domingo, 30 de outubro de 2022

Modelo de ata notarial de adjudicação compulsória extrajudicial e a prática nos cartórios de notas de acordo com a lei 14.382/22

Rodrigo Reis Cyrino

O país inova ainda mais com a lei 14.382/22, que traz importantes alterações na lei de registros públicos, o que trará grandes avanços para o mercado imobiliário e a economia do país.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

1. Notas introdutórias


Em recente evento do Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário do Estado do Espirito Santo - IBRADIM/ES - e em razão do convite feito pela Dra. Leila Imbroisi, advogada e diretora desta instituição, e pela Dra. Laila Farias, advogada e presidente da comissão de direito imobiliário pela OAB de Vila Velha/ES, tive a honra de palestrar sobre o importante tema da "adjudicação compulsória extrajudicial", juntamente com as respeitadas e competentes registradoras de imóveis Dras. Renata Aoki e Gabriela Cristina de Lima, o que me despertou para escrever este trabalho, fruto das inúmeras dúvidas teóricas e práticas que tive sobre a temática.


O fenômeno da extrajudicialização ou desjudicialização de procedimentos no Brasil, através das serventias extrajudiciais, é muito louvável, pois os notários e registradores são agentes fiscalizados regularmente pelo Poder Judiciário, submetidos a concurso público de provas e títulos e a quem são conferidos os atributos da fé pública, com a atuação sem a utilização do orçamento público, pois atuam em caráter privado. Além disso, as serventias extrajudiciais atuam como verdadeiros cooperadores da justiça em novas arenas de diálogo e de solução de demandas, o que traz novas opções facultativas para o cidadão, advogados, corretores de imóveis, arquitetos, engenheiros, construtoras e tantos outros profissionais imobiliaristas. É uma nova cultura que tem sido pouco a pouco implementada, especialmente nas faculdades de direito.


No mundo, o modelo de cartórios existe também em pelo menos 86 países, inclusive na União Europeia e na China. Há uma instituição que regularmente reúne todos os países com o fim de implementar avanços em toda a atividade nos quesitos de segurança, celeridade e tecnologia em prol dos usuários, que é a União Internacional do Notariado Latino (UINL), o que possibilita segurança jurídica nos negócios jurídicos, bem como o seu registro permanente com a emissão de certidões, o que assegura a ordem pública, o desenvolvimento de um país e um fortalecimento da cidadania, principalmente pelo exercício do direito à propriedade privada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana. E mais: na questão imobiliária, o valor para uma transação imobiliária é pago uma vez só e não de forma permanente, como ocorre em outros países.


Nesse cenário, o país inova ainda mais com a lei 14.382/22, que traz importantes alterações na lei de registros públicos, o que trará grandes avanços para o mercado imobiliário e a economia do país, pois foram implementadas novas possibilidades procedimentais e mais flexíveis para a regularização imobiliária junto aos cartórios.


Uma dessas novidades e objeto deste trabalho é o novo procedimento da adjudicação compulsória extrajudicial, que estabelece uma célere de regularização imobiliária, quando toda a obrigação contratual já foi cumprida e há somente a necessidade da efetiva transferência do imóvel, o que efetivará para o cidadão o direito fundamental à plena moradia, não só de fato, mas também documental e fomentará cada vez mais o mercado do crédito bancário imobiliário e também da construção civil.


Clique aqui para conferir a íntegra do artigo.

https://www.migalhas.com.br/arquivos/2022/10/4072A2ABEDAB8C_Modelodeatanotarialdeadjudicac.pdf

Rodrigo Reis Cyrino

Tabelião de Notas do 2º Ofício de Vitória/ES em Jardim Camburi. Doutorando em direitos e garantias fundamentais. Mestre em direito, Estado e cidadania. Pós-graduado em direito privado e direito processual civil. Diretor do Conselho Federal do Colégio Notarial. Membro da Academia Notarial Brasileira. Membro indicado para União Internacional do Notariado Latino - UINL. Professor da Escola Nacional de Notários e Registradores - ENNOR. Professor da pós-graduação de direito tributário e de família da Faculdade de Direito de Vitória - FDV. Coordenador da pós-graduação em direito notarial, registral e imobiliário da ESA/OAB.

Fonte: https://www.migalhas.com.br/depeso/375025/modelo-de-ata-notarial-extrajudicial-nos-cartorios-com-a-lei-14-382-22

Se ex assumiu posição de dono único de pet, não há obrigação de dividir custos

 A relação entre humanos e animais de estimação é definida pelo direito de propriedade. Assim, cabe ao dono pagar pelas despesas geradas pelo cuidado do animal. Se um casal combinou, ao se separar, que o pet ficará com um deles, ele deve passar a ser o único dono, ficando obrigado a arcar com todos os custos.

 Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso especial ajuizado por um homem para desobriga-lo de dividir com a ex-companheira os custos que ela teve de suportar com os seis cachorros que adotaram juntos enquanto eram um casal.

 Essa obrigação foi determinada pelas instâncias ordinárias e não foi contestada pelo homem. Ao STJ, ele recorreu sustentando que sua ex-companheira havia perdido o prazo para ajuizar ação de cobrança. A análise se resumiu, portanto, à questão da prescrição.

 Como o ordenamento jurídico não traz qualquer previsão sobre o prazo prescricional para a hipótese envolvendo pets, a decisão passou pela definição da natureza jurídica dos animais de estimação e, por fim, pelo enquadramento da situação às regras do Código Civil.

 A corrente vencedora foi a do voto divergente do ministro Marco Aurélio Bellizze. Para ele, sequer há prescrição. Isso porque o direito a pedir o ressarcimento pelos gastos com os pets não se configurou, na medida em que a autora da ação se tornou a única dona dos animais.

