sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Evento gratuito: Jornada da Advocacia: Descomplicando o Divórcio


A partir do dia 18/9, o
 IbiJus - Instituto Brasileiro de Direito dará início à "Jornada da Advocacia: Descomplicando o Divórcio", um evento totalmente gratuito, online e ao vivo. O objetivo é apresentar o método SENSE, desenvolvido pelas advogadas e mediadoras de conflito Ana Luiza Pureur e Júlia Freitas, para uma atuação eficiente e financeiramente sustentável. Inscreva-se! 



Com a guarda compartilhada, tenho direito de ficar 50% do tempo com meus filhos?

Essa é sua dúvida também? Então leia o artigo.

Publicado por Suely Leite Viana Van Dal

Sempre que os pais estão se separando e tem filhos menores, o primeiro assunto que abordo é sobre a guarda. Eu, defensora que sou da guarda compartilhada, já começo logo a demonstrar as vantagens dessa forma de guarda.

A grande dúvida gira em torno de como será dividido o tempo que cada um ficará com os filho.

Com a guarda compartilhada, a forma que será aplicada é questão de bom senso entre ambos, pois a lei prevê que o tempo de convívio com os pais deverá ser de forma equilibrada. Contudo, isso não significa que deverão contar os minutos que a criança está com um para que seja “descontado” do tempo do outro.

Ainda, deve ser observado pelos pais o que é melhor para a criança ou adolescente, pois em muitos casos ter a guarda física, não poder estar presente, e ter a necessidade de deixar com terceiros, pode não ser o melhor. Daí o motivo da lei dizer que “sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos.”

Além disso, sempre há aquela pergunta: - mas Doutora, se a guarda é compartilhada, não somos obrigados a compartilhar exatamente a mesma quantidade de convívio com meu filho ou filha?

Não tem não! A única coisa que tem é ver o que é melhor para os filhos, pois não adianta estabelecer horários rígidos que não possam ser cumpridos, e somente para cumprir uma regra estabelecida. O que deve é ter a maturidade de decidir o que é melhor e qual rotina melhor se encaixa para a criança naquele momento. E quando digo naquele momento, é porque as situações podem mudar e a forma de convívio poderá ser alterada, desde que não haja prejuízo para os menores.

Quando os pais não chegarem em um consenso sobre a guarda, o juiz deverá aplicar a guarda compartilhada, é o que prevê a legislação, salvo se um dos pais declarar que não quer ter a guarda do filho. Diante disso, o juiz determinará a guarda unilateral, qual seja, para somente um dos pais.

O intuito da guarda compartilhada é fazer com que os filhos não percam o contato, a referência paterna ou materna depois de um divórcio entre os pais, bem como perder os vínculos com o restante dos familiares. Logo, é importante que ao procurar um advogado (a) esteja aberto a ver o que é melhor para os filhos em um momento tão delicado e difícil, e que precisa ser pensado para que o processo de divórcio afete o menos possível a vida dos menores.

Espero ter contribuído.

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*Imagem google (meramente ilustrativa)

https://suelyvandal.jusbrasil.com.br/artigos/624746486/com-a-guarda-compartilhada-tenho-direito-de-ficar-50-do-tempo-com-meus-filhos?utm_campaign=newsletter-daily_20180914_7567&utm_medium=email&utm_source=newsletter

