quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Perda da posse

Conforme o art. 1.223 CC, “Perde-se a posse quando cessa, embora contra a vontade do possuidor, o poder sobre o bem, ao qual se refere o art. 1.196”. Como se vê no novo Código Civil optou-se por não trazer um rol das situações que ensejariam a perda da posse, tal qual se encontra no Código de 1916. Com efeito, o art. 520 do Código Civil revogado assim as enumerava exemplificativamente:

Art. 520. Perde-se a posse das coisas:
I - pelo abandono;
II - pela tradição;
III - pela perda, ou destruição delas, ou por serem postas fora do comércio;
IV - pela posse de outrem, ainda contra a vontade do possuidor, se este não foi manutenido ou reintegrado em tempo competente;
V - Pelo constituto possessório.

- Inciso I: se referia ao abandono de coisa possuída, que se caracterizava por ato, geralmente tácito, de desprezo à coisa. Pode-se citar a situação em que o locatário deixa o imóvel alugado, sem comunicar nada ao locador.

De acordo com Fiúza (2003, 743), são precisos dois elementos para que ocorra abandono: um objetivo e outro subjetivo. “O primeiro é a derrelição da coisa, ou ato de abandonar, em si, do ponto de vista material. O segundo é o animus dereliquendi, ou vontade de não mais ter a coisa. A pessoa que deixa sua casa de praia fechada por vários meses no ano, ou até mesmo durante vários anos, não a está abandonando. Falta o animus dereliquendi”.

Continua citado doutrinador ensinando sobre a renúncia, que se assemelha ao abandono, sendo também forma de fazer cessar a posse. O que ocorre na renúncia é que o titular abre mão da coisa ou do direito, de forma expressa, por ato de vontade liberatório. Assim, não se faz necessária a derrelição, mas é essencial a declaração expressa de vontade, no sentido de renunciar à coisa. “Tomemos o seguinte exemplo: certo locatário comunica ao locador sua vontade de deixar o imóvel locado. O locador lhe pede que fique nele por mais duas semanas, a fim de guardá-lo contra invasões, para que possa encontrar mais tranqüilamente outro inquilino. Se o locatário aceitar a missão, terá perdido a posse, tornando-se mero detentor do imóvel. Não houve abandono. Não houve a derrelição, ou seja, o ato de despojar-se da coisa. Houve renúncia ao estado de posse e os conseqüentes direitos”.

Por isso, explica que se o abandono ou a renúncia partirem do próprio dono da coisa, haverá desconstituição do estado e dos direitos de posse e perda do direito de propriedade. Por outro lado, se quem abandona ou renuncia não for dono, haverá somente perda da posse. “Ocorre às vezes, porém, do próprio dono abandonar, e perder tão somente a posse, permanecendo intacto seu direito de propriedade. Para salvar navio do naufrágio, joga-se ao mar toda a carga. Houve sem dúvida abandono, mas sem perda do direito de propriedade. Tanto que se a carga for recuperada, seu proprietário poderá reivindicá-la”.

 - Inciso II: a tradição é a transferência da coisa das mãos do possuidor para outra pessoa. “Para que cesse a posse do tradens (pessoa que transfere), deve estar presente a intenção de transmitir a posse ao accipiens (pessoa que recebe, que aceita). É o que acontece, por exemplo, na compra e venda, na doação e na locação; embora nesta última o tradens só perca a posse direta” (Fiúza, 2003, 744).

- Inciso III: perda é o extravio da coisa, sendo impossível seu reencontro. Se perco meu relógio dentro de casa, continuo a possuí-lo. Então, pode-se dizer que a perda ocorre quando for absolutamente impossível encontrar a coisa, de modo que não mais se possa utilizá-la economicamente.

Destruição é perecimento da coisa, objeto da posse. Pode ser natural ou por fato humano. É preciso que a coisa fique inutilizada de forma definitiva, tornando impossível o exercício do poder de utilizar, economicamente, o bem por parte do possuidor; a sua simples danificação não implica a perda da posse.

Por ter sido colocada fora do comércio por motivo de ordem pública, de moralidade, de higiene ou de segurança coletiva, não podendo ser, assim, possuída porque é impossível exercer, com exclusividade, os poderes inerentes ao domínio.

- Inciso IV: Pela posse de outrem ainda que contra a vontade do possuidor se este não foi manutenido ou reintegrado em tempo competente. A inércia do possuidor, turbado ou esbulhado no exercício de sua posse, deixando escoar o prazo de ano e dia, acarreta perda da sua posse, dando lugar a uma nova posse em favor de outrem.

- Inciso V: Pelo constituto possessório: que, simultaneamente, é meio aquisitivo da posse por parte do adquirente, e de perda, em relação ao transmitente.

O parágrafo único do art. 520 do Código Civil revogado traz mais duas hipóteses, que são de perda da posse dos direitos. A 1ª parte trata da impossibilidade do exercício da posse, isto porque a impossibilidade física ou jurídica de possuir um bem leva à impossibilidade de exercer sobre ele os poderes inerentes ao domínio. Já a 2ª parte trata da prescrição, de forma que, se a posse de um direito não se exercer dentro do prazo previsto, tem-se, por conseqüência, a sua perda para o titular.

Por fim, o art. 522, também do diploma legal revogado, regula a perda da posse para o ausente, quando, tendo notícia da ocupação, se abstém o mesmo de retomar o bem, abandonando seu direito; ou quando, tentando recuperar a sua posse, for, violentamente, repelido por quem detém a coisa e se recusa, terminantemente, a entregá-la.

