terça-feira, 9 de maio de 2017

Contrato, traços norteadores para interpretação contratual

Publicado por Francisco Edgar Nitão

1. INTRODUÇÃO

Para a compreensão do maravilhoso mundo dos contratos, primeiro é necessário saber que os negócios jurídicos são pautados fortemente em princípios, como o da boa-fé, da autonomia de vontades dentre outros também importantíssimos. A observância a tais princípios significa em certo modo, a pré-existência de intenção no cumprimento das obrigações pactuadas.

A intenção resulta em acordo de vontades entre as partes que as vezes seguem por meandros diferentes quando da execução do negócio, acontece de as partes ao interpretarem o descrito contratual ao seu modo, divergem a respeito do cumprimento ou não de uma cláusula, por exemplo. Desta forma, buscou o legislador civil regular as interpretações contratuais, preservando a intenção pactuada e o efetivo cumprimento da obrigação.

2. TRAÇOS NORTEADORES PARA INTERPRETAÇÃO DOS CONTRATOS CONFORME O CÓDIGO CIVIL

A bem da verdade, quando falamos em interpretação contratual, queremos trazer a baila a vontade da lei, no tocante aos negócios jurídicos. O sentido normativo é que eles se cumpram, observando claro, algumas disposições elencadas pela própria norma, a saber:

a. A Intenção Consubstanciada

Em conformidade com a norma: Art. 112. “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem. ” Com base nesta regra, o contrato firmado pelas as partes, deve ser executado com base na intenção alocada as palavras ali descritas em formas de cláusulas e não o contrário.

b. A Boa-Fé

A Lei, sempre norteia os negócios jurídicos com a boa-fé, pois, de todo modo, é princípio iniciador de qualquer relação jurídica, Art. 113. “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé...” Nenhum contrato pode ser interpretado sem ela, a boa-fé objetiva, por esta razão, cabe aos contratantes ao estabelecerem a avença, depositarem sobre ela uma intenção verdadeira e honesta no cumprimento do pacto.

c. Costumes locais

Considerando países como o Brasil, em que há profundas variações na cultura em diferentes partes do território nacional, o legislador se preocupou na manutenção do contrato estabelecendo que sua interpretação deve ser observada em conformidade com os usos, ou costumes locais, Art. 113. “Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme (...) e os usos do lugar de sua celebração. ”

d. Interpretação restritiva – Contratos Benéficos e Cláusulas de renúncias

A luz do Código Civil a determinação a respeito da interpretação dos contratos benéficos, e as cláusulas contratuais que renunciam direitos devem ser interpretados estritamente, Art. 114. “Os negócios jurídicos benéficos e a renúncia interpretam-se estritamente. ” Optou o legislador, em estabelecer que os contratos gratuitos ou benéficos, como a doação, comodato, quando passados pelo crivo da interpretação, devem ser interpretados estritamente, em razão da gratuidade contratual, assim como as cláusulas que estabelecem a renúncia de direitos à parte contraente, não podem ser interpretadas subjetivamente, deve, neste diapasão, alcançar objetivamente o que nela está escrito.

3. POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS

Como visto, o contrato de doação é benéfico, por esta razão deve ser, conforme determinação legal, interpretado estritamente, não admitindo nenhum outro tipo de interpretação. Assim em julgado, o Tribunal de Justiça do Paraná, determinou a nulidade de ato jurídico correlacionado a contrato de doação celebrado por procurador, sem que estabelecesse no mandato a especificação estrita para tanto. Segue o julgado.

APELAÇÃO CÍVEL. NULIDADE DE ATO JURÍDICO C/C REINTEGRAÇÃO DE POSSE E PERDAS E DANOS. CONTRATO DE DOAÇÃO CELEBRADO POR PROCURADOR. MANDATO COM PODERES GENÉRICOS PARA ALIENAR E DOAR. CONTRATO DE DOAÇÃO. NATUREZA BENÉFICA. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. PECULIARIDADE DO ANIMUS DONANDI. NECESSIDADE DE OUTORGA DE PODERES ESPECÍFICOS, APONTANDO OS BENS A SEREM DOADOS E OS BENEFICIÁRIOS. CERCEAMENTO DE DEFESA INEXISTENTE. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. DESNECESSIDADE DE AUDIÊNCIA PRELIMINAR E DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE DISCUSSÃO QUANTO À HIGIDEZ MENTAL DA OUTORGANTE OU QUANTO À VALIDADE DO INSTRUMENTO PROCURATÓRIO. VALIDADE DOS DEMAIS ATOS DO PROCURADOR. HOUVE EXCESSO AOS PODERES SOMENTE NA DOAÇÃO. DECISÃO DE MÉRITO MANTIDA. HONORÁRIOS EXCESSIVOS. CPC, ART. 20, § 4º. DESNECESSIDADE DE APEGO AOS PARÂMETROS DE 10 A 20%. REDUÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. No contrato de doação firmado por procurador, somente se reconhece o animus donandi (vontade de doar) por parte deste, quando do instrumento de mandato constar, expressamente, a individualização do bem e o beneficiário da liberalidade, sendo insuficiente a cláusula que confere poderes genéricos para a prática do ato jurídico. (TJ-PR - AC: 1814288 PR 0181428-8, Relator: Dilmari Helena Kessler, Data de Julgamento: 20/03/2007, 7ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ: 7343).

Deste modo, a relatora afirma que o instrumento de mandato, deveria constar expressamente o bem a ser doado como também aquele que no caso o receberia, disposições contratuais não dispostas na avença.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

É comum os inúmeros casos de controversas, a respeito de interpretação de cláusulas contratuais. Levando em conta os princípios contratuais, a interpretação deve atender alguns critérios estabelecidos em Lei. Obviamente a devida atenção a estes critérios legais, irá dirimir os conflitos, preservando assim a estabilidade do negócio jurídico.

Por Francisco Edgar Nitão – Advogado em Contratos

https://edgarlnitao.jusbrasil.com.br/artigos/455654448/contrato-tracos-norteadores-para-interpretacao-contratual?utm_campaign=newsletter-daily_20170508_5251&utm_medium=email&utm_source=newsletter

Nenhum comentário:

Postar um comentário