel não especificado previamente?

O art. 661, caput, do Código Civil diz que o mandato em termos gerais só confere poderes de administração. 

A venda não é considerada ato de mera administração, mas sim de alienação.
O parágrafo primeiro do mesmo artigo, por sua vez, diz que "para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos".

Resta perguntar: o que são poderes especiais e expressos? Resposta: são especiais os poderes que extravasam os atos de mera administração. São expressos os poderes que nascem de uma declaração. No referido texto de lei, a palavra expressos significa o contrário de implícito. Ou seja, não se pode conceber um poder subentendido de alienação. Precisa haver a manifestação expressa do mandante nesse sentido.

No entanto, parte significativa da jurisprudência tem entendido que não basta o poder especial contido na procuração para viabilizar a venda de bem imóvel. Seria também necessária a descrição precisa do imóvel que se pretende alienar. O Superior Tribunal de Justiça (Resp. 262.777-SP) já decidiu, em 2009, nesse sentido: "Para realização de negócio jurídico que transcende a administração ordinária, tal qual a alienação de bens imóveis, exige-se a outorga de poderes especiais e expressos, com a respectiva descrição do objeto a ser negociado" (Relator: Ministro Luis Felipe Salomão).

Em outras palavras, a interpretação majoritária ordena a imprescindibilidade da individualização dos poderes e também a precisa identificação dos bens a serem negociados. Não é preciso encarecer a quantidade e a importância das consequências práticas advindas desse entendimento. Basta lembrar que o cartório de registro de imóveis pode não registrar a compra e venda de um imóvel alienado nessas condições. E se não há registro do título aquisitivo, tecnicamente não há transferência da propriedade.

Tal compreensão não nos parece a mais acertada. Claramente, o adjetivo "expressos" qualifica o substantivo "poderes". Logo, os poderes devem ser expressos. Não há na lei absolutamente nenhuma menção à necessidade de identificação precisa dos bens a serem negociados por procurador. Nem se pode extrair tal conclusão do texto legal. O legislador assim se pronunciou ("poderes expressos") porque no caput do mesmo artigo 661 do CC, não há necessidade de especificar expressamente os poderes que decorrem da mera administração. Ex: para locar, não é necessário poder expresso, pois estaria compreendido na ideia de administração. Diferentemente, o poder para a alienação em nenhuma circunstância pode ser presumido. Deve resultar, expressa e inequivocamente, da procuração.

Além disso, a leitura do art. 661 do CC sob tal perspectiva cria limitação muito significativa à vontade das partes. As pessoas, pelas mais variadas razões, podem julgar conveniente a outorga de procuração com maior amplitude, principalmente para amparar ausências de duração mais prolongada por parte do mandante. 

Muitas vezes, o objetivo pode ser o de vender bens futuros, que ainda não podem por essa razão ser identificados porque ainda não integram o patrimônio do mandante. A interpretação ora comentada simplesmente aniquila tal possibilidade.

Extrair da lei o que ela não contém é inadequado, ainda que o objetivo seja o de aumentar a segurança das relações negociais e evitar simulações. Ninguém pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art. 5o, II, da CF).

Adriano Ferriani é professor de Direito Civil e chefe do departamento de Direito Civil, Direito Processual Civil e Direito do Trabalho da PUC/SP.
http://www.migalhas.com.br/Civilizalhas/94,MI179501,51045-E+possivel+a+alienacao++por+procuracao++de+bem+imovel+nao 

TJGO: Pai é condenado a indenizar filho por abandono afetivo

Um homem que não contribuiu com a criação de seu filho foi condenado a indenizar o menor por abandono afetivo. O valor fixado é de R$ 22.420,00, além do pagamento de alimentos ao adolescente, no valor mensal que corresponde a 50% do salário mínimo, mais 50% das despesas médicas, farmacêuticas, odontológicas e com materiais escolares. A decisão é do juiz de Direito Danilo Luiz Meireles dos Santos, da 2ª Vara de Família e Sucessões de Anápolis/GO.

Segundo os autos, o menor afirma que, o requerido efetuou seu registro de nascimento, porém nunca lhe forneceu qualquer ajuda financeira, tampouco contribuiu com sua criação. Argumenta que o abandono afetivo causou sérios danos em sua formação psicológica e na sua inserção social. Assevera ainda que não possui meios próprios para manter a sua subsistência. 

O pai apresentou contestações que foram impugnadas e ainda alegou não ter condições de arcar com os alimentos em quantia superior a 30% do salário mínimo, pois um valor maior comprometeria à sua subsistência.

Para o magistrado, a família passou a ser reconhecida como base da sociedade. "Resguardar a pessoa dos filhos torna-se matéria de interesse social, razão pela qual a legislação prevê normas que devem ser observadas", afirma. 

De acordo com a decisão, o art. 227, da CF/88, "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária". 

O magistrado também cita o art. 19, do ECA (lei n° 8.069/90), que fala sobre a importância da convivência familiar. "Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.” 

Segundo o magistrado, a indenização tem, além do caráter punitivo e compensatório, função pedagógica, porque visa combater as atitudes que afrontam os princípios constitucionais de proteção e garantia da dignidade humana. No caso específico, as consequências psicológicas são consideradas irreversíveis e permanentes, pois nenhuma conduta do pai poderá amenizar os danos do abandono.

O juiz ainda afirma em sua decisão que "a afetividade se trata de um dever familiar, fundamental na formação do menor. Assim, se conclui que não se trata de mensurar os sentimentos, no caso, o amor paterno, mas sim, analisar se houve o descumprimento de uma obrigação legal", concluiu. 

O número do processo não é divulgado porque corre em segredo de justiça.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI179506,51045-Pai+e+condenado+a+indenizar+filho+por+abandono+afetivo

terça-feira, 28 de maio de 2013

Julgado STJ - extinção de usufruto

DECISÃO
 
Independe de prazo certo a extinção de usufruto pelo não uso de imóvel .
A extinção do usufruto pelo não uso de imóvel pode ocorrer independentemente de prazo certo, sempre que, diante das circunstâncias, se verificar o não atendimento dos fins sociais da propriedade.

A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou provimento a recurso especial interposto por uma usufrutuária de imóvel em Minas Gerais que sofria uma ação de extinção de usufruto movida pela proprietária. Esta alegava que a usufrutuária não estava utilizando o bem sobre o qual tinha direito.

O usufruto é “o direito real em que o proprietário – permanecendo com a posse indireta e com o poder de disposição – transfere a um terceiro as faculdades de usar determinado bem e de retirar-lhe os frutos”. No entanto, em decorrência do não uso do bem, o direito real do usufrutuário torna-se extinto, conforme dispõe artigo 1.410, VIII, do Código Civil (CC).

Extinção do usufruto

O recurso é contra decisão do tribunal de justiça mineiro, que deu provimento à apelação da proprietária do imóvel para extinguir o usufruto. Os desembargadores consideraram que as provas integrantes do processo revelam que a usufrutuária não usava o imóvel há mais de uma década. “Extingue-se o usufruto pelo não uso da coisa pelo prazo de 10 anos”, estabeleceu o acórdão.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, destacou que o artigo 1.228, parágrafo 1º, do CC estabelece que a usufrutuária tem a obrigação de exercer seu direito em consonância com as finalidades social e econômica a que se destina a propriedade. Para assegurar que seja cumprida essa função, o Código Civil de 2002 instituiu o não uso da coisa como causa extintiva do usufruto.