Regras fundamentais das ações possessórias

Segundo Fiúza (2003, 739), as ações possessórias, no CPC, são tratadas com quatro regras fundamentais, quais sejam:

a) Duplicidade - O réu contrapõe, na mesma ação, pedido possessório. Não existe reconvenção, a contestação tem caráter de reconvenção. O fundamento dessa regra é a celeridade e, por ser posse, é uma situação de fato.

b) Fungibilidade - A ação possessória pode ter seu pedido alterado no curso da demanda possessória, entretanto, somente no que diz respeito à tutela possessória. É a mutabilidade do pedido no curso da demanda. Art. 920 CPC: “a propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos requisitos estejam provados”.

c) Cumulatividade – Além do pedido possessório, poderão ser pedidos, também: indenização, perdas e danos, multa, desfazimento de construção etc.

d) Rito próprio - É um rito especial para a demanda possessória. Inicia-se com uma petição inicial, que tem os requisitos gerais do art. 282 do CPC e requisitos específicos de ação possessória: existência da posse; existência de turbação, esbulho ou ameaça; data da turbação, esbulho ou ameaça, para fins de liminar (1 ano e 1 dia); perda ou  manutenção da posse.

Presentes esses requisitos, o juiz poderá, ao despachar a inicial, praticar três atos: indeferi-la; conceder liminar, sem ouvir a parte contrária; determinar audiência de justificação. Não sendo possível a concessão da liminar, de plano, poderá o juiz determinar audiência de justificação acerca das determinações do art. 927 do CPC.

Efeitos da posse

A) Legítima defesa da posse - Também chamada de desforço físico, é a auto-tutela, em que o titular, usando meios moderados, repele turbação ou esbulho na posse (art. 1.210, § 1º).
Os requisitos são: uso dos meios necessários; moderação; ocorrência de injusta agressão; atual ou iminente; posse.
            Na hipótese de excesso na legítima defesa da posse, sendo doloso ou culposo, aplica-se o art. 186 do Código Civil, gerando indenização, ou seja, o excesso não gera a perda da posse, mas sim uma indenização.

B) Acessórios da coisa - São os frutos e as benfeitorias. Os frutos são melhoramentos internos da coisa, ou seja, aumento da qualidade ou quantidade interna da coisa. As benfeitorias são acréscimos externos da coisa, ou seja, aumento da qualidade ou quantidade externa da coisa.
Os frutos podem ser: materiais: decorrem da natureza; industriais: decorrem da mão humana; legais: decorrem da lei.
As benfeitorias podem ser: necessárias: aquelas indispensáveis à manutenção da coisa, ou seja, o acréscimo mantém o valor econômico da coisa; úteis: aquelas que aumentam a qualidade econômica da coisa por gerar maior utilidade; voluptuárias: aquelas que aumentam substancialmente o valor econômico da coisa para lhe garantir maior deleite.
Existem três princípios que regem a matéria: acessório segue o principal: quem possui o principal possui também o acessório; res perit domino: a coisa perece para o dono; princípio da boa-fé: existe a presunção de boa-fé; ou seja, no silêncio, presume-se a posse de boa-fé.

B.1) Efeitos da posse de boa-fé:
- Em relação aos frutos - O possuidor de boa-fé terá direito aos frutos percebidos e colhidos, e direito à indenização pela produção e custeio (todos os aparatos da coisa). (Art. 1.214 CC).
- Em relação às benfeitorias - O possuidor tem direito a indenização plena pelas benfeitorias necessárias e úteis, bem como direito de retenção por estas (poderá reter a coisa até que seja indenizado) e direito a levantar as benfeitorias voluptuárias se não houver indenização por elas. (Art. 1.219 CC).
- Em relação à deterioração - Em tese, o possuidor é irresponsável pela deterioração natural. Tem responsabilidade subjetiva. (Art. 1.217 CC).

B.2) Efeitos da posse de má-fé:
- Em relação aos frutos - O possuidor de má-fé tem obrigação de devolução dos frutos percebidos e colhidos, perderá os frutos pendentes e tem o direito de ser indenizado pela produção e custeio (visa ao não enriquecimento indevido de terceiros). (Art. 1.216 CC).
- Em relação às benfeitorias - O possuidor perderá as benfeitorias úteis e voluptuárias, terá direito à indenização pelas benfeitorias necessárias e não poderá reter a coisa, nem levantar, se não houver indenização por elas. (Art. 1.220 CC).
- Em relação à deterioração - O possuidor de má-fé tem responsabilidade objetiva. Será responsável por qualquer perecimento, só podendo se eximir se demonstrar que a deterioração ocorreria em qualquer hipótese. Há a inversão do ônus da prova. (Art. 1.218 CC).

C) Usucapião - É um efeito possessório. A passagem do tempo com uma relação de posse gera a propriedade. É a única em que o proprietário não tem publicidade, tendo em vista que a sentença do juiz, na usucapião, é meramente declaratória, não havendo registro. Nesse caso, a propriedade é adquirida com o decurso do tempo, independente de haver ou não registro.

            D) Presunção de propriedade – Devido ao fato de ser a visibilidade do domínio. Presunção esta juris tantum.