A interdição dos direitos civis, frente ao estatuto da pessoa com deficiência

Thays Antonio
A lei como está, necessita ser alterada e há projeto de lei em tramite (757/15), cujo objetivo é ajustar os pontos controversos que ficaram na legislação brasileira após o "atropelamento legislativo" que ela causou.
sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Sob o argumento de melhor inserir as pessoas com deficiência mental na sociedade, em 2016 entrou em vigor a Lei Brasileira de Inclusão (LBI),também conhecida como estatuto da pessoa com deficiência1.
Desde então, muitas dúvidas e discussões doutrinárias persistem e as discussões judiciais vem se avolumando. Dentre outras, aquela mais polêmica é a que trata a "teoria das incapacidades". Com efeito, com o advento do estatuto, a regra é que a deficiência mental não afeta a capacidade civil da pessoa e, sendo assim, o deficiente é considerado capaz para celebrar contratos, casar, propor ação nos juizados especiais, etc.
Consequentemente, ao excluir os deficientes do rol de pessoas absolutamente incapazes (art. 3° do CC, com redação alterada pela LBI), a aplicação dos institutos assistenciais e protetivos, como o da curatela e o da tomada de decisão apoiada, passam a ser aplicados apenas em casos excepcionais, sendo restritos apenas aos atos negociais e patrimoniais, resguardando os demais direitos das pessoas com deficiência, como votar, trabalhar e casar (arts. 6°, 84 e 85 da LBI)
De fato, com as alterações realizadas pela lei de inclusão, as pessoas referidas no art. 1.767 do Código Civil (sujeitas à curatela) não são mais declaradas ineptas a todos os atos da vida civil, e, portanto, não mais poderão ser nomeados curadores para geri-las por inteiro. Assim, sem respaldo na lei material, fica sem sentido e cai por terra as disposições dos artigos 747 e seguintes do CPC, que dispõe sobre a ação de interdição.
Com efeito, o estatuto traz como institutos assistenciais e protetivos apenas a tomada de decisão apoiada e a curatela, determinando como requisito para a instituição desta última a comprovaçãode deficiência ou doença mental grave que coloque o deficiente em estado de vulnerabilidade perante terceiros.
A tomada de decisão apoiada, que inexistia no ordenamento jurídico brasileiro, foi criada pelo art. 116 da lei de inclusão e deve ser observada quando a pessoa é portadora de transtornos mentais brandos, ou seja, quando a deficiência ou doença não afeta completamente o seu discernimento. Diferente das intervenções conhecidas até então, a tomada de decisão apoiada não restringe o exercício de direito do deficiente, tratando-se apenas de uma salvaguarda para situações pontuais, principalmente em casos que necessite contratar, negociar ou acordar com terceiros3.
Em outras palavras, sem abrir mão de seus poderes e capacidades, a pessoa com deficiência mental, conhecendo e tendo clareza da sua doença, poderá indicar duas pessoas de sua confiança para orientá-la e acompanhá-la na realização de atos da vida civil, de modo que auxiliem na tomada de decisões em que a sua situação de hipossuficiência pudesse prejudicá-la, possibilitando, assim, que exerça plenamente a sua capacidade.
A prerrogativa do pedido para instituição da tomada de decisão apoiada é personalíssima da pessoa com deficiência, ou seja, apenas ela pode solicitar esse apoio ao judiciário. Postulado o pedido, o juiz, com o auxílio da equipe multidisciplinar, irá avaliar não apenas a pertinência do pedido como a qualidade dos indicados a assumirem a responsabilidade4.
Já a curatela, imposta em situações extraordinárias, é restrita apenas àquelas pessoas com deficiência ou doença mental grave, e, assim, por incapacidade permanente ou transitória que afete a sua manifestação da vontade, necessita que um terceiro administre seu patrimônio e seus negócios, perdendo relativamente a sua capacidade para tanto.
Neste quesito, importante ressaltar que, além de a curatela afetar tão somente os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial (art. 85 LBI), é necessário um laudo elaborado por equipe multiprofissional e interdisciplinar demonstrando a ausência de discernimento. Além disso, ressalta-se que a lei de inclusão proíbe que a curatela alcance os direitos civis relativos ao próprio corpo, à sexualidade, ao matrimônio, à privacidade, à educação, à saúde, ao trabalho e ao voto (art. 6º e art. 85, §1º da LBI).
Por ser medida extraordinária, deverá constar na sentença que determinar a instituição da curatela as razões e motivações de sua definição, preservando os interesses do curatelado. Ainda, ao nomear curador, o juiz deverá dar preferência a pessoa que tenha vinculo de natureza familiar, afetiva ou comunitária com o curatelado.
Outra importante inovação realizada pela lei de inclusão é a implementação da possibilidade de o juiz nomear mais de uma pessoa como curador, possibilitando, assim, a curadoria compartilhada. (art. 1.775-A do Código Civil)
Como exposto, embora a LBI tenha acabado com a interdição "total" das pessoas com transtorno mental, ainda existem procedimentos necessários para apoiar as pessoas que possam ser vulneráveis, hipossuficientes em questões patrimoniais. E, uma vez que o CPC/15 entrou em vigor após a lei de inclusão (apesar de ter sido aprovado antes), não há procedimento para a nomeação de curador ou de apoiador aos deficientes.
Dessa forma, não há como negar que a "interdição completa", bem como o curador com poderes indefinidos, gerais e ilimitados, não mais existem em nosso ordenamento jurídico. Por óbvio que o procedimento de interdição permanece, contudo sob outra e nova perspectiva, desta feita limitada aos atos de conteúdo econômico ou patrimonial.
A lei como está, necessita ser alterada e há projeto de lei em tramite (757/15), cujo objetivo é ajustar os pontos controversos que ficaram na legislação brasileira após o "atropelamento legislativo" que ela causou. Porém, até que o projeto vingue, as questões relativas a capacidade civil das pessoas devem ser regidas pelo citado estatuto, com a concorrência do bom senso a ser empreendido pelos advogados e julgadores caso a caso, a fim de a lei não se voltar contra àqueles que deveriam proteger, ou seja, os deficientes mentais em graus de discernimento diversos.
__________
2 De acordo com o art. 2°, §1° da LBI, a avaliação da deficiência será biopsicossocial, realizada por equipe multiprofissional
3 FILHO, Waldir Macieira da Costa. Do Reconhecimento Igual perante a Lei in LEITE, Flávia Piva Almeida; RIBEIRO, Lauro Luiz Gomes Ribeiro; FILHO, Waldir Macieira da Costa (Coord.). Comentários ao Estatuto da Pessoa com Deficiência. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 371
4 Ibidem. p. 372
__________

