quarta-feira, 25 de abril de 2012

Download ilegal não é roubo de propriedade intelectual

Por mais que baixar filmes ou músicas pela internet seja uma prática errada, caracterizada como ilegal, ela não pode ser juridicamente qualificada como roubo — nem mesmo furto — de propriedade intelectual. As indústrias da música, do cinema e do vídeo, entre outras, se referem ao download não autorizado como roubo para que as pessoas se sintam ameaçadas. Mas roubo — ou furto — significa se apossar de alguma coisa que pertence a outra pessoa. No caso de downloads, ninguém perde a propriedade de sua obra. O posicionamento foi defendido em entrevista ao canal de TV ABC pelo professor da Faculdade de Direito da Universidade Rutghers, de Nova Jersey, Stuart Green, que também é especialista em crime do colarinho branco.

No momento, os americanos discutem a qualificação dessa infração. É uma discussão importante, segundo o professor, porque há alguns anos as produtoras de bens intelectuais, os parlamentares que as defendem, agentes do FBI e promotores tentam fazer o público pensar sobre esse problema como um roubo. E tentam usar o peso moral do roubo para condenar essa prática. Mas muita gente distingue a apropriação de bens tangíveis da apropriação de bens intangíveis. Assim, pessoas que nunca entrariam em uma loja para roubar um DVD ou um CD, podem não ser relutantes em baixar alguma coisa da internet, diz ele.

"Para os jovens, por exemplo, fazer o download de música, filmes, vídeos e softwares da internet sequer parece uma coisa errada, carregada com a mesma dose de ilegalidade que caracteriza o furto de propriedades físicas", diz o professor. "Quando se trata de propriedade intangível, a coisa muda de figura. Se eu coloco alguma dessas propriedades em meu website para ganhar dinheiro, mas você descobre uma maneira de baixá-la sem me pagar, você não me subtraiu aquela propriedade, porque eu ainda a tenho", explica.

Se não é furto e muito menos roubo, o que é então? Em vez de falar sobre esses tipos de crime, é melhor falarmos sobre transgressão, contravenção ou, quem sabe, apropriação indébita ou uso não autorizado, diz. No caso, a transgressão é tradicionalmente entendida como o uso temporário da propriedade de alguém, sem a devida permissão. "Mas isso não significa subtração de propriedade. Dizer que alguém roubou a propriedade de alguém torna a coisa muito mais séria. É provavelmente uma das formas mais substanciais de crime contra a propriedade que temos", diz ele.

"E isso é exatamente o que as indústrias americanas do cinema, da música, do vídeo, entre outras, querem que aconteça. Elas querem que as pessoas acreditem que fazer o download de suas obras é um crime tão sério quanto o roubo, que deve ser punido na mesma medida", declara. Mas, por essa ser uma ideia que muita gente não aceita, é preciso rever todo o quadro, antes que ele comece a minar a eficácia e a legitimidade da legislação pertinente e as pessoas deixem de levar a lei a sério, afirma.

http://www.conjur.com.br/2012-abr-23/download-ilegal-nao-roubo-propriedade-intelectual-especialista

Uso indevido de marca por si só não gera dano moral

O uso indevido de uma marca registrada não gera o dever de indenizar, “quando a violação acontece de forma tênue ou sem a potencialidade nociva capaz de desfigurar a identificação do produto ou serviço”. Com este entendimento, a 1ª Câmara de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo concedeu decisões diferentes em dois processos em que as empresas queriam ser indenizadas por terceiros que fizeram uso e imitação de duas marcas.

O TJ paulista analisou dois casos: o de uma rede de estacionamentos que utilizava a marca e o nome Red Park, parecido com o de outra empresa que atua no mesmo ramo há oito anos, a Rede Park, e o de dois lojistas que vendiam calçados que imitavam marcas registradas e mundialmente conhecidas (Adidas e Reebok). As decisões foram diferentes.

O desembargador Enio Zuliani, relator dos processos, apoiou-se no artigo 5º, XXIX, da Constituição Federal e na Lei de Propriedade Industrial – LPI - [Lei 9.279/1996]. E ainda no entendimento do TJ-SP de que “se sente no dever de admitir o dano moral quando o ilícito prejudicar a credibilidade da marca, esvaziando seu prestígio perante os consumidores, razão do sucesso do empreendimento”.

Para Zuliani, as duas empresas que se sentiram ofendidas e entraram na Justiça estão amparadas e protegidas pela lei, que confere proteção às criações intelectuais, prevendo, expressamente, a proteção à propriedade das marcas e outros signos distintivos e pela Constituição.

Os lojistas foram condenados ao pagamento de R$ 6 mil cada um a titulo de danos morais. No caso da réplica dos tênis, o relator entende que como os produtos apreendidos são falsificados e apresentam qualidade inferior aos originais e acabamento fora dos padrões, “leva fatalmente a denegrir a imagem do original”.
(...)

Leia a íntegra em http://www.conjur.com.br/2012-abr-22/uso-indevido-marca-gera-indenizacao-prejudica-terceiro

Consumidor pode escolher como quer ser ressarcido

Uma decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça reafirmou um importante direito dos consumidores que nem sempre é respeitado no dia-a-dia pelos comerciantes. Trata-se da possibilidade de que o consumidor opte pela melhor forma de ser ressarcido, quando diante de produtos ou serviços comercializados com vícios de qualidade ou quantidade.

Na ação submetida à apreciação da corte, um consumidor buscava a substituição de um veículo, adquirido há cerca de onze anos, com um defeito na pintura. Apesar de um dos juízes que analisou o processo ter adotado entendimento contrário à opção feita pelo consumidor, a decisão não prevaleceu em razão da clareza da dicção da norma do Código de Defesa do Consumidor, que estabelece que diante de cada espécie de vício, a opção a ser feita quanto à melhor forma de ressarcimento é exclusiva do consumidor, capaz, inclusive, de exigir seu cumprimento.

Quando o consumidor se depara com serviços que apresentem vícios de qualidade (que os tornem impróprios ao consumo, lhes diminuam o valor ou não sejam condizentes com a oferta ou mensagem publicitária) ou produtos com vícios de quantidade com relação ao seu conteúdo líquido (inferior às indicações da embalagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza), o CDC autoriza a eleição da forma de ressarcimento tão-logo se verifique a ocorrência do vício. Para os casos de vícios de produtos em geral, sejam de qualidade ou quantidade, se o vício não for sanado pelo fornecedor no prazo máximo de 30 dias, ou em outro que venha a ser convencionado pelas partes, o CDC autoriza a eleição da forma de ressarcimento pelo consumidor, que pode variar entre a substituição dos produtos, restituição da quantia paga, abatimento proporcional do preço, complementação do peso ou medida, etc.

O posicionamento do STJ, que privilegia o poder de decisão dos consumidores, deve ser visto com bastante prudência por consumidores e empresários. Isso porque, enquanto consumidores devem estar atentos às prerrogativas que lhes são conferidas pelo CDC, empresários devem se conscientizar quanto aos riscos e falhas que podem advir da comercialização de seus produtos e serviços, disponibilizando atendimento adequado no momento posterior à venda, com vistas à facilitar a solução de problemas que eventualmente sejam enfrentados por seus clientes.

http://www.conjur.com.br/2012-abr-22/stj-reafirma-direito-consumidor-escolher-ressarcido

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Banco é obrigado a informar sobre portabilidade

O Banco Central informa que apenas 30 mil brasileiros fazem pedido de portabilidade de dívida, ou seja, fazem transferência de débito para instituições que ofereçam melhores condições de pagamento. Esse é um indicativo do desconhecimento de boa parte da população por seus direitos, uma vez que movimentações como essas são vantajosas, como informa o portal O Tempo.