Prazo

A relatora observa que o legislador não estipulou o prazo mínimo a ser observado para a hipótese discutida no recurso, ou seja, o não uso do bem. Contudo, apontou que a doutrina tem se inclinado pela aplicação do prazo de dez anos, baseada na regra geral de prescrição do artigo 205 do Código Civil ou empregando, por analogia, o prazo previsto para extinção de servidões pelo mesmo motivo. Essa posição foi adotada no acórdão recorrido.

No entanto, segundo Nancy Andrighi, não é possível admitir que sejam aplicados prazos prescricionais, devido a dois pontos cruciais. Primeiro porque a norma do Código Civil de 1916, que previa a extinção do usufruto pela prescrição, não foi reeditada pelo Código atual, encontrando-se, portanto, revogada. Segundo porque o usufruto – direito real – não prescreve. A relatora entende que “a ausência de prazo específico, nesse contexto, deve ser interpretada como opção deliberada do legislador, e não como lacuna da lei”.


REsp 1179259 - http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=109802






STJ amplia conceito de família para proteger bem

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou possível que a impenhorabilidade do bem de família atinja simultaneamente dois imóveis do devedor — aquele onde ele mora com sua esposa e outro onde vivem as filhas nascidas de relação extraconjugal.
Os ministros entenderam que a impenhorabilidade do bem de família deve resguardar não somente o casal, mas o sentido amplo de entidade familiar. Assim, no caso de separação dos membros da família, a entidade familiar não se extingue para efeitos de impenhorabilidade de bem. Pelo contrário, surge em duplicidade: uma composta pelos cônjuges e outra composta pelas filhas de um deles.
O recurso julgado pelo STJ foi interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais contra decisão do Tribunal de Justiça do estado, que, por maioria, decidiu que a garantia legal da impenhorabilidade só poderia recair sobre um único imóvel, onde o devedor morasse com sua família.
Ao ser intimado da penhora, o devedor alegou que o imóvel em que vivia era bem de família e indicou, em substituição, um segundo imóvel. Após a substituição do bem penhorado, o devedor alegou que este também era impenhorável por também se tratar de bem de família. Disse que neste segundo imóvel residiam suas duas filhas e a mãe delas.
Como a Justiça não reconheceu a condição de bem de família do segundo imóvel, a mãe, representando as filhas, ofereceu embargos de terceiros para desconstituir a penhora incidente sobre o imóvel em que residiam. Dessa vez, a pretensão teve êxito, e a penhora foi afastada na primeira instância, mas o TJ-MG reformou a decisão. Por maioria de votos, o TJMG decidiu que a relação concubinária do devedor não poderia ser considerada entidade familiar, nos termos da legislação em vigor.

Direito à moradia
Relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva disse que o reconhecimento da união estável como entidade familiar pela Constituição trouxe “importante distinção entre relações livres e relações adulterinas”, mas essa distinção não interfere na solução do caso analisado, pois o que está em questão é a impenhorabilidade do imóvel onde as filhas residem. Afinal, lembrou o ministro, a Constituição estabelece que os filhos, nascidos dentro ou fora do casamento, assim como os adotados, têm os mesmos direitos.
Segundo o relator, a jurisprudência do STJ vem há tempos entendendo que a impenhorabilidade prevista na Lei 8.009 não se destina a proteger a família em sentido estrito, mas, sim, a resguardar o direito fundamental à moradia, com base no princípio da dignidade da pessoa humana.

Famílias diversas
“Firme em tal pensamento, esta corte passou a abrigar também o imóvel de viúva sem filhos, de irmãos solteiros e até de pessoas separadas judicialmente, permitindo, neste caso, a pluralidade de bens protegidos pela Lei 8.009”, afirmou o relator. Para ele, “o conceito de entidade familiar deve ser entendido à luz das alterações sociais que atingiram o direito de família. Somente assim é que poderá haver sentido real na aplicação da Lei 8.009”.
Isso porque, explicou Villas Bôas Cueva, o intuito da norma não é proteger o devedor contra suas dívidas, tornando seus bens impenhoráveis, mas garantir a proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 27 de maio de 2013
 http://www.conjur.com.br/2013-mai-27/stj-considera-relacionamento-extraconjugal-proteger-bem-familia

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Matéria especial do STJ aborda o contrato de gaveta na compra de imóvel