 Nem dono ele era mais

 O caso trata de um casal que teve união estável entre 2007 e 2012. Em 2013, após a separação, a mulher assumiu para si a posse dos pets, que até então se encontravam no sítio do ex-companheiro. Em 2017, ela ajuizou uma ação para cobrar dele a divisão dos custos que teve com os animais.

 As instâncias ordinárias julgaram a demanda procedente e determinaram o pagamento de R$ 39,5 em favor da mulher, além de obrigar o ex-companheiro a dividir os custos até a morte ou alienação dos cachorros.

 Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, a relação entre dono e animal é regida pelo direito de propriedade. Como os pets foram adotados durante a união estável, eles pertenciam simultaneamente aos companheiros.

 Com a separação, essa situação de condomínio (quando algo pertence simultaneamente a mais de uma pessoa) durou apenas até a partilha. E no caso julgado, a partilha não contou com nenhuma previsão sobre a propriedade dos pets.

 Assim, a ex-companheira, ao pegar para si os animais, se consolidou como única proprietária. Implicitamente, ficou convencionado que os pets são dela. Como única dona, ela assumiu para si os bônus (a companhia dos cachorros) e também os ônus (os custos de despesas).

 Maioria?

 A posição do relator foi acompanhada pelo ministro Moura Ribeiro. O voto foi por dar provimento ao recurso. O ministro Paulo de Tarso Sanseverino formou a maioria ao acompanhar a conclusão, mas por fundamentos diferentes.

 Para ele, a regra mais adequada para regular a prescrição no caso é realmente o artigo 206, parágrafo 3º do Código Civil, que prevê prazo de 3 anos para pretensões nascidas do enriquecimento sem causa.

 O termo inicial seria o término da situação de condomínio (quando a mulher pegou os animais para si). Como isso ocorreu em 2013 e a ação só foi ajuizada em 2017, considerou a pretensão prescrita.

 Votos vencidos

 Ficaram vencidos os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Nancy Andrighi. Ambos entenderam que, como não há norma específica para o caso dos autos, incide a regra geral do artigo 205 do Código Civil, que prevê prescrição de dez anos.

 Para o relator, ministro Cueva, o caso não se amolda a obrigação de mero ressarcimento. Ao abandonar os animais em seu sítio, o ex-companheiro enriqueceu ilicitamente, mas também cometeu abuso de direito ao deixar tudo a cargo da ex-companheiro.

 Já a ministra Nancy entendeu que, como os cães não entraram na partilha do casal, a situação de condomínio persistiu mesmo depois de a ex-companheira assumir para si a posse dos pets. Assim, cada coproprietário tem responsabilidade na medida de sua quota-parte.

 “Na hipótese de despesas comuns realizadas por apenas um dos condôminos, este passa a ser titular de pretensão condenatória de haver dos demais o que despendeu em proveito da comunhão”, afirmou. “Fazendo um, sozinho, as despesas, poderá exigir ressarcimento dos demais”, apontou, ao afastar a prescrição.

 REsp 1.944.228

Fonte: Conjur

STJ: Programa de fidelidade aérea gratuito pode cancelar pontos com o falecimento do titular

 A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou válida a cláusula do regulamento do programa de fidelidade de uma companhia aérea que previa o cancelamento dos pontos acumulados pelo cliente após o seu falecimento.

 O recurso analisado pelo colegiado foi originado de ação civil pública ajuizada por uma associação de consumidores. O juízo de primeira instância declarou a cláusula nula e determinou que os herdeiros poderiam utilizar as milhas em cinco anos. Houve recurso ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que apenas alterou o prazo de utilização para dois anos.

 No recurso ao STJ, a companhia aérea alegou que a anulação da cláusula geraria o desvirtuamento do programa de fidelidade, que passaria a beneficiar não apenas os clientes fiéis, mas também os seus herdeiros – o que afetaria o aspecto econômico-financeiro do programa. A empresa sustentou que as normas de proteção do Código de Defesa do Consumidor (CDC) só se aplicariam aos contratos de adesão gratuitos quando fosse comprovado algum prejuízo ao consumidor.

 Contrato é unilateral, gratuito e intransferível

 Relator do caso, o ministro Moura Ribeiro destacou que existem duas formas de juntar pontos com viagens aéreas: uma em que o consumidor adquire, de maneira onerosa, um programa de aceleração de acúmulo de pontos; outra na qual o consumidor ganha os pontos, gratuitamente, como bônus por sua fidelidade – e era este o caso dos autos.

 O magistrado observou que esse é um tipo de contrato de adesão, unilateral e gratuito, em que a empresa aérea fica responsável tanto pelo estabelecimento das cláusulas quanto pelas obrigações decorrentes do acordo, não tendo o consumidor que pagar pelo benefício. “Sendo o contrato gratuito, deve ser interpretado de forma restritiva, nos termos do disposto no artigo 114 do Código Civil”, disse o relator.

 Dessa forma, Moura Ribeiro concluiu que o direito de propriedade – intuito personae, nesse caso (cujo titular é a própria pessoa) – deve ser analisado sob o enfoque do poder de fruição, sendo, assim, legal a previsão da empresa aérea quanto a ser o benefício “pessoal e intransferível”.

 Herdeiros, muitas vezes, nem são clientes da companhia

 “Os pontos são bonificações gratuitas concedidas pela instituidora do programa àquele consumidor pela sua fidelidade com os serviços prestados por ela ou seus parceiros. Não parece lógico falar em abusividade ao não se permitir que tais pontos sejam transmitidos aos seus herdeiros, por ocasião de seu falecimento – herdeiros que, muitas vezes, nem sequer são clientes e muito menos fiéis à companhia instituidora do programa”, comentou o ministro.

