O direito a alimentos, como mencionado anteriormente, apresenta como
uma de suas características a irrepetibilidade. Assim, mesmo que reste
demonstrado que os alimentos foram pagos indevidamente, não incidirá
como conseqüência a obrigação de restituir o indevido. É o princípio da
dignidade da pessoa humana e o direito à vida que orientam tal
entendimento.
Nesse sentido, cabe relembrar a redação do art. 6º da Lei de Alimentos
Gravídicos, segundo a qual o juiz fixará os alimentos considerando a
existência de indícios de paternidade, sendo tais alimentos devidos até o
nascimento da criança. Após o nascimento com vida, aí sim surgirá a
possibilidade de realização do exame pericial.
A partir deste momento, é gerada grande celeuma: a possibilidade de,
nascendo a criança e realizado o exame pericial, concluir-se pela
ausência de vínculo jurídico entre o menor e o indigitado pai, tendo o
requerido já contribuído durante toda a gestação. Diante dessa questão, o
art. 10 (vetado) da lei nº 11.804/08, estabelecia que, em caso de
resultado negativo do exame pericial de paternidade, a autora
responderia objetivamente pelos danos morais e materiais causados ao
réu. Ademais, esclarecia no parágrafo único, que a indenização seria
liquidada nos próprios autos.
Segundo razões do veto presidencial, o referido dispositivo trata de
norma intimidadora, uma vez que cria hipótese de responsabilidade
objetiva, em detrimento do exercício regular de um direito, ou seja,
pelo simples fato de se ingressar em juízo e não obter êxito. Esta
possibilidade abre espaço a que toda ação desacolhida, rejeitada ou
extinta confira direito indenizatório ao réu, tratando-se de flagrante
afronta ao princípio Constitucional de acesso à Justiça, dogma norteador
do estado democrático de direito.[11]
O fato é que, com razão, a disposição foi vetada.
Por outro lado, ainda que afastada a hipótese de responsabilidade
objetiva da gestante, que é aquela apurada independentemente de culpa do
agente causador do dano, discute-se acerca da possibilidade de ser
permitida a indenização quando constatado o dolo, isto é, quando a
gestante postula em juízo os alimentos gravídicos conhecendo plenamente
que o demandado não é o genitor da criança.
Nesse sentido, concebe-se por dolo, a intenção deliberada de ofender o
direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, ou seja, quando há o
absoluto conhecimento do mal e o direto propósito de praticá-lo.[12]
Nesse aspecto, o princípio da irrepetibilidade dos alimentos deveria ser flexibilizado, sob pena de enriquecimento ilícito.[13] Nas palavras de Débora Rezende Cardoso,
Admitir a aplicação irrestrita da regra da irrepetibilidade dos
alimentos significaria admitir que o sistema jurídico brasileiro tolera o
enriquecimento sem causa no Direito de Família, isto é, ainda que a
verba alimentar seja paga indevidamente, não gera a obrigação de
restituição, criando evidente desequilíbrio patrimonial. [14]
Ocorre que, apesar da regra da impossibilidade de repetibilidade dos
alimentos e de indenização ao réu pelos prejuízos a ele causados, deve
ser ressaltado que o Código Civil atual, em geral o Direito, também não
compadece com a má-fé, reprime o abuso de direito e pune a postura
desleal. Em verdade, as condutas humanas deveriam revestir-se de
princípios éticos e do dever de probidade.
O fato de alguém se beneficiar dos rendimentos do trabalho do outro sem
justa causa, constitui enriquecimento ilícito, impondo-se a
restituição, ainda que se trate de relações familiares, pois, é
importante que se diga, das relações familiares também emerge a
necessidade ímpar de justiça, licitude e bom senso.[15]
Assim, caso fique demonstrado o dolo, a má-fé ou o exercício abusivo do
direito por parte da gestante na ação de alimentos gravídicos, pode o
réu, considerando a ausência do vínculo de paternidade e a existência de
dano por ele sofrido, pleitear indenização contra a mãe da criança.
SOUZA, Ilara Coelho de. Alimentos gravídicos: responsabilidade civil da gestante pela ausência de vínculo jurídico entre alimentando e alimentante. Jus Navigandi, Teresina, ano 18, n. 3474, 4 jan. 2013 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/23375>. Acesso em: 11 jan. 2013.
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