O dado revela o uso indiscriminado desta modalidade de acordo intitulada "contrato de gaveta": segundo a Corte, 30% dos mutuários brasileiros são usuários desse tipo de instrumento. Acerca do tema, veja material especial divulgada no site do STJ:
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Contrato de gaveta: riscos no caminho da casa própria
Comprar imóvel com "contrato de gaveta" não é seguro, mas é prática comum. Acordo particular realizado entre o mutuário que adquiriu o financiamento com o banco e um terceiro, traz riscos evidentes. Entre outras situações, o proprietário antigo poderá vender o imóvel a outra pessoa, o imóvel pode ser penhorado por dívida do antigo proprietário, o proprietário antigo pode falecer e o imóvel ser inventariado e destinado aos herdeiros.
Além disso, o próprio vendedor poderá ser prejudicado, caso o comprador fique devendo taxa condominial ou impostos do imóvel, pois estará sujeito a ser acionado judicialmente em razão de ainda figurar como proprietário do imóvel.
Por problemas assim, o “contrato de gaveta” é causa de milhares de processos nos tribunais, uma vez que 30% dos mutuários brasileiros são usuários desse tipo de instrumento.
A CEF considera o “contrato de gaveta” irregular porque, segundo o artigo 1º da lei 8.004/90, alterada pela lei 10.150/00, o mutuário do SFH - Sistema Financeiro de Habitação tem que transferir a terceiros os direitos e obrigações decorrentes do respectivo contrato. Exige-se que a formalização da venda se dê em ato concomitante à transferência obrigatória na instituição financiadora.
Entretanto, o STJ tem reconhecido, em diversos julgados, a possibilidade da realização dos “contratos de gaveta”, uma vez que considera legítimo que o cessionário do imóvel financiado discuta em juízo as condições das obrigações e direito assumidos no referido contrato.
Validade de quitação
O STJ já reconheceu, por exemplo, que se o “contrato de gaveta” já se consolidou no tempo, com o pagamento de todas as prestações previstas no contrato, não é possível anular a transferência, por falta de prejuízo direto ao agente do SFH.
Para os ministros da 1ª turma, a interveniência do agente financeiro no processo de transferência do financiamento é obrigatória, por ser o mútuo hipotecário uma obrigação personalíssima, que não pode ser cedida, no todo ou em parte, sem expressa concordância do credor.
No entanto, quando o financiamento já foi integralmente pago, com a situação de fato plenamente consolidada no tempo, é de se aplicar a chamada “teoria do fato consumado”, reconhecendo-se não haver como considerar inválido e nulo o “contrato de gaveta” (REsp 355.771).
Em outro julgamento, o mesmo colegiado destacou que, com a edição da lei 10.150, foi prevista a possibilidade de regularização das transferências efetuadas até 25 de outubro de 1996 sem a anuência da instituição financeira, desde que obedecidos os requisitos estabelecidos (REsp 721.232).
“Como se observa, o dispositivo em questão revela a intenção do legislador de validar os chamados ‘contratos de gaveta’ apenas em relação às transferências firmadas até 25 de outubro de 1996. Manteve, contudo, a vedação à cessão de direitos sobre imóvel financiado no âmbito do SFH, sem a intervenção obrigatória da instituição financeira, realizada posteriormente àquela data”, afirmou o relator do caso, o então ministro do STJ Teori Zavascki, hoje no STF.
No julgamento do REsp 61.619, a 4ª turma do STJ entendeu que é possível o terceiro, adquirente de imóvel de mutuário réu em ação de execução hipotecária, pagar as prestações atrasadas do financiamento habitacional, a fim de evitar que o imóvel seja levado a leilão.
Para o colegiado, o terceiro é diretamente interessado na regularização da dívida, uma vez que celebrou com os mutuários contrato de promessa de compra e venda, quando lhe foram cedidos os direitos sobre o bem. No caso, a Turma não estava discutindo a validade, em si, do “contrato de gaveta”, mas sim a quitação da dívida para evitar o leilão do imóvel.
Revisão de cláusulas
Para o STJ, o cessionário de contrato celebrado sem a cobertura do FCVS  - Fundo de Compensação de Variações Salariais não tem direito à transferência do negócio com todas as suas condições originais, independentemente da concordância da instituição financeira.
O FCVS foi criado no SFH com a finalidade de cobrir o saldo residual que porventura existisse ao final do contrato de financiamento. Para ter esse benefício, o mutuário pagava uma contribuição de 3% sobre cada parcela do financiamento. Até 1987, os mutuários não tinham com o que se preocupar, pois todos os contratos eram cobertos pelo FCVS. A partir de 1988, ele foi retirado dos contratos e extinto em definitivo em 1993.
De acordo com a ministra Isabel Gallotti, relatora do caso, o terceiro pode requerer a regularização do financiamento, caso em que a aceitação dependerá do agente financeiro e implicará a celebração de novo contrato, com novas condições financeiras.
Segundo a ministra, quando o contrato é coberto pelo FCVS, o devedor é apenas substituído e as condições e obrigações do contrato original são mantidas. Porém, sem a cobertura do FCVS, a transferência ocorre a critério do agente financeiro e novas condições financeiras são estabelecidas (REsp 1.171.845).
Em outro julgamento, o STJ também entendeu que o cessionário de mútuo habitacional é parte legítima para propor ação ordinária contra agente financeiro, objetivando a revisão de cláusula contratual e de débito, referente a contrato de financiamento imobiliário com cobertura pelo FCVS.
“Perfilho-me à novel orientação jurisprudencial que vem se sedimentando nesta Corte, considerando ser o cessionário de imóvel financiado pelo SFH parte legítima para discutir e demandar em juízo questões pertinentes às obrigações assumidas e aos direitos adquiridos através dos cognominados ‘contratos de gaveta’, porquanto, com o advento da Lei 10.150, o mesmo teve reconhecido o direito de sub-rogação dos direitos e obrigações do contrato primitivo”, assinalou o relator do recurso, o ministro Luiz Fux, atualmente no STF (REsp 627.424).
Seguro habitacional
Exigido pelo SFH, o seguro habitacional garante a integridade do imóvel, que é a própria garantia do empréstimo, além de assegurar, quando necessário, que, em eventual retomada do imóvel pelo agente financeiro, o bem sofra a menor depreciação possível.
No caso de “contrato de gaveta”, a 3ª turma do STJ decidiu que não é devido o seguro habitacional com a morte do comprador do imóvel nessa modalidade, já que a transação foi realizada sem o conhecimento do financiador e da seguradora (REsp 957.757).
Em seu voto, a relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que, de fato, não é possível a transferência do seguro habitacional nos “contratos de gaveta”, pois nas prestações de mútuo é embutido valor referente ao seguro de vida, no qual são levadas em consideração questões pessoais do segurado, tais como idade e comprometimento da renda mensal.
“Ao analisar processos análogos, as turmas que compõem a 2ª seção decidiram que, em contrato de promessa de compra e venda, a morte do promitente vendedor quita o saldo devedor do contrato de financiamento. Reconhecer a quitação do contrato de financiamento em razão, também, da morte do promitente comprador, incorreria este em enriquecimento sem causa, em detrimento da onerosidade excessiva do agente financeiro”, destacou a relatora.
Diante dos riscos representados pelo “contrato de gaveta”, o melhor é regularizar a transferência, quando possível, ou ao menos procurar um escritório de advocacia para que a operação de compra e venda seja ajustada com o mínimo de risco para as partes contratantes.

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI179304,51045-Materia+especial+do+STJ+aborda+o+contrato+de+gaveta+na+compra+de

Programa Adoção Tardia é destaque no site do CNJ

O Programa "Adoção Tardia", desenvolvido pela 1ª Vara da Infância e Juventude da Serra, ganhou destaque desde última sexta-feira (24) no site do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) como iniciativa de conscientização à adoção de crianças e adolescentes entre 3 e 18 anos.

Em sua segunda edição, o programa busca levar informações aos interessados, permite a troca de experiências com pais adotivos sobre todo o processo e as dificuldades de adaptação entre a recém-formada família. Neste ano um estande foi montado no shopping Mestre Álvaro, na Serra, para tirar dúvidas. Os servidores ainda fizeram uma panfletagem e exposição de fotos de famílias que já adotaram crianças dentro por meio do "Adoção Tardia".

"Estou muito feliz e realizada com esse resultado tão satisfatório. As pessoas que participaram do evento já estão procurando a 1ª Vara da Infância e da Juventude. Isso demonstra que estamos conseguindo acabar com o mito da Adoção Tardia", explicou a juíza Gladys Pinheiros.

Desenvolvido pela magistrada, juntamente com sua equipe multidisciplinar e parceiros, o programa foi vencedor da IX edição do Prêmio Innovare, que reconhece práticas inovadoras no âmbito do Poder Judiciário. Nesta edição do Prêmio Innovare, foram escolhidas seis práticas vencedoras de um universo de mais de 400 inscritas por operadores do Direito em todo o Brasil.

O prêmio do Instituto Innovare é concedido a magistrados, advogados, Tribunais e membros da Defensoria e Ministério Público. "Eu realmente, desde a primeira Campanha, eu não esperava esse resultado tão positivo. Vamos continuar conscientizando sobre a adoção de crianças e adolescentes levando esse programa por meio de outros eventos que pretendemos realizar", pontuou a juíza

O Espírito Santo, atualmente, possui 848 crianças e adolescentes em acolhimento. Deste total, 133 estão aptas para a adoção e a maioria possui idade entre 3 e 18 anos, perfil muitas vezes distante do idealizado pelos mais de 700 pretendentes a pais adotivos, que manifestaram interesse em crianças na faixa etária entre 0 e 2 anos.

Confira matéria publicada pelo CNJ http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/24838-judiciario-investe-no-combate-a-preconceitos

