Nos termos do art. 225, § 1º, V da CF/88, todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Incumbe ao Poder Público, para assegurar a efetividade deste direito, "controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente".
Determina o artigo 23 da Constituição Federal, outrossim, a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para, dentre outras providências, "proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas" (inciso VI), bem como "preservar as florestas, a fauna e a flora" (inciso VII). Compete à União, aos Estados e ao DF, ademais, legislar concorrentemente sobre "florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição" (art. 24, VI da CF-88)[6] .
Esclarece o texto constitucional, ainda, que "No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais" (art. 24, § 1º). Assim, enquanto compete à União fixar as normas gerais acerca da proteção ao meio ambiente e do controle da poluição, cabe aos Estados e ao DF regular particularidades e eventos específicos e suprir eventuais omissões das normas gerais federais.
Verifica-se, assim, nos dizeres de Consuelo Yoshida, competência legislativa concorrente / suplementar e competência administrativa comum[7].
No que respeita à legislação federal, há de se distinguir os dispositivos atinentes à possibilidade da queima daqueles concernentes à autorização, ao controle e à fiscalização de tal atividade.
Quanto à possibilidade da queima, dispunha o art. 27, caput do Código Florestal anterior (lei 4.771/65) ser "proibido o uso de fogo nas florestas e demais formas de vegetação". Nos termos do parágrafo único do mesmo dispositivo legal, contudo, "Se peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, a permissão será estabelecida em ato do Poder Público, circunscrevendo as áreas e estabelecendo normas de precaução". O decreto 2.661/98, ao regulamentar o disposto no referido artigo 27, fixou em seu Capítulo II as regras para a "Permissão do Emprego do Fogo", com as condições necessárias à obtenção da "Autorização de Queima Controlada".
Determinou-se que "O emprego do fogo mediante Queima Controlada depende de prévia autorização, a ser obtida pelo interessado junto ao órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA[8] , com autuação na área onde se realizará a operação" (art. 3º), sendo tal autorização necessariamente precedida de uma série de providências por parte do interessado (arts. 4º e 5º[9]). A "Autorização de Queima Controlada", de seu turno, deverá "conter orientações técnicas adicionais, relativas às peculiaridades locais, aos horários e dias com condições climáticas mais adequadas para a realização da operação, a serem obrigatoriamente observadas pelo interessado" (art. 10).
Foram previstas, também, as possibilidades de "escalonamento regional do processo de Queima Controlada, com base nas condições atmosféricas e na demanda de Autorizações de Queima Controlada, para controle dos níveis de fumaça produzidos" (art. 13) e de suspensão da queima quando "constatados risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis", quando "a qualidade do ar atingir índices prejudiciais à saúde humana" ou quando “os níveis de fumaça, originados de queimadas, atingirem limites mínimos de visibilidade, comprometendo e colocando em risco as operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de transporte” (art. 14). Por fim, a própria "Autorização de Queima Controlada” poderá ser “suspensa ou cancelada pela autoridade ambiental" nos casos de "risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis", "interesse e segurança pública" ou "descumprimento das normas vigentes." (art. 15).
Determinou o mesmo decreto 2.661/98, igualmente, que o "emprego do fogo, como método despalhador e facilitador do corte de cana-de-açúcar em áreas passíveis de mecanização da colheita[10], será eliminado de forma gradativa, não podendo a redução ser inferior a um quarto da área mecanizável de cada unidade industrial ou propriedade não vinculada a unidade agroindustrial, a cada período de cinco anos, contados da data da publicação deste Decreto" [11](art. 16, caput), exceto no que respeita às lavouras de até cento e cinquenta hectares (art. 16, § 4º).
O emprego do fogo para fins de queima controlada, portanto, configura prática expressamente admitida e regulada pela legislação federal, inclusive quanto aos requisitos necessários à expedição, pelo órgão integrante do SISNAMA com atuação na respectiva área, da "Autorização de Queima Controlada".