Outra hipótese para o baixo número de pessoas que utilizam desse serviço é a negligência dos bancos, que omitem informação ou dizem não oferecer a possibilidade da portabilidade. 

Os bancos não são obrigados a realizar a portabilidade, porém têm que informar da possibilidade ao cliente. Se a informação sobre a transferência não for fornecida pela instituição financeira, o cliente tem o direito de denunciar o banco em questão.

Para o cliente conseguir realizar a portabilidade é necessário ir até o banco para onde será feita a transferência. O banco procurado irá quitar o empréstimo feito na outra instituição financeira e renegociar a dívida com o cliente. Na transação não há cobrança de taxas, nem cobrança de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

Geralmente, a ação do banco é assumir a dívida e aumentar o crédito do cliente para que esse volte a pagar as prestações que estava acostumado.

Revista Consultor Jurídico

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Juízes estão sujeitos ao Código Civil e ao Código Penal

Tenho lido, visto e ouvido na mídia em geral, e com cada vez maior frequência, no atual contexto de ampla exposição do Poder Judiciário, afirmações equivocadas quanto às possibilidades de punição a infrações legais cometidas por magistrados.

O maior engano dessas afirmativas é o de que os juízes somente são puníveis com aposentadoria compulsória integral, o que configuraria privilégio injustificável, agressivo ao princípio da isonomia, e ademais existente unicamente no Brasil, como uma insólita jabuticaba judiciária tupiniquim.

Outro é o de considerar inaceitável que, quando um magistrado erra e causa dano, e o cidadão lesado ingressa com uma ação e ganha, quem paga a indenização é o Erário, e não o magistrado responsável.
É preciso desfazer esses equívocos.
E é melhor começar pelo segundo, que é mais simples.

Efetivamente, quando um agente público lesa um particular e este ingressa com a ação de reparação de dano, quem vai pagar pelo erro é o Erário. Porém isso vale para qualquer agente público, seja juiz ou não. Está na constituição: artigo 37, § 6.º, e é muito bom para o cidadão que seja assim, porque litigando apenas contra o Estado, o cidadão só precisa provar a ação ou omissão, o nexo de causalidade e o dano. Se litigasse contra o agente público, além disso tudo, teria de comprovar a culpa ou dolo deste, o que é complicado.

Eu, seguindo opinião de muitos e bons juristas, acho até que o lesado, querendo, podia litigar desde logo contra o Estado e o agente causador do dano. Mas o Supremo Tribunal Federal já pacificou que tem de ser só contra o ente público, que poderá, posteriormente, acionar o agente (é o chamado direito de regresso). O único problema é que tais ações regressivas muitas vezes não são propostas, mas isso não é responsabilidade dos juízes, e sim dos gestores públicos e da advocacia pública...

De todo jeito, o magistrado ocasionador de possível prejuízo ao Erário (como qualquer outro agente público, repita-se), está sujeito a uma ação de regresso para repor financeiramente tal lesão.

Desfeito o segundo equívoco, é o caso de analisar o principal, consistente em dizer-se que, qualquer que seja a infração ou ilegalidade cometida por magistrado, a pena máxima será, tão-somente, aposentadoria compulsória. Ainda mais: com a integralidade dos proventos!

Com todo o respeito, não é assim.
Não existe um só dispositivo na Constituição da República que diga isso.
Não existe lei nenhuma dando respaldo a tal afirmação.

Leia a íntegra em  www.http://www.conjur.com.br/2012-abr-18/juizes-tambem-submetem-codigo-civil-codigo-penal

quarta-feira, 18 de abril de 2012

TJ-RS garante vaga em creche para criança autista

O direito ao amparo e à educação na infância, garantido pela Constituição Federal, é um bem maior e prepondera sobre qualquer regra ou óbice infraconstitucional. Com este entendimento, a 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul determinou que o Município de Porto Alegre custeie a vaga de uma criança com autismo e retardo mental moderado em creche particular. A decisão monocrática foi tomada pelo desembargador Rui Portanova, no dia 2 de abril. Ele confirmou liminar concedida pela da 2ª Vara da Infância e Juventude da Capital.

"Além disso, tratando-se de obrigação do ente público para com criança e adolescente, o próprio mérito da questão já foi por demais debatido nesta Corte’’, definiu o desembargador Portanova, citando precedentes. Segundo os atestados médicos juntados no processo, o menor necessita de acompanhamento especial, com suporte fonoaudiólogo, terapia ocupacional e escola especial.

O Município entrou com Agravo de Instrumento. Alegou que a condenação ao custeio da vaga em creche particular é descabida, pois existem vagas em escolas públicas ou conveniadas que estão aptas à atender as necessidades especiais do menor.

A Associação dos Pais de Amigos de Excepcionais (Apae) foi intimada a manifestar a possibilidade de atender a criança. No entanto, afirmou que não possui tratamento adequado para autistas. Outras entidades, indicadas pelo Município, também foram consultadas. Nenhuma afirmou ter condições de atender este tipo de demanda. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-RS.
Clique aqui para ler a decisão.
 
Revista Consultor Jurídico
http://www.conjur.com.br/2012-abr-17/municipio-fornecer-vaga-creche-particular-crianca-autismo

Função social da propriedade

A instituição jurídica da propriedade surgiu para responder à necessidade de se afetar certas riquezas a fins individuais ou coletivos. Inicialmente, a propriedade foi regulada por princípios individualistas, razão pela qual caracterizava um direito absoluto voltado apenas à satisfação de interesses individuais – refletia, assim, um ideário regido pela autonomia da vontade e pela soberania do indivíduo. Segundo Leon Duguit, “consistía en dar al poseedor de la cosa um derecho subjetivo absoluto: absoluto em su duracción, absoluto em sus efectos”.

Na etapa inicial da evolução do capitalismo, a felicidade traduzia-se na concepção de ampla liberdade para que qualquer cidadão pudesse atuar em prol dos seus interesses pessoais. Por isso, da mesma forma que o proprietário tinha o direito de gozar, usar e fruir da sua propriedade, ele tinha o direito de não utilizá-la, de não produzir, de ficar inerte diante dela. Por ser um direito absoluto seu, o proprietário poderia manejá-lo como quisesse e, se ao fazê-lo causasse danos a terceiro, não seria responsável por isso, porquanto apenas estaria exercitando o seu direito.

Aos poucos, contudo, percebeu-se que o indivíduo tinha o dever de cumprir uma certa função na sociedade, em razão do lugar que nela ocupa, devendo, para tanto, empregar o seu esforço físico ou intelectual em prol do desenvolvimento dessa coletividade. Não havia, pois, interesse em se proteger o indivíduo como um fim em si mesmo, mas pelo proveito que ele agrega à sociedade. Retratando essa nova concepção sobre o papel do indivíduo na sociedade, León Duguit revela:

Ahora bien, hoy en día tenemos la clara conciencia de que el individuo no es un fin, sino un medio; que el individuo no es más que una rueda de la vasta máquina que constituye el cuerpo social; que cada uno de nosotros no tiene razón de ser en el mundo más que por la labor que realiza en la obra social. Así, pues, el sistema individualista está en flagrante contradicción con ese estado de la conciencia moderna.

