O Estado democrático de direito impõe à todos os indivíduos que vivem
em sociedade a aceitarem as normas sociais, as obrigações impostas pela
moral e pela ética, enquanto compromissos supralegais. Dessa forma,
todos assumem o dever de não ofender, nem de lesar, sob pena de ter que
reparar o dano causado. É um dever geral de não prejudicar ninguém, o
qual o direito romano tratava em sua neminemleadere, ou não ofender
ninguém.
Segundo Stoco (2004, p.120),a responsabilidade, embora apoiada no mundo fático, tem sustentação jurídica, conforme expressa:
[...] depende da prática de um ato ilícito e, portanto, antijurídico, cometido conscientemente, dirigido a um fim, ou orientado por comportamento irrefletido, mas informado pela desídia, pelo açodamento ou pela inabilidade técnica, desde que conduza a um resultado danoso no plano material ou imaterial ou moral.
Para melhor compreender a sustentação jurídica da responsabilidade, se
faz necessário uma análise no campo do direito, onde a infração à norma,
o nexo causal entre o infrator e a infração, o dano causado, o nexo
causal, a sanção aplicável e a obrigação de reparar são elementos
essenciais. Na configuração da responsabilidade civil estão
necessariamente presentes três elementos fundamentais para a doutrina
subjetivista: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, um
dano e o nexo de causalidade entre um e outro. A compreensão desses três
elementos torna-se essencial no estudo do tema, devendo ser abordado,
cada um especificamente, segundo o entendimento doutrinário, para que
possamos aplicar nos casos concretos.
3.1 DANO, CULPA E RESPONSABILIDADE
Diversos doutrinadores asseveram que não há responsabilidade sem
prejuízo. O prejuízo ocasionado pelo agente é o dano. Neste
entendimento, segundo (MATIELO, 1995) o dano é componente essencial e
indispensável à responsabilização do agente. Essa responsabilização
poderá ainda ser originada de ato lícito ou não e ainda de
inadimplemento contratual, seja de forma subjetiva ou objetiva, como
será discutido adiante.Com o dano, nasce a obrigação de reparar.
No que se refere ao termo “culpa”, o Código Civil Brasileiro adotou um
entendimento lato sensu abrangendo o dolo ou pleno conhecimento do mal e
perfeita intenção de o praticar, e a culpa em sentido estrito (stricto
sensu ou aquiliana) onde ocorre a violação de um dever que o agente
podia conhecer e observar, ou seja, configuração do elemento da
previsibilidade.
Há ainda que se falar em homo medius como elemento fundamental na
conceituação de culpa. Para Gonçalves (2009) um homem-padrão, criado in
abstracto pelo julgador, não incorreria em um comportamento causador de
dano por imperícia, imprudência ou negligência. Segundo o insigne
doutrinador, se, da comparação entre a conduta do agente causador do
dano e o comportamento de um homem médio (homem-padrão in abstracto)
ficar concluso que o dano decorreu de uma imprudência, imperícia ou
negligência do primeiro, nas quais não incorreria o homem-padrão,
estaria aí caracterizada a culpa.
O previsível da culpa se mede pelo grau de atenção exigível do homo
medius. A conduta imprudente consiste em agir o sujeito sem as
precauções necessárias implicando em importância inadequada pelos
interesses de outrem. A negligência é a falta de atenção, a ausência de
reflexão necessária onde o agente deixa de prever o resultado que
poderia ser previsto. A imperícia consiste na falta de preparo técnico
adequado e proporcional à complexidade do ato executado.
O art. 944 do CC/2002 preceitua que “a indenização mede-se pela
extensão do dano”, o que permite entender que se não há dano, não há
obrigação de indenizar, ou seja, não há responsabilização do agente pelo
resultado. Daí entende-se que o dano é pressuposto da obrigação de
indenizar. Dessa forma, no âmbito cível, a extensão ou o quantum do dano
é quem dá a dimensão da indenização. Em outras palavras, estabelece
parâmetro para se pleitear uma valor pecuniário indenizatório pelo
indivíduo que se sentir lesado em seu direito ou para arbitragem pelo
juiz da causa. Assim, entende-se que o dano é o elemento objetivo da
obrigação de indenizar.
3.2 NEXO DE CAUSALIDADE
O conceito de nexo causal não é jurídico, segundo Cavalieri Filho
(2001), pois deriva das leis naturais, estabelecendo apenas o liame, a
ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Não é
satisfatório que o agente tenha praticado um ato ilícito ou erro de
conduta, não basta ainda que a vítima sofra um dano, é imprescindível
que se estabeleça uma relação de causalidade entre o fato antijurídico e
o mal causado.
A complexidade envolvendo o entendimento do nexo causal abrange
diversas teorias, sendo considerado por muitos doutrinadores como o
elemento da responsabilidade civil mais difícil de ser determinado, pois
se antepõe à duas questões importantes: a dificuldade de sua prova e a
identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano,
principalmente em se tratando de multicausalidades, onde nem sempre se
tem condições de assinalar qual a causa direta do dano (STOCO, 2004).