            E) Ações possessórias (interditos possessórios) – Existem dois grupos de ações possessórias:
- Típicas: são aquelas que tratam da relação material da pessoa com a coisa. Podem ser: reintegração de posse, em caso de esbulho; manutenção de posse, em caso de turbação, ou interdito proibitório, em caso de ameaça.
- Atípicas: são aquelas que tratam, além da relação material, da relação jurídica e suas conseqüências no sistema jurídico. Podem ser: embargos de terceiros possuidores, nunciação de obra nova etc.
Obs.: Exceptio domini ou exceptio proprietatis: é o fenômeno segundo o qual o réu alega, na defesa, ser titular do domínio nas ações possessórias. Quanto à alegação de domínio (exceptio domini) nas ações possessórias, está previsto no art. 923 do CPC: “Na pendência do processo possessório, é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação do esbulho cometido pelo autor”. O art. 923 proíbe a alegação de domínio sobre a coisa, em caso de ação possessória.
            Regra geral, portanto, em matéria possessória, o juiz não irá decidir domínio; entretanto, existem duas exceções a essa regra citadas por Silvio Rodrigues (2002, 58):
            - Súmula n. 487 do Supremo Tribunal Federal: se as duas partes fundamentarem a posse em propriedade (se os dois alegarem ser proprietários), o juiz deverá julgar pela propriedade.
- Julga-se pelo domínio quando não se prova posse, ou seja, se nenhuma das partes provar a posse, o juiz julgará pelo domínio.
Traz Flávio Tartuce um entendimento mais moderno segundo o qual “No atual Código Civil, por força do disposto no §2º do seu art. 1.210, não há mais lugar para a "exceptio proprietatis", como defesa oponível às ações possessórias típicas, havendo, assim, a partir da vigência do Código Civil de 2002, absoluta separação entre os juízos possessório e petitório. Leia a lúcida e hodierna decisão monocrática prolatada pelo eminente e culto Desembargador Silveira Lenzi, fundamentada no Enunciado n. 79 do CEJ (Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal) e nas lições de Arruda Alvim”.

“Decisão Monocrática: Agravo de Instrumento Nº 2004.025421-0/0000-00, da comarca de Jaraguá do Sul. Relator: Des. Silveira Lenzi. Data da decisão: 04.10.2004. Publicação: DJSC n. 11.531, edição de 07.10.2004, p. 17/18. Agravante: Geison Roberto Schäffer. Advogada: Regina Potapoff. Agravadas : Alaide Roters e outros.
Advogado: Roberto Cesar Schroeder

DESPACHO

Geison Roberto Schäffer interpõe agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, contra a decisão interlocutória de fls. 35/37, proferida nos autos da ação de reintegração de posse n. 036.04.002795-9, movida por Alaíde Roters, Daniele Roters Monteiro, Marcos André Alves Monteiro, Mauro Eduardo Roters, Marlene Roters Gottardi e Edmundo Gottardi, que deferiu a liminar.

O agravante alega que: a) não esbulhou a posse dos autores, ora agravados; b) em virtude de suas dificuldades financeiras, reside no imóvel há mais de 04 (quatro) anos, conforme acordo firmado com o seu tio, marido da primeira agravante, antes de seu falecimento; c) após a morte de seu tio, os recorridos concordaram com a sua permanência no imóvel, porque quitava os tributos, mantinha o terreno limpo e edificou benfeitorias em torno de R$ 10.000,00 (dez mil reais); d) sua mãe é herdeira legítima do imóvel, porque a casa nele existente foi edificada pelo seu avô; e) os recorridos inobservaram o compromisso firmado.

Requer a concessão do efeito suspensivo e o final provimento do recurso.

É o relatório.

Para a concessão de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, providência excepcional, necessária a existência dos pressupostos estabelecidos no art. 558, caput, do estatuto processual - a relevância da fundamentação e a possibilidade de lesão grave e de difícil reparação, até o julgamento do recurso.

Reputo ausente o fumus boni iuris.
Isto porque, aparentemente, o esbulho restou caracterizado com a permanência do ora agravante no imóvel, mesmo após ter sido notificado extrajudicialmente para que o desocupasse (fl. 19).
Saliento, ainda, que, em inobservância ao art. 333, inc. II, do CPC, inexistem provas de que o ora recorrente tenha edificado benfeitorias necessárias ou úteis que justificassem seu direito de retenção, a teor do art. 1.219 do CC/02.

Ademais, a questão acerca da propriedade da casa situada no imóvel é irrelevante ao caso, porquanto não se discute tal matéria no juízo possessório, por força do art. 1.210, § 2º, do CC/02: “Não obsta a manutenção ou reintegração na posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa.”

Daí o Enunciado n. 79, aprovado nas Jornadas de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, dispor que: “Enunciado 79 do CEJ: ‘A ‘exceptio proprietatis’, como defesa oponível às ações possessórias típicas, foi abolida pelo Código Civil de 2002, que estabeleceu a absoluta separação entre os juízos possessório e petitório’.” (In: Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa, Código Civil e Legislação Civil em Vigor, 22ª ed., São Paulo, Saraiva, 2003, p. 217).

Arruda Alvim, no mesmo sentido, expõe: “A posse, como se disse, é protegida como defesa de uma situação de fato. Esta assertiva tanto mais se evidencia a partir do que consta do § 2º do art. 1.210 do CC, a mostrar, que no plano do juízo possessório está estabelecida a impenetrabilidade em relação à alegação de domínio ou de outro direito (o que já era da tradição recente de nosso direito).” (Defesa da Posse e Ações Possessórias, revista de Processo, n. 114, p. 26, mar./abr. 2004).

Ausente o fumus boni iuris, despiciendo o exame do periculum in mora.

Do exposto, indefiro o pedido de efeito suspensivo.
Intimem-se.
Cumpra-se o disposto no inc. V do art. 527 do CPC.
Após, à redistribuição.

Florianópolis, 04 de outubro de 2004.

Silveira Lenzi
RELATOR”

Aquisição da posse

De acordo com o art. 1.204: “Adquire-se a posse desde o momento em que se torna possível o exercício, em nome próprio, de qualquer dos poderes inerentes à propriedade”.

O art. 1.205 dispõe que se pode adquirir a posse:
I – pela própria pessoa que a pretende ou por seu representante (legal ou convencional); e
II – por terceiro sem mandato, dependendo de ratificação.