 Para o relator, entender de forma diferente “corresponderia a premiar aquele consumidor que, quando do ingresso no programa de benefícios ofertado – frise-se, gratuitamente –, era sabedor das regras do jogo e com elas concordou em detrimento do fornecedor, o que não se pode admitir, pois a proteção da harmonia e do equilíbrio, da mesma forma, não impõe ao fornecedor gravames excessivos, mas exclusivamente aqueles vinculados à natureza de sua atividade e à proteção dos interesses legítimos dos sujeitos da relação”, concluiu.

 Leia o acordão no REsp 1.878.651.

 Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

 Fonte: STJ

STJ: Sem registro, contrato de união estável com separação total de bens não produz efeitos perante terceiros

 Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o contrato particular de união estável com separação total de bens não impede a penhora de patrimônio de um dos conviventes para o pagamento de dívida do outro, pois tem efeito somente entre as partes. De acordo com o colegiado, a união estável não produz efeitos perante terceiros quando não há registro público.

 A turma julgadora firmou esse entendimento, por unanimidade, ao negar provimento ao recurso especial em que uma mulher contestou a penhora de móveis e eletrodomésticos, que seriam apenas dela, para o pagamento de uma dívida de seu companheiro. Ela alegou que, antes de comprar os itens, havia firmado contrato de união estável com separação total de bens com o devedor.

 Segundo o processo, esse contrato foi celebrado quatro anos antes do deferimento da penhora, mas o registro público foi realizado somente um mês antes da efetivação da constrição.

 Contrato particular tem eficácia apenas para questões internas da união estável

 A mulher opôs embargos de terceiro no cumprimento de sentença proposto contra seu companheiro, mas as instâncias ordinárias consideraram que os efeitos do registro público da união estável não retroagiriam à data em houve o reconhecimento de firmas no contrato. Contudo, resguardaram o direito da embargante à metade da quantia resultante do leilão dos bens.

 Para a relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, o que estava em discussão não era exatamente a irretroatividade dos efeitos do registro da separação total de bens pactuada entre os conviventes, mas a abrangência dos efeitos produzidos pelo contrato particular e por seu posterior registro.

 De acordo com a magistrada, o artigo 1.725 do Código Civil estabeleceu que a existência de contrato escrito é o único requisito legal para que haja a fixação ou a modificação do regime de bens aplicável à união estável, sempre com efeitos futuros.

 Desse modo, o instrumento particular terá eficácia e vinculará as partes, independentemente de publicidade e registro, sendo relevante para definir questões internas da união estável, porém “é verdadeiramente incapaz de projetar efeitos para fora da relação jurídica mantida pelos conviventes, em especial em relação a terceiros porventura credores de um deles”, acrescentou.

 Registro da união estável não afeta a penhora deferida anteriormente

 Sobre o caso analisado, a ministra destacou que o requerimento e o deferimento da penhora ocorreram antes do registro do contrato com cláusula de separação total de bens, que somente foi feito um mês antes da efetiva penhora dos eletrodomésticos – indicando que o registro foi uma tentativa de excluir da constrição que seria realizada os bens supostamente exclusivos da companheira. 

Ao manter o acórdão recorrido, Nancy Andrighi concluiu que o fato de a penhora ter sido efetivada só após o registro público da união estável é irrelevante, pois, quando a medida foi deferida, o contrato particular celebrado entre a recorrente e o devedor era de ciência exclusiva dos dois, não projetando efeitos externos. 

Leia o acórdão no REsp 1.988.228.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

Fonte: STJ

Dinheiro em Dia: Número de testamentos cresce 21% – veja quando precisa registrar

 Entenda o que são “herdeiros necessários” e quando é preciso fazer o registro

 O número de testamentos registrados entre janeiro e junho deste ano foi 21,38% maior do que no mesmo período em 2019, segundo o Colégio Notarial do Brasil, com aumento de 17.801 para 21.608 documentos registrados em cartórios. O aumento demonstra a preocupação dos brasileiros em deixar o seu desejo quanto ao seu patrimônio determinado em caso da sua falta, principalmente após a pandemia de Covid-19.

 Ainda de acordo com a instituição, 2021 teve o maior número de testamentos registrados no período de um ano nos últimos 10 anos, com mais de 38 mil documentos.

 O testamento não é um instrumento útil apenas para milionários, mas para qualquer pessoa que tenha algum bem a ser dividido.

 “Um testamento bem elaborado pode evitar conflitos familiares que surgem no momento da divisão do patrimônio, além de trazer segurança aos envolvidos, proteger o patrimônio familiar e acrescentar eventuais herdeiros à partilha”, esclarece a advogada Elisângela Lima dos Santos Borges, especialista em Direito de Família e Sucessões e sócia no Gaudêncio Advogados.

 Quando é recomendado registrar um testamento?

 A especialista esclarece que, caso haja “herdeiros necessários”, como filhos, netos, cônjuges ou pais e avós, o testador (pessoa que manifesta o desejo por meio do testamento) só pode dispor da metade de seus bens, pois a lei garante a eles uma parte dos bens do falecido.

 Então, com o testamento, o patrimônio do testador somente será transferido aos herdeiros no momento de seu falecimento.

 Elisângela Lima dos Santos Borges esclarece abaixo os casos mais representativos, no caso de sucessão de filhos e cônjuge, em que é recomendado registrar um testamento: 

  1. Para igualar a parte de cada herdeiro

 O testador pode ter filhos de diversos relacionamentos e dependendo do regime de casamento adotado, se falecer no estado civil de casado ou viver em união estável, a viúva meeira (quando recebe sua meação, metade do patrimônio do falecido) ou herdeira (quando casada no regime da separação total de bens, por exemplo), será beneficiada e se tiver filhos, estes, quando do seu falecimento, receberão mais do que os filhos nascidos fora dessa união. 