Assessoria de Comunicação do TJES

O casamento 'gay' é ato inexistente

Causa estarrecimento a recente resolução do Conselho Nacional de Justiça, de n.º 175, que obriga os cartórios a celebrar o casamento de pessoas do mesmo sexo. Até pouco tempo, não havia dúvidas de que o casamento havido entre pessoas do mesmo sexo era negócio jurídico inexistente.
Já atropelavam a Constituição as decisões judiciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que reconheciam a existência e atribuíam efeitos jurídicos à união civil entre pessoas do mesmo sexo. Tais decisões, como a recente resolução do CNJ, causam perplexidade e suscitam o questionamento sobre os limites da atuação do Poder Judiciário. Poderá ele reescrever a Constituição, atribuindo-se funções de legislador constituinte, invocando princípios para solapar a letra expressa do texto constitucional? Está correto do ponto de vista técnico fazer prevalecer princípios, cujo conteúdo é sempre maleável, em detrimento da letra expressa do texto constitucional?
Ora, o art. 226, § 3.º, da Lei Maior é de clareza meridiana:
“§ 3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento”.
Em outras palavras, nem mesmo a união civil pode se dar entre pessoas do mesmo sexo. Também ela é inexistente aos olhos do direito, por mais que se invoquem princípios de discutível conteúdo, quanto mais o casamento. A dualidade de sexos é elemento essencial da união civil, diz o Constituinte. Coisa diversa é a sociedade de fato, que não constitui entidade familiar, pode ser formada por pessoas do mesmo sexo e ter consequências jurídicas. Casamento gay e união civil entre pessoas do mesmo sexo são construções de vento, ficções, mas não ficções jurídicas, pois nem sequer penetram no mundo do direito.
O Poder Judiciário envereda por caminho perigoso, antidemocrático, totalitário, manietando a ampla discussão que o tema deve ter. Introduz, manu militari, com desprezo da opinião pública e ignorando a atuação do Parlamento, inovações graves no ordenamento jurídico, tão somente com base em princípios, repita-se, de conteúdo discutível, de forte carga ideológica, e contrariamente a texto expresso promulgado pelo Poder Constituinte Originário.
O direito não pode ficar refém de ideologias. Não pode se curvar e estar a serviço de crenças liberalizantes em matéria sexual. Ideologia não se impõe no tapetão. Crenças materialistas não detém, na Constituição, qualquer privilégio em relação a crenças de outra ordem. Na Constituição, materialismo e espiritualismo equivalem-se. Não se impõe materialismo por sentença.
Será que nos apercebemos da gravidade da situação?
Invoca-se a laicidade do Estado, apesar de geralmente haver abuso no emprego desse argumento. Agora, é jurídico decidir com base em princípios quando há texto constitucional expresso, emanado do Poder Constituinte Originário? E os outros princípios expressos da república, do estado de direito, da separação de poderes, da liberdade de pensamento e de crença, da soberania popular? Qual é a sua extensão? Ou invocar a república e o estado de direito comprometem a laicidade do Estado? A separação de poderes é dogma jurídico ou de que natureza? O poder emana do povo ou dos juízes? É o povo quem dá o poder aos juízes, não o contrário.
Tenho para mim que as decisões judiciais que reconhecem a união civil entre pessoas do mesmo sexo e a recente resolução do CNJ atentam, elas sim, contra a laicidade do Estado. Explico.
De um lado, elas não têm assento na lei, na Lei Maior, no texto constitucional, portanto, não têm substrato jurídico. De outro, não se assentam na natureza humana, pois diz-se que o gênero é uma construção social. De outro ainda, não se assentam na soberania popular, senhora do seu destino. Assentam-se, ao revés, em princípios que, infelizmente, estão sujeitos a manipulações ou servem a construções ideológicas. Comprometem-se, portanto, tais atos com uma visão de mundo segundo a qual os homossexuais são vítimas da sociedade, e o homossexualismo é um supervalor humano.
A pergunta, pois, que não quer calar é se estado confessional é apenas aquele que professa uma fé religiosa ou se o é aquele que impõe uma ideologia oficial. Para mim, a resposta à indagação é óbvia. Não se pode proscrever uma fé oficial de cunho metafísico e tornar obrigatório um credo materialista, ainda que travestido de direitos humanos.
Outra questão que se põe é a seguinte: existe liberdade absoluta em matéria sexual? Se nenhum direito é absoluto, por que o seria o de contrair casamento contrariamente à lei natural? A sociedade inteira não tem o direito de opinar e influir nas decisões do Estado em matéria familiar? Por que razão deteria o Poder Judiciário mais legitimidade ou autoridade do que o povo, do qual se diz que o poder emana e que o exerce diretamente ou por meio de representantes eleitos, para determinar, com base em princípios de questionável conteúdo e alcance, forjados nos laboratórios da ideologia, e não em texto constitucional expresso, o desenho, a moldura, o caráter da sociedade ou entidade familiar?
A norma emanada da Resolução n.º 175 do CNJ é ato inexistente. Tanto quanto a união civil e o casamento entre pessoas do mesmo sexo, não encontra suporte no ordenamento jurídico brasileiro, no estado de direito, na soberania popular, na separação de poderes, na laicidade do Estado e no art. 226, § 3.º, da Constituição. Não vale a tinta com que foi escrita. É uma ficção e não merece cumprimento.

KRAUSE, Paul Medeiros. O casamento 'gay' é ato inexistente. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3615, 25 maio 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24514>. Acesso em: 27 maio 2013.

Direito de habitação impede alienação de imóvel

As filhas do primeiro casamento não podem opor à segunda família do pai falecido, detentora de direito real de habitação sobre imóvel objeto da herança, as prerrogativas inerentes à propriedade de fração desse imóvel. Assim, elas não podem pedir a alienação do patrimônio imobiliário para a apuração do quinhão que lhes é devido. O entendimento, por maioria, é da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
A ação de dissolução de condomínio foi ajuizada pelas filhas do primeiro casamento contra a segunda esposa e os filhos do segundo casamento de seu pai, que vivem no imóvel em decorrência do direito de habitação.
Na ação, as autoras alegaram que, após a morte do pai, apesar do recebimento de fração ideal como quinhão de herança (1/8), não tiveram acesso ao imóvel. Assim, em razão da impossibilidade de utilizar o patrimônio herdado, pretendem que o imóvel seja vendido para que possam receber sua parte em dinheiro.

Único imóvel
O juízo de primeiro grau determinou a alienação judicial do imóvel, resguardando o direito de preferência e adjudicação a ser exercido por cada condômino até a assinatura do auto de arrematação. A segunda família apelou e o Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a sentença. “Ao cônjuge sobrevivente, observadas as prescrições legais, é assegurado o direito real de habitação relativamente ao único imóvel destinado à residência da família, a teor do disposto no artigo 1.611 do Código Civil de 1916”, observou o acórdão do TJ-SP.
No STJ, as filhas do primeiro casamento sustentaram que a vedação judicial à possibilidade de disporem do patrimônio que lhes foi deixado como herança vulnera o princípio da isonomia entre os herdeiros.

Direito real
A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, restabeleceu a sentença e determinou a alienação judicial do bem. Segundo a ministra, a relação entre as famílias, apesar da previsão legal de direito real de habitação para a segunda esposa do falecido, não pode ter outro tratamento que não aquele que usualmente se dá ao condomínio.
O ministro Sidnei Beneti divergiu do entendimento da relatora. Ele citou o Código Civil de 2002, que em seu artigo 1.831 determina: “Ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens, será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habitação relativamente ao imóvel destinado à residência da família, desde que seja o único daquela natureza a inventariar.”
Segundo Beneti, o Código Civil atual reproduziu na essência o que dispunha o de 1916 sobre a matéria, reafirmando a intenção de “amparar o cônjuge supérstite que reside no imóvel do casal”. No caso julgado, observou o ministro, trata-se de “modesta casa situada no interior, já tendo sido, nas alegações da parte contrária, transferido todo o patrimônio do de cujus à anterior esposa e às ora recorrentes, quando da separação”.
O ministro citou ainda a ampla jurisprudência do STJ em reconhecimento do direito de habitação do cônjuge sobrevivente, a qual serviu de fundamento para a própria decisão do TJ-SP. Os demais ministros do colegiado acompanharam o voto divergente do ministro Beneti. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Revista Consultor Jurídico, 25 de maio de 2013
http://www.conjur.com.br/2013-mai-25/direito-habitacao-impede-alienacao-imovel-divisao-heranca

quinta-feira, 23 de maio de 2013

Guarda de animais silvestres

Conama regula medida em que pessoa física poderá obter posse provisória de algumas espécies da fauna, mas prioridade continua com Ibama

DA REDAÇÃO

O Conselho Nacional de Meio Ambiente aprovou, nesta quarta-feira (22/05), resolução que regula a guarda provisória de espécies da fauna silvestre por pessoas físicas em todo o País, quando não houver outra solução possível. A prioridade de guarda continua a cargo dos Centros de Triagem de Animais Silvestres, os Cetas, autorizados pelo Ibama e responsáveis pela recuperação e reintrodução desse animais na natureza.

