Prima facie, improbidade administrativa é a caracterização atribuída pela Lei nº 8.429/92 a certas condutas praticadas por agentes públicos e por particulares que nelas tomem parte. Essas condutas são explicitadas pelos artigos 9º, 10 e 11 da aludida Lei, com a definição dos atos de enriquecimento ilícito, dos que acarretam lesão ao erário e daqueles que violam os princípios da Administração Pública, respectivamente[67].
Com isso, tem-se que a noção de improbidade administrativa que deriva do mencionado diploma legal é, de certa forma, abrangente, modificando qualquer referência legal ou doutrinária que, anteriormente à sua edição, vinculasse o termo de improbidade à ideia de desonestidade[68].
Como bem assevera a Procuradora da República Márcia Noll Barboza,
a partir da Lei de improbidade administrativa, devemos entender a improbidade administrativa como aquela conduta considerada inadequada – por desonestidade, descaso ou outro comportamento impróprio – ao exercício da função pública, merecedora das sanções previstas no referido texto legal[69].
No entanto, alguns doutrinadores[70] entendem que o comando legal em tela preocupou-se somente em definir os tipos de improbidade administrativa, sem, todavia, definir o que é ato ímprobo.
Dessa forma, ao deixar de definir o conceito jurídico de ato de improbidade administrativa, a Lei nº 8.429/92 permitiu que seu intérprete utilize-se de uma noção ampla da ação de improbidade administrativa, o que gera diversos equívocos, por possibilitar interpretações ampliativas ou analógicas contrárias ao princípio da reserva legal. Isso permitiu, até mesmo, que atos administrativos ilegais, praticados sem má-fé ou sem prejuízo ao ente público, fossem confundidos com os tipos presentes na aludida lei[71].
O professor Mauro Roberto Gomes de Mattos[72], inclusive, afirma ser a lei uma norma de conteúdo incompleto, assemelhando-se a uma norma penal em branco, ficando o aperfeiçoamento por conta de quem a interpreta.
Saindo, entretanto, do contexto da Lei de improbidade administrativa, faz-se mister entender algumas definições de importantes doutrinadores pátrios para se delimitar o seu conteúdo.
Vale ressaltar que a doutrina não define a improbidade administrativa de maneira consensual. A diversidade de definições e conceitos é resultado do enfoque que cada doutrinador destaca na análise da improbidade administrativa, em alguns momentos destacando aspectos da moralidade administrativa, e em outros dando maior ênfase ao enriquecimento ilícito do sujeito ativo que incorreu na conduta reprovável[73].
Alexandre de Moraes define os atos de improbidade administrativa como
aqueles que, possuindo natureza civil e definidamente tipificada em lei federal, ferem direta ou indiretamente os princípios constitucionais e legais da administração pública, independentemente de importarem enriquecimento ilícito ou de causarem prejuízo material ao erário público[74]
Por sua vez, Marino Pazzaglini Filho e outros autores, em uma análise introdutória sobre a questão em foco, constatam que
numa primeira aproximação, improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que sob diversas formas promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito Democrático e Republicano), revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo ‘tráfico de influência’ nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interessados da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos[75]
Atentando às diversas ligações entre os mais variados ramos do Direito, Antônio Lamarca, consagrado jurista do Direito do Trabalho, também ensina a sua definição de improbidade administrativa:
“improbidade” é a “falta de probidade”; mau caráter; desonestidade; maldade; perversidade (...) juridicamente, porém, o sentido deve ser menos amplo. A não ser assim, o prosseguimento de todo e qualquer vínculo empregatício ficaria sempre na dependência do bem caráter, da honradez e da ‘bondade’ (contrário da perversidade) do trabalhador: uma empresa de grandes proporções deveria manter em seus quadros milhares de obreiros honestos, bons, de bom caráter, o que seria o mais completo absurdo[76]
Ademais, o professor Mario Roberto Gomes de Mattos[77] entende ser o ato de improbidade administrativa “aquele em que o agente público pratica ato comissivo ou omissivo com devassidão (imoralidade), por meio de uma conduta consciente e dolosa. É a prática de ato lesivo ao erário, ou que demonstre uma moralidade qualificada” (MATTOS, 2010, p. 31).
Por fim, ainda no campo das definições, Wallace Paiva Martins Júnior assevera que
improbidade administrativa revela-se quando o agente público rompe com o compromisso de obediência aos deveres inerentes à sua função, e essa qualidade é fornecida pelo próprio sistema jurídico através de seus princípios e de suas normas das mais variadas disciplinas [...] significa servir-se da função pública para angariar ou distribuir, em proveito pessoal ou para outrem, vantagem ilegal ou imoral, de qualquer natureza, e por qualquer modo, com violação aos princípios e regras presidentes das atividades na Administração Pública, menosprezando os deveres do cargo e a relevância dos bens, direitos, interesses e valores confiados à sua guarda, inclusive por omissão, com ou sem prejuízo patrimonial[78]
SANTIAGO, Rafael da Silva. Improbidade administrativa: um estudo de seus aspectos teóricos gerais com exemplos práticos. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 3072, 29 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20531>.
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