Pela mesma razão que o indivíduo tinha o dever de cumprir uma função social, o possuidor de riqueza também tinha o dever de utilizá-la para aumentar a riqueza geral da sociedade. O seu bem só seria protegido socialmente na medida em que fosse utilizado como instrumento de multiplicação da riqueza geral. Assim, a propriedade deixava de ser um direito subjetivo do indivíduo para se tornar uma propriedade-função. Nesse sentido, Guillermo Benavides Melo:

En otras palabras, la propiedad que no resulte dirigida, orientada, hacia el servicio de la sociedad, no es una propiedad deficiente, o a la cual haga falta un atributo, falta que la situaría en condición de inferioridad frente a otras propiedades que si satisfagan ese requerimiento constitucional. O como solemos decir en el lenguaje común los colombianos, no es que la propiedad con función social sea de “mejor familia” que aquella huérfana de tal función. No. Para el derecho colombiano, la función social condiciona la existencia misma del derecho, lo que equivale a afirmar categóricamente que la propiedad privada que no cumple función social, sencillamente no es propiedad privada.

Tendo surgido para atender a uma necessidade econômica, o instituto jurídico da propriedade, então, evoluiu de acordo com as novas formas que essas necessidades foram adquirindo. Se a necessidade econômica que ensejou o surgimento da instituição se transformava, por consectário lógico, a concepção jurídica da propriedade também tinha que se transformar, para atender também a interesses coletivos. Isso, todavia, não implicava na coletivização da propriedade, eis que o proprietário não só tem o poder-dever de utilizar sua coisa para a satisfação de necessidades comuns, como também deve buscar a satisfação de necessidades individuais. Afinal, a intensidade da divisão do trabalho é diretamente proporcional à atividade que é individualmente realizada.

Como bem afirma José Diniz de Morais, a idéia de função social não é de inspiração socialista, como muitos sustentam. Ao contrário, serve para legitimar o negócio do empresário e do proprietário produtor de riquezas como sendo uma atividade de interesse geral, o que termina por legitimar o próprio lucro, fortalecendo e embelezando o sistema capitalista. Hoje, sem dúvida, a fórmula função social reveste-se de um conceito técnico-jurídico que, além de reconhecer a propriedade privada dos bens, veio à baila para tornar tal instituto ainda mais consolidado, configurando-se, assim, como uma característica peculiar do modelo jurídico capitalista. Nesse ponto, é interessante conhecer as lições do autor:

Não se pode, a partir desse fato, concluir que a propriedade torna-se social, que o direito se socializa, uma vez que, como base estrutural do ordenamento jurídico, a noção de propriedade privada imprime ao direito cunho individualista e a fórmula função social, muito mais do que negá-la, confirma-a. “Tem” ou “é” função social a propriedade privada porque é propriedade privada, porque se não o fosse seria propriedade pública ou social e, portanto, função pública ou função social.

Atualmente, a função social tem sido definida como sendo uma série de encargos, ônus e estímulos que formam um complexo de recursos que remetem o proprietário a direcionar o bem às finalidades comuns. Daí a razão de ser da propriedade, comumente chamada de poder-dever ou de direito-função. Como forma de rechaço das concepções individualistas, a função social da propriedade foi positivada em diversas cartas constitucionais do século XX, no bojo das quais se exaltaram direitos extrapatrimoniais e valores como a dignidade da pessoa humana e a solidariedade – “o indivíduo solitário, isolado em sua atividade econômica, é convertido na pessoa solidária que convive em sociedade e encontra nas necessidades do outro um claro limite à sua liberdade de atuação”.

MACEDO, Gabriela Silva. O instituto da recuperação de empresas e sua função social . Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3212, 17abr. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21530>.