A medida regulamenta uma lei de 1998, que prevê que os órgãos ambientais podem encaminhar animais apreendidos, resgatados ou recebidos espontaneamente para serem cuidados por pessoas cadastradas. Os cuidadores precisam demonstrar que apresentam condições para abrigar as espécies até que o órgão ambiental encontre uma destinação adequada. A reintrodução ao habitat é uma prioridade prevista em lei.

Em último caso, quando não houver condições de transporte ou abrigamento em instalações adequadas ou mesmo guardador cadastrado, a guarda pode ser dada provisoriamente à pessoa encontrada em posse do animal. Porém, ela continuará tendo que responder judicialmente pela posse ilegal do animal. As leis ambientais brasileiras consideram crime retirar animais silvestres de seus habitats sem a prévia autorização dos órgãos ambientais competentes.

Nem todas as espécies são passíveis de criação em cativeiro para fins comerciais ou para serem criados como mascotes. O Ibama terá 90 dias para publicar a chamada “lista pet”, relacionando as espécies abrangidas pela resolução Conama. A medida aprovada deverá trazer segurança jurídica tanto para a guarda e depósito quanto para a fiscalização após a apreensão dos animais. Criar animais silvestres como domésticos, principalmente aves e pequenos primatas, é costume em pequenas comunidades interioranas. Isso acaba inviabilizando sua reintrodução à natureza.

Fonte:  http://www.mma.gov.br/informma/item/9347-guarda-de-animais-silvestres

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Multiparentalidade: a possibilidade de coexistência da filiação socioafetiva e filiação biológica

 
Há muito se fala em parentalidade socioafetiva. Há muito se discute sobre qual das modalidades de filiação deve prevalecer. Aliás, será julgado pelo Supremo Tribunal Federal, recurso que analisa o que deve preponderar: paternidade biológica ou socioafetiva.[1] A questão que se coloca é: será sempre necessário ver o tema da filiação numa lógica de mono ou biparentalidade? Não será possível que uma alguém tenha mais de duas pessoas que exerçam efetivamente e afetivamente as funções parentais? Ter-se-á que enxergar a questão sempre sob uma ótica de substituição ou exclusão, ou será possível que uma pessoa tenha uma mãe e dois pais, duas mães e um pai ou, até mesmo, duas mães e dois pais?
Um “lugar comum” de possibilidade de ocorrência da parentalidade socioafetiva é a denominada família mosaico, que resulta da multiplicidade das relações parentais oriundas das desuniões e da reconstituição da vida afetiva dos seus membros, por meio do casamento ou união estável. A especificidade desse modelo familiar origina-se na peculiar estrutura do núcleo, formado por pares onde um ou ambos tiveram uniões ou casamentos anteriores e trazem consigo, para a nova entidade familiar, seus filhos e, não raras vezes, tem prole comum.
Mas não apenas nesse modelo familiar é possível a existência de parentalidade socioafetiva. A mesma também estará presente, por exemplo, em casos de adoção à brasileira, que se configura quando alguém, ciente de que não é o pai biológico de uma criança, a registra e age como se seu pai fosse, muito embora a paternidade registral não corresponda à paternidade genética.
Essas são apenas duas das possibilidades onde a filiação socioafetiva[2] pode se apresentar e, recentemente, alguns casos foram decididos pelo Judiciário, evidenciando que a existência de parentalidade socioafetiva não implica, necessariamente, em uma exclusão da parentalidade biológica e vice-versa.
No Estado de Rondônia, em lide recente, buscava-se a desconstituição de uma paternidade registral e o reconhecimento da paternidade genética por meio de uma ação de investigação de paternidade cumulada com anulatória de registro civil, em um caso clássico de adoção à brasileira.
É certo que possuímos um direito fundamental ao conhecimento das origens genéticas e, ao buscar que a sua realidade registral correspondesse à realidade biológica, a criança em causa aproximou-se do pai genético, a partir da realização do exame de DNA e passou a relacionar-se com ele. Todavia, reconhecia como pai aquele que coabitava com sua mãe à época do seu nascimento e, mesmo estando ciente que não era seu pai, registrou-a. Aliás, os vínculos afetivos mostraram-se tão fortes que a convivência continuou e alargou-se no tempo, mesmo após o fim da união com sua genitora.
O que fazer em casos como este, onde ambos os pais – biológico e socioafetivo – se mostram dispostos a exercer a função paterna com zelo e afeto? Escolher entre um e outro? Não parece ser a resposta mais razoável e de acordo com o melhor interesse da criança.
Como indicou a magistrada do caso em tela, “pretendida declaração de inexistência do vínculo parental entre a autora e o pai registro afetivo fatalmente prejudicará seu interesse, que diga-se, tem prioridade absoluta, e assim também afronta a dignidade da pessoa humana. Não há motivo para ignorar o liame socioafetivo estabelecido durante anos na vida de uma criança, que cresceu e manteve o estado de filha com outra pessoa que não o seu pai biológico, sem se atentar para a evolução do conceito jurídico de filiação”.[3]
Assim, ciente de toda a singularidade do caso, considerando as manifestações da criança, no sentido de que possui dois pais e a vontade do pai socioafetivo, que não desejava desfazer a parentalidade constituída, a magistrada acolheu a proposta do MP de reconhecimento de dupla paternidade registral da infante. Assim, foi mantido no assento de nascimento o nome do pai socioafetivo e acrescentado o nome do pai biológico.
Em dois julgados, no Estado de Pernambuco e no Estado do Paraná, respectivamente, buscava-se o reconhecimento de filiação socioafetiva, por meio de adoções unilaterais, que implicaria na ruptura do vínculo dos autores com os pais biológicos mostrando-se, nesses casos concretos, contrário ao melhor interesse das crianças.
O Juiz da 2ª Vara da Infância e Juventude de Recife reconheceu a multiparentalidade, ao invés de conceder a adoção unilateral da madrasta, autorizando que uma criança de 4 anos fosse registrada no nome dos pais biológicos e no da companheira do pai, que criava o infante praticamente desde o seu nascimento, em virtude da carência material da mãe biológica. A ideia inicial, como mencionado, era a de que a mãe-afim adotasse o enteado mas, em nome do princípio do melhor interesse da criança, o magistrado terminou por determinar que menino iria ter duas mães jurídicas e um pai, por não enxergar razões para que o vínculo com a mãe biológica fosse destruído.[4]
Em Cascavel, no Paraná, o Juiz da Vara da Infância e Juventude reconheceu a paternidade socioafetiva do padrasto de um adolescente de 16 anos.[5] Ao invés de conceder a adoção unilateral requerida, determinou a inclusão do nome do pai-afim no assento de nascimento do rapaz, sem prejuízo da paternidade biológica. Após uma criteriosa análise dos fatos, o magistrado constatou que o adolescente tinha nos dois indivíduos a figura paterna e que deferir a adoção, com a consequente ruptura dos vínculos com o pai biológico, iria contra o princípio do melhor interesse da criança.
Assim, em atendimento a tal princípio, o juiz ficou convencido de que a melhor solução para o caso seria levar para o mundo jurídico a multiparentalidade que se apresentava no mundo fático. Mãe e pais exerciam genuinamente – de forma efetiva e afetiva – os seus papeis parentais possuindo importância equivalente na vida do adolescente. Então, por que excluir? Por que ter que fazer uma escolha, num verdadeiro dilema salomônico moderno, quando ambas paternidades poderiam coexistir harmonicamente?
Assim, o rapaz passou a ter uma mãe e dois pais registrais, dos quais poderá ser dependente em planos de saúde, planos previdenciários. Também poderá pleitear alimentos dos dois, assim como será herdeiro de ambos. Tal decisão leva-nos à compreensão de que a filiação socioafetiva possui a mesma solidez e leva aos mesmos efeitos jurídicos que a filiação natural.
Pode-se, por fim, afirmar que o reconhecimento da parentalidade socioafetiva não implica – necessariamente – em uma punição aos familiares consanguíneos. Biologia e afeto podem – e devem – caminhar juntos, de mãos dadas, sempre que tal fato se mostrar benéfico às partes, tomando em consideração o princípio absoluto e inafastável do melhor interesse da criança ou adolescente.