*Thays Antonio é advogada do escritório a|CF - Advocacia Cunha Ferraz.
https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI287451,51045-A+interdicao+dos+direitos+civis+frente+ao+estatuto+da+pessoa+com

TJ/SP: DECISÃO SOBRE RECUSA DE REGISTRO DE PACTO ANTENUPCIAL

Publicado em: 13/09/2018

Processo Nº 583.00.2007.240561-0 
 
DÚVIDA IMOBILIÁRIA – recusa de registro de pacto antenupcial com regime matrimonial de separação total de bens (legal) dispondo sobre a possibilidade de doação, alienação e transferência de bens ao cônjuge – possibilidade ante a plena capacidade dos contratantes – improcedência.
 
Vistos.
Cuida-se de dúvida imobiliária suscitada pelo 10º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, por requerimento de Gillian Carol Steel, que pretende registrar pacto antenupcial em que se estabeleceu a possibilidade de livre disposição entre cônjuges casados no regime de separação legal de seus bens. Alega o Registrador que o título não foi registrado por afrontar o regime de separação obrigatória imposto, devendo a cláusula que permite a livre disposição de bens entre cônjuges ser excluída do contrato antenupcial por meio de reti-ratificação (fls. 02/03). A interessada impugnou o feito sustentando a validade do contrato antenupcial haja vista que a imposição do regime de separação a cônjuges maiores de 60 anos vem sendo mitigada pelas Cortes brasileiras desde a promulgação da Constituição Federal (fls. 24/28).
 
O Ministério Público ofereceu parecer no sentido de procedência da dúvida, sustentando que a estipulação da possibilidade de fazer doações, alienações e transferências entre si, de bens pretéritos e futuros, implica burla ao regime legal de bens do casamento sendo, portanto, nula (fls. 37/38).
 
É O RELATÓRIO.
 
FUNDAMENTO E DECIDO.
 
Anote-se, de início, que não cabe a este Juízo correicional-administrativo verificar a nulidade, ou não, do ato a ser registrado. Tal fato deve ser objeto de ação própria por terceiro interessado na via adequada. O que se discute aqui é a possibilidade de registro de pacto antenupcial com disposição que autoriza cônjuges casados pelo regime da separação obrigatória de bens a doarem, alienarem ou transferirem seus bens um ao outro.
 
A despeito da r. manifestação do Ministério Público, a recusa deve ser afastada.
 
A lei não veda que cônjuges casados no regime da separação legal de bens estipulem a livre disposição de bens entre si no pacto antenupcial. Apenas exige que o pacto antenupcial seja feito por escritura pública (artigo 1.653 do Código Civil), o que foi feito e encartado nos autos. Demais disso, pelo que consta, o pacto foi celebrado por partes capazes que, ao menos em tese, tinham discernimento no momento da celebração do ato. Extrai-se, portanto, que, formalmente, o título está em ordem, não se podendo falar, por conseguinte, em nulidade do ato levado a registro.
 
Quanto à disposição do artigo 1655, do Código Civil, que prevê a nulidade do ato cuja convenção ou cláusula contravenha disposição absoluta de lei, forçoso reconhecer que foi respeitada. Apesar de o Oficial de Registros argumentar no sentido de que o antigo diploma civil de 1916 previa em seu art. 312 a proibição da estipulação de doações recíprocas nos casos de separação obrigatória de bens, é certo que tal disposição não foi repetida pelo atual legislador de 2002. Aliás, ao contrário: foi revogada pelo art. 2045, do Novo Código Civil, que dispôs expressamente sobre a revogação do Código Civil de 1916 (v. LICC, art. 2º).
 