“Supressio" e o princípio da boa–fé contratual

Ensina-nos o mestre Luiz Rodrigues Wambier, calcado em vasta experiência, através de artigo valoroso publicado na Revista dos Tribunais 915/280, janeiro de 2.012: "A supressio significa o desaparecimento de um direito, não exercido por um lapso de tempo, de modo a gerar no outro contratante ou naquele que se encontra no outro polo da relação jurídica a expectativa de que não seja mais exercido. Pode-se dizer que o que perdeu o direito teria abusado do direito de se omitir, mantendo comportamento reiteradamente omissivo, seguido de um surpreendente ato comissivo, com que já legitimamente não contava a outra parte".
O respeitado professor leciona ainda que, ao lado da "supressio", há outro instituto, vinculado à Teoria dos Atos Próprios. Esta teoria exige do contratante a adoção de conduta linear, por assim dizer, que não se traduza por atos capazes de confundir a contraparte, em razão da incongruência na execução do contrato.
Exemplo prático: locatário, depois de três anos na vigência de um contrato locativo comercial com prazo determinado de cinco anos, recebe carta de cobrança da empresa locadora exigindo diferenças quanto à inflação do primeiro ano locatício, as quais não foram cobradas por mera liberalidade, tanto que os recibos locativos mensais foram firmados sem ressalvas. Há se falar na aplicação da "supressio", com a extinção do direito à cobrança da reposição inflacionária devida no primeiro ano? Cremos que sim, houve caducidade do direito decorrente da impossibilidade de posteriormente a empresa locadora postar-se diante de um comportamento contratual contraditório, a chamada Verwikung do direito alemão, onde o instituto restou positivado após a Primeira Guerra Mundial.
Ensina a doutrina portuguesa, na voz de Antônio Manuel da Rocha e Menezes Cordeiro (Da boa-fé no direito civil, Coimbra, Almedina, 1997, páginas 808 e 809), que: "o titular do direito, abstendo-se do exercício durante um certo lapso de tempo, criaria, na contraparte, a representação de que esse direito não mais seria actuado; quando, supervenientemente, visse agir, entraria em contradição". Em arremate a este sentir aduz o mestre Rodrigues Wambier, artigo citado: "A supressio que, como observei antes, integra o conjunto de fenômenos que compõem a cláusula da boa- fé objetiva, se expressa na impossibilidade do exercício de direitos ou prerrogativas contratuais em decorrência do transcurso do tempo associado à boa – fé".
O nosso direito positivo tem raízes nos seguintes dispositivos que não ocultam a sua inspiração em área de direito público que, consabidamente, invalida os atos manchados pelo desvio de finalidade. Até bem pouco tempo atrás, raros eram os atos da vida civil passíveis de controle de finalidade (como as doações remuneratórias). Agora, os dispositivos transformaram a exceção em regra:
Art.421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.
Art.422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa – fé.
No plano pretoriano, nossas Cortes têm desvelado e desvendado o alcance lídimo da supressio.
Oferta-nos o Superior Tribunal de Justiça como exemplo prático precedente haurido no julgamento do Recurso Especial 953389/SP, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, em 23 de fevereiro de 2010: "Direito civil. Contrato de locação de veículos por prazo determinado. Notificação, pela locatária, de que não terá interesse na renovação do contrato, meses antes do término do prazo contratual. Devolução apenas parcial dos veículos após o final do prazo, sem oposição expressa da locadora. Continuidade da emissão de faturas, pela credora, no preço contratualmente estabelecido. Pretensão da locadora de receber as diferenças entre a tarifa contratada e a tarifa de balcão para a locação dos automóveis que permaneceram na posse da locatária. Impossibilidade. Aplicação do princípio da boa-fé objetiva. Honorários advocatícios. Julgamento de improcedência do pedido. Aplicação da regra do art. 20, §4º, do CPC. Inaplicabilidade do §3º desse mesmo dispositivo legal. Precedentes. - A notificação a que se refere o art. 1.196 do CC/02 (art. 575 do CC/02) não tem a função de constituir o locatário em mora, tendo em vista o que dispõe o art. 1.194 do CC/16 (art. 573 do CC/02). Ela objetiva, em vez disso, a: (i) que não há a intenção do locador de permitir a prorrogação tácita do contrato por prazo indeterminado (art. 1.195 do CC/16 - art. 574 do CC/02; (ii) fixar a sanção patrimonial decorrente da retenção do bem locado. Na hipótese em que o próprio locatário notifica o locador de que não será renovado o contrato, a primeira função já se encontra preenchida: não é necessário ao locador repetir sua intenção de não prorrogar o contrato se o próprio locatário já o fez.
A segunda função, por sua vez, pode se considerar também preenchida pelo fato de que é presumível a ciência, por parte do locatário, do valor das diárias dos automóveis pela tarifa de balcão. Haveria, portanto, em princípio, direito em favor da locadora à cobrança de tarifa adicional. - Se o acórdão recorrido estabelece, contudo, que não houve qualquer manifestação do credor no sentido da sua intenção de exercer tal direito e, mais que isso, o credor comporta-se de maneira contraditória, emitindo faturas no valor original, cria-se, para o devedor, a expectativa da manutenção do preço contratualmente estabelecido. - O princípio da boa-fé objetiva exerce três funções: (i) a de regra de interpretação; (ii) a de fonte de direitos e de deveres jurídicos; e (iii) a de limite ao exercício de direitos subjetivos. Pertencem a este terceiro grupo a teoria do adimplemento substancial das obrigações e a teoria dos atos próprios ('tu quoque'; vedação ao comportamento contraditório; "surrectio'; 'supressio'). - O instituto da 'supressio' indica a possibilidade de se considerar suprimida uma obrigação contratual, na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo credor, gere no devedor a justa expectativa de que esse não exercício se prorrogará no tempo. - Nas hipóteses de improcedência do pedido, os honorários advocatícios devem ser fixados com fundamento no art. 20, §4º do CPC, sendo inaplicável o respectivo §3º. Aplicando-se essa norma à hipótese dos autos, constata-se a necessidade de redução dos honorários estabelecidos pelo Tribunal. Recurso especial parcialmente provido".
Estribam-se estes ensinamentos na plena confiança que as relações sociais devem ter no exercício contínuo da cidadania, seja pré, durante ou pós-contrato. Vale conferir, a segurança jurídica existente nas relações privadas deve alcançar todos os momentos da vida social, pois conceitua-nos a professora Judith Martins Costa que o direito privado é um “sistema em construção" (Revista de Informação Legislativa, vol.35, p.07). Neste diapasão, comportamentos contraditórios que conclamem as partes contratantes à chamada "surpresa", decorrente da omissão menoscabada, proposital ou não, do titular do direito reconhecível, não encontram mais guarida em nosso sistema, com isto, retira-se da esfera de exercício deste direito a possibilidade de exigi-lo fora do tempo normal de exercício ou execução ou retira-se (supressão) este direito da esfera de conduta de seu titular, daí que o exercício anormal, atemporal, a nosso ver, configura abuso, devendo ser excluído do mundo jurídico em razão da inação, para se manter equilíbrio das relações jurídicas privadas.
_________
* Sérgio Roxo da Fonseca é advogado, procurador de Justiça aposentado pelo MP de São Paulo, professor livre-docente pela UNESP – Franca. É conselheiro estadual e membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/SP.
** Vinicius Bugalho é advogado, ex-procurador municipal, assessor do Tribunal de Ética XIII e membro da Comissão de Estudos Eleitorais e Valorização do Voto da OAB / SP.
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI153483,91041-

Incorporador também é responsável por danos de construção defeituosa

O incorporador, como impulsionador do empreendimento imobiliário em condomínio, atrai para si a responsabilidade pelos danos que possam resultar da inexecução ou da má execução do contrato de incorporação, incluindo-se aí os danos advindos de construção defeituosa. A decisão é da 4ª turma do STJ, que rejeitou recurso de um incorporador contra o condomínio de um edifício de Brasília.

O profissional sustentou que não pode responder solidariamente com o construtor pelos vícios que surgiram na construção do edifício, pois cumpriu todas as incumbências determinadas na lei 4.591. Afirmou ainda que o artigo 618 do CC imputa a responsabilidade nos contratos de empreitada de edifícios e outras construções ao empreiteiro/construtor, pelo prazo irredutível de cinco anos, respondendo ele pela solidez e segurança, assim como em razão dos materiais e do solo.

Em seu voto, o ministro Raul Araújo, relator, concluiu que é o incorporador o principal garantidor do empreendimento no seu todo, solidariamente responsável com outros envolvidos nas diversas etapas da incorporação. Segundo ele, essa solidariedade decorre tanto da natureza da relação jurídica estabelecida entre o incorporador e o adquirente de unidades autônomas, quanto de previsão legal, já que a solidariedade não pode ser presumida.

"Mesmo quando o incorporador não é o executor direto da construção do empreendimento imobiliário, mas contrata construtor, fica, juntamente com este, responsável pela solidez e segurança da edificação. Trata-se de obrigação de garantia assumida solidariamente com o construtor", acrescentou.
  • Processo relacionado: REsp 884.367

Após quase oito anos, STF julga ação sobre terras quilombolas

Os ministros do STF devem analisar, na sessão plenária de hoje, a ADIn 3.239, apresentada pelo PFL - Partido da Frente Liberal (atual DEM - Democratas) contra o decreto 4.887/03, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. A ação tramita há quase oito anos (confira no Processômetro).
 
O partido alega que o decreto invade esfera reservada à lei e disciplina procedimentos que implicarão aumento de despesa, como o que determina a desapropriação, pelo Incra - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, de áreas em domínio particular para transferi-las às comunidades quilombolas. "O papel do estado limita-se, segundo o artigo 68 do ADCT, a emitir os títulos", afirma a ação, uma vez que a própria CF/88 reconhece a propriedade definitiva aos remanescentes daquelas comunidades que tenham fixado residência no local desde 5 de outubro de 1988 – ou seja, não cabe falar em propriedade alheia a ser desapropriada e transferida ou promover despesas públicas, conforme a ADIn.

A ação sustenta ainda a inconstitucionalidade do critério de autoatribuição fixado no decreto para identificar os remanescentes dos quilombos e na caracterização das terras a serem reconhecidas a essas comunidades.

Atualmente, apenas 193 comunidades quilombolas possuem títulos de propriedade de terras. De acordo com a Comissão Pró-Índio de SP, esse número representa 6% da totalidade de comunidades estimadas (cerca de 3 mil).

