quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Os três tipos de improbidade administrativa

Saiu na Folha de hoje (22/12/11):

Tucano paga motorista com verba pública
O deputado federal Duarte Nogueira (SP), líder do PSDB na Câmara, paga com dinheiro público um motorista particular que atende a seus filhos no interior paulista.
José Paulo Alves Ferreira, conhecido como Paulo Pedra, é desde julho contratado como secretário parlamentar pelo gabinete do deputado tucano, com salário que pode chegar a R$ 1.900, a depender de gratificações.
O expediente é cumprido em Ribeirão Preto, base eleitoral de Nogueira e onde moram os filhos. O deputado confirmou que o motorista atende a seus filhos, mas só ‘fora do horário comercial’ e quando o parlamentar não está na cidade. Ele afirmou ‘não ver nada demais nisso’.
As regras da Câmara permitem o trabalho do assessor no Estado, mas a atividade deve ser inerente ao exercício do mandato parlamentar.
O Ministério Público Federal considera desvio de função a atuação de servidores em tarefas particulares.


O termo desvio de função normalmente está associado ao servidor ou empregado concursado ou contratado para uma função que exerce outra. Por exemplo, ele foi contratado como analista e acabou trabalhando como gerente, mas sem receber por isso. Para os servidores públicos, a súmula 378 do STJ diz que, “reconhecido o desvio de função, o servidor faz jus às diferenças salariais decorrentes”, e os artigos 460 e 461 da CLT, nos casos de trabalhadores regidos pela CLT, dizem que “na falta de estipulação do salário ou não havendo prova sobre a importância ajustada, o empregado terá direito a perceber salário igual ao daquela que, na mesma empresa, fizer serviço equivalente ou do que for habitualmente pago para serviço semelhante” e “sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário”.

Mas a matéria acima não trata de alguém contratado para uma função menor e que acaba exercendo uma função diferente. Ela trata de alguém que está sendo pago com dinheiro público para exercer uma função privada.

Bem, no sentido mais amplo da expressão, trata-se de fato de um desvio de função: ele não está exercendo a função para a qual é pago. Mas do ponto estritamente legal, trata-se de improbidade administrativa (Lei 8.429/92).

Existem três grandes grupos de improbidades administrativas: aquelas que levam o servidor a enriquecer-se ilicitamente, aquelas que causam um prejuízo aos cofres públicos e aquelas que, embora não gerem enriquecimento ou causem prejuízos aos cofres públicos, atentam contra os princípios da boa administração pública.

Reparem que no exemplo acima – se de fato ocorreu (só a Justiça poderá decidir) – o deputado suspeito não se enriqueceu diretamente (ele não recebeu o dinheiro), mas ele se enriqueceu indiretamente, e isso basta para a lei ("utilizar, em obra ou serviço particular ... o trabalho de servidores públicos, empregados ou terceiros contratados por essas entidades"). Ele causou também um dano aos cofres públicos porque gastou dinheiro público para um benefício privado (ele ordenou
ou permitiu a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento), e agiu contra os princípios da administração pública, como a honestidade e a legalidade.

As penas para cada um dos três grupos são diferentes:

Enriquecimento ilícito
Ferir os princípios da administração pública

Texto modificado para corrigir e acrescentar o último parágrafo.
  • Ressarcimento integral do dano, quando houver,
  • Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio,
  • Perda da função pública,
  • Suspensão dos direitos políticos de 8 a 10 anos,
  • Pagamento de multa civil de até 3 vezes o valor do acréscimo patrimonial
  • Proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de 10 anos;
Prejuízo ao erário
  • Ressarcimento integral do dano,
  • Perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio
  • Perda da função pública,
  • Suspensão dos direitos políticos de 5 a 8 anos,
  • Pagamento de multa civil de até 2 vezes o valor do dano
  • Proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de 5 anos
  • Ressarcimento integral do dano, se houver,
  • Perda da função pública,
  • Suspensão dos direitos políticos de 3 a 5 anos,
  • Pagamento de multa civil de até 100 vezes o valor da remuneração percebida pelo agente
  • Proibição de contratar com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios pelo prazo de 3 anos.
Reparem que as penas vão diminuindo. Isso porque se você cometeu o primeiro tipo de improbidade, muito provavelmente terá cometido os outros, e responderá pelo que for mais grave. Não é possível enriquecer ilicitamente sem agir ilegalmente, ferindo os princípios da administração pública, por exemplo. E, segundo a lei, o magistrado não precisa escolher uma da lista de possíveis punições: dependendo da gravidade dos fatos, ele pode aplicar várias (ou mesmo todas) as punições.

http://direito.folha.com.br/1/post/2011/12/os-trs-tipos-de-improbidade-administrativa.html

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