Sendo assim, não há como, sob o argumento de interpretar a vontade do legislador, aplicar lei revogada, ignorando o art. 2045, do Novo Código Civil. Acresça-se a isso o fato de a escritura ora em debate ter sido lavrada na vigência do Novo Código. Inaplicável, destarte, a disposição do Código revogado. Além disso, vem prevalecendo na doutrina e jurisprudência o entendimento de que a obrigatoriedade da adoção do regime de separação legal é inconstitucional.
 
A propósito, cite-se a decisão proferida em 1998 pelo ministro César Peluso, então desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, sob a égide do Código Bevilaqua:
 
“Tampouco são nulas as doações ulteriores ao matrimônio. E não o são, porque o disposto no art. 258, parágrafo único, II, do Código Civil, refletindo concepções apenas inteligíveis no quadro de referências sociais doutra época, não foi recepcionado, quando menos, pela atual Constituição da República e, portanto, já não vigendo, não incide nos fatos da causa. É que seu sentido emergente, o de que varão sexagenário e mulher qüinquagenária não tem liberdade jurídica para dispor acerca do patrimônio mediante escolha do regime matrimonial de bens, descansa num pressuposto extrajurídico óbvio, de todo em todo incompatível com as representações dominantes da pessoa humana e com as conseqüentes exigências éticas de respeito à sua dignidade, à medida que, por via de autêntica ficção jurídico-normativa, os reputa a ambos, homem e mulher, na situação típica de matrimônio, com base em critério arbitrário e indução falsa, absolutamente incapazes para definirem relações patrimoniais do seu estado de família. […] Noutras palavras, decretou-se, com vocação de verdade legal perene, embora em assunto restrito, mas não menos importante ao destino responsável das ações humanas, a incapacidade absoluta de quem se achasse, em certa idade, na situação de cônjuge, por, deficiência mental presumida iuris et de iure contra a natureza dos fatos sociais e a inviolabilidade da pessoa. […] Deduzir, com pretensão de valor irrefutável e aplicação geral, homens e mulheres, considerados no ápice teórico do ciclo biológico e na plenitude das energias interiores, à condição de adolescentes desvairados, ou de neuróticos obsessivos, que não sabem guiar-se senão pelos critérios irracionais das emoções primárias, sem dúvida constitui juízo que afronta a amesquinha a realidade humana, sobretudo quando a evolução das condições materiais e espirituais da sociedade, repercutindo no grau de expectativa e qualidade de vida, garante que a idade madura não tende a corromper, mas a atualizar as virtualidades da pessoa, as quais constituem o substrato sociológico da noção da capacidade jurídica. […] Não é tudo. A eficácia restritiva da norma estaria, ainda, a legitimar e perpetuar verdadeira degradação, a qual, retirando-lhe o poder de dispor do patrimônio nos limites do casamento, atinge o cerne mesmo da dignidade da pessoa humana, que é um dos fundamentos da República (art. 1º, III, da Constituição Federal), não só porque a decepa e castra no seu núcleo constitutivo de razão e vontade, na sua capacidade de entender e querer, a qual, numa perspectiva transcendente, é vista como expressão substantiva do próprio Ser, como porque não disfarça, sob as vestes grosseiras de paternalismo insultuoso, todo o peso de uma intromissão estatal indevida em matéria que respeita, fundamentalmente, à consciência, intimidade e autonomia do cônjuge. E aqui, para agravo da