A relação de convivência extra matrimonial entre pessoas de sexos diferentes sempre existiu nas sociedades.
A propósito, o casamento formal no Brasil remonta ao ano de 1.890,
quando foi instituído através do Decreto nº.181, de 24 de janeiro de
1.890. A partir daí passou o casamento civil a ser o único meio de
constituição de família legítima.
As uniões de fato eram desprezadas pelo direito, sendo, inclusive,
tratada pelo Código Civil revogado, Lei nº. 3.071/1.916, apenas com o
objetivo de proteger a família constituída pelo casamento formal, como
são exemplos: art.248, inciso IV(que legitima a mulher casada para
reivindicar os bens comuns, móveis ou imóveis, doados ou transferidos
pelo marido à concubina), art. 1.177 (proíbe a doação do cônjuge
adúltero ao seu cúmplice) e art.1.719, III (impede que a concubina seja
nomeada herdeira ou legatária do testador casado, ou o concubino de
testadora casada) etc.
Anteriormente ao casamento formal, a união entre um homem e uma mulher
reconhecida pela sociedade era aquela formada pelo casamento religioso,
uma vez que era considerado pela Igreja Católica como um sacramento,
sendo esse o ensinamento doutrinário que pregava.
Após o advento do Decreto nº. 181/1.890, que estabeleceu o casamento
formal, tanto as famílias que eram constituídas por mera convivência
duradoura dos cônjuges, bem como as famílias que se formavam pelo
casamento religioso eram consideradas como famílias compostas por
concubinos, tidas como famílias ilegítimas.
Com o passar do tempo, a jurisprudência brasileira passou a reconhecer a
existência no mundo jurídico daquela relação de convivência entre o
homem e a mulher não impedidos de casar, que era o considerado
“concubinato puro”.
Pacificando a jurisprudência, o Supremo Tribunal Federal acabou
editando quatro súmulas a respeito dessas relações não formais como o
casamento, mas sem impedimento para a sua realização. São as súmulas
número: 35; 380; 382 e 447.[2]
A Súmula nº. 35 previa o direito da concubina, em caso de acidente do
trabalho ou de transporte, ser indenizada pela morte do amásio, se entre
eles não havia impedimento para o matrimônio.
A Súmula nº. 380 trata da dissolução da sociedade de fato, reconhecendo
direito à partilha dos bens adquiridos na constância da união e pelo
esforço de ambos os conviventes, como segue: “Comprovada a existência de
sociedade de fato entre concubinos, é cabível a sua dissolução
judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”.
A Súmula nº382 trouxe inovação na relação concubinária, ao estabelecer
que a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é elemento
essencial à caracterização do concubinato.
Por fim, a Súmula 447, cujo teor é: “É válida a disposição
testamentária em favor do filho adulterino do testador com a sua
concubina”.
No período intermediário entre a edição do Código Civil Revogado
(1.916) e a entrada em vigor da Constituição de 1988, decretos e leis
foram editados, que, de alguma forma, davam destaque ao concubinato.