Não há, destaque-se, qualquer determinação no sentido de que a referida Autorização não possa "abranger atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas"[12]. Ao contrário, as diversas providências exigidas por parte dos interessados bem demonstram serem as atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas o principal objeto dos referidos dispositivos legais e regulamentares.
Entendimento diverso, com o devido respeito, não pode ser aceito por implicar restringir onde a lei não restringe, ferindo princípio elementar de hermenêutica[13], como ensina Carlos Maximiliano: "Quando o texto dispõe de modo amplo, sem limitações evidentes, é dever do intérprete aplicá-lo a todos os casos particulares que se possam enquadrar na hipótese geral prevista explicitamente; não tente distinguir entre as circunstâncias da questão e as outras; cumpra a norma tal qual é, sem acrescentar condições novas, nem dispensar nenhuma das expressas."[14] Implicaria, ainda, atuar o Poder Judiciário como legislador positivo, disciplinando além do quanto previsto em lei, o que é igualmente inviável no sistema jurídico pátrio, em obediência ao princípio da separação dos Poderes[15].
Note-se que as referidas disposições do decreto 2.661/98 subsistem plenamente aplicáveis na medida em que a autorização do uso de fogo na vegetação, quando constatadas peculiaridades que a justifiquem, continuou possível com o advento do novo Código Florestal (lei 12.651/2012). Ademais, passou a haver, na própria lei, expressa determinação no sentido de ser competente para tal autorização o órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA[16].
Com efeito, o art. 38 da lei 12.651/2012, de forma ainda mais clara e detalhada que o art. 27 do Código Florestal anterior, determina ser “proibido o uso de fogo na vegetação”, exceto, dentre outras situações, "em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle" (inciso I).
Determina o § 1º do mesmo dispositivo que, na referida situação, "o órgão estadual ambiental competente do Sisnama exigirá que os estudos demandados para o licenciamento da atividade rural contenham planejamento específico sobre o emprego do fogo e o controle dos incêndios".
Portanto, a queima da palha da cana já era legítima antes do novo Código Florestal (desde que, por óbvio, cumpridos os requisitos legais pertinentes), cujo advento apenas reforçou tal legitimidade, além de afastar qualquer dúvida quanto a ser cabível sua autorização pelo "órgão estadual ambiental competente do Sisnama".
De fato, quanto à autorização, ao controle e à fiscalização da queima da palha da cana, cumpre destacar que também eram de competência do órgão ambiental estadual antes mesmo do advento da lei 12.651/2012. Isto porque a lei 6.938/81 (e alterações), que dispôs sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, criou o já referido SISNAMA, do qual fazem parte o Conselho de Governo ("com a função de assessorar o Presidente da República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos ambientais"); o CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente, como órgão consultivo e deliberativo); a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República (órgão central, "com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente"), o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, "com a finalidade de executar e fazer executar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente"); "os órgãos ou entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental" (grifos não originais); e "os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições" (art. 6º, incisos I a VI).
Não há como negar, face ao disposto nos referidos art. 6º, V da lei 6.938/81 e 3º do decreto 2.661/98, a competência do órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA para a autorização, o controle e a fiscalização da queima da palha da cana, antes mesmo do advento do novo Código Florestal.
Em suma, dúvida não remanesce acerca da possibilidade de tal prática e da competência do órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA para autorizá-la, controlá-la e fiscalizá-la na vigência quer do Código Florestal anterior (lei 4.771/65), quer do atual (lei 12.651/2012).
Determina o artigo 23 da Constituição Federal, outrossim, a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para, dentre outras providências, "proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas" (inciso VI), bem como "preservar as florestas, a fauna e a flora" (inciso VII). Compete à União, aos Estados e ao DF, ademais, legislar concorrentemente sobre "florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição" (art. 24, VI da CF-88)[6] .