  1. Destinar um bem específico para um herdeiro

 Outra situação ocorre quando o falecido deseja deixar um bem específico para cada herdeiro, como por exemplo: a casa de praia ficará com o herdeiro mais novo, o apartamento ficará com o herdeiro mais velho, o valor em dinheiro ficará com o filho que mora no exterior, feitas as devidas compensações dos valores, se for o caso. 

  1. Quando um herdeiro tem dívidas

 Há situações em que algum dos herdeiros possui dívidas. Assim, para evitar que o patrimônio seja afetado e contamine o interesse dos demais herdeiros, faz-se necessário atribuir a ele um bem separado ou de menor valor, respeitada a parte legítima. 

  1. Determinar cláusulas restritivas

 O testador pode colocar cláusulas restritivas ao patrimônio transferido, como incomunicabilidade. Neste caso, ao contrair núpcias ou união estável, os bens não se comunicarão com o cônjuge ou companheiro, mesmo que o regime adotado seja o da comunhão universal de bens.

 Ainda sobre cláusulas restritivas, poderá ser incluída cláusulas de impenhorabilidade ou de inalienabilidade. No primeiro caso, o bem não é passível de penhora para pagamento de dívidas. Já no segundo caso o bem não pode ser vendido, doado, ou qualquer outra forma de alienação, salvo, mediante autorização judicial em casos específicos.  Isso acontece, por exemplo, quando o doador quer manter a casa em que viveu no seio familiar. 

  1. Exclusão de herdeiros

 O testamento pode ser elaborado também para exclusão de herdeiros necessários, chamada cláusula de deserdação. Isso ocorre quando houver uma das hipóteses previstas em lei, como atentados contra a vida e a honra do testador, ou de cônjuge/companheiro, dentre outras hipóteses.

 A deserdação só atinge o deserdado, não se estendendo aos seus herdeiros, portanto, se o filho é deserdado, o neto recebe a sua cota parte na herança.

 Beneficiar cônjuge ou companheiro/a

 O testador, casado pelo regime da separação total de bens, pode querer beneficiar o cônjuge ou companheiro, no momento de seu falecimento, atribuindo a ele uma cota parte maior de seu patrimônio.

 Privilegiar quem não é herdeiro necessário

 Em razão da possibilidade de dispor da metade de seus bens, o testador pode querer privilegiar outra pessoa, além dos herdeiros necessários, como por exemplo, um sobrinho, um cuidador, uma instituição de caridade.

 Borges esclarece ainda que será necessário fazer a abertura do testamento judicialmente, além do inventário.

 “Ressalto que a lei prevê a necessidade de nomeação de um testamenteiro, pessoa que estará encarregada de abrir o testamento e fazer com que a vontade do falecido seja cumprida”, finalizou.

 Fonte: Dinheiro em Dia

TJRS – INVENTÁRIO. DOAÇÃO REMUNERATÓRIA. COLAÇÃO – DISPENSA.

EMENTA OFICIAL: INVENTÁRIO. DOAÇÃO DE DOIS BENS IMÓVEIS. DETERMINAÇÃO DE TRAZER OS BENS COLAÇÃO. DOAÇÃO REMUNERATÓRIA. DESCABIMENTO. 1. A DOAÇÃO DE BEM FEITA AOS HERDEIROS NECESSÁRIOS CONSTITUI NEGÓCIO JURÍDICO VÁLIDO E EFICAZ, QUANDO REVESTIDO DA FORMA LEGAL E SEM VÍCIO DE VONTADE. 2. SE A DOAÇÃO FOI FEITA COM NÍTIDO CARÁTER REMUNERATÓRIO, ENTÃO TAIS BENS NÃO DEVEM INTEGRAR O MONTE PARTILHÁVEL, SENDO IMPERIOSA A DISPENSA DE COLAÇÃO. INTELIGÊNCIA DO ART. 2.011 DO CCB. RECURSO PROVIDO. (TJRS. Sétima Câmara Cível. Agravo de Instrumento n. 5123425-03.2022.8.21.7000, Comarca de Carlos Barbosa, Relator Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, julgado em 28/09/2022 e publicado em 29/09/2022).

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O impacto das novas tecnologias na celebração de documentos públicos e particulares

quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Paulo Henrique Bione e Joyce Horrana da Silva

Ao contrário do que alguns podem vir a pensar, assinatura eletrônica não é a mesma coisa que assinatura digital.

Dentre os principais avanços contemporâneos na formalização de negócios, há que se registrar a expressiva diminuição da burocracia e dos entraves para celebração e assinatura de documentos.


Ainda que retomadas, ao menos parcialmente, as atividades presenciais, é certo que a celebração de contratos e assinatura digitais cresceram exponencialmente.


O maior tempo de criação do documento, a complexidade da coleta de assinaturas físicas, os custos com papel e impressora, cartório, transporte, armazenamento, entre outros, reforçaram tal mudança de formato.


Antes de mais nada, aos que estiverem se perguntando acerca da segurança jurídica envolvida: sim, tanto a assinatura digital quanto a eletrônica possuem validade jurídica prevista em lei, assegurada pela Medida Provisória 2.200/01. A MP também reforça que o ICP-Brasil não é o único meio que as tornam válidas, levando em conta os métodos de assinatura eletrônica que trouxemos acima.


De toda forma, por segurança, muitas empresas têm adotado cláusulas que deixam claro o uso dessa tecnologia na celebração de seus contratos, ratificando ainda mais a validade. Isso tem ocorrido para evitar qualquer tipo de objeção futura de alguma das partes, vez que, apesar da previsão legal, o entendimento ainda não é 100% pacificado entre os tribunais.