            Comentando o inciso II acima citado, Caio Mário (2003, 45) diz que não é necessário constituir formalmente um procurador para que alguém adquira a posse por intermédio de outrem, basta que lhe seja dada esta incumbência, ou que exista vínculo jurídico entre eles. “Assim é que o jardineiro que vai buscar as plantas, ou a doméstica que recebe a caixa de vinho adquirem a posse alieno nomine, para o patrão e em nome deste, embora dele não sejam mandatários”.

Ninguém pode transmitir mais direitos do que tem, ou seja, a posse é transmitida com o mesmo caráter que ela possui (Ex.: a posse precária, se transmitida, ainda será precária). Assim é que no art. 1.206 se lê: “A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres”. E também que “Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida” (art. 1.203 CC).

Acessão da posse: é a soma do tempo da posse atual com o da posse anterior, na posse derivada. Jamais poderá acontecer na posse originária, tendo em vista que há necessidade de nexo de causalidade para que seja somado o tempo. É o que se extrai do art. 1.207 em que: “O sucessor universal continua de direito a posse de seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais”.

            Obs. É interessante observar o que está no art. 1.209 “A posse do imóvel faz presumir, até prova contrária, a das coisas móveis que nele estiverem”.

Princípio da continuidade do caráter da posse

            De acordo com o art. 1.203: “Salvo prova em contrário, entende-se manter a posse o mesmo caráter com que foi adquirida”. Daí pode-se inferir que é possível a mudança na natureza da posse, o que recebe a denominação de interversão do título. É o que, por exemplo, ocorre quando o comodatário se recusa a restituir a coisa objeto do contrato alegando que a recebeu em dação em pagamento. Bem ressalta Venosa (2002, 77) que “a simples vontade do possuidor não tem o condão de modificar a natureza da posse. O que modificaria sua natureza seria ato material exteriorizado em outra relação de fato com a coisa.

Tendo em vista o que está previsto nos arts. 1.206 de que “A posse transmite-se aos herdeiros ou legatários do possuidor com os mesmos caracteres” e 1.207 de que “O sucessor universal continua de direito a posse de seu antecessor; e ao sucessor singular é facultado unir sua posse à do antecessor, para os efeitos legais”, Caio Mário (2003, 31) diz que “Se a posse originária era injusta, o desconhecimento do defeito daquele que a recebeu por título hereditário não lhe apaga o defeito porque o herdeiro, como sucessor universal do defunto, continua na mesma posse, com os vícios e qualidades que a revestiam”. Por outro lado, “Se a aquisição se der a título singular (convenção, legado), o mesmo não ocorre, pois que, começando sempre a posse com o ato aquisitivo, não a inquinam os vícios anteriormente existentes. É certo que o adquirente tem a faculdade de juntar à sua a posse do antecessor (accessio possessionis), mas é mera faculdade, de que somente se utilizará se lhe convier, e o possuidor é disto o único árbitro”.

Lei nº. 12.344 (9/12/10) - 70 anos é a idade limite para a escolha do regime de bens do casamento

RESTRIÇÕES AO DIREITO DE AMAR

Rodrigo da Cunha Pereira
Advogado, Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, Doutor (UFPR), Mestre (UFMG) em Direito Civil, autor de vários artigos e livros em Direito de Família e Psicanálise

 
Entrou em vigor a lei nº. 12.344, sancionada pelo Presidente da República no último dia 9/12, que aumenta para setenta anos a limitação da idade para a escolha do regime de bens do casamento. Com o Código Civil Brasileiro de janeiro de 2003, este limite, que era de cinqüenta anos para mulheres e sessenta para homens, passou a ser de sessenta anos para ambos os sexos. Isto significa que homens e mulheres, acima de sessenta, e a partir desta nova lei, setenta anos, não têm a liberdade de escolher as regras econômicas de seu casamento e por analogia de sua união estável, pois só podem se unir pelo regime de separação de bens.

O fundamento e "espírito" desta proibição é evitar os chamados popularmente de "golpes-do-baú". Parte-se do pressuposto que alguém com mais de sessenta anos, e agora setenta, não tem mais a capacidade de discernir o certo ou errado e está mais vulnerável de ser enganado pelo seu pretenso cônjuge ou companheiro. "Golpes-do-baú" sempre existiram e continuarão, independentemente do regime de bens do casamento. Para essas exceções a receita é a de sempre, ou seja, em se constatando a enganação ou o engodo, o contrato de casamento pode ser desfeito ou anulado através dos instrumentos jurídicos próprios.
Esta nova lei tem o mérito de trazer à reflexão e proporcionar a importante discussão sobre os limites de intervenção do Estado na vida privada dos cidadãos, sobre a contradição da restrição à liberdade de escolha do regime de bens do casamento, sobre expectativas de herança, enfim, sobre os perigos das paixões. A partir desta nova lei, a Presidente eleita, Dilma Rousseff, se vier a se casar novamente não está mais obrigada a se casar pelo regime de separação de bens. Por outro lado, os ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso e Jose Sarney, por terem mais de 70 anos de idade continuam semi-interditados, ou seja, se vierem a se casar novamente têm restrição em sua liberdade na escolha das regras econômicas de suas novas relações amorosas.

O superior Tribunal de Justiça - STJ e alguns tribunais estaduais já haviam se posicionado pela inconstitucionalidade desta regra (art. 1641, II código civil) restritiva de liberdade individual (Recurso Especial 471.958). A contradição, e, portanto a ainda inadequação da nova lei, ao continuar impondo limite de idade para escolha do regime de bens do casamento, é flagrante se pensarmos que grande parte dos julgadores dos tribunais superiores, ocupantes de cargos no legislativo e executivo, têm mais de sessenta, e boa parte até mais de setenta anos, tomam decisões importantes para a vida econômica do país e não podem decidir sobre a economia de sua própria vida?