Esclarece o texto constitucional, ainda, que "No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais" (art. 24, § 1º). Assim, enquanto compete à União fixar as normas gerais acerca da proteção ao meio ambiente e do controle da poluição, cabe aos Estados e ao DF regular particularidades e eventos específicos e suprir eventuais omissões das normas gerais federais.
Verifica-se, assim, nos dizeres de Consuelo Yoshida, competência legislativa concorrente / suplementar e competência administrativa comum[7].
No que respeita à legislação federal, há de se distinguir os dispositivos atinentes à possibilidade da queima daqueles concernentes à autorização, ao controle e à fiscalização de tal atividade.
Quanto à possibilidade da queima, dispunha o art. 27, caput do Código Florestal anterior (lei 4.771/65) ser "proibido o uso de fogo nas florestas e demais formas de vegetação". Nos termos do parágrafo único do mesmo dispositivo legal, contudo, "Se peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, a permissão será estabelecida em ato do Poder Público, circunscrevendo as áreas e estabelecendo normas de precaução". O decreto 2.661/98, ao regulamentar o disposto no referido artigo 27, fixou em seu Capítulo II as regras para a "Permissão do Emprego do Fogo", com as condições necessárias à obtenção da "Autorização de Queima Controlada".
Determinou-se que "O emprego do fogo mediante Queima Controlada depende de prévia autorização, a ser obtida pelo interessado junto ao órgão do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA[8] , com autuação na área onde se realizará a operação" (art. 3º), sendo tal autorização necessariamente precedida de uma série de providências por parte do interessado (arts. 4º e 5º[9]). A "Autorização de Queima Controlada", de seu turno, deverá "conter orientações técnicas adicionais, relativas às peculiaridades locais, aos horários e dias com condições climáticas mais adequadas para a realização da operação, a serem obrigatoriamente observadas pelo interessado" (art. 10).
Foram previstas, também, as possibilidades de "escalonamento regional do processo de Queima Controlada, com base nas condições atmosféricas e na demanda de Autorizações de Queima Controlada, para controle dos níveis de fumaça produzidos" (art. 13) e de suspensão da queima quando "constatados risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis", quando "a qualidade do ar atingir índices prejudiciais à saúde humana" ou quando “os níveis de fumaça, originados de queimadas, atingirem limites mínimos de visibilidade, comprometendo e colocando em risco as operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de transporte” (art. 14). Por fim, a própria "Autorização de Queima Controlada” poderá ser “suspensa ou cancelada pela autoridade ambiental" nos casos de "risco de vida, danos ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis", "interesse e segurança pública" ou "descumprimento das normas vigentes." (art. 15).
Determinou o mesmo decreto 2.661/98, igualmente, que o "emprego do fogo, como método despalhador e facilitador do corte de cana-de-açúcar em áreas passíveis de mecanização da colheita[10], será eliminado de forma gradativa, não podendo a redução ser inferior a um quarto da área mecanizável de cada unidade industrial ou propriedade não vinculada a unidade agroindustrial, a cada período de cinco anos, contados da data da publicação deste Decreto" [11](art. 16, caput), exceto no que respeita às lavouras de até cento e cinquenta hectares (art. 16, § 4º).
O emprego do fogo para fins de queima controlada, portanto, configura prática expressamente admitida e regulada pela legislação federal, inclusive quanto aos requisitos necessários à expedição, pelo órgão integrante do SISNAMA com atuação na respectiva área, da "Autorização de Queima Controlada".
Não há, destaque-se, qualquer determinação no sentido de que a referida Autorização não possa "abranger atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas"[12]. Ao contrário, as diversas providências exigidas por parte dos interessados bem demonstram serem as atividades agroindustriais ou agrícolas organizadas o principal objeto dos referidos dispositivos legais e regulamentares.