Notas

[1] Agravo do Recurso Extraordinário (ARE) 692186-PB.
[2] E note-se que nem sempre a filiação socioafetiva estará sozinha. Como se afirmou no julgado do Paraná, “a filiação socioafetiva pode estar acompanhada de outros tipos filiação. O filho pode ser ao mesmo tempo biológico, registral e socioafetivo. A filiação também pode ser registral e socioafetiva, mas não biológica. É o caso da filiação que se estabelece por adoção, pela chamada adoção à brasileira, bem como pela paternidade assistida heteróloga. O pai aparece no registro e mantém uma relação de afetividade filial com a criança, mas não é o genitor biológico. Outra situação é o da paternidade biológica e socioafetiva, mas não registral. É o caso, por exemplo, do filho que está registrado apenas no nome da mãe e convive com o pai, mas não consta no registro de nascimento o nome do genitor. Ainda é possível apenas a filiação socioafetiva, que neste caso não coincide nem com a filiação biológica, nem com a filiação registral, mas é meramente socioafetiva, como é o caso dos denominados filhos de criação”. Cfr. http://www.direitodascriancas.com.br/anexos/2/7/SENTENCA_DUPLA_PARENTALIDADE___INICIAIS.pdf
[3] Processo 0012530-95.2010.8.22.0002. Disponível em: www.tjro.jus.br Acesso em: 09/03/2013.
[4] Cfr. “Juiz de Recife registra criança em nome de pai, mãe e madrasta”. Disponível em: http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/juiz-de-recife-registra-crianca-em-nome-de-pai-mae-e-madrasta Acesso em: 09/03/2013.
[5] Sentença disponível em: http://www.direitodascriancas.com.br/anexos/2/7/SENTENCA_DUPLA_PARENTALIDADE___INICIAIS.pdf Acesso em: 09/03/2013. 


CHAVES, Marianna. Multiparentalidade: a possibilidade de coexistência da filiação socioafetiva e filiação biológica.. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3611, 21 maio 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/24472>. Acesso em: 22 maio 2013.

PSC pede que resolução do CNJ sobre casamento homoafetivo seja suspensa

O PSC - Partido Social Cristão ajuizou MS no STF contra ato da presidência do CNJ consistente na edição da resolução 175/13, que proíbe que os cartórios se recusem de habilitar, de celebrar o casamento civil ou de converter a união estável em casamento entre pessoas do mesmo sexo. O partido pede liminar para suspender os efeitos da resolução e, no mérito, a sua vigência até que o Congresso Nacional delibere sobre a questão.
 
Segundo o PSC, ao dispor sobre a questão, o CNJ violou direito líquido e certo de todos os seus filiados, especialmente de seus 19 deputados Federais e um senador, de discutir e votar a matéria no âmbito do Poder Legislativo. 

O PSC afirma que o teor da resolução do CNJ 175/13 não pode ter validade sem ser objeto do devido processo legislativo, no qual o partido poderá exercer suas prerrogativas legais e constitucionais, expressando sua vontade nos limites de sua orientação cristã. Para o partido, houve "abuso de poder do presidente do CNJ ao buscar legislar, apropriando-se de prerrogativas do Congresso Nacional".
O partido afirma que qualquer PL dessa natureza jamais terá sua aprovação. "O PSC é totalmente contrário à união entre pessoas do mesmo sexo e sempre se posicionará neste sentido, no exercício de suas prerrogativas legais, junto ao Congresso Nacional". Ressalta que, a partir das regras de interpretação e considerando a natureza das relações jurídicas, "no universo das entidades familiares só tem cabimento a união entre homem e mulher, ou seja, entre pessoas de diferentes sexos". Para a legenda, às "parcerias homossexuais" estão assegurados apenas efeitos jurídicos no campo do Direito das Obrigações e do Direito das Sucessões.
Citando o julgamento da ADPF 132, o PSC afirma que nesse julgamento o STF apenas reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo, não se pronunciando sobre casamento civil. "O temor que aqui se assevera é do sentimento de que, usurpando o poder de legislar do Congresso Nacional e cobrindo a resolução com o efeito de decisões anteriores do STF sobre assuntos apenas correlatos, norteando e dilatando o objeto das ações, o CNJ estaria também inovando com tal decisão”.
O relator do MS é o ministro Luiz Fux.
  • Processo relacionado: MS 32077
     

    http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI178981,11049-Partido+questiona+resolucao+do+CNJ+sobre+casamento+entre+homossexuais

Divórcio e separação consensuais em cartório com filhos ou menores incapazes

Em vigor desde janeiro de 2007, a lei 11.441/07, que alterou dispositivos do CPC, permite que a separação e o divórcio sejam efetuados por meio de escritura pública lavrada por um Tabelião de Notas.

Salutar a medida de desjudicialização destes atos, pois proporciona rapidez ao casal separando ou divorciando, por meio de procedimento simples e rápido.

Sempre é necessária a assistência de um advogado ao casal na prática do ato, além da consensualidade das partes. 

A atualização do capítulo XIV (Do Tabelionato de Notas) das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo (Tomo II – Cartórios Extrajudiciais) inovou, conforme disposto no item 86.1, ao prever a possibilidade de se promover a separação ou o divórcio em cartório de notas, mesmo havendo filhos menores ou incapazes do casal, o que até então não era permitido.

A exigência é que as questões referentes aos interesses dos filhos menores ou incapazes sejam resguardadas em lide judicial específica, tais como guarda, visitas e alimentos. Uma vez protegidos tais interesses na esfera judicial, pode ser feito o divórcio ou separação em um Tabelionato de Notas.

Restará, assim, ao Judiciário, apenas as separações ou divórcios em que haja lide ou que não tenham sido resolvidos judicialmente os direitos e interesses dos filhos menores ou incapazes.

Tal entendimento da Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo foi adotado, também, pelo Centro de Estudos Jurídicos do Conselho da Justiça Federal recentemente, por meio do enunciado 571 da VI Jornada de Direito Civil da Justiça Federal, ocorrido nos dias 11 e 12/5 de 2013.

O procedimento no cartório colabora com novo paradigma, que é o da desjudicialização, pois a lavratura da escritura em um Tabelionato de Notas é procedimento simples, rápido e dinâmico, atendendo à sociedade de maneira eficaz.

O atendimento ao casal, que busca se separar ou divorciar, deve ser feito em sala ou ambiente reservado e discreto, com prévio aconselhamento sobre a seriedade ato e seus efeitos. O Tabelião deve agir como assessor imparcial das partes e verificar se, realmente, esse é o propósito do casal, pois, muitas vezes, escutar as partes pacientemente e um bom e firme aconselhamento sobre os efeitos decorrentes da separação e divórcio, especialmente se existirem filhos, evita a prática de atos impensados e desmotivados.

Havendo indícios de fraude à lei, de prejuízos a um dos cônjuges ou de dúvidas sobre o propósito de se separar ou divorciar, o ato deve ser recusado. 