A ação que corre no STF não é a única que contesta a regulamentação de terras quilombolas. Está tramitando na Câmara a PEC 215/00, que propõe transferir para o Congresso a responsabilidade pela demarcação e homologação de terras quilombolas, indígenas e de áreas de conservação ambiental. De acordo com a CF/88, essa é uma atribuição do Poder Executivo.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI153860,61044-Apos+oito+anos+em+tramitacao+STF+julga+caso+sobre+terras+quilombolas

terça-feira, 17 de abril de 2012

Adoções que superaram preconceitos

Vanessa queria ser mãe, mas o sonho lhe pareceu impossível quando ela e o marido Leonardo descobriram que não podiam ter filhos. A descoberta, entretanto, não desanimou o casal que passou a ver na adoção uma forma de consolidar o desejo de aumentar a família. Um aspecto, entretanto, chama a atenção na história do casal. Diferente da grande maioria, ambos não buscaram no filho a ser adotado algum tipo de semelhança física. Eles -brancos e de olhos claros -escolheram três crianças negras e com idades mais elevadas. Oito anos após a decisão, a conclusão deles é: "Nós é que fomos adotados", revelam emocionados.

A experiência de Vanessa e Leonardo é uma exceção já que mitos e preconceitos ainda permeiam a escolha de muitos pretendentes, o que acaba por atravancar a adoção. Segundo dados do Cadastro Nacional de Adoção (CNA), gerido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o número de interessados em adotar é quase cinco vezes maior que o de crianças e adolescentes disponíveis. Pelo levantamento feito no último dia 12 de abril, há 5.163 crianças e adolescentes disponíveis para a adoção em todo o Brasil enquanto há 27.813 pretendentes.

O juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça Nicolau Lupianhes, coordenador do Cadastro Nacional de Adoção, explica que o número de interessados é maior justamente por causa do perfil exigido. "Os pretendentes tem um perfil para a criança a ser adotada. Geralmente, eles querem brancos, do sexo feminino, em média com até dois anos, sem moléstia ou irmãos. Temos poucos nesse perfil. Por essa razão o número de pretendentes é maior", afirma.

De acordo com a última consulta, menos de 1% do total de pretendentes tem interesse em adotar crianças com mais de oito anos de idade, por exemplo. Os dados mostram que mais da metade desejam crianças com até dois anos de idade -estes somam 57,8% dos cadastrados.

A raça também se mostra outra restrição à adoção. O levantamento mostra que 90,9% dos cadastrados querem crianças brancas. Pardas são aceitas por 61,5% dos interessados. Negras são preferidas por 34,7% das pessoas que querem adotar. Outros 36,5% desejam crianças amarelas, e 33,6% aceitam crianças indígenas.

Também de acordo com o CNA, 82,5% dos pretendentes desejam adotar apenas uma criança. O percentual cai consideravelmente para os interessados em adotar duas crianças -estes chegam a 16,4%. Já em relação aos interessados em adotar três crianças, o percentual cai para 0,76%.

O coordenador do CNA afirma que políticas públicas têm sido desenvolvidas para conscientizar os interessados sobre esse tipo de exigências. Nesse sentido, Lupianhes destaca a nova Lei da Adoção (Lei 12.010) que entrou em vigor em 2009. "A legislação trouxe uma série de exigências, entre as quais a necessidade de os pretendentes participarem de um curso, a fim de se prepararem para a adoção. Isso tem se mostrado algo muito positivo, pois tem conscientizado os pretendentes sobre a questão do perfil", explica o magistrado, para quem laços familiares e fraternos podem e devem ser construídos independentemente de critérios tais como raça ou idade.

Na contramão - A história de Vanessa e Leonardo prova que isso é possível. Na contramão de muitos pretendentes e suas diversas exigências, o casal, que reside no Rio de Janeiro, adotou Mário (atualmente com 18 anos) e seus irmãos gêmeos Bruno e Bruna (14 anos). "Queríamos adotar uma criança com uns cinco e seis anos. No juizado, na época, a assistente social nos explicou que havia uma criança neste perfil, mas que ela tinha dois outros irmãos. Fomos conhecê-los e ficamos apaixonamos", conta Vanessa.

Ela explica que não enfrentou problemas graves de adaptação. "Eles sempre foram muito tranqüilos. Não vivenciamos maiores dificuldades. A criança mais velha está querendo ser adotada. E isso facilita a convivência. Eles já estavam no abrigo há quatro anos. A empatia foi muito grande", destaca.

Vanessa dá a receita para a construção de uma relação harmoniosa com os filhos adotados. "Essa coisa de achar que a criança mais velha é cheia de mania, que não é possível contornar, não é realidade. A convivência com a criança, bem como a educação e o amor que você dá, supera isso. Esses preconceitos, como idade e cor, não deveriam ser levados em consideração", afirma.

Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias
Fonte: JUSBRASIL

Bolsonaro: quais os limites da imunidade parlamentar?

Saiu na Folha de hoje (5/4/12):

Deputados defendem que Bolsonaro seja processado
Deputados da Comissão de Direitos Humanos da Câmara pediram ontem ao presidente da Casa, Marco Maia (PT-RS), que abra processo disciplinar contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) (…)
Segundo o relato dos deputados, Bolsonaro destratou um dos funcionários da comissão ao solicitar documentos levados por testemunhas que participaram da Guerrilha da Araguaia.
Elas foram ouvidas em reunião secreta da subcomissão para que tivessem as identidades preservadas, pois sofrem ameaças de morte.
O deputado, que não é membro da comissão, teria entrado na sala aos gritos, ofendendo os depoentes.
‘O deputado constrangeu membros da comissão, agrediu um servidor, tentou atrapalhar o debate. Tirou fotos escondidas dos depoentes e disse ao servidor, ao ter negado o direito de arrancar documentos das suas mãos, que a conversa não tinha 'chegado no chiqueiro'’, relatou o presidente da comissão, Domingos Dutra (PT-MA)


E também na Folha de hoje:

Político é preso ao xingar guarda-civil de 'macaco' no ABC
A polícia autuou Adriano Giovanni Pieroni, 48, em flagrante por injúria racial e desacato à autoridade. Ele continuava preso até ontem à noite.
Segundo a polícia, o político estava no velório de um primo e passou a ofender os guardas Edemir Edinor da Silva, 39, e Jucélio Marciano da Silva, 37.
A polícia apurou que os xingamentos aconteceram após Pieroni tomar três doses de vodca em um bar ao lado do velório. Pieroni teria chamado um guarda de ‘preto’ e de ‘macaco’
".

Senadores e deputados têm imunidade parlamentar (deputados estaduais e vereadores também têm algo parecido).

A imunidade parlamentar, segundo nossa Constituição, significa que “são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” e “não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável” (art. 53).

Pode soar estranho, mas a imunidade parlamentar serve para proteger o eleitor.

A imunidade parlamentar, nos moldes que a conhecemos hoje, surgiu na Inglaterra, durante a Idade Média, para proteger o povo contra o rei. Se o parlamentar – que representa o eleitor – pudesse ser preso, torturado e morto se dissesse algo que o rei não gostasse, ele não estaria representando os seus eleitores. Logo, eles se viram obrigados a criar um mecanismo através do qual se tornassem intocáveis pelo que dissessem no exercício de suas funções parlamentares (algo parecido beneficiava os lordes, que também eram parlamentares, mas não eram eleitos. Mas essa é outra discussão).