A teoria da equivalência das condições, da equivalência dos
antecedentes ou da conditio sinequa non foi defendida por Julius Glasser
e desenvolvida por MaximilianVon Buri o qual afirma que tudo o que
concorrer para o resultado é causa dele(PAGLIUCA, 2004). Como exemplo de
aplicabilidade desse conceito no ordenamento jurídico brasileiro, o
art. 13 do Código Penal brasileiro assevera que “O resultado, de que
depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa.
Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria
ocorrido”. Trata-se de uma teoria que simplifica de forma prática a
relação causal, porém inadequada em diversas situações fáticas na esfera
cível.
Segundo essa teoria, para determinar se uma condição é causa de um
evento ou resultado, procede-se eliminando abstratamente essa condição.
Se, ainda assim, o resultado persistir, essa condição não será a causa.
Por outro lado, se o resultado não se constatar ao eliminar a condição
prévia, então pode-se concluir que esta deu causa ao evento. Em caso de
múltiplas condições, essa teoria atribui a todas o mesmo valor, de modo
que se equivalem, não estabelecendo qual condição foi preponderante,
sendo este entendimento alvo de críticas pela doutrina, por não atender
adequadamente às aplicações nos casos concretos, principalmente
relacionados ao direito civil.
A teoria da causalidade adequada é um aperfeiçoamento da teoria da
equivalência, tendo surgido no século XIX por Johanes Von Kries,
filósofo alemão, onde segundo ele, causa será o antecedente não só
necessário, mas ainda adequado à produção do resultado (SOTOCO, 2004).
Dessa forma, nem todas as condições poderão ser entendidas como causa,
mas tão somente aquela que for mais adequada a produzir o resultado ou
efeito, de forma mais conveniente à concretização do evento danoso.
Estabelece-se então um juízo de probabilidades ao ser analisado pelo
julgador, a fim de estabelecer, dentre os antecedentes, aquele que
efetivamente contribuiu para o resultado.
Como exemplo no ordenamento jurídico brasileiro, citamos o art. 403 do
atual Código Civil brasileiro, in verbis: “Ainda que a inexecução
resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos
efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem
prejuízo do disposto na lei processual”. Este artigo encontrava
equivalência no art. 1.060 do Código Civil de 1916. Na área penal, o §
1° do art. 13 onde afirma que “A superveniência de causa relativamente
independente exclui a imputação quando, por si só, produz o resultado;
os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”.
Para Stoco (2004) se faz necessária a identificação do agente cujo
comportamento seja considerado causa eficiente para a ocorrência do
resultado. O referido autor cita o art. 186 do Código Civil atual, o
qual dispõe que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que
exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Ainda segundo o doutrinador,
existe uma causa eficiente para a eclosão do evento, ainda que outras
tenham se inserido em ocasião precedente ou posterior. Com essa
interpretação o autor defende que o referido Código Civil adotou uma
teoria da causa eficiente, sendo esta considerada por ele como mais
precisa e pertinente do que a teoria da causalidade adequada.
3.3 IMPUTABILIDADE E CAPACIDADE
A capacidade de discernimento é o componente necessário para que alguém
que pratique um ato ilícito seja obrigado a repará-lo. Assim define o
art. 186 do Código Civil o qual a imputabilidade está relacionada à
existência da livre determinação de vontade do agente. Essa vontade pode
ser expressa, inclusive, por omissão voluntária resultando em dano,
ainda que exclusivamente moral.
A imputabilidade se configura nas circunstâncias que impõem ao
profissional a capacidade para responder pelas consequências da sua
prática profissional. A regulamentação das profissões traz, por um lado,
direitos e garantias ao indivíduo que se qualificou para o seu
exercício, mas também uma presunção de capacidade natural de realizar
prognósticos de condutas e medida dos atos que perpetra, conforme os
conhecimentos científicos e habilidades técnicas adquiridas. Essa
capacidade é aperfeiçoada pela ciência que possibilita um juízo mais
preciso do exercício profissional.
Conforme pode-se observar no art. 186 C.C. o qual estabelece uma
ligação entre a imputabilidade do agente para a existência do ato
ilícito, entende-se que aqueles que estavam incapacitados de entender ou
querer o resultado danoso não poderiam responder por suas
consequências. Assim, não incorreria em culpa o incapacitado
sendo,portanto, considerados irresponsáveis pela conduta.Uma vez
considerado habilitado para o exercício de profissão regulamentada, a
capacidade civil é inquestionável e o agente assume todas as
responsabilidades inerentes à sua prática. Aos órgãos reguladores e
fiscalizadores da profissão compete o zelo à boa prática profissional,
protegendo a sociedade.
OLIVEIRA, Rauirys Alencar de; BENTO, Cléa Mara Coutinho. Responsabilidade civil do fisioterapeuta nos procedimentos dermatofuncionais com fins estéticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3547, 18 mar. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23975>. Acesso em: 19 mar. 2013.
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