Para finalizar, toda a atividade do Tabelião de Notas deve ser sempre pautada pela prudência e acautelamento.
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* Rogério Tobias é representante do 2º Tabelião de Notas e de Protesto de Letras e Títulos de Jaú - SP.

Envio de cartão de crédito sem solicitação é abusivo e gera dano moral

O envio do cartão de crédito, ainda que bloqueado, sem pedido prévio e expresso do consumidor, caracteriza prática comercial abusiva e autoriza a indenização por danos morais. A decisão da 3ª turma do STJ foi tomada no julgamento de REsp do MP/SP contra uma administradora de cartão de crédito.

O MP estadual ajuizou ACP visando impedir a administradora a remeter cartões de crédito aos consumidores, sem que tenham solicitado previamente, sob pena de multa diária. Em primeira instância, a administradora foi condenada a se abster, imediatamente, de enviar ao consumidor, sem que haja solicitação prévia, cartões de crédito ou outro tipo de produto que viole o disposto nos arts, 6°, inciso IV, e 39, inciso III, do CDC, sob pena de multa diária de 50 salários mínimos. 

A administradora foi ainda proibida de cobrar qualquer valor a título de encargo ou prestação de serviço, referente aos cartões de crédito enviados aos consumidores sem solicitação prévia, também sob pena do pagamento de multa diária de 50 salários mínimos. Por fim, foi condenada a indenizar os consumidores pelos danos morais e patrimoniais causados em razão do envio dos cartões.

O banco apelou da sentença. O TJ/SP, por maioria, proveu a apelação por entender que o simples envio de cartão de crédito bloqueado não configuraria prática vedada pelo ordenamento jurídico, constituindo mera oferta de serviço sem qualquer dano ou prejuízo patrimonial. 

Contra a decisão, o MP interpôs embargos infringentes, que foram rejeitados. Para o TJ/SP, o que o CDC veda é que se considere contratado o serviço com o simples envio, obrigando o consumidor a cancelar o cartão caso não o deseje. 

O MP/SP recorreu ao STJ sustentando que, na literalidade da lei, a prática adotada pela administradora de cartões de crédito é expressamente vedada e considerada abusiva. 

O inciso III do art. 39 do CDC diz que é vedado ao fornecedor "enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer qualquer serviço". Para o MP, a expressão legal não permite relativização. Além disso, não reclama a ocorrência de lesão e não fala em lesividade potencial ou situações de perigo. Simplesmente proíbe a conduta, dentro da sistemática protetiva do CDC. 

O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino ressaltou que, mesmo quando o cartão seja enviado bloqueado, a situação vivenciada pelos consumidores gera angústia desnecessária, especialmente para pessoas humildes e idosas. 

Ele citou precedente da própria 3ª turma, que, embora analisando situação diversa, concluiu pelo caráter ilícito da conduta de enviar cartão não solicitado, com base no art. 39, III, do CDC. Naquele caso (REsp 1.061.500), foi duscutida a indenização por dano moral a consumidor idoso que recebeu cartão desbloqueado, não solicitado, seguido de faturas. 

A 3 ª turma, seguindo o voto do relator, reconheceu o caráter abusivo da conduta da administradora com o simples envio do cartão de crédito sem solicitação prévia do consumidor. Fudamentando que o CDC tutela os interesses dos consumidores em geral no período pré-contratual, proibindo abusos de direito na atuação dos fornecedores no mercado de consumo. Portanto, a prática de enviar cartão não solicitado é absolutamente contrária à boa-fé objetiva. Assim, restabeleceu a sentença de primeira instância. 

Voto vencido
Ficou vencido o ministro Villas Bôas Cueva, para quem "o envio de cartão bloqueado ao consumidor, que pode ou não solicitar o desbloqueio e aderir à opção de crédito, constitui proposta, e não oferta de produto ou serviço, esta sim vedada pelo artigo 39, III, do CDC". 

Para o ministro Cueva, o envio de cartão desbloqueado pode gerar dano patrimonial, em razão da cobrança indevida de anuidades, ou moral, pelo incômodo das providências necessárias ao cancelamento. Já o cartão bloqueado, segundo ele, não gera débito nem exige cancelamento. O ministro observou ainda que, no caso, foram prestadas informações corretas ao consumidor.
Veja a íntegra do acórdão.

http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI178939,91041-Envio+de+cartao+de+credito+sem+solicitacao+e+abusivo+e+gera+dano+moral

terça-feira, 21 de maio de 2013

Testemunhas fundamentam reconhecimento de maternidade após 33 anos

O juízo da 2ª vara da Família e Sucessões de SP reconheceu o vínculo de filiação entre um rapaz e sua tia por meio de prova testemunhal. 

Filha de tradicionalista família japonesa, a suposta mãe não contou com o apoio necessário para o exercício da maternidade como solteira, de modo que o irmão mais velho e a esposa assumiram a criança. 

Embora não tenha sido possível a produção de prova pericial, "por impossibilidade técnica de se chegar a resultado cientificamente tangível", para o julgador "não só boa parte dos irmãos da falecida confirma a narrativa da inicial como também as duas testemunhas inquiridas, que dão conta das tentativas de contato da família com o suposto pai, da sua negativa quanto à paternidade e do arranjo familiar para esconder a gravidez da filha não casada". 