Se lermos a Constituição com cuidado, veremos que a imunidade parlamentar não é uma varinha de condão que torna a pessoa imune a processos.

Primeiro, o parlamentar é inviolável por suas opiniões, palavras e votos. A lei não diz nada a respeito de suas ações. Logo, se um parlamentar resolve amputar os braços dos inimigos políticos com um serra elétrica, ou invadir um determinado local, agredir uma testemunha ou expo-la a perigo de vida, ele não está protegido.

A mesma coisa acontece se suas opiniões nada tiverem a ver com o exercício de seu mandato, ou quando ele deixa de cumprir suas obrigações (um deputado que deixa de pagar a conta de água ou descumpre os termos de um crontrato que assinou com alguém, está sujeito a um processo como qualquer outra pessoa). Em resumo: a imunidade serve para proteger o exercício de sua função e não para coloca-lo acima da lei.

Segundo, ele só pode ser preso em flagrante por crimes inafiançáveis. Isso serve para que ele não seja preso 'por acaso' no dia de uma votação importante, ou algo parecido. Não adiantaria nada dar liberdade para falar o que quiser, mas mante-lo preso, impossibilitado de ser ouvido.


A lei diz que, se o crime for afiançável, ele não pode ser preso. Mas aqui a Constituição está apenas falando da prisão antes do julgamento. Ele será processado e julgado (pelo STF, se for membro do Congresso Nacional), e, se condenado, poderá ser preso como qualquer outra pessoa. Ou seja, ele não aguardará seu julgamento preso, exceto se foi preso em flagrante por um crime inafiançável. Mas, ele será julgado e, se condenado, poderá ser preso.

A pessoa só tem imunidade enquanto for parlamentar. E para se manter como parlamentar ele precisa, entre outras coisas, agir com decoro (decência, dignidade). Se ela não agir com decoro, ela  perde seu mandato (art. 55, II) e fica sujeito às mesmas regras que todo mundo.

E aqui entra um detalhe interessante: ela possui prerrogativas de um parlamentar (inclusive a imunidade) mas, segundo a própria Constituição, “é incompatível com o decoro parlamentar (…) o abuso das prerrogativas” (§1º). O que a Constituição está dizendo aqui é que ele pode perder seu mandato (e, por consequência, sua imunidade) se abusar de sua imunidade. Ou seja, a imunidade deve ser usada com parcimônia.

 
http://direito.folha.com.br/1/post/2012/04/bolsonaro-quais-os-limites-da-imunidade-parlamentar.html

segunda-feira, 16 de abril de 2012

A inserção do deficiente no mercado de trabalho

Sabemos que hoje a grande dificuldade de inserir os deficientes no mercado de trabalho, impossibilitando, ademais, o cumprimento das cotas pelas empresas, decorre, principalmente, da falta de habilitação ou reabilitação. Uma pesquisa do Instituto Ethos, nas 500 maiores empresas do país, revela que uma das maiores queixas é a baixa qualificação. Mas, não bastam leis para obrigar as empresas a contratarem pessoas portadoras de deficiência se não se pratica a verdadeira inclusão social, se inexistentes mecanismos que permitam a capacitação para que possam ser inseridos no mercado de trabalho com condições reais de exercer atividade compatível com sua condição física e mental.
Mas, enfim, apresenta-se uma solução que vai ao cerne da questão da inserção do deficiente no mercado de trabalho. O Deputado Federal Márcio Macedo, do PT/SE, apresentou Projeto de Lei que dispõe sobre a concessão de bolsa pelas empresas às pessoas com deficiência, sem habilitação. O Projeto de Lei 3502/2012 propõe a inclusão do parágrafo 3º ao artigo 93 da Lei 8.213/91; pela atual redação do artigo 93 “a empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas”, ressaltando que o percentual varia de acordo com o número de empregados da empresa, conforme relacionado no dispositivo legal mencionado.
Note-se que a lei se refere a “beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas”, entretanto, como bem salientou o Ilustre Deputado, autor do Projeto de Lei em comento, após 21 anos da promulgação da Lei 8.213, de 1991, “pouco se avançou na inclusão dessas pessoas no mercado de trabalho brasileiro, na medida em que a norma não vem sendo cumprida”.
De acordo com levantamento feito pelo autor do Projeto de Lei pouco mais de 50% das empresas cumprem o disposto no artigo 93 da Lei 8.213/91, sendo que muitas delas alegam “que não o fazem por não conseguirem recrutar pessoas habilitadas no mercado de trabalho”. E, infelizmente, esta é a realidade de nosso país, as empresas têm, de fato, dificuldade para encontrar pessoas portadoras de deficiências habilitadas (ou capacitadas). Mas, por outro lado, também os deficientes têm dificuldade de buscarem capacitação, por falta de oportunidade, de incentivo, de recursos financeiros, enfim, por diversos motivos. E, como bem afirma o Deputado Federal, Márcio Macedo, não é justo punir as empresas por não cumprirem o disposto no art. 93 da Lei 8.213/91, mas também não é justo “permitir a exclusão das pessoas com deficiência do mercado de trabalho por não terem habilitação”.
Aí reside, no meu ponto de vista, a maior fundamentação do Projeto de Lei apresentado pelo Ilustre Deputado, ou seja, possibilitar o cumprimento da Lei visando a inclusão efetiva das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho, dando às empresas alternativas para não ficarem à margem da lei e oportunizando aos deficientes capacitação profissional para o ingresso no mercado de trabalho.
O tema inclusão social não é assunto novo, embora só no século XX tenha ganhado força. Desde 1989, a Lei 7.853 já dispunha sobre a inclusão das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho. A mencionada Lei, no entanto, só veio a ser regulamentada 10 anos depois, no ano de 1999, com o Decreto 3.298. O Decreto regulamentador, no § 3º  do artigo 28 define como habilitação profissional o processo destinado a propiciar à pessoa portadora de deficiência, em nível formal e sistematizado, aquisição de conhecimentos e habilidades especificamente associados à determinada profissão ou ocupação.
Assim, o Projeto de Lei 3502/2012 traz valiosa ferramenta de concretização da inserção das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho, ensejando o cumprimento efetivo da legislação, e concretizando, ademais, os Direitos Fundamentais insertos na Constituição Federal, pela defesa da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho.
Outra vantagem, não tão importante quanto à inclusão social dos deficientes, a valorização da autoestima, vida digna, enfim, tantas outras benesses, sem deixar de mencionar os benefícios à Seguridade Social, na medida em que quanto mais deficientes empregados, menor o número de benefícios de prestação continuada a serem pagos.
Digna de nota, portanto, a iniciativa do Deputado Federal Márcio Macedo, que com o Projeto de Lei em comento, e visando a resolver a problemática da inserção das pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho, propõe, conforme justificação apresentada, “que as empresas que não consigam captar pessoas com deficiência habilitadas no mercado de trabalho, sejam obrigadas a oferecer-lhes bolsas de qualificação, de valor igual ou superior a um salário mínimo, até o limite de 50% do preenchimento das vagas. As pessoas habilitadas por meio dessas bolsas que apresentarem certificado de conclusão do curso que comprove sua habilitação serão obrigatoriamente contratadas, pelo período de até um ano, pela empresa concedente das bolsas”.
A aprovação do Projeto de Lei 3502/2012 certamente beneficiará milhares de pessoas portadoras de deficiência que aguardam apenas uma oportunidade de capacitação para inserirem-se no mercado de trabalho, inserção esta de inúmeros benefícios, não apenas para os deficientes, mas para toda a sociedade e para o Estado.

