Em um momento em que o Judiciário incentiva a conciliação e os acordos extrajudiciais, seria um contrasenso um tribunal não respaldar um pacto sem que houvesse vício de consentimento por uma das partes envolvidas. Para a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em nome da segurança jurídica, a realização de um acordo extrajudicial impede a discussão posterior, no Judiciário, da questão que foi objeto dessa transação. A Turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina para julgar improcedente uma ação de indenização proposta por uma passageira que sofreu acidente de ônibus.
O único fator que ensejaria a ação de indenização, afirmou a relatora do recurso no STJ, ministra Nancy Andrighi, seria vício na vontade. De acordo com ela, “o tribunal estadual não teceu nenhuma consideração acerca da existência de qualquer vício na manifestação de vontade da vítima que pudesse impedir o acordo extrajudicial de produzir efeitos”.
Pelo contrário. “No momento da assinatura do acordo, a recorrida [passageira] estava representada por um advogado, que também firmou o documento, inexistindo qualquer alegação da parte quanto à existência de algum vício de consentimento capaz de acarretar a invalidade do negócio jurídico”. Ou seja, não houve engano quanto a nenhum dos elementos essenciais ao negócio, como natureza, objeto, substância ou pessoa. “Ainda que, posteriormente, possa ter considerado insuficiente a quantia recebida, não se pode atribuir seu arrependimento a erro no momento da conclusão do negócio.”
Na decisão, a ministra Nancy Andrighi reconhece que a jurisprudência sobre o assunto ainda não é unânime. No entanto, para ela, essa heterogeneidade se deve ao modo como se dá cada caso concreto. “Torna-se indispensável a avaliação das circunstâncias existentes no momento em que o ato foi praticado e em que medida influenciaram o ânimo contratante”, explica.
O advogado Rodrigo de Assis Horn, do Mosimann, Horn & Advogados Associados, que representou a empresa, conta que a decisão incentiva a conciliação. “Feito o acordo, não existe a possibilidade de ajuizamento de ação para rediscutir as questões por ele abrangidas, salvo quando da ocorrência de dolo ou violência, em que a parte terá de pleitear a anulação da transação”, explica.
No caso, a passageira da Transporte Coletivo Estrela machucou o joelho em acidente ocorrido com o ônibus da empresa em 1999, na cidade de São José (SC). Em acordo celebrado com a empresa, a mulher recebeu um valor para o custeio do tratamento médico e, ainda, outro a título de compensação pelo período em que ficou afastada do trabalho. Os dois somaram R$ 3 mil. Insatisfeita, recorreu ao Judiciário pedindo indenização por danos materiais, morais, estéticos e pensão.
Ao rejeitar pedido por pedido, a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, lembrou, com base em entendimento do ministro Carlos Alberto Menezes Direito, que “a quitação plena e geral, para nada mais reclamar a qualquer título, constante de acordo extrajudicial, é válida e eficaz, desautorizando investida judicial para ampliar a verba indenizatória aceita e recebida”.
Em sentido contrário, o TJ-SC havia decidido que a quitação dada pela empresa, por ocasião da realização de acordo extrajudicial, não retira da passageira o direito de ajuizar ação pedindo a complementação da reparação dos danos sofridos em razão do acidente, "principalmente se o valor pago pela empresa de transportes responsável pelo sinistro, a título de danos morais, é ínfimo e não condiz com o ilícito causado”. O TJ havia fixado uma indenização de R$ 20 mil.
RE 1.265.890
Revista Consultor Jurídico
Nenhum comentário:
Postar um comentário