classificação jurídica que, como toda legislação, opera, distinguindo entre categorias de cônjuges, fundado em critérios factuais aleatórios, o velho artigo 258, parágrafo único, II, do Código Civil, perpetra discriminação não menos desarrazoada e injusta, porque não há norma nem princípio jurídico que impeça a alguém, em razão de idade avançada e de envolvimento afetivo, doar bens ao parceiro, antes ou durante o concubinato, e sequer no decurso de relacionamento efêmero que reúna todos os ingredientes de uma aventura amorosa. Tampouco estão os mais jovens imunes aos riscos patrimoniais da ilusão e da farsa. Por que é, pois, que, sob pretexto de vulnerabilidade psíquica, subentendida como doença peculiar da instituição matrimonial, haveriam de ser tolhidos na mais nobre das manifestações humanas, que é o exercício da generosidade e da justiça, apenas os cônjuges os quais não raro têm largas razões para compartilhar e repartir por conta de injunção normativa, esta, sim, decrépita, e cuja menor extravagância está em desestimular, por reação legítima em resguardo da autonomia, ética e da liberdade jurídica, que relações não matrimoniais se convertam em casamento? E atentado considerável à estabilidade do ordenamento jurídico é já o descrédito notório, que, provocado pela inconveniência dessa conversão, capaz de satisfazer anseios genuínos e evitar incertezas danosas à ordem social, levaria, ou vem levando, à desuetudo dos casamentos tardios. […] São estas todas razões mais que bastantes por negar vigor ao artigo 258, parágrafo único, II, do Código Civil, em especial na sua imodesta conseqüência de proibir alienações, gratuitas ou onerosas, entre os cônjuges. Não custa, porém, aduzir que, conquanto sem argumentos manifestos, há quem, dentre juristas respeitáveis, sustente não ser essa, conseqüência da regra: “Quando o regime é o da separação, os cônjuges podem livremente negociar um com o outro” (AGOSTINHO ALVIM, “Da Doação”, SP, Ed. RT, 1ª ed., 1973., p. 147, n. 46). É quem chegue a mesma conclusão, entendendo ser inaplicável ao casamento, ainda que celebrado sob regime legal de separação pura de bens, que é o de que se cogita na hipótese, o conteúdo restritivo do artigo 312 do Código Civil, o qual só apanharia os nubentes, não os cônjuges; “Os bens e demais frutos que sobejam aos encargos do casamento podem ser doados a quem quer que seja, inclusive ao outro consorte… A 4ª Câmara do Tribunal de Justiça de São Paulo, a 20 de março de 1947 (R. dos T., 167, 689), tentou estender às doações entre cônjuges o que só se refere às doações entre nubentes: É nula a liberalidade feita pelo marido à mulher na constância do casamento contraído sob o regime de separação obrigatória de bens. É certo que o artigo 312 do Código Civil trata das doações antenupciais, não fazendo referência a doações durante a vigência do casamento. Mas, está subentendido, por força de extensão, que a proibição compreende também as liberalidades na constância do casamento, porque, do contrário, não haveria razão para lei vedar as doações antenupciais. Seria inutilidade. Sem razão; não se interpretam leis sem se entenderem” (PONTES DE MIRANDA, op. cit., pp. 431-432, § 943, n. 2. Não há contradição com p. 425, § 939, n. 5, onde trata de doações inter sponsos, não inter conjuges. Cf., ainda, seu “Direito de Família”, RJ, Ed. Jacintho R. dos Santos, 1917, p. 238, § 115)” (Apelação Cível 007512-4/2-00, TJSP, julgamento 18/08/98, São José do Rio Preto, Relator: Cezar Peluso).
 