Exemplo disso: o Decreto-Lei nº. 4.737, de 24 de setembro de 1942, que
permitiu o reconhecimento dos filhos “naturais” ou “ilegítimos” após o
desquite; a Lei nº. 883, de 24 de outubro de 1949, que ampliou as
hipóteses de reconhecimento de filhos “ilegítimos”, em qualquer caso de
dissolução da sociedade conjugal; a Lei nº.5.890/73, que atribuiu
redação ao inciso I do art.11 da Lei Orgânica da Previdência Social –
LOPS, Lei nº.3.807, de 26/08/1.960, incluiu a companheira mantida há
mais de cinco anos como dependente dos segurados da previdência social
urbana; a Lei n. 6.515/77, cujo art. 51 atribuiu nova redação ao art.1º
da Lei nº.883, possibilitou o reconhecimento de filho havido fora do
casamento durante a vigência da sociedade conjugal, desde que se fizesse
por intermédio de testamento cerrado, aprovado antes ou depois do
nascimento do filho e, nessa parte, irrevogável; a Lei nº. 6.015/73
(art.57 e parágrafos), com redação da Lei 6.216/75, atribuiu direito a
concubina de adotar o nome do companheiro com vida em comum por, no
mínimo, cinco anos, ou se houver filhos em comum, desde que haja
impedimento legal para o casamento, decorrente do estado civil de
qualquer das partes ou de ambas; Lei nº. 4.069/62, cujo artigo 5º, §§ 3º
e 4º previu que a concubina seria a beneficiária da pensão deixada por
servidor civil, militar ou autárquico, solteiro, desquitado ou viúvo,
que não tenha filhos capazes de receber o benefício e desde que haja
subsistido impedimento legal para o casamento; Lei nº. 4.284/63, onde a
concubina seria beneficiária de congressista falecido no exercício do
mandato, cargo ou função; Lei nº. 4.103-A/62, que a concubina fosse
beneficiária de advogado; a Lei nº. 7.087/82 que regulamentava ser a
companheira dependente do segurado perante o Instituto de Previdência
dos Congressistas - IPC; o Decreto nº. 73.617/74, que estabeleceu ser a
companheira dependente do trabalhador rural; e a Lei nº. 7.210/84, que
instituiu a Lei de Execução Penal, permitiu o direito de visita pela
companheira ao preso e autoriza este a sair do estabelecimento em caso
de falecimento dela.
Finalmente, após o advento da Carta Política Pátria, que reconheceu a
união extra matrimônio como entidade familiar, batizando-a de União
Estável e elevando-a ao patamar de entidade familiar e
após, a edição da Lei n. 8.971/94, que regula o direito dos companheiros
a alimentos e à sucessão, cujo art. 1º concedeu à companheira ou ao
companheiro, na união estável (concubinato puro), após a convivência de
cinco anos ou a existência de prole, o direito a alimentos, nos moldes
da Lei n. 5.478, de 25 de julho de 1968, enquanto não constituir nova
união e desde que prove a necessidade, iniciando, assim, os efeitos
patrimoniais da união estável.
No campo doutrinário, Maria Helena Diniz (2003: p.109-116), ao tecer
comentários acerca do §3º do art.226 da CF/88, afirma que a citada norma
constitucional não teria eficácia imediata, portanto, é norma com
eficácia relativa complementável de princípio institutivo, sendo que
esse princípio seria o de que a união estável é entidade familiar. Logo,
não é auto - aplicável. É norma cuja aplicação depende de outra
posterior, que dê corpo à instituição a que aquela se refere. Para a
renomada autora, enquanto a norma posterior não for editada, a norma
constitucional não produz efeitos positivos, mas apenas paralisa os
efeitos de normas contrárias a ela.
E regulamentando o §3º do art.226 da Lei Máxima Pátria, foi editada a
Lei n. 9.278/96 que passou a estabelecer um regime de bens básico para
as uniões estáveis, adotando o regime semelhante ao da comunhão parcial,
em que os companheiros amealhavam um patrimônio comum, sendo presumida a
colaboração mútua durante a união. O artigo 5º dessa lei estabelece que
em não havendo estipulação em contrato escrito, os bens móveis e
imóveis adquiridos, onerosamente, por um ou por ambos os concubinos
durante a convivência, são considerados fruto do trabalho e da
colaboração comum, pertencendo a ambos, em condomínio e em partes
iguais, mas para isso, a união tem que ser duradoura, notória, pública,
contínua e tenha sido estabelecida com objetivo de constituição de
família. O parágrafo único desse dispositivo concede ao companheiro
sobrevivente o direito real de habitação, relativamente ao imóvel
destinado à residência da família, porém, passando a ser extinto
referido direito quando o seu titular contrair nova união ou se casar.
Ainda essa última lei editada em 1.996 veio atribuir aos
conviventes/companheiros idênticos direitos e deveres como no casamento
formal, quais sejam respeito e consideração mútua, a assistência moral e
material recíprocas, a guarda, o sustento e a educação dos filhos
comuns, de forma partilhada.
Como a Lei nº.9.278/96 veio para regulamentar o §3º do art.226 da
CF/88, o seu artigo 9º estabelece a competência para julgar as questões
relativas ao concubinato, como sendo das Varas de Família, admitindo que
possa ser adotado o segredo de justiça, modificando o art.155, inciso
II do Código de Processo Civil.
