Trecho retirado das páginas 42 e 43
(...)Para prosseguirmos no presente estudo, ainda faz-se necessário adentrarmos, mesmo que brevemente, no conceito da união estável putativa, formulado a partir da teoria do casamento putativo (62), cuja origem etimológica do termo putativo advém do latim putativus (imaginário), putare (crer, imaginar).
Dentre inúmeras definições doutrinárias, podemos citar o conceito de Rodrigues, para quem o casamento putativo “[...] é o casamento reputado ser o que não é. A lei, por meio de uma ficção e tendo em vista a boa-fé dos contraentes ou de um deles, vai atribuir ao casamento anulável, ou mesmo nulo, os efeitos do casamento válido,[...]”.(63)
Trata-se de um regime de exceção dentro da teoria das nulidades do casamento perfeitamente aplicável ao instituto da união estável - equiparado à entidade familiar pelo Constituinte de 1988 -, para reconhecer-se efeitos pessoais, patrimoniais, em relação a terceiros e ao companheiro de boa-fé.
O instituto da união estável putativa é conceituado por Veloso (1997, p. 46) como sendo uma união paramatrimonial que, em razão da boa-fé de um ou ambos os companheiros, deve ser regida pelos mesmos princípios que orientam o casamento, nos termos seguintes: […] tratar-se-á de uma união estável putativa, que tem de gerar consequências patrimoniais à companheira, sem prejuízo da esposa, é óbvio (...) a união estável é
uma convivência qualificada, 'more uxorio', de caráter
notório dotada de estabilidade, permanência, com um
substrato moral relevante e o ânimo de permanecer
juntos, de constituir família. Os partícipes vivem
maritalmente, embora sem casamento. Conforme
antes mencionamos, a união estável de um casal
transmite a todos a aparência de um casamento
('marriage apparent, 'ménage de fait', como se diz na
doutrina francesa). Trata-se, pois, de situação
paraconjugal, paramatrimonial, estabelecendo
comunidade de vida à qual se aplicam, até pela íntima
semelhança, quase igualdade, os princípios do
casamento. E nosso sistema, nossa civilização só
admite o casamento monogâmico. Não iria transigir
com uma 'união estável' poligâmica ou poliândrica.
Mas pode acontecer de um dos parceiros estar de boa fé,
convicto que integra uma entidade familiar, com
todos os requisitos que a lei estipula, sem saber que o
outro mantém diversa união ou, até, outras uniões.
Podemos falar aqui, igualmente, com relação ao
convivente de boa-fé, numa união estável 'putativa',
para efeito de gerar consequências para este parceiro
inocente.
Em verdade, na união estável putativa, a companheira ignora a existência
de esposa ou de outras companheiras preexistentes e, por consequência,
desconhece os reflexos de tal união. A recíproca para o companheiro que, de
boa-fé, mantinha união com segurada casada e não separada de fato,
também é verdadeira.
Notas:
(62) O artigo 1561 do Código Civil disciplina que: “Embora anulável ou mesmo nulo, se contraído
de boa-fé por ambos os cônjuges, o casamento, em relação a estes como aos filhos,
produz todos os efeitos até o dia da sentença anulatória.”
(63) RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, v. 6. p. 111.
(...)
Trecho retirado das páginas 45 e 46
(...)
Nesta esteira, Pessoa destaca que:
Há que se antever situações nas quais o concubinato
pode ser puro somente para uma das partes, aquela
que se encontra de boa-fé, admitindo-se, em seu
favor, a proteção conferida pela lei, uma vez
encontrados nessa união putativa os elementos
essenciais e atendidos os fatores de eficácia próprios
da generalidade dos casos.(65)
Também Viana, reconhecendo a possibilidade de existir união
estável putativa, elenca como efeitos civis em favor do companheiro de
boa-fé, dentre eles, o direito à meação do patrimônio havido na constância da união estável e o de ser herdeiro, em não havendo descendente ou ascendente.(66)
No âmbito do regime geral de Previdência Social, a concorrência
do direito da companheira em relação à esposa legítima, no recebimento
do benefício previdenciário de pensão por morte, é analisada pela Autarquia
Previdenciária diante de cada caso concreto, “predominando o espírito
da lei sobre a forma, devidamente adequado ao fato social sobre o qual
incide”, nas palavras de Pires.(67)
No entanto, o mesmo não ocorre nos regimes próprios de Previdência
Social onde se verifica uma predominância do não reconhecimento
do direito da companheira putativa no recebimento de pensão por morte de
segurado casado.
Não é raro, no nosso dia-a-dia, nos depararmos com a situação da
dupla vida conjugal, na qual um homem/mulher consegue administrar uma
família, legalmente constituída, com outro relacionamento sério e duradouro,
do qual também é responsável pela administração e sustento dos
entes familiares.
Os Tribunais Superiores pátrios firmaram entendimento jurisprudencial (68),
ainda não unânime no Superior Tribunal de Justiça, acerca do
não reconhecimento do direito de perceber pensão por morte, pelo companheiro
do segurado falecido, ante a constatação de concubinato adulterino,
ainda que putativo.
(...)
Notas:
(65) PESSOA, Claudia Grieco Tabosa. Efeitos patrimoniais do concubinato. São Paulo: Saraiva,
1997. p. 46.
(66) VIANA, Marco Aurélio S. Da união estável. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 91.
(67) PIRES, Maria da Graça M. S. Soromenho. O concubinato no direito brasileiro. Rio de
Janeiro: Forense, 1998. p. 71.
(68) Em relação ao STF podemos citar: RE 590.779, Rel. Min. Marco Aurélio, 1 ª Turma, DJE
de 27/03/2009, disponível em . Acesso em 10 de abril de 2014; RE
397.762, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, DJE de 12/09/2008, disponível em
.
Acesso em 10 de abril de 2014; MS 27.871-MC, Rel. Min. Ellen Gracie, DJE de
17/03/2009, disponível em .
Acesso em 10 de abril de 2014; RE 491.039, Rel. Min.
Cezar Peluso, DJE de 05/08/2009, disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2382680>.
Acesso em 10 de abril de 2014.
Trechos do artigo A PROTEÇÃO DA UNIÃO ESTÁVEL
PUTATIVA NOS REGIMES
PREVIDENCIÁRIOS PÚBLICOS de Christiane Cruvinel Queiroz, publicado na Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca - v. 9, n. 2 (2014). - http://www.revista.direitofranca.br/index.php/refdf/article/view/253/237
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