Se é certo que o casamento de maior de 60 anos pode se dar de forma interessada no patrimônio do outro cônjuge, certo também é que tal interesse pode se dar em qualquer idade. “A plena capacidade mental deve ser aferida em cada caso concreto, não podendo a lei presumi-la, por mero capricho do legislador que simplesmente reproduziu razões de política legislativa, fundadas no Brasil do início do século passado” (Silmara Juny Chinelato, apud Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Vol. VI, Editora Saraiva, p. 410).
 
Mesma orientação foi tomada em recente decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo:
 
“Não colhe o inconformismo do apelante, eis que a vedação prevista na lei civil, em razão da idade do autor, não se refere à doação na constância da união estável, de sociedade de fato, ou mesmo do casamento. Para se atingir o objetivo do autor, necessário seria que fosse ele interditado para os atos da vida civil. A doação de imóvel para a companheira ou cônjuge não se estende ao impedimento da sociedade constituída com separação total ou parcial. Trata-se, na verdade, de ato de mera liberalidade praticado por profissional do Direito, a fazer presumir, portanto, conheça as razões e vicissitudes dos impedimentos e suas vantagens, impostos pelo legislador, que, por si-sós, não constituiriam um bill de indenidade para as demais pessoas, fossem quais fossem suas atividades profissionais. Outrossim, quanto ao art. 312 do CC/16, cabe mencionar que referido dispositivo nada mais fez do que impor odiosa restrição ao casamento, quando um dos cônjuges não pode sequer fazer mera liberalidade, amparando o outro, sem desamparar a própria velhice ou eventual prole. Sobre este assunto, pertinente trazer a decisão proferida pelo TJ/MG, Apelação n. 1.0491.04.911594- Apelação n. 546.548.4/7- São Pauto Voto n. 15.769, Rei. VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE, julgado em 29.03.2005: (…). Pois bem, o atualíssimo Diploma Civil de 2002, que tantas inovações progressistas nos trouxe, nesta parte manteve este censurável atentado contra a liberdade individual de pessoas maiores e capazes, fazendo uma odiosa discriminação contra estas pessoas, ferindo o seu direito de livre disposição do patrimônio adquirido com seu trabalho, cabendo ao Judiciário, no cumprimento de sua função precípua de integração do ordenamento jurídico para o alcance da justiça, analisar cada caso concreto e fazer a leitura legal que mais se amolda aos objetivos prescritos pela norma. O objetivo do retro citado artigo [art. 1641, do CC] é de proteção dessas pessoas (maiores de 60 anos) contra, como são costumeiramente chamados, casamentos interesseiros, onde o nubente mais jovem contrai matrimônio com idoso visando auferir vantagem econômica. A proteção da lei, ao meu entender, deve parar por aí, pois já cumpriu assim o seu objetivo de proteção e alerta aquele que está contraindo matrimônio com pessoa mais jovem. Alargar o sentido da norma para proibir o sexagenário, maior e capaz, repita-se, de dispor de seu patrimônio de maneira que melhor lhe aprouver é, como dito acima, um atentado contra a sua liberdade individual (…). A aplicação da proibição ao cônjuge, já de tenra idade, de fazer doação ao seu consorte jovem deve ser aplicada com rigor naquelas hipóteses onde se evidencia no caso concreto que o nubente mais velho já não dispõe de condições para contrair matrimônio, deixando claro que este casamento tem o único objetivo de obtenção de vantagem material’” (APELAÇÃO CÍVEL COM REVISÃO n° 546.548-4/7-00, TJSP, julgamento 02/04/2008, São Paulo, Relator: CAETANO LAGRASTA).
 
Tenha-se em mente, outrossim, que o Novo Código Civil estatuiu como princípio básico o da boa-fé objetiva, diferentemente do Antigo, regido pelo interesse privado e pela boa-fé subjetiva.
 
Carlos Roberto Gonçalves explica muito bem o assunto:
 
“Todavia, a boa-fé que constitui inovação do Código de 2002 e acarretou profunda alteração no direito obrigacional clássico é a objetiva, que se constitui em uma norma jurídica fundada em um principio geral do direito, segundo o qual todos devem comportar-se de boa-fé nas suas relações recíprocas. Classifica-se, assim, como regra de conduta. Incluída no direito positivo de grande parte dos países ocidentais, deixa de ser principio geral de direito para transformar-se em cláusula geral de boa-fé objetiva. É, portanto, fonte de direito e de obrigações. Denota-se, portanto, que a boa-fé é tanto forma de conduta (subjetiva ou psicológica) como norma de comportamento (objetiva). Nesta última acepção, está fundada na honestidade, na retidão, na lealdade e na consideração para com os interesses do outro contraente, especificamente no sentido de não lhe sonegar informações relevantes a respeito do objeto e conteúdo do negócio” (Direito Civil Brasileiro, Vol. III, 2ª Edição, Ed. Saraiva, p. 35/36).
 
Sendo o pacto antenupcial, em última análise, um contrato, deve prevalecer a boa-fé objetiva, ou seja, deve-se presumir a honestidade contratual das partes. Por derradeiro, insta salientar que o registro na Serventia Predial dará publicidade do ato a terceiros a partir do seu ingresso no registro tabular, portanto terá efeitos  ex nunc, isto é, não alcançará atos realizados no passado, sendo que neste citado período o contrato terá produzido efeitos apenas entre as partes.
 
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada pelo 10º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, por requerimento de Gillian Carol Steel, para determinar o registro do Pacto Antenupcial encartado nos autos.
 
Oportunamente cumpram-se o artigo 203, II, da Lei de Registros Públicos e o conseqüente disposto na portaria-conjunta 01/2008 das 1ª e 2ª Varas de Registros Públicos de São Paulo.
 
PRIC.
São Paulo, 28 de abril de 2008.
GUSTAVO HENRIQUE BRETAS MARZAGÃO
DOE, 21/05/2008
Fonte: TJ/SP

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