O advogado Marcos Antonio Ferreira Beni atuou na causa pelo autor da ação.
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TERMO DE AUDIÊNCIA - CONCILIAÇÃO, INSTRUÇÃO E JULGAMENTO
Aos 07 de maio de 2013, às 14:30h, na sala de audiências da 2ª Vara da Família e Sucessões, do Foro Regional XI - Pinheiros, Comarca de SÃO PAULO, Estado de São Paulo, sob a presidência do MM. Juiz de Direito Dr. Augusto Drummond Lepage, comigo Escrevente ao final nomeada, foi aberta a audiência de conciliação, instrução e julgamento, nos autos da ação e entre as partes em epígrafe.
Cumpridas as formalidades legais e apregoadas as partes, compareceram a Drª. Amaitê Iara Giriboni de Mello, Promotora de Justiça; o requerente M.Y.H.; seu advogado, Dr. Marcos Antonio Ferreira Beni; os requeridos T.H., M.H., M.V.H.; a advogada, Drª. Regina Célia Baraldi Bisson.
Ausentes a requerida I.I.H.S.; sua advogada, Drª. Karin Yoko Hatamoto Sasaki; o requerido L.T.H.; seu advogado,Dr. Adriano Pereira Esteves; o requerido J.H.; seu advogado, Dr. Helio Aparecido de Fazzio, e ausentes também S.I., S.Y.S., W.S. e C.A.S.K..
INICIADOS OS TRABALHOS, pelo MM. Juiz foi colhido o depoimento pessoal do autor e da requerida. Em seguida foi ouvida uma testemunha do autor, Sr. L. e foram colhidos os depoimentos pessoais de T. e de M. A seguir foi ouvida a segunda testemunha do autor, Sr.A., em termo apartado.
Dada a palavra a Drª. Promotora de Justiça, por ela foi dito: "MM. Juiz, primeiramente retrato-me da promoção ministerial de fls.14/15 para expressar interesse ministerial na presente demanda, que versa sobre ação de estado. M.Y.H. aduz que, muito embora tenha sido registrado como filho legítimo de M.H. e M.V.H., em realidade é filho biológico de Y.H., com pai desconhecido, sendo registrado pelos primeiros através da conhecida "adoção à brasileira".
Tal ocorreu por quanto Y. ficou grávida solteira, havendo resistência familiar a que assumisse sozinha um filho, razão pela qual o autor foi recebido no seio familiar de M. e M.. Com o óbito de Y., o pedido se volta contra seus herdeiros, bem retratados na exordial, postulando o autor, ao final, que seja anulado o seu registro de nascimento par que novo seja expedido constando somente a genitora Y.H..
Citados, contestaram o feito a co demandada I. (fls.85/91), L., a (fls.93/101), que concordou com o pedido e J. (fls.135/136). Saneado o feito, após regular instrução processual, a prova médica realizada a fls.205/209 excluiu a filiação biológica do autor com relação a M. e M.
Não mais se prosseguiu na prova pericial porque o despacho de fls.217, com respaldo na informação otécnioca do Laboratório Fleury, observou que o resultado médico seria inviável. Em substituição ou mesmo em complementação, colheu-se a prova testemunhal na presente audiência. Esta é a síntese do quanto ocorrido nos autos.
O pedido é procedente.
Com efeito, se a prova hematológica não pode trazer suficientes subsídios de prova no peculiar caso vertente, a colheita testemunhal demonstrou, com sobras, os fatos retratados na prefacial. Os depoimentos pessoais convergem todos no mesmo sentido, qual seja, de que Y. viu-se grávida do namorado, abandonada por este e sem apoio de seus genitores, orientais de tradição rigorosa.
A cunhada M., que já possuia dois filhos, dispôs-se a acolher mais aquela criança, com se filho o fosse. Curioso notar que a diferença entre os nascimentos da segunda filha de M. e M., de nome V., é de apenas oito meses, o que em tudo corrobora à circunstância de que M. não seria seu filho biológico.
Aliás, se dúvida houvesse nesse ponto, o exame de DNA foi conclusivo e absoluto na exclusão de vínculo biológico. Por outro lado, o depoimento testemunhal também trouxe a mesma versão já retratada, demonstrando que M. foi criado como se filho o fosse dos tios, ainda que fosse forte o vínculo afetivo que durante toda a vida nutriu por Y., ainda que não soubesse que esta era a sua genitora sanguínea.
A prova trazida aos autos é robusta e não conflitante, comprovando a saciedade ou os fatos descritos na exordial, sendo imperioso o acolhimento do pedido. É o que se requer, segundo o elevado critério de V. Exa. A seguir pelo MM. Juiz foi proferida a seguinte sentença:
"Vistos. M.Y.H. ajuizou a presente demanda de investigação de maternidade cumulada com anulação de assento de nascimento em face dos herdeiros de Y.H. , isto é, T.H., M.H., L.T.H., I.I. H.S., J.H., M.H., M.V.H., S.I., S.Y.S., W.S. e C.A.S.K., aduzindo, em síntese, ser filho biológico de Y.H., que ficou grávida de seu namorado, o qual se recusou a assumir a paternidade e desapareceu. Em virtude da rígida moral da família de Y., ficou decidido que seu irmão mais velho e sua mulher, M. e M.H., seriam os responsáveis pela criação do filho de Y.
Após o nascimento do autor, a criança foi registrada em nome do casal. Somente após o falecimento da mãe biológica é que o autor veio a saber a respeito de sua verdadeira ascendência.
Pela 1ª Vara da Família local tramita o inventário dos bens de Y.H.. Pede o reconhecimento do vínculo de filiação com a falecida Y.H. e a consequente anulação do assento de nascimento em relação a M.H. e M.V.H.. Os réus foram citados e apenas L.T.H., I.I.H.S. e J.H. apresentaram suas contestações, impugnando os fatos narrados na inicial, que demandariam instrução probatória (fls.93/101, 85/91 e 135/136).
Os requeridos T.H., S.I., S.Y.S., W.S. e C.A.S. reconheceram a procedência do pedido (fls.26/29).
Após a réplica, o feito foi saneado, produzindo-se exame hematológico que excluiu a paternidade e a maternidade dos pais registrários. Não foi possível a realização da prova técnica em relação à filiação do autor com a falecida Y. Na presente audiência tomou-se o depoimento pessoal de todas as partes presentes e foram ouvidas duas testemunhas arroladas pelos autores. Encerrada a instrução, as partes reiteraram os posicionamentos anteriormente deduzidos, posicionando-se todos os presentes pela a procedência da demanda. O Ministério Público atua no feito e também se posicionou pela procedência da demanda.
É o relatório.
Decido.
Diz a inicial que a tia do autor, Y.H., é na verdade sua mãe. Filha de uma tradicionalista família japonesa, de moral rígida, a suposta mãe não contou com o apoio necessário para o exercício da maternidade como solteira. Em razão dos padrões morais então vigentes, o arranjo familiar foi no sentido de que tanto a paternidade quanto a paternidade fossem assumidas pelo irmão mais velho da mãe biológica e sua mulher: o casal M. e M.H..
A prova pericial confirma boa parte da narrativa deduzida na inicial, pois o exame hematológico pelo método do DNA excluiu, de modo categórico, o vínculo biológico de filiação com os pais registrários. A prova oral hoje produzida se encadeia com o resultado da prova pericial, dando conta de que a mãe biológica deu à luz o filho que gestava, tendo sido emitida a certidão de nascido vivo com o nome da mãe sem preenchimento, o que possibilitou o registro do autor como filho de seus tios. Neste sentido, destaque-se o pormenorizado depoimento da mãe registrária.
A prova oral é uníssona ainda em confirmar a rígida moral da família Hatamoto, a qual engendrou esta solução no intuito da manutenção de determinadas aparências. Todos os que depuseram nesta solenidade são unânimes em retratar que as exigências morais que levaram a encobrir a maternidade da filha que não era casada. Repare-se que a prova oral dá conta da ciência de todos os irmãos da falecida mãe a respeito deste arranjo familiar e, se notarmos os termos das contestações apresentadas, deles não se extrai a categórica refutação do vínculo de filiação do autor com a falecida Y.
Não foi possível a produção da prova pericial, por impossibilidade técnica de se chegar a resultado cientificamente tangível, mas isso não inviabiliza a causa, pois, no sistema da persuasão racional eleito pelo Código de Processo Civil para a valoração das provas, não há hierarquia entre elas que devem ser analisadas em conjunto, sob padrões de verossimilhança, de modo a representarem um todo harmônico, que é justamente o que ocorre no presente caso.
Não só boa parte dos irmãos da falecida confirma a narrativa da inicial como também as duas testemunhas inquiridas, que dão conta das tentativas de contato da família com o suposto pai, da sua negativa quanto à paternidade e do arranjo familiar para esconder a gravidez da filha não casada. Portanto, todos estas provas levam este julgador à certeza veracidade dos fatos narrados na inicial, que conduzem à consequência jurídica ora pretendidas. Necessária se faz a substituição do nome da mãe no assento de nascimento do autor, bem como da exclusão do pai, não só pela ausência do vínculo biológico nem pelo fato de ser irmão da verdadeira mãe biológica.
Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE A DEMANDA para reconhecer a existência do vínculo de filiação de M.Y.H. com Y.H. e para determinar a inclusão do nome desta última no assento de nascimento do autor, dele excluindo-se os nome de M.H. e M.V.H..
Condeno os requeridos I.I.H.S., J.H. e L.T.H. ao pagamento das custas despesas processuais e honorários advocatícios de R$4.000,00. Transitada em julgado, expeça-se o mandado de anulação de averbação ao registro civil. Publicada em audiência, saindo as partes cientes e intimadas.
Nada mais. Lido e achado conforme, segue devidamente assinado. Eu, Elaine Cristina Pirillo de Meneses, escrevente, digitei e providenciei a impressão.
 http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI178740,11049-Juiz+baseia-se+em+testemunhas+para+reconhecer+maternidade+apos+33+anos