Mas atenção. Alguns documentos ou órgãos públicos exigem a utilização do certificado digital ICP-Brasil.


Ao contrário do que alguns podem vir a pensar, assinatura eletrônica não é a mesma coisa que assinatura digital.


Enquanto a assinatura digital é uma espécie de assinatura eletrônica, que requer o uso de um certificado digital, a assinatura eletrônica é mais abrangente: são todos os métodos utilizados para acessar, assinar, compartilhar e aprovar informações no virtual.


Para garantir sua legitimidade, a assinatura eletrônica adota mecanismos como senha, biometria ou até mesmo a própria assinatura digital, que, aliados a um contexto (e-mails, pagamentos etc.), garantem uma validade irrefutável àquele documento. Foi o que entendeu o Tribunal de Justiça de São Paulo, em abril de 2022, ao julgar um agravo de instrumento no qual o executado impugnou a validade da sua assinatura à confissão de dívida, por ela ter sido de forma eletrônica:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSINATURA ELETRÔNICA. VALIDADE DO DOCUMENTO. Os executados impugnaram a assinatura presente no Contrato de Confissão de Dívida. Porém, apesar do alcance distinto, a assinatura eletrônica também garante segurança e autenticidade. Diferente da assinatura digitalizada, a assinatura digital/eletrônica tem o mesmo valor de uma realizada a próprio punho. A agravante não negou a contratação da confissão de dívida, o que fazia presumir sua validade. Isto é, em nenhum momento no recurso a parte negou que seu representante fosse o autor daquela assinatura digital. Incidência do o § 2o do artigo 10º da Medida Provisória 2.200-2/2001. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Turma julgadora. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO IMPROVIDO.


(TJ-SP - AI: 20314981720228260000 SP 2031498-17.2022.8.26.0000, Relator: Alexandre David Malfatti, Data de Julgamento: 07/04/2022, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 07/04/2022)


Sendo assim, já é possível assumir que, atualmente, a assinatura eletrônica apresenta-se como a forma mais eficiente para firmar contratos entre particulares, desde que sejam observados os principais pontos que conferem validade jurídica aos documentos assinados dessa forma.


Além disso, a prática de atos notariais eletrônicos nos tabelionatos de notas do país encontra-se regulamentada. O provimento 100/20, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), instituiu o e-Notariado, plataforma que, entre suas diversas funcionalidades, viabiliza, de forma online, a assinatura de documentos, o reconhecimento de firma, a lavratura de procurações e escrituras públicas, a emissão de certificados, todos digitalmente emitidos por tabeliões de notas e profissionais do Direito dotados de fé pública.


A iniciativa atrai principalmente os usuários mais reticentes com novas tecnologias, aumentando a aderência da modalidade.


Os benefícios e o custo baixo pelo uso dessas novas tecnologias parecem bastante atrativos às empresas. E são.


Existem cases de sucesso documentados pelo DocuSign, umas das principais empresas do ramo de assinaturas digitais, que demonstraram:


Redução do tempo de assinatura de contratos em 67%, sendo que 25% dos negócios passaram a ser fechados em menos de 1 hora;

Diminuição do custo médio de logística de operação em incríveis 75%.1

O Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) registrou, ainda, em 2021, mais de 7 milhões de certificados digitais emitidos apenas no padrão da ICP-Brasil. Até abril de 2022, o número total de certificados ativos totalizava 10.822.393.


Portanto, esse aumento demonstra um claro avanço na forma de desenvolver novos negócios. Alguns por entusiasmo, outros por necessidade e muitos por redução de custos, aumento de produtividade e inovação.


Aos que buscam aderir às ferramentas aqui mencionadas: é importante lembrar, para garantir-se a devida segurança jurídica, a importância de cláusulas contratuais específicas completas e adequadas para o uso dessa e outras tecnologias.

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1 https://www.docusign.com.br/blog/beneficios-da-assinatura-eletronica


Fonte: https://www.migalhas.com.br/depeso/376108/o-impacto-das-novas-tecnologias-na-celebracao-de-documentos-publicos




terça-feira, 25 de outubro de 2022

Depoimento especial de crianças em alienação parental terá protocolo

 24 de outubro de 2022, 19h14

A construção de um protocolo para a escuta especializada e depoimento especial de crianças e adolescentes nas ações de família em que se discuta alienação parental, que ocorre quando o pai ou a mãe age para colocar a criança ou adolescente contra o outro genito, será o foco do grupo de trabalho instituído pelo Conselho Nacional de Justiça.

123RFDepoimento especial de crianças em casos de alienação parental terá protocolo

Segundo a Portaria CNJ 359/2022, publicada esta semana, o grupo contará com a participação de juízes, especialistas no tema e psicólogos. Para a definição do GT, o CNJ considerou ser necessária a discussão de um protocolo validado academicamente e editado "no contexto de uma política judiciária apropriada para a coleta de depoimento de crianças e adolescentes com caráter de prova judicial no âmbito das Varas de Família em situações de alienação parental".

A questão atende às modificações propostas pela Lei 14.340/2022, que trata de procedimentos relativos à alienação parental e à suspensão do poder familiar. A nova legislação alterou a Lei da Alienação Parental (Lei 12.138/2010) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990) e retira a suspensão da autoridade parental da lista de medidas possíveis a serem usadas pelo juiz em casos de prática de alienação parental, que era prevista pela norma anterior.

O GT terá seis meses, podendo o prazo ser prorrogado por igual período, para promover debates sobre o modelo de depoimento especial a ser adotado nas ações de família que envolvam alienação parental; e realizar diagnósticos sobre a temática da escuta especializada de crianças e adolescentes em processos envolvendo direito de família.