BORETTI, Larissa Pedroso. A inserção do deficiente no mercado de trabalho. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3207, 12 abr. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21496/a-insercao-do-deficiente-no-mercado-de-trabalho>

Juizados Especiais Cíveis: aspectos recursais

O procedimento instituído pela Lei n. 9.099/95 é orientado pelos princípios da informalidade, celeridade, concentração, economia e simplicidade. Seu objetivo é tornar a prestação jurisdicional mais acessível, notadamente, à população carente.
Referidos princípios são informadores de todo o processo, inclusive na etapa recursal, mais simples que a sistemática estabelecida pelo CPC, o qual somente será aplicável se não for incompatível com as normas da lei 9.099/95.
Por esta razão, não há previsão de recurso em face de decisões interlocutórias, como regra. Os atos processuais são concentrados na audiência de instrução e julgamento, ocasião em que todos incidentes processuais serão dirimidos, conforme preconiza o art. 29.
No entanto, quando a concentração não é observada e há risco de dano ao jurisdicionado. Joel Dias Figueira Júnior defende o cabimento de agravo de instrumento nesta hipótese. In verbis:
“em síntese, a tese da irrecorribilidade das decisões serve apenas para as interlocutórias proferidas dentro do segmento representado pela instrução oral, posto que fundamenta na razão de ser da própria concentração da audiência. Assim, desde que se verifiquem as hipóteses aludidas, não se pode obstar a interposição de agravo, pelo regime instrumental, sob pena de importar em sérios prejuízos aos litigantes”.[1]  
Admite-se agravo, de forma uníssona apenas diante das situações previstas nos artigos 544 e 557 do CPC.
Não se pode olvidar, ainda, da prática disseminada de impetração de mandado de segurança em face de decisões interlocutórias, notadamente, quando teratológicas.
Referida possibilidade é creditada à inexistência de previsão recursal com efeito suspensivo para decisões interlocutórias (art. 5º, II, da lei 12.016/2009), bem como em razão do teor da súmula 376 do Superior Tribunal de Justiça.
A sentença, a seu turno, comporta insurgência via recurso inominado, previsto no art. 41, possuindo as mesmas feições do recurso de apelação com algumas diferenças.
A primeira é o prazo de interposição e contrarrazões, que é dez dias, em homenagem à celeridade, ao oposto da apelação, cujo prazo recursal e de resposta será de quinze dias (art. 508 do CPC).
A segunda distinção é quando aos efeitos de recebimento do recurso. O inominado tem como regra o efeito devolutivo, como forma de propiciar a execução provisória da sentença. O duplo efeito (suspensivo e devolutivo) só é cabível para evitar risco irreparável para a parte recorrente (art. 43). Na apelação, contudo, a regra é o efeito suspensivo, admitindo-se apenas o devolutivo nas hipóteses dos incisos I a VII do art. 520 do CPC.
Nos juizados, não se admite a interposição de recurso adesivo (art. 500 do CPC), por ausência de previsão legal e por implicar em inegável prejuízo à celeridade, o que resultou na edição do enunciado 88 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais, o FONAJE.
Por fim, o apelo deve ser preparado nas quarenta e oito horas seguintes à interposição, independente de intimação, sob pena de deserção. Não se admite a complementação do preparo, razão pela qual não haverá intimação para regularização, devendo ser pronunciada a deserção.
O recurso de embargos de declaração também apresenta particularidades, quanto ao cabimento, à forma de interposição e o efeito em relação ao prazo para apresentação de outros recursos.
Além das hipóteses previstas, atualmente, no CPC (obscuridade, contradição e omissão), o art. 48 da lei 9.099/95 traz ainda a expressão “dúvida” dentre as situações que podem desafiar o oferecimento de embargos.
O conceito de dúvida é trazido por Ricardo Chimenti que define como sendo “quando o julgado não demonstra de forma clara qual a convicção do julgador quanto aos fatos apurados ou mesmo em relação ao direito aplicado”[2].
A dúvida era prevista no art. 535 do CPC, mas foi suprimida pela reforma processual introduzida pela lei 8.950/94, o que não foi acompanhado pela lei 9.099/95 que manteve a mesma previsão do art. 47 da lei 7.244/84.
Os embargos, no procedimento da lei 9.099/95 poderão ser interpostos oralmente e sem a necessidade de advogado (art. 49).
O prazo para recurso em face da sentença fica suspenso pela apresentação de embargos, ao oposto do art. 538 do CPC que prevê a interrupção. Assim, não haverá restituição de todo o prazo para interpor o inominado, apenas restarão os dias remanescentes.
Outro aspecto interessante é quanto ao colegiado revisor, conhecido como turma recursal, formada por juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição e não por desembargadores, não sendo as turmas, portanto, órgãos fracionários dos tribunais de justiça.
A forma de provimento dos cargos de juiz de turma recursal depende da regulamentação do Poder Judiciário de cada ente da federação, já que a lei federal silenciou a respeito.
Em regra, os magistrados exercem este cargo sem prejuízo de suas funções nas varas em que são titulares e sua designação dura, no máximo, dois anos, admitidas reconduções. Verifica-se, ainda, que a escolha recai, preferencialmente, em juízes de juizados especiais.
No Tribunal de Justiça do Paraná, a forma de provimento ocorre com prejuízo das funções, sendo designado juiz substituto para atuação exclusiva nas varas titularizadas pelos magistrados que passaram a compor as turmas, durante sua designação. Os juízes interessados na vaga participam de concurso pelos critérios de antiguidade e merecimento, conforme art. 3º da Resolução TJPR 04/2010.
Referida medida é salutar, ante o fato de que o volume de feitos em grau de recurso vem crescendo exponencialmente, graças ao aumento de demanda nos juizados especiais, cuja competência vem sendo alargada por sucessivas legislações.
O julgamento e a redação dos acórdãos são bastante informais, já que o relatório é dispensado, bastando a fundamentação suficiente e a parte dispositiva (art. 46), o que restou consolidado pelo enunciado 92 do FONAJE.
Ante a dispensa do relatório, é igualmente dispensada a figura do revisor, sendo que cada recurso será apreciado, em regra, por um relator e dois vogais.
O julgamento colegiado conta com importante instrumento para a celeridade que é a “súmula de julgamento”, que se aplica quando a sentença é mantida por seus próprios fundamentos.
A maioria das turmas recursais adota para as súmulas o mesmo formato das ementas, contendo verbetação (palavras-chave), fundamentação, e a parte dispositiva contendo o resultado do julgamento, que no caso é de não-provimento.
Em Mato Grosso do Sul, o formato de súmula também passou a ser utilizado para hipóteses de provimento parcial em homenagem ao principio da informalidade e celeridade[3].
As diferenças aqui retratadas asseguram a agilidade nos julgamentos e na publicação do resultado das sessões, para que não exceda o prazo de dez dias do art. 564 do CPC.
Em relação aos recursos cabíveis em face da decisão colegiada, também há limitações em relação ao procedimento do CPC. Os únicos recursos cabíveis são de embargos de declaração (art. 48) e recurso extraordinário (art. 102, III, da Carta Magna).
O recurso especial não é admitido, ante o fato de que turma recursal não é considerada tribunal (art. 105, III, da CF). É um órgão revisor, mas formada por juízes em exercício no primeiro grau de jurisdição. 
Ocorre que há um tipo de manifestação direcionada ao Superior Tribunal de Justiça relativa às decisões das turmas recursais, trata-se da reclamação, prevista no art. 105, I, “f” da CF, regulamentada pela resolução 12/2009 daquele tribunal.
A reclamação visa preservar a autoridade das decisões do STJ e manter a uniformidade na interpretação da legislação federal, já que os juizados estaduais não contam com uma turma nacional de uniformização, a exemplo dos juizados especiais federais (art. 14, §2° da lei 10.259/2001). 
A uniformização não foi disciplinada pela lei 9.099/95, o que ficou a cargo das legislações estaduais. Assim, só há normatização legal para os casos de divergência interna, ou seja, entre as turmas dos juizados de um mesmo estado.
No entanto, a imposição de uniformização entre turmas de estados diferentes encontra oposição na doutrina. Neste sentido, é a lição de Rêmolo Leteriello: “por outra parte, contraria o bom senso impedir uma turma estadual de interpretar livremente matéria objeto de jurisprudencia de turma de outro estado”[4].
O autor, igualmente, defende que a matéria deve ser regulada apenas pela lei local, em respeito às peculiaridades regionais de cada tribunal, ao contrário da previsão do Projeto de Lei federal 4.423-A, que acaba instaurando, de certo modo, um terceiro grau de jurisdição nos juizados.
Referida consequência já se nota, ante o excesso de reclamações ofertadas ao STJ, que se tornaram uma forma travestida de recurso especial, e representou considerável risco à celeridade e efetividade.
Felizmente, os ministros, atentos a essa realidade, decidiram delimitar as hipóteses de cabimento desta medida. Trata-se da Reclamação 4858, de Relatoria da Ministra Nancy Andrighi, que tramitou perante a Segunda Seção e teve o julgamento concluído em 23 de novembro de 2011.
A decisão definiu que a reclamação somente será admitida em caso de decisão que afronta enunciado de súmula ou decisão proferida no âmbito de recursos repetitivos (art. 543-C do CPC) e somente para questões de direito material.
Por derradeiro, não se admite ação rescisória no procedimento dos juizados (art. 59), o que é alvo de críticas doutrinárias, ante o fato de que o julgador singular ou colegiado pode incorrer nas hipóteses do art. 485 do CPC[5].
Por todo o exposto, conclui-se que a simplicidade e celeridade que orientam o rito dos juizados também se aplicam à fase recursal, ante a admissibilidade de número menor de recursos, prazos mais exíguos e procedimentos simplificados de julgamento colegiado.
Referida flexibilização, contudo, não implica em prejuízo aos princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e duplo grau de jurisdição. O objetivo é assegurar que a prestação jurisdicional possa ser entregue em prazo razoável, suprimindo formalidades e atos processuais que possam ser utilizados de forma protelatória.

