terça-feira, 19 de março de 2013

Pressuposições da responsabilidade civil

O Estado democrático de direito impõe à todos os indivíduos que vivem em sociedade a aceitarem as normas sociais, as obrigações impostas pela moral e pela ética, enquanto compromissos supralegais. Dessa forma, todos assumem o dever de não ofender, nem de lesar, sob pena de ter que reparar o dano causado. É um dever geral de não prejudicar ninguém, o qual o direito romano tratava em sua neminemleadere, ou não ofender ninguém.
Segundo Stoco (2004, p.120),a responsabilidade, embora apoiada no mundo fático, tem sustentação jurídica, conforme expressa:
[...] depende da prática de um ato ilícito e, portanto, antijurídico, cometido conscientemente, dirigido a um fim, ou orientado por comportamento irrefletido, mas informado pela desídia, pelo açodamento ou pela inabilidade técnica, desde que conduza a um resultado danoso no plano material ou imaterial ou moral.
Para melhor compreender a sustentação jurídica da responsabilidade, se faz necessário uma análise no campo do direito, onde a infração à norma, o nexo causal entre o infrator e a infração, o dano causado, o nexo causal, a sanção aplicável e a obrigação de reparar são elementos essenciais. Na configuração da responsabilidade civil estão necessariamente presentes três elementos fundamentais para a doutrina subjetivista: a ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta, um dano e o nexo de causalidade entre um e outro. A compreensão desses três elementos torna-se essencial no estudo do tema, devendo ser abordado, cada um especificamente, segundo o entendimento doutrinário, para que possamos aplicar nos casos concretos.

3.1    DANO, CULPA E RESPONSABILIDADE

Diversos doutrinadores asseveram que não há responsabilidade sem prejuízo. O prejuízo ocasionado pelo agente é o dano. Neste entendimento, segundo (MATIELO, 1995) o dano é componente essencial e indispensável à responsabilização do agente. Essa responsabilização poderá ainda ser originada de ato lícito ou não e ainda de inadimplemento contratual, seja de forma subjetiva ou objetiva, como será discutido adiante.Com o dano, nasce a obrigação de reparar.
No que se refere ao termo “culpa”, o Código Civil Brasileiro adotou um entendimento lato sensu abrangendo o dolo ou pleno conhecimento do mal e perfeita intenção de o praticar, e a culpa em sentido estrito (stricto sensu ou aquiliana) onde ocorre a violação de um dever que o agente podia conhecer e observar, ou seja, configuração do elemento da previsibilidade.
 Há ainda que se falar em homo medius como elemento fundamental na conceituação de culpa. Para Gonçalves (2009) um homem-padrão, criado in abstracto pelo julgador, não incorreria em um comportamento causador de dano por imperícia, imprudência ou negligência. Segundo o insigne doutrinador, se, da comparação entre a conduta do agente causador do dano e o comportamento de um homem médio (homem-padrão in abstracto) ficar concluso que o dano decorreu de uma imprudência, imperícia ou negligência do primeiro, nas quais não incorreria o homem-padrão, estaria aí caracterizada a culpa.
O previsível da culpa se mede pelo grau de atenção exigível do homo medius. A conduta imprudente consiste em agir o sujeito sem as precauções necessárias implicando em importância inadequada pelos interesses de outrem. A negligência é a falta de atenção, a ausência de reflexão necessária onde o agente deixa de prever o resultado que poderia ser previsto. A imperícia consiste na falta de preparo técnico adequado e proporcional à complexidade do ato executado.
O art. 944 do CC/2002 preceitua que “a indenização mede-se pela extensão do dano”, o que permite entender que se não há dano, não há obrigação de indenizar, ou seja, não há responsabilização do agente pelo resultado. Daí entende-se que o dano é pressuposto da obrigação de indenizar. Dessa forma, no âmbito cível, a extensão ou o quantum do dano é quem dá a dimensão da indenização. Em outras palavras, estabelece parâmetro para se pleitear uma valor pecuniário indenizatório pelo indivíduo que se sentir lesado em seu direito ou para arbitragem pelo juiz da causa. Assim, entende-se que o dano é o elemento objetivo da obrigação de indenizar.