O colegiado também deverá sugerir à Presidência do CNJ o protocolo voltado a dar melhor aplicabilidade e executoriedade ao que está previsto na Lei em relação ao depoimento especial e escuta especializada em situações de violência. Também deverá fomentar iniciativas de aprimoramento do depoimento especial de crianças e adolescentes.

Para os normativos legais, o ato de alienação parental faz parte do rol de formas de violência contra crianças e adolescentes, pois pode ser entendido como a interferência em suas formações psicológicas, “promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este”, como descreve a Lei 13.431/2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.

Revista Consultor Jurídico, 24 de outubro de 2022, 19h14

TJ-SP majora indenização devida por médico que agrediu mulher em posto

 24 de outubro de 2022, 18h28

Por 

O valor da reparação deve ser correspondente à lesão, de forma não só a compensar o dano sofrido, mas também a impor ao ofensor uma sanção que o leve a rever seu comportamento com vistas a evitar a repetição do ilícito.

ReproduçãoTJ-SP majora indenização devida por médico que agrediu mulher em posto

O entendimento foi adotado pela 34ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo para majorar uma indenização devida por um médico que agrediu uma mulher em um posto de saúde. O valor da reparação passou de R$ 5 mil para R$ 20 mil.

De acordo com os autos, a autora acompanhava uma amiga e o filho de 6 anos, que buscavam atendimento com um psiquiatra. Ela disse que, após uma hora de espera, foram recebidas de forma grosseira pelo réu, que teria se recusado a realizar a consulta, sob o argumento de que não atendia crianças.

Houve uma discussão entre as partes e a autora disse que foi agredida verbalmente pelo psiquiatra. Além disso, ela afirmou que, no momento em que pegou o celular para filmar, teria sido agredida fisicamente. O médico foi condenado a indenizar a mulher em primeira instância. O TJ-SP confirmou a condenação e ainda aumentou o valor da reparação.

"Como observado pelo MM. juízo, 'na condição de profissional qualificado (médico psiquiatra), bastaria ao requerido que retornasse para sua sala de atendimento, dando o conflito por encerrado'. O psiquiatra, de quem, por dever de ofício, se esperava autocontrole, teve atitude vergonhosa e covarde. Sentiu-se no direito de ir para cima de uma mulher, dentro do posto de saúde, e simplesmente lhe arrancar das mãos o celular", disse o relator, desembargador Costa Wagner.

Segundo o magistrado, se entendesse que a mulher estava agindo com excesso, caberia ao médico, "de forma civilizada," adotar as medidas cabíveis, "entre as quais não se encontra o ato truculento e por que não dizer, machista, de tirar a força o celular das mãos de uma mulher e ainda ironizar dizendo que a 'mocinha estava muito nervosa'".

O relator ainda classificou a conduta do médico como "lamentável, invasiva e repugnante", extrapolando os limites do bom senso. "As filmagens demonstram claramente a conduta repreensível do profissional de saúde, que, se não bastasse a agressão perpetrada, desrespeitava (dentro de um posto de saúde) determinação para o uso de mascaras (ato a que o médico se refere como 'algo tão pequeno')", completou.

Clique aqui para ler o acórdão
Processo 1000831-10.2021.8.26.0450

Tábata Viapiana é repórter da revista Consultor Jurídico.

Revista Consultor Jurídico, 24 de outubro de 2022, 18h28

Jornal da USP: Uma vez reconhecido como válido, testamento vital não pode ser contestado pela família

 

José Luiz Gavião de Almeida explica que ele só pode ser contestado em relação à própria validade do ato, que é quando a família alega que a pessoa que o fez já não estava de plena posse de suas faculdades mentais

 O testamento vital procura cumprir os desejos das pessoas, quando estas estão com doenças terminais e não têm mais condições de saúde. Criado nos Estados Unidos na década de 1960, só chegou ao Brasil em 2012. Levantamento do Colégio Notarial do Brasil mostra que cresceu o número de solicitações de testamentos vitais em nove anos. As DAV, como são conhecidas as Diretivas Antecipadas de Vontade, apresentaram um aumento de 235% em todo o País. São Paulo foi a cidade com mais solicitações, passando de 62 lavramentos em 2012 para 586 em 2021, uma alta de 845%.

 José Luiz Gavião de Almeida, professor de Direito Civil da Faculdade de Direito da USP, explica que “esse instrumento foi criado para que as pessoas pudessem adoecer, decidir a respeito de uma morte sem dor, evitando aqueles tratamentos recessivos que às vezes acabam levando à pessoa um sofrimento muito grande”. No Brasil, não existe nenhuma lei tratando do Testamento Vital, então ele é uma espécie das chamadas Tratativas Antecipativas de Vontade, nas quais a pessoa trata do que ela quer que seja feito amanhã. Essas tratativas podem ser um Testamento Vital sobre o qual normalmente a pessoa vai decidir o tratamento da sua saúde ou um mandato duradouro em que a pessoa nomeia alguém para decidir por ela quando não tiver mais condições.

 Decisão antes da morte

 Segundo o professor Gavião, “teoricamente” esses dois documentos são  inaplicáveis no Brasil. “O testamento é um instrumento pelo qual eu decido alguma coisa e a validade dele é para depois da minha morte. O testamento vital é quando é decidido alguma coisa antes da minha morte. Em um momento em que eu não tenho mais consciência para decidir, mas antes da morte. O testamento é para depois da minha morte. O mandato duradouro também não seria difícil de ser aplicado no Brasil, porque também é um instrumento em que eu nomeio alguém para decidir por mim, mas ele só vale enquanto eu esteja vivo ou em plena consciência. No momento em que eu perca a minha capacidade, a minha consciência de decidir, o mandato também desaparece.” Por não ser proibido, algumas pessoas acreditam que tanto o testamento vital quanto o mandato duradouro têm validade no País. O professor Gavião explica que, no Direito brasileiro, quando não existe uma obrigatoriedade escrita na lei de uma determinada forma, qualquer forma pode ser utilizada para o ato. Assim, se isso fosse aplicado ao testamento vital, um escrito público, particular e até oral serviria. Um escrito público seria muito mais seguro, em termos de poder ser utilizado, porque um instrumento particular como o papel poderia ser perdido. Então, ele é mais seguro do que qualquer outro porque ficaria no cartório e poderia ser acessado a qualquer momento.