HINDO, Michelle Dibo Nacer. Juizados Especiais Cíveis: aspectos recursais. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3209, 14 abr. 2012 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/21508/juizados-especiais-civeis-aspectos-recursais>

domingo, 15 de abril de 2012

Legalidade ou não de gravações telefônicas serve para reflexão jurídica

Todos estão acompanhando pelo noticiário as repercussões da denominada Operação Monte Carlo da Polícia Federal, que resultou na prisão de Carlos Cachoeira e 34 pessoas no final de fevereiro. Inicialmente, o senador foi acusado de receber, em seu casamento, presentes caros de Cachoeira, mas vindo a tona novas gravações, haveria indícios de que o relacionamento do Senador e Carlos Cachoeira envolveria participação em situações criminosas.

Recentemente, veio ao conhecimento a tese da defesa do Senador Demóstenes Torres: a ilicitude da interceptação como meio de prova. Isso porque, em se tratando de Senador da República, o início de sua investigação somente poderia ter sido ser autorizado pelo STF nos termos do art. 53 e parágrafos da Constituição Federal[1]. Com isso, os indícios até agora colhidos não serviriam para subsidiar qualquer acusação formal em face do Senador.

Com base nessa alegação, resolveu-se conferir a jurisprudência dos Tribunais Superiores a respeito do tema para se aferir ou ao menos indicar um prognóstico a respeito da possibilidade de sucesso da tese. Vale anotar, inclusive que o STF já autorizou o início da investigação em face do Senador.

Por coincidência, nessa última semana colheu-se do informativo do Superior Tribunal de Justiça excerto de precedente que pode ser utilizado para a análise do caso, veja-se:

“Não há nulidade no julgamento realizado pelo órgão especial do Tribunal de Justiça, composto de vinte e quatro desembargadores, apesar de um deles ter declarado a sua suspeição e, mesmo assim, ter participado da votação. Tendo em vista que apenas dois desembargadores foram contrários ao recebimento da denúncia contra a promotora de justiça, deve-se entender que a efetiva participação do magistrado suspeito não influenciou no resultado do julgamento, circunstância que, nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal, afasta a alegação de nulidade. “Também não pode ser declarada a nulidade da ação penal por ilicitude das escutas telefônicas realizadas em outro processo, que julgava terceira pessoa, sob a alegação da incompetência do magistrado que autorizou a produção da prova, com base na prerrogativa de função da paciente, pois se trata de prova emprestada, resultante do encontro fortuito, submetida ao crivo do contraditório e da ampla defesa no processo em que a paciente figura como denunciada”. Precedente citado: HC 130.990-RJ, DJ 22 de fevereiro de 2010. HC 227.263-RJ, Relator Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS), julgado em 27 de março de 2012.

Leia a íntegra em http://www.conjur.com.br/

Contratação de temporário não prejudica concursado

A contratação temporária de não concursados, a título precário, não gera direito de nomeação a candidato aprovado em concurso público mas que não foi nomeado. A decisão foi dada pelo ministro Humberto Martins em agravo regimental impetrado no STJ.

O ministro afirmou que, segundo a jurisprudência do STJ, a contratação temporária com base no artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal ocorre só para função pública e não para cargo ou emprego, que exige a vacância prévia. A 2ª Turma acompanhou o voto do ministro de forma unânime. 

Humberto Martins entendeu que não há liquidez e certeza no direito à nomeação. Lembrou que o aprovado em concurso fora do número de vagas previsto em edital tem “mera expectativa de direito” e que tais vagas devem ser ocupadas na ordem de aprovação. Ele rejeitou a alegação de que a contratação temporária, ainda no prazo de validade do concurso, para funções correlatas às do cargo de oficial de apoio transformaria a expectativa de direito em liquidez e certeza para nomeação.

O magistrado observou que o STJ já tem precedentes negando a nomeação, relacionados ao mesmo concurso. Esse direito só existiria se, comprovadamente, surgissem novas vagas para os cargos do concurso ainda no seu prazo de validade, o que não ocorreu em nenhuma das ocasiões. Ficou claro nos autos, como apontou o ministro, que os candidatos foram aprovados além das vagas. 

No caso, um grupo de aprovados no concurso para oficial de apoio judicial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais pretendia garantir suas nomeações. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
RMS 35.825
Revista Consultor Jurídico