Entendimento diverso, com o devido respeito, não pode ser aceito por implicar restringir onde a lei não restringe, ferindo princípio elementar de hermenêutica[13], como ensina Carlos Maximiliano: "Quando o texto dispõe de modo amplo, sem limitações evidentes, é dever do intérprete aplicá-lo a todos os casos particulares que se possam enquadrar na hipótese geral prevista explicitamente; não tente distinguir entre as circunstâncias da questão e as outras; cumpra a norma tal qual é, sem acrescentar condições novas, nem dispensar nenhuma das expressas."[14] Implicaria, ainda, atuar o Poder Judiciário como legislador positivo, disciplinando além do quanto previsto em lei, o que é igualmente inviável no sistema jurídico pátrio, em obediência ao princípio da separação dos Poderes[15].
Note-se que as referidas disposições do decreto 2.661/98 subsistem plenamente aplicáveis na medida em que a autorização do uso de fogo na vegetação, quando constatadas peculiaridades que a justifiquem, continuou possível com o advento do novo Código Florestal (lei 12.651/2012). Ademais, passou a haver, na própria lei, expressa determinação no sentido de ser competente para tal autorização o órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA[16].
Com efeito, o art. 38 da lei 12.651/2012, de forma ainda mais clara e detalhada que o art. 27 do Código Florestal anterior, determina ser “proibido o uso de fogo na vegetação”, exceto, dentre outras situações, "em locais ou regiões cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou florestais, mediante prévia aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e controle" (inciso I).
Determina o § 1º do mesmo dispositivo que, na referida situação, "o órgão estadual ambiental competente do Sisnama exigirá que os estudos demandados para o licenciamento da atividade rural contenham planejamento específico sobre o emprego do fogo e o controle dos incêndios".
Portanto, a queima da palha da cana já era legítima antes do novo Código Florestal (desde que, por óbvio, cumpridos os requisitos legais pertinentes), cujo advento apenas reforçou tal legitimidade, além de afastar qualquer dúvida quanto a ser cabível sua autorização pelo "órgão estadual ambiental competente do Sisnama".
De fato, quanto à autorização, ao controle e à fiscalização da queima da palha da cana, cumpre destacar que também eram de competência do órgão ambiental estadual antes mesmo do advento da lei 12.651/2012. Isto porque a lei 6.938/81 (e alterações), que dispôs sobre a Política Nacional de Meio Ambiente, criou o já referido SISNAMA, do qual fazem parte o Conselho de Governo ("com a função de assessorar o Presidente da República na formulação da política nacional e nas diretrizes governamentais para o meio ambiente e os recursos ambientais"); o CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente, como órgão consultivo e deliberativo); a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República (órgão central, "com a finalidade de planejar, coordenar, supervisionar e controlar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente"), o IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, "com a finalidade de executar e fazer executar, como órgão federal, a política nacional e as diretrizes governamentais fixadas para o meio ambiente"); "os órgãos ou entidades estaduais responsáveis pela execução de programas, projetos e pelo controle e fiscalização de atividades capazes de provocar a degradação ambiental" (grifos não originais); e "os órgãos ou entidades municipais, responsáveis pelo controle e fiscalização dessas atividades, nas suas respectivas jurisdições" (art. 6º, incisos I a VI).
Não há como negar, face ao disposto nos referidos art. 6º, V da lei 6.938/81 e 3º do decreto 2.661/98, a competência do órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA para a autorização, o controle e a fiscalização da queima da palha da cana, antes mesmo do advento do novo Código Florestal.
Em suma, dúvida não remanesce acerca da possibilidade de tal prática e da competência do órgão ambiental estadual integrante do SISNAMA para autorizá-la, controlá-la e fiscalizá-la na vigência quer do Código Florestal anterior (lei 4.771/65), quer do atual (lei 12.651/2012).
(...)
Mário Luiz Oliveira da Costa é advogado do escritório Dias de Souza Advogados Associados S/C.
http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI180001,61044-A+queima+da+palha+da+cana-de-acucar+no+Estado+de+Sao+Paulo
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