quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Usucapião administrativa: As unidades em condomínios edilícios

terça-feira, 11 de setembro de 2018
Por Vitor Frederico Kümpel e Bruno de Ávila Borgarelli
Dando continuidade à série de colunas sobre a usucapião extrajudicial, este brevíssimo texto trata da possibilidade de aplicar-se essa modalidade de usucapião às unidades autônomas em condomínios edilícios. Não havia previsão expressa quanto a isso no CPC/2015, que inseriu o art. 216-A na Lei de Registros Públicos.
Agora, com a vigência da lei 13.465/2017, acrescentou-se o §11 ao art. 216-A da LRP, com a seguinte redação: "No caso de o imóvel usucapiendo ser unidade autônoma de condomínio edilício, fica dispensado consentimento dos titulares de direitos reais e outros direitos registrados ou averbados na matrícula dos imóveis confinantes e bastará a notificação do síndico para se manifestar na forma do § 2º deste artigo".
Assim, e seguindo-se a imposição do §2º do mesmo dispositivo, caso o síndico não dê manifestação no prazo legalmente assinalado (quinze dias), interpretar-se-á o seu silêncio como anuência. Essa presunção de concordância, como já se disse, é uma das grandes novidades da lei 13.465/2017.
Pois bem. No caso de unidade autônoma de condomínio edilício, a desnecessidade de comunicação e anuência dos titulares de direitos reais e outros sobre os imóveis confinantes é de evidente razão. Com as áreas em geral perfeitamente demarcadas, não há motivo para citar e reunir a manifestação de todos os confrontantes, bastando mesmo que se notifique o síndico.
Isso veio a ser também confirmado pelo provimento 65/2017 do CNJ, em seu art. 6º. Relativamente aos titulares de direitos reais ou outros direitos sobre o próprio imóvel que se pretende usucapir, entende-se não ser possível a representação pelo síndico, o que de resto espelha a literalidade do art. 216-A, §11 da LRP.
Uma dúvida que sempre se coloca é quanto à possibilidade de usucapião de unidade em condomínio não regularizado, ou seja, naqueles casos em que a instituição condominial não está devidamente registrada. No art. 216-A, §11 da LRP não se fala em constituição regular de condomínio. O provimento 65 do CNJ, por sua vez, menciona claramente a usucapião de unidade de "condomínio edilício regularmente constituído".
Diante disso, fica-se com o entendimento já acolhido pelo Conselho Superior da Magistratura de SP, no sentido de ser, sim, possível a usucapião de unidade autônoma em condomínio irregular. Assim ficou a ementa1:
REGISTRO DE IMÓVEIS – Usucapião – Mandado de registro – Recusa, sob o fundamento de que os imóveis são unidades de empreendimento que configura condomínio irregular – Afirmação de que o registro das incorporações, instituições e convenções de condomínio é objeto de determinação legal e, sem o seu cumprimento, as unidades autônomas não têm acesso ao fólio real – Sentença de procedência da dúvida – Reconhecimento, todavia, da usucapião como forma originária de aquisição da propriedade, hipótese que viabiliza o registro pretendido – Recurso provido.
De se destacar, também, o seguinte trecho da decisão:
Deveras, doutrina e jurisprudência proclamam, em uníssono, a caracterização da usucapião como modo originário de aquisição do domínio, o que faz com que o ingresso na tábua registral, excepcionalmente, não se prenda a liames com o passado. Bem por isto, não há que se afirmar que o Juízo que decretou a usucapião tenha sido “induzido em erro” e, assim, deixado de observar que as unidades usucapidas se situam em condomínio irregular. Na verdade, o que se aprecia em ação de usucapião, como oportunamente ponderado pelos apelantes, é a realidade de fato, traduzida em posse sobre bem materialmente existente. Uma vez preenchidos os requisitos legais para que isto gere a aquisição da propriedade, a realidade de fato passa a equivaler a realidade de direito, cujo ingresso no registro imobiliário é consequência.
Superada essa questão, resta mais um ponto interessante a tratar em relação ao objeto de usucapião aqui observado.
Acredita-se, antes de tudo, que a possibilidade da usucapião administrativa de unidade autônoma de condomínio edilício pode ter um saudável reflexo na regularização de muitos imóveis. Durante boa parte dos anos 90 e 2000, muitos proprietários de unidades autônomas tentavam, mas não conseguiam regularizar seus imóveis, livrando-se de hipotecas incidentes em relação a negócios firmados entre a construtora e o agente financeiro. Paralelamente, muitos proprietários intentavam ações de usucapião, mas o STJ entendia não ser possível, diante da precariedade da posse. A dívida hipotecária, assim, ficava travada na matrícula do imóvel, impedindo o procedimento judicial de usucapião.
Até que veio a súmula 308 do STJ: "A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel". Com esse enunciado, como se sabe, a hipoteca não vincula o compromissário comprador.
E isso, entre outras coisas, viabiliza a retomada da discussão sobre usucapião. É que, com a ineficácia da hipoteca em relação ao terceiro adquirente da unidade autônoma em condomínio edilício, o caminho fica livre para a usucapião. E, com a possibilidade de usucapião extrajudicial, na forma como adotada no art. 216-A (com as supracitadas modificações introduzidas pela lei 13.465/2017), parece que se está diante de um excelente caminho para a regularização de muitos imóveis.
O foco está, portanto, nessas áreas edilícias não regularizadas. De uma situação de completo travamento matricial, passando pela Súmula 308 até chegar à usucapião extrajudicial. Trata-se de um verdadeiro evoluir no processo de regularização urbana, de todo alinhado aos objetivos e à sistemática da própria usucapião administrativa, bem como da lei 13.465/2017.
Sejam felizes! Até o próximo Registralhas.
__________
1 APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.241-6/9, São Caetano do Sul, j. 13.04.2010, D.J.E. 15.06.2010.