Paira sobre esta restrição não apenas uma inconstitucionalidade e um atentado às liberdades individuais daqueles que chegam aos setenta anos de idade e são automaticamente semi-interditados, mas principalmente o preconceito. Para o senso comum, alguém com mais de sessenta ou setenta anos de idade que estabelece uma relação amorosa com outra pessoa bem mais nova está sendo ludibriada e deve ser protegida. O preconceito está principalmente em acreditar que pessoas mais velhas não são capazes de despertar o amor e o desejo em alguém bem mais jovem. E é assim que se vai construindo historias de exclusão e expropriação da cidadania. Ainda bem que a maturidade, a segurança emocional e o próprio dinheiro podem ser outros novos elementos de atração e sedução para quem está na chamada terceira idade, já que o corpo certamente não é mais o encanto principal. Não há mal nenhum alguém ter dinheiro e isto ter se tornado um "valor agregado", para usar uma expressão do mercado econômico, que tange e conduz também o mercado erótico e amoroso.

Embora a lei seja bem intencionada, ela é tímida e perdeu uma boa oportunidade para acabar de vez com um dos resquícios de atraso do ordenamento jurídico brasileiro. Tal restrição atenta contra a liberdade individual e fere a autonomia e dignidade dos sujeitos.

Fonte: INJUR

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Dos bens quanto à possibilidade de serem comercializados

a) alienáveis ou no comércio — aqueles que podem ser comercializados;

b) inalienáveis ou fora do comércio — aqueles que, ordinariamente, não podem ser alienados, podendo se classificar em:

- inapropriáveis por natureza - bens de uso inexaurível, bens sem utilidade e os direitos da personalidade. Ex.: alto mar, o ar, a luz solar  direito à vida, à honra. Os primeiros perdem a natureza de bens fora do comércio, quando forem captados, por meio de aparelhagem, para extrair certos elementos, com o objetivo de atender certas finalidades.

- legalmente inalienáveis - aqueles que têm sua comercialidade excluída por lei e, somente mediante autorização legal, podem ser alienados. Ex.: bens públicos de uso comum do povo e de uso especial.

- inalienáveis pela vontade humana - aqueles a que o indivíduo, por ato inter vivos ou causa mortis, impõe a cláusula de inalienabilidade, temporária ou vitalícia, nos casos e formas previstos em lei. Ex.: cláusula constante de testamento e de doação. A cláusula de inalienabilidade implica em impenhorabilidade e incomunicabilidade.

A inalienabilidade pode ser absoluta (quando o bem não puder ser alienado em nenhuma hipótese) ou relativa (quando o bem for passível de alienação em certos casos mediante a observância dos requisitos legais).

Dos bens considerados em relação ao titular do domínio

Em relação ao titular do domínio, temos os bens públicos (pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno) e os bens particulares (todos os outros bens, seja qual for a pessoa a que pertencerem).

Os bens públicos classificam-se em:

1) de uso comum do povo (ou do domínio público) - podem ser utilizados, sem restrição, gratuita ou onerosamente, por qualquer pessoa. Ex.: ruas, praças, jardins, mares, praias, rios etc.

2) de uso especial (ou do patrimônio administrativo) - são destinados a algum serviço da pessoa jurídica de direito público a que pertencem. Ex.: edifícios ou terrenos destinados a serviço ou estabelecimento da administração federal, estadual, territorial ou municipal, inclusive os de suas autarquias.

3) dominicais ou dominiais (ou do patrimônio disponível) - constituem o patrimônio da pessoa jurídica de direito público, como objeto de direito pessoal ou real da entidade. Ex.: créditos, terras devolutas, estradas de ferro etc. Não dispondo a lei em contrário, consideram-se dominicais os bens pertencentes às pessoas jurídicas de direito público a que se tenha dado estrutura de direito privado.

Os bens públicos dominicais podem, por determinação legal, ser convertidos em bens de uso comum do povo ou de uso especial (afetação) e vice-versa (desafetação).

Os bens públicos apresentam, em regra, os seguintes caracteres: inalienabilidade quanto aos bens públicos de uso comum do povo e os de uso especial, enquanto conservarem a sua qualificação. Os bens públicos dominicais podem ser alienados, observadas as exigências da lei; imprescritibilidade, não podendo ser adquiridos por usucapião, impenhorabilidade, visto serem, em regra, inalienáveis.

Dos bens reciprocamente considerados

a) Principal (é o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente, como o solo) e acessório (é o bem cuja existência supõe a do principal, como uma construção em relação ao solo).

Tanto os bens corpóreos, como os incorpóreos, comportam tal distinção. Exemplo de tal distinção relativamente aos bens corpóreos já foi dado. Quanto aos bens incorpóreos, pode-se citar como exemplo um crédito como coisa principal e os juros ou a cláusula penal como acessórios, eis que se submetem à existência daquele.

Salvo disposição especial em contrário, a coisa acessória segue a principal (arts.1.209, 233 e 287, do CC). Assim, a natureza daquela deve ser a mesma desta (se móvel for o principal, móvel o será o acessório). Se nula for a obrigação principal, nula será a acessória. O proprietário ou o possuidor da coisa principal também o será, em regra, da acessória. Como exceção, tem-se o tratamento atribuído às pertenças, que, apesar de serem acessórios circunstanciais ou acidentais, não seguem a aludida regra. Com efeito, o art. 94 do CC/2002 estabelece: “Os negócios que dizem respeito ao bem principal não abrangem as pertenças, salvo se o contrário resultar da lei, da manifestação de vontade, ou das circunstâncias do caso”.