3.2 NEXO DE CAUSALIDADE

O conceito de nexo causal não é jurídico, segundo Cavalieri Filho (2001), pois deriva das leis naturais, estabelecendo apenas o liame, a ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. Não é satisfatório que o agente tenha praticado um ato ilícito ou erro de conduta, não basta ainda que a vítima sofra um dano, é imprescindível que se estabeleça uma relação de causalidade entre o fato antijurídico e o mal causado.
A complexidade envolvendo o entendimento do nexo causal abrange diversas teorias, sendo considerado por muitos doutrinadores como o elemento da responsabilidade civil mais difícil de ser determinado, pois se antepõe à duas questões importantes: a dificuldade de sua prova e a identificação do fato que constitui a verdadeira causa do dano, principalmente em se tratando de multicausalidades, onde nem sempre se tem condições de assinalar qual a causa direta do dano (STOCO, 2004).
A teoria da equivalência das condições, da equivalência dos antecedentes ou da conditio sinequa non foi defendida por Julius Glasser e desenvolvida por MaximilianVon Buri o qual afirma que tudo o que concorrer para o resultado é causa dele(PAGLIUCA, 2004). Como exemplo de aplicabilidade desse conceito no ordenamento jurídico brasileiro, o art. 13 do Código Penal brasileiro assevera que “O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. Trata-se de uma teoria que simplifica de forma prática a relação causal, porém inadequada em diversas situações fáticas na esfera cível.
Segundo essa teoria, para determinar se uma condição é causa de um evento ou resultado, procede-se eliminando abstratamente essa condição. Se, ainda assim, o resultado persistir, essa condição não será a causa. Por outro lado, se o resultado não se constatar ao eliminar a condição prévia, então pode-se concluir que esta deu causa ao evento. Em caso de múltiplas condições, essa teoria atribui a todas o mesmo valor, de modo que se equivalem, não estabelecendo qual condição foi preponderante, sendo este entendimento alvo de críticas pela doutrina, por não atender adequadamente às aplicações nos casos concretos, principalmente relacionados ao direito civil.
A teoria da causalidade adequada é um aperfeiçoamento da teoria da equivalência, tendo surgido no século XIX por Johanes Von Kries, filósofo alemão, onde segundo ele, causa será o antecedente não só necessário, mas ainda adequado à produção do resultado (SOTOCO, 2004). Dessa forma, nem todas as condições poderão ser entendidas como causa, mas tão somente aquela que for mais adequada a produzir o resultado ou efeito, de forma mais conveniente à concretização do evento danoso. Estabelece-se então um juízo de probabilidades ao ser analisado pelo julgador, a fim de estabelecer, dentre os antecedentes, aquele que efetivamente contribuiu para o resultado.
Como exemplo no ordenamento jurídico brasileiro, citamos o art. 403 do atual Código Civil brasileiro, in verbis: “Ainda que a inexecução resulte de dolo do devedor, as perdas e danos só incluem os prejuízos efetivos e os lucros cessantes por efeito dela direto e imediato, sem prejuízo do disposto na lei processual”. Este artigo encontrava equivalência no art. 1.060 do Código Civil de 1916. Na área penal, o § 1° do art. 13 onde afirma que “A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produz o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou”.
Para Stoco (2004) se faz necessária a identificação do agente cujo comportamento seja considerado causa eficiente para a ocorrência do resultado. O referido autor cita o art. 186 do Código Civil atual, o qual dispõe que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Ainda segundo o doutrinador, existe uma causa eficiente para a eclosão do evento, ainda que outras tenham se inserido em ocasião precedente ou posterior. Com essa interpretação o autor defende que o referido Código Civil adotou uma teoria da causa eficiente, sendo esta considerada por ele como mais precisa e pertinente do que a teoria da causalidade adequada.

3.3 IMPUTABILIDADE E CAPACIDADE

A capacidade de discernimento é o componente necessário para que alguém que pratique um ato ilícito seja obrigado a repará-lo. Assim define o art. 186 do Código Civil o qual a imputabilidade está relacionada à existência da livre determinação de vontade do agente. Essa vontade pode ser expressa, inclusive, por omissão voluntária resultando em dano, ainda que exclusivamente moral.
A imputabilidade se configura nas circunstâncias que impõem ao profissional a capacidade para responder pelas consequências da sua prática profissional. A regulamentação das profissões traz, por um lado, direitos e garantias ao indivíduo que se qualificou para o seu exercício, mas também uma presunção de capacidade natural de realizar prognósticos de condutas e medida dos atos que perpetra, conforme os conhecimentos científicos e habilidades técnicas adquiridas. Essa capacidade é aperfeiçoada pela ciência que possibilita um juízo mais preciso do exercício profissional.
Conforme pode-se observar no art. 186 C.C. o qual estabelece uma ligação entre a imputabilidade do agente para a existência do ato ilícito, entende-se que aqueles que estavam incapacitados de entender ou querer o resultado danoso não poderiam responder por suas consequências. Assim, não incorreria em culpa o incapacitado sendo,portanto, considerados irresponsáveis pela conduta.Uma vez considerado habilitado para o exercício de profissão regulamentada, a capacidade civil é inquestionável e o agente assume todas as responsabilidades inerentes à sua prática. Aos órgãos reguladores e fiscalizadores da profissão compete o zelo à boa prática profissional, protegendo a sociedade.

OLIVEIRA, Rauirys Alencar de; BENTO, Cléa Mara Coutinho. Responsabilidade civil do fisioterapeuta nos procedimentos dermatofuncionais com fins estéticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3547, 18 mar. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23975>. Acesso em: 19 mar. 2013.

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