https://www.migalhas.com.br/Registralhas/98,MI287245,91041-Usucapiao+administrativa+As+unidades+em+condominios+edilicios

STJ: Família de vítima de descarga elétrica em celular conectado à energia será indenizada

STJ manteve acórdão do TJ/SP que estabeleceu pensão mensal e danos morais.
segunda-feira, 10 de setembro de 2018

O ministro Antonio Carlos Ferreira, do STJ, manteve decisão que condenou a Nokia a indenizar família de vítima de descarga elétrica em celular conectado à energia. No caso, a empresa foi condenada a pagar pensão mensal e indenização, por danos morais, a mãe e filha de um homem que morreu por descarga elétrica, após ser atingido por um raio enquanto falava pelo celular que estava conectado na energia.
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O ministro pontuou que o TJ/SP, à luz das provas dos autos, concluiu pela responsabilidade civil da empresa, suficientemente demonstrada a ocorrência do evento, do dano e do nexo causal, afastando a tese de culpa exclusiva da vítima ou culpa concorrente capaz de excluir sua responsabilidade, nos seguintes termos:  
"As autoras, mãe e filha da vítima de eletroplessão, Erik, alegam que a ré disponibilizou no mercado produto com defeitos de informação, de fabricação e de segurança, o que acarretou a morte da vítima quando atingida por um raio, ocasião em que falava ao celular fabricado pela ré. Chovia, na ocasião, e tanto o aparelho como seu manual não fariam menção aos perigos eventuais de se falar ao celular quando conectado na energia - para recarga -, mormente quando chovesse. A responsabilidade da ré foi bem definida."
Para o ministro, as razões recursais limitam-se a alegar, de forma genérica, a ocorrência de contradição e omissão no julgado, sem indicar, contudo, os dispositivos eventualmente descumpridos, o que caracteriza deficiência na fundamentação, a teor da súmula 284 do STF.
Desta forma, considerando a fundamentação do acórdão objeto do recurso especial, os argumentos utilizados pela parte recorrente somente poderiam ter sua procedência verificada mediante o necessário reexame de matéria fática, não cabendo so STJ, a fim de alcançar conclusão diversa, reavaliar o conjunto probatório dos autos, em conformidade com a súmula 7. 
O acórdão foi reformado apenas no ponto dos juros de mora incidentes sobre o pensionamento. O TJ/SP entendeu que os juros de mora deveriam incidir desde o evento danoso, por tratar-se de ilícito extracontratual. 
No entanto, segundo o ministro Antonio Carlos Ferreira, o entendimento está em dissonância com a jurisprudência do STJ acerca da matéria. De acordo com ele, tratando-se de responsabilidade contratual, é pacífico nesta Corte que os juros moratórios incidem desde a citação do devedor, conforme previsto no artigo 405 do CC/02. Assim, no caso concreto, a responsabilidade decorre da relação de consumo entre as partes e, portanto, os juros de mora da pensão devem incidir desde a citação do devedor.
Diante do exposto, o ministro deu parcial provimento ao Resp apenas para que os juros moratórios incidam desde a citação do devedor.
https://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI287207,91041-Familia+de+vitima+de+descarga+eletrica+em+celular+conectado+a+energia