Espécies de bens acessórios:

1) frutos - são as utilidades que a coisa periodicamente produz, cuja percepção não lhe altera a substância.
Quanto a sua origem, os frutos podem ser: naturais - aqueles que resultam da própria força orgânica da coisa. Ex.: as crias dos animais, os frutos de uma árvore etc. Não perdem esta característica pelo simples fato de o homem contribuir, através de processos técnicos, para melhorar a qualidade e a produtividade; industriais - aqueles que resultam da atividade humana. Ex.: a produção de uma fábrica; civis - rendimentos oriundos da utilização de coisa frutífera, por outrem que não o proprietário. Também recebem o nome de rendimentos. Ex.: rendas, juros, aluguéis etc.

Quanto ao seu estado, os frutos podem ser: pendentes - enquanto unidos à coisa que os produziu; percebidos ou colhidos - depois de separados; estantes - depois de separados e enquanto encontrarem-se armazenados ou acondicionados para expedição ou venda; percipiendos - que deviam ser, mas não foram percebidos; consumidos - aqueles que não mais existem.

Importância da distinção:
- Os frutos pendentes ao tempo em que cessar a boa-fé do possuidor devem ser restituídos, depois de deduzidas as despesas de produção e custeio. Devem também ser restituídos os frutos colhidos com antecipação.
- Os frutos naturais e industriais reputam-se colhidos e percebidos logo que são separados. Os civis reputam-se percebidos dia por dia.
- O possuidor de boa-fé tem direito, enquanto ela durar, aos frutos percebidos.
- O possuidor de má-fé responde por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como pelos que, por culpa sua, deixou de perceber, desde o momento em que se constituiu de má-fé; tem direito, porém, às despesas de produção e custeio.

2) produtos - são as utilidades que se retiram da coisa, com prejuízo para a sua substância e com diminuição gradativa, até o esgotamento, por não se renovarem periodicamente. Ex.: petróleo de um poço, pedras de uma pedreira etc.

3) benfeitorias - são os melhoramentos que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore (benfeitorias necessárias. Ex.: conserto de um telhado), aumentar ou facilitar o seu uso (benfeitorias úteis. Ex.: construção de uma garagem), ou de mero deleite ou recreio, que não aumentem o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor (benfeitorias voluptuárias. Ex.: construção de um jardim em imóvel residencial).

Importância da distinção das espécies de benfeitorias:

- O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, ao de levantá-­las, quando o puder sem detrimento da coisa. Pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis poderá exercer o direito de retenção.
- Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; mas não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

Não se consideram benfeitorias:
- os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, do possuidor ou do detentor (acessões naturais - aluvião, avulsão, abandono de álveo e formação de ilhas);
- as obras que criam coisa nova, que se adere à propriedade anteriormente existente, como as construções e as plantações (acessões artificiais) Ainda sobre o assunto, leciona Carlos Roberto Gonçalves: “Malgrado o novo Código Civil não tenha repetido as exceções constantes do art. 62 do diploma de 1916, não se consideram bens acessórios: a pintura em relação à tela, a escultura em relação à matéria-prima e a escritura ou outro qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima que os recebe, considerando-se o maior valor do trabalho em relação ao do bem principal (CC, art. 1.270, §2º)”.

4) acessões - são os melhoramentos sobrevindos à coisa sem a intervenção do proprietário, do possuidor ou do detentor (acessões naturais - aluvião, avulsão, aban­dono de álveo e formação de ilhas) e as obras que criam coisa nova, que se adere à pro­priedade anteriormente existente, como as construções e as plantações (acessões artifi­ciais ou industriais). Distinguem-se das benfeitorias, eis que estas se destinam a con­servação, melhoria ou embelezamento da coisa, enquanto aquelas alteram a substância do bem.

5) pertenças - bens que, não constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou aformoseamento de outro. Ainda que sejam separados da coisa principal, esta continuará sendo considerada completa. Ex.: mp3 instalado em um carro, quadro pendurado na parede de uma casa etc.

6) partes integrantes - acessórios que, unidos ao principal, formam com ele um todo, sendo desprovidos de existência material própria. Se forem separadas da coisa principal, esta ficará incompleta. Ex.: peças de um relógio.

Bens divisíveis/indivisíveis, singulares/coletivos

e) Bens divisíveis (os que se podem fracionar sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor ou prejuízo do uso a que se destinam) e indivisíveis (os que se não podem partir sem alteração na sua substância, diminuição considerável de valor ou prejuízo do uso a que se destinam -indivisibilidade natural - e os que, embora naturalmente divisíveis, se consideram indivisíveis por lei - indivisibilidade por determinação legal - ou por vontade das partes - Indivisibilidade convencional). Exemplos de indivisibilidade natural: cavalo de corridas, relógio, diamante de 50 quilates etc. Exemplos de indivisibilidade por determinação legal: servidões prediais em relação ao prédio serviente, área rural equivalente a um módulo regional – lei 4.504/64 – art. 65, hipoteca – art 1421 CC/02, partilha de herança – art. 1791, objeto indivisível – obrigação indivisível – e devedor é obrigado pela dívida toda (CC, art. 314). Exemplos de bens indivisíveis por convenção das partes: condomínio tornado voluntariamente indivisível e obrigações indivisíveis.

f) Bens singulares (os que, embora reunidos, se consideram de per si, independentemente dos demais, como um livro) e coletivos, universais ou universalidades (os que, embora constituídos de vários bens singulares, são considerados como um todo, distinto daqueles que o compõem).

Os bens coletivos classificam-se em:

1) universalidades de fato (universitas rerum) — pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária. Ex.: biblioteca.

2) universalidades de direito (universitas juris) — complexo de relações jurídicas, de uma pessoa, dotadas de valor econômico. Ex.: herança, massa falida etc.

Nas universalidades de fato, em desaparecendo todos os objetos, menos um, se tem por extinta a coletividade, mas não o direito sobre o remanescente. Essa regra, embora não repetida pelo novo Código Civil, ainda se afigura aplicável.