Essa Lei nº. 9.278/96 gerou controvérsia por haver redefinido a união
estável sem ter atribuído lapso temporal ou exigir a existência de prole
para o seu reconhecimento, diferentemente do que estabelecia a Lei nº.
8.971/94, no seu art. 1º. Como se percebe a modificação veio a revogar o
art. 1º da Lei nº. 8.971/94 e, por conseguinte, resultou em que a
caracterização da união estável dependa das circunstâncias do caso
concreto.
Tem-se conhecimento de que, após a edição dessas leis, foi criado um
Projeto de Lei, n. 2.686 de 1996, Estatuto da União Estável, de autoria
do então Ministro da Justiça, Nelson Jobim, objetivando sistematizar a
União Estável, entanto foi vetado.
No art.1º do referido projeto, estava estabelecido que: “É reconhecida
como união estável a convivência, por período superior a cinco anos, sob
o mesmo teto, como se casados fossem, entre um homem e uma mulher, não
impedidos de realizar matrimônio ou separados de direito ou de fato dos
respectivos cônjuges.” Tal norma, sendo de caráter geral, deveria se
sobrepor ao Código Civil Brasileiro.
Hoje, a mais recente norma legal que regula a União Estável é o Novo
Código Civil com vigência a partir de 01/01/2003, que dedicou o Título
III exclusivamente à União Estável dentro do Livro IV - Do Direito de
Família, regulando-a na forma da Carta Política Pátria e da Lei nº.
9.278/96.
O art.1.723 do Código Civil reconhece como entidade familiar a união
estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública,
contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituir uma
família, não se configurando, no entanto, se presentes os impedimentos
legais do casamento, aqueles previstos no art.1.521 da Lei Civil,
excetuando-se o caso em que a pessoa casada se ache separada de fato ou
judicialmente.
Como na Lei nº.9.278, o art. 1.724 do Código Civil enumera os deveres
recíprocos aos companheiros, que são os deveres de respeito e
assistência, e o de guarda, sustento e educação dos filhos, inovando com
o dever de lealdade, que nada mais é que a fidelidade estabelecida no inciso I do art.1.566 do Código Civil como um dever do casamento.
Em relação aos efeitos patrimoniais decorrentes da União Estável, o
art.1.725 do CC estabelece o regime de comunhão parcial de bens, onde
serão partilhados entre eles os bens adquiridos durante a constância,
ressalvando o caso em que haja contrato escrito pelos companheiros.
Seguindo as prescrições constitucionais do §3º do art.226 da
Constituição Federal/88, o art. 1.726 do CC dita que a união estável
possa ser convertida em casamento por meio de pedido formulado pelos
companheiros ao juiz, como o respectivo assento no Registro Civil.
Por fim, encerrando os regramentos acerca da União Estável, o art. 1.727 do Novo Código Civil diferencia a união estável do concubinato,
que era denominado pela doutrina de “concubinato impuro”, estabelecendo
que as relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de
casar, constituem concubinato, portanto, não constituem união estável.
De todo o exposto, conclui-se que para a União Estável se configurar é mister que estejam presentes requisitos como a união entre homem e mulher, que ambos convivam, portanto, o dever de coabitação, que também existe no casamento,
embora a doutrina e a jurisprudência admitam domicílios separados, a
teor do disposto na Súmula nº382 do STF, ao estabelecer que a vida em
comum sob o mesmo teto, more uxório, não é elemento essencial à
caracterização do concubinato, e que essa convivência seja pública, contínua e duradoura.
Ressalte-se que a doutrina majoritária admite que a coabitação é
elemento essencial para a configuração da união estável, uma vez que
esta deve ter aparência de casamento, embora não negue eficácia à citada
Súmula 382, refletindo uma situação de exceção.
Encerrando o tema, o que se percebe é que a corrente mais literal de
interpretação da união estável exige três condições básicas para a sua
configuração: a notoriedade, a fidelidade e a continuidade da relação.
SILVA, Ivete Sacramento de Almeida. A sentença declaratória de união estável como prova plena da condição de dependente perante a previdência social. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3479, 9 jan. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23422>. Acesso em: 11 jan. 2013.
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