 Revogação a qualquer momento

 O testamento vital não tem prazo de validade, mas pode ser revogado a qualquer instante. Assim, a própria pessoa pode colocar uma cláusula informando que ele é irrevogável. Como não existe na lei uma determinação de como ele deve ser feito, ele é livre. Ele pode ser feito de forma oral ou escrita em casa, em um papel onde a pessoa coloca suas vontades, então não há a necessidade de ser produzido por um advogado.

 Não existe nenhuma lei a respeito do assunto, mas há a resolução n°1995/2012 do Conselho Federal de Medicina relacionada ao tema, como destaca o professor. “Ela não é lei, portanto não é obrigatória, mas ela determina aos médicos que cumpram essas diretivas antecipativas de vontade sob pena de descumprimento das regras do Conselho Federal de Medicina, mas são só regras de ordem profissional.” No caso dos familiares, se o testamento vital for reconhecido como válido, não é possível sua contestação. Ele só poderia ser contestado em relação à própria validade do ato. “A família poderia dizer que, quando ele foi feito, a pessoa já não estava, por exemplo, em plenas condições de entender o que estava fazendo. Aí então o ato vai ser invalidado”, explica o professor.

 Fonte: Jornal da USP

https://cnbsp.org.br/2022/10/17/jornal-da-usp-uma-vez-reconhecido-como-valido-testamento-vital-nao-pode-ser-contestado-pela-familia/

Boletim Notarial - 479 

20 de out. de 2022 18:37 

Cessão de posição contratual e o papel da anuência do cedido

 24 de outubro de 2022, 12h07

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A cessão de posição contratual consiste na transferência do conjunto de posições subjetivas, ativas e passivas, titularizadas por uma das partes em um contrato. Ao contrário do que ocorreu em outros ordenamentos jurídicos, como no italiano e no português, o Código Civil brasileiro não regulou expressamente a cessão de posição contratual. A disciplina legal da cessão de créditos e da assunção de dívidas poderia ser tomada como suficiente para a resolução dos conflitos relativos à cessão de posição contratual caso houvesse coincidência integral entre esta última e a transferência da soma dos créditos e dívidas emergentes do contrato.

Contudo, como se verá a seguir, esse não é o entendimento da corrente doutrinária majoritária e tampouco o adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Por isso, a Corte Superior tem papel fundamental na fixação das balizas do fenômeno por meio da interpretação sistemática das normas sobre direito das obrigações e teoria geral dos contratos.

Adoção da teoria unitária sobre a cessão de posição contratual
Apesar de não haver o tratamento legal expresso da cessão de posição contratual, a jurisprudência do STJ vem admitindo a sua ocorrência no ordenamento jurídico brasileiro pelo menos desde 2002, com o julgamento do REsp n. 356.383/SP.  [2]

Nele, a 3ª Turma reconheceu a legitimidade do cessionário para pleitear a revisão do contrato de arrendamento mercantil, podendo requerer a revisão das prestações vincendas e das prestações anteriormente pagas pelo cedente.

O voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, reconhece a cessão de posição contratual no direito brasileiro e sua autonomia diante de uma mera conjunção de cessão de créditos e assunção de dívidas, conforme trecho citado da obra de Silvio de Salvo Venosa:

"Nenhum intérprete, por mais arguto que seja, pode predeterminar até onde irão as conseqüências de um contrato, ainda não exaurido. Os direitos potestativos, emergentes do contrato-base, por conseqüência, também se transferem. Assim, a cessão de todos os créditos e de todas as pretensões presentes e futuras e a assunção de todas as dívidas não esgotam o conteúdo jurídico do tema em estudo."

A apreensão da cessão da posição contratual como sendo mais abrangente do que a soma dos créditos e dívidas transferidos revela o alinhamento da Corte Superior com a orientação das teorias unitárias, em contraposição às teorias atomísticas.

Enquanto as teorias atomísticas adotam um ponto de vista analítico, de decomposição da figura em estudo, as unitárias "configuram o fenômeno como transmissão dos vínculos criados por um contrato, encarados unitariamente, constituindo uma unidade dogmática autônoma, não equiparável a uma simples soma ou a um mero conglomerado de créditos e débitos".[3]

Por isso, a cessão de posição contratual engloba não somente os créditos e as dívidas, mas também os ônus, faculdades e direitos potestativos oriundos da relação contratual.

Esse entendimento foi confirmado na ocasião de julgamento do REsp n. 1.036.530/SC, que será analisado de maneira mais detalhada adiante.

Relevância da anuência do cedido para a cessão de posição contratual
Uma das questões mais importantes concernentes à cessão de posição contratual é a relativa ao papel da anuência do cedido. A visão mais disseminada é a de que a declaração do cedido é parte integrante do negócio dispositivo de cessão do contrato[4]. Desta forma, trata-se de um negócio trilateral, composto das declarações do cedente, do cessionário e do cedido. Para Pontes de Miranda, no entanto, a autorização do cedido consiste em negócio jurídico unilateral que interfere na eficácia do contrato de cessão[5].