“Nas universalidades de direito, as coisas que entram em substituição às que por elas se trocam, tomam-lhes o lugar, mantendo íntegra a universalidade” (Silvio Rodrigues). Os bens que compõem uma universalidade podem ser objeto de relações jurídicas próprias.

Bens fungíveis/infungíveis e consumíveis/inconsumíveis

c) Bens fungíveis (os que podem substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e quantidade) e infungíveis (os que não podem substituir-se por outros da mesma espécie, quantidade e qualidade). É também utilizada a idéia de fungibilidade quanto às obrigações de fazer. Se a prestação puder ser realizada por qualquer pessoa, por não demandar técnica ou conhecimentos especializados, será fungível. Caso contrário, se requerer atuação personalíssima, será infungível.

OBS. O empréstimo de coisas fungíveis recebe o nome de mútuo e o de coisas infungíveis, de comodato.

Regra geral, a fungibilidade e a infungibilidade decorrem da natureza do bem, porém é possível que por vontade das partes um bem fungível se torne infungível.

d) Bens consumíveis (os móveis, cujo uso importa destruição imediata da própria substância e os destinados à alienação, como uma tela exposta para a venda em uma galeria de artes) e inconsumíveis (os que podem ser usados continuamente possibilitando que se retirem todas as suas utilidades, sem importar em destruição imediata de sua substância, como, por exemplo, um automóvel).

OBS. A consumibilidade não decorre apenas da natureza do bem, mas, também, de sua destinação econômico-jurídica. É possível que por vontade das partes um bem naturalmente consumível seja considerado inconsumível.

A consumibilidade não se confunde com a fungibilidade.

Classificação dos bens

Dos bens considerados em si mesmos:

a) Bens corpóreos (têm existência material perceptível pelos nossos sentidos, como os móveis e imóveis em geral) e incorpóreos (não têm existência tangível e são relativos aos direitos que as pessoas naturais ou jurídicas têm sobre as coisas, sobre os produtos de seu intelecto ou contra outra pessoa, apresentando valor econômico).

É bem incorpóreo a patente de invenção industrial, que permite se fabricar e vender com exclusividade um determinado produto; a marca industrial ou de comércio, que identifica um produto e o valoriza aos olhos dos consumidores; a criação artística ou literária que forma objeto do direito do autor. É um bem imaterial o crédito, que assegura ao titular a prestação do devedor (que pode implicar em uma coisa não material, e consistir simplesmente em um serviço ou uma outra atividade humana).

OBS. Somente os bens corpóreos podem ser objeto de contrato de compra e venda. Os bens incorpóreos somente se transferem pelo contrato de cessão.

b) Bens imóveis (aqueles que não podem ser transportados de um lugar para o outro, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social) e móveis (aqueles que podem ser transportados de um lugar para o outro, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social). Os bens suscetíveis de movimento próprio, enquadráveis na classificação de bens móveis, são chamados de semoventes (ex: um cavalo).

OBS. As formas de aquisição da propriedade são distintas de acordo com o bem: se imóvel, opera-se com o registro, se móvel, opera-se com a simples tradição da coisa.

É possível um cônjuge alienar ou gravar de ônus real os bens móveis, sem a anuência do outro, o mesmo não ocorrendo quanto aos bens imóveis, salvo no regime de separação absoluta de bens (art. 1647 do CC).

O tempo para a aquisição do bem por usucapião é maior para os imóveis, do que para os móveis.

Enquanto é admissível que um bem móvel não pertença a nenhum proprietário (isto é res nullius, coisa de ninguém), isto não é concebível para os imóveis, que devem sempre ter um proprietário: os imóveis que não são de propriedade de ninguém (chamados imóveis vacantes) são automaticamente do Estado.

Espécies de bens imóveis:

1) por sua própria natureza: o solo com sua superfície, o espaço aéreo e o subsolo (art. 79 do CC);

2) por acessão natural: tudo o que se incorporar naturalmente ao solo, como as árvores e os frutos pendentes;

3) por acessão artificial ou industrial: tudo aquilo que o homem incorporar permanentemente ao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios e construções, de modo que se não possa retirar sem destruição, modificação, fratura ou dano (art. 79 do CC);

4) por determinação legal: os direitos reais sobre imóveis, as ações que os assegurem (art. 80, I e II do CC) e o direito à sucessão aberta. As apólices da dívida pública oneradas com a cláusula de inalienabilidade não mais são consideradas imóveis por determinação legal.

De acordo com os incisos I e II do art. 81 do CC, não perdem o caráter de imóveis: as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local (ex.: casas pré-fabricadas) e os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele mesmo se reempregarem.

Espécies de bens móveis:

1) por natureza: bens suscetíveis de movimento próprio, ou que, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social, podem ser removidos para outro local, mediante o emprego de força alheia (art. 82 do CC).

2) por antecipação: bens incorporados ao solo, mas destinados à oportuna separação e conversão em móveis, como as árvores destinadas ao corte. A esse respeito, o Código Civil (art. 95) estabelece que, apesar de ainda não separados do bem principal, os frutos e produtos podem ser objeto de negócio jurídico.

3) por determinação legal: as energias que tenham valor econômico, os direitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes, os direitos pessoais de caráter patrimonial e as ações respectivas, os direitos do autor e os direitos de propriedade industrial (art. 83 do CC).

Os materiais destinados a alguma construção, enquanto não forem empregados, conservam sua qualidade de móveis; readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algum prédio.

OBS. Alguns tipos de móveis apresentam características particulares: são de grande dimensão, têm sempre um certo valor econômico e a sua circulação é bastante controlável. São os automóveis, os navios e os aviões. Por isso, é possível e útil instituir também para esses móveis mecanismos de registro e publicidade para os direitos que lhes dizem respeito, fundado sobre a inscrição em registro público: por isso se chamam bens móveis registrados.