Independentemente de se optar por uma ou outra corrente, as consequências práticas são idênticas, pois sem a autorização do cedido, a cessão contratual não produzirá efeitos perante ele. Trata-se de consequência imediata de uma das projeções da autonomia privada: não se pode obrigar uma parte a contratar com outra à qual ela não optou se vincular, senão em virtude da lei.

Sobre esse tema, o STJ considera, em geral, ser ineficaz a cessão de posição contratual sem a anuência expressa do cedido.[6]

No julgamento do REsp. n. 1.036.530/SC[7], foi proferido acórdão que destoou da linha de raciocínio acima e no qual entendeu-se que, após quitadas as prestações do contrato, a vontade do cedido seria irrelevante. No caso concreto, havia contrato de leasing entre a arrendadora e o arrendatário. Paralelamente, ocorreu a celebração de contrato de compra e venda entre o arrendatário e terceiro. No ano seguinte, as obrigações entre o arrendatário e a arrendadora foram quitadas. Posteriormente, a arrendadora foi notificada pelo terceiro sobre o negócio jurídico entre ele e o arrendatário e informada de que o paradeiro do arrendatário era desconhecido, tendo sido solicitada na ocasião a transferência do veículo junto ao Detran. A instituição financeira arrendadora se recusou a realizar a transferência sob o argumento de não haver anuído com a cessão do contrato.

Em seu voto, o Min. relator Marco Buzzi confirmou o entendimento reiterado da Corte de que, não havendo a anuência expressa da arrendadora, não poderia haver a cessão de posição contratual.

Contrariando essa posição, o ministro Luis Felipe Salomão abriu divergência com o voto que se sagrou vencedor para inaugurar a tese de que "uma vez quitadas as obrigações relativas ao contrato-base, a manifestação positiva de vontade do cedido em relação à cessão contratual torna-se irrelevante, perdendo sua razão de ser, haja vista que a necessidade de anuência ostenta forte viés de garantia na hipótese de inadimplemento pelo cessionário".

A ministra Isabel Galloti acompanhou o voto do ministro relator, mas sob o fundamento da ilegitimidade da instituição financeira para figurar no polo passivo da demanda, tendo em vista a inexistência de relação jurídica com o terceiro e a ausência de citação do arrendatário para se manifestar sobre o suposto contrato de compra e venda celebrado.

Em suas razões, consignou-se o seguinte: "Estamos presumindo contra o vendedor, que não foi citado nem por edital e nem integrou a relação processual, que esses documentos são perfeitos e verdadeiros. Não se duvida de que o sejam, mas isso poderia somente ser afirmado pelo Poder Judiciário, com força de coisa julgada, se a demanda tivesse sido dirigida contra o vendedor, contra aquele com quem o autor celebrou a compra e venda, contra aquele ao qual a instituição financeira teria o dever de transferir a propriedade".

Não se adentrou à controvérsia sobre a necessidade ou não da anuência do cedido após o adimplemento das prestações do cedente. Com efeito, tal parece ser o raciocínio mais acertado. Afinal, não se está diante de cessão da posição de arrendatário no contrato originalmente celebrado com a instituição financeira. O que se discute no caso é a possibilidade de opor contra a arrendadora um dever em face de terceiro com o qual não possui relação jurídica alguma, o que, como bem pontuou a Min. Isabel Galotti, não é apropriado.

Na cessão de posição contratual, as disposições acordadas e o tipo negocial não são alterados. Além disso, o cessionário passa responder ao cedido nos mesmos termos em que responderia, anteriormente à cessão, o cedente. No caso concreto, existiu um negócio jurídico de leasing entre a arrendadora e o arrendatário e uma promessa de compra e venda paralela entre o promitente-vendedor, que figura como arrendatário no contrato de leasing com a instituição financeira, e o promitente-comprador do bem, que é terceiro em relação ao contrato de leasing.

*Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Roma II-Tor Vergata, Girona, UFMG, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC, UFMT, UFBA, UFRJ e UFAM).


[2] REsp n. 356.383/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 5/2/2002, DJ de 6/5/2002, p. 289.

[3] MOTA PINTO, Carlos Alberto da. Cessão de Contrato: contendo parte tratando a matéria conforme o direito brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1985,

p. 166.

[4] Nesse sentido, GOMES, Orlando. Contratos. Atual. Antônio Junqueira de Azevedo e Francisco Paulo de Crescenzo Marino. 26ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 179 e BIANCA, Cesare Massimo. Diritto Civile: Il Contratto. v.III. Milano: Giuffrè Editore, 2000, p. 717, que assevera ser esse o posicionamento majoritário da doutrina italiana.

[5] PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado. t. XXIII. São Paulo: Revista do Tribunais, 2012, p. 494-496.

 [6] AgRg no REsp n. 898.830/RJ, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 16/11/2010, DJe de 1/12/2010.

AgInt no REsp n. 1.591.138/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 13/9/2016, DJe de 21/9/2016.

AgInt nos EREsp n. 1.570.460/RS, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, julgado em 13/9/2017, DJe de 18/9/2017.

AgInt no REsp n. 1.577.979/RS, relator Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), Quarta Turma, julgado em 24/4/2018, DJe de 2/5/2018.

AgInt no REsp n. 1.577.979/RS, relator Ministro Lázaro Guimarães (Desembargador Convocado do TRF 5ª Região), Quarta Turma, julgado em 24/4/2018, DJe de 2/5/2018.

[7] REsp n. 1.036.530/SC, relator Ministro Marco Buzzi, relator para acórdão Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 25/3/2014, DJe de 15/8/2014.

Gabriela Cobra e Monteiro é advogada e mestranda em Direito Civil pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP).

Revista Consultor Jurídico, 24 de outubro de 2022, 12h07

https://www.conjur.com.br/2022-out-24/direito-civil-atual-cessao-posicao-contratual-papel-anuencia-cedido