Dos Bens: conceito e caracteres

Conceito:

Não há consenso na doutrina quanto ao conceito de bem. Em certos casos, coisas são o gênero, e bens, a espécie; outras, estes são o gênero e aquelas a espécie; outras, por fim, são os dois termos utilizados como sinônimo, havendo então entre eles coincidência de significação.

Seguimos o pensamento de Gagliano e Pamplona Filho (2003, 261) que identificam a coisa sob o aspecto de sua materialidade, reservando o vocábulo aos objetos corpóreos. Os bens, por sua vez, compreenderiam os objetos corpóreos ou materiais (coisas) e os ideais (bens imateriais). Dessa forma, há bens jurídicos que não são coisas: a liberdade, a honra, a vida etc.

Caracteres:

Os bens possuem os seguintes caracteres:

a) idoneidade para satisfazer um fim econômico (excluem-se os elementos morais da personalidade, inapreciáveis economicamente);

b) gestão econômica autônoma, que é um requisito não absoluto (Ex.: energia elétrica); e

c) subordinação jurídica ao seu titular.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Apelação

A Arbitragem e o Direito Ambiental

(...)  O procedimento em caso de reparação do dano ambiental é plenamente possível de resolve-lo através da Justiça Arbitral Privada. O artigo 1º da Lei de arbitragem dispõe que: "as pessoas capazes de contratar poderão valer-se da arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis." Hipoteticamente, imaginemos uma firma tendo que mudar as suas instalações industriais de um determinado município para outro município, ou mesmo mudar de Estado, uma vez que constatou que o solo e o lençol freático da área na qual estava instalada, foram contaminados pelo lançamento irregular de efluentes de uma planta industrial vizinha. Existe, sem dúvida, uma questão de interesse público, portanto indisponível, que é a própria contaminação ambiental, e uma questão de direito privado, a indenização que o poluidor deve à empresa que foi obrigada a se re-localizar. Esta última se constitui em um direito plenamente disponível e privado.

O litígio, seja ele acerca de qualquer matéria ou referente ao Direito Ambiental, entre as empresas, no juízo arbitral estaria definido no prazo máximo de 6(seis) meses, com a grande vantagem de que, nos termos do Art. 31 da Lei de Arbitragem, "A sentença arbitral produz entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo". A decisão arbitral, portanto, pode ser um poderoso elemento para resguardar responsabilidades ambientais futuras, visto que o seu valor é igual ao de uma decisão do Poder Judiciário. Mesmo o acordo entre as partes, uma vez instaurado o juízo arbitral, será declarado em sentença pelo árbitro. Há, como se vê, um fortíssimo grau de segurança jurídica.

(...) São várias as vantagens do uso do procedimento arbitral, como celeridade, legalidade, irrecorribilidade, informalidade, confidencialidade e respeito da vontade das partes, e mais, todas as audiências são registradas em sistema de áudio e vídeo.

Fonte: http://orbitral.zip.net/

STJ julga conflito entre arbitragem e Judiciário

Começou na tarde desta quarta-feira (24/8) um julgamento que pode se tornar o leading case da arbitragem no Brasil. Os ministros da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça analisam, sob a relatoria da ministra Nancy Andrighi, o conflito de competência suscitado entre uma Câmara Arbitral e um órgão do Judiciário. O ministro Sidnei Beneti pediu vista dos autos.

Uma das questões principais que serão respondidas é se o árbitro exerce atividade jurisdicional, e se é de sua competência analisar todas as questões atinentes a litígio submetido à arbitragem, inclusive a análise de medidas cautelares, presvistas no artigo 800 do Código de Processo Civil.

De acordo com o advogado Caio Rocha, especialista em Direito Processual Civil, o caso rivaliza em importância com o julgamento da homologação de sentença estrangeira que, em 2001, decidiu pela constitucionalidade da Lei de Arbitragem, como noticiou a revista Consultor Jurídico. Na época, os ministros, por sete votos a quatro, decidiram que os mecanismos legislação são, sim, constitucionais.

Como lembrou Nancy Andrighi, a corte já decidiu pelo não conhecimento de conflitos travados entre duas Câmaras Arbitrais, mas não entre uma Câmara arbitral e um juiz togado. Na primeira possibilidade, a matéria depende de interpretação da cláusula arbitral, a ser apreciado pelo juiz de primeira instância.

O advogado explica que no julgamento que começou na quarta, “tem-se um juízo arbitral de São Paulo e um juízo de direito do Rio de Janeiro, sendo que este estaria interferindo indevidamente na lide, imputando a uma das partes medidas cautelares cuja concessão dependeria da análise de probabilidade de êxito da demanda que tramita no tribunal arbitral”.

A relatora afirmou expressamente ser o árbitro juiz de fato e de direito da causa a ele proposta, sendo que qualquer interferência no exercício dessa jurisdição estaria eivada de nulidade, por incompetência absoluta. De acordo com ela, a sentença arbitral é título executivo judicial e as medidas cautelares estão sujeitas unicamente à apreciação do juízo arbitral, desde que, para a sua concessão, haja necessidade de análise das questões discutidas na arbitragem.

Para Caio Rocha, o posicionamento “pode confirmar a sintonia do Brasil com o movimento já cristalizado nos países desenvolvidos, a fim de transformar a arbitragem num dos mais importantes e civilizados mecanismos de resolução de conflitos”.
(...)
Revista Consultor Jurídico, 26 de agosto de 2011
http://www.conjur.com.br/2011-ago-26/stj-julga-conflito-competencia-entre-arbitragem-judiciario