quarta-feira, 27 de abril de 2022

Live ao vivo dia 27/04/22 - no @ibdfamgoias - A efetividade jurídica do contrato de namoro

 Para assistir acesse: https://www.instagram.com/tv/Cc3xBPuh9ig/?igshid=YmMyMTA2M2Y=




#REPOST @ibdfamgoias

No próximo dia 27 de abril, o IBDFAM Goiás promoverá a Live: A efetividade jurídica do contrato de namoro.

Neste evento faremos o lançamento do livro: Direito de Família - Diálogos Interdisciplinares, que tem a assinatura da nossa presidente Marlene Farinha, no prefácio do livro.

A transmissão será pelo Instagram do IBDFAM GOIÁS, a partir das 18h30 e contará com a participação: Adriano Cielo Dotto e Patrícia F. L. Donzele Cielo.
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segunda-feira, 11 de abril de 2022

Ações possessórias e reivindicatórias - distinção e aspectos controversos

 Júlio César Bueno, Victor Madeira Filho, Danilo Gallardo Correia e Riccardo Fraga Napoli

A comparação entre as ações possessórias e reivindicatórias ainda hoje constitui árdua tarefa para os operadores do Direito. Os juristas se sentem intrigados diante desses meios de tutela jurisdicional, vez que a legislação pátria não se mostra suficientemente clara em alguns dos dispositivos a eles atinentes. Num primeiro momento, parece simples a distinção entre as ações. No juízo possessório, ou seja, em conflitos que envolvem posse, apenas a posse é tratada como fato e também como fim a ser alcançado.

sexta-feira, 19 de maio de 2006

1. -      A comparação entre as ações possessórias e reivindicatórias ainda hoje constitui árdua tarefa para os operadores do Direito. Os juristas se sentem intrigados diante desses meios de tutela jurisdicional, vez que a legislação pátria não se mostra suficientemente clara em alguns dos dispositivos a eles atinentes. Num primeiro momento, parece simples a distinção entre as ações. No juízo possessório, ou seja, em conflitos que envolvem posse, apenas a posse é tratada como fato e também como fim a ser alcançado. Já, no âmbito revindicatório, discute-se matéria relativa à propriedade e visa-se ao reconhecimento do domínio¹.

 2. -      Nesse contexto, se um mero possuidor (não-proprietário) for turbado na posse pelo legítimo proprietário, poderá ele ajuizar ação de manutenção de posse contra o último, visto que, nessa hipótese, o que importa não é socorrer o direito de propriedade daquele que tem o domínio ("o proprietário"), mas tutelar a posse do indivíduo turbado ("o possuidor"). Portanto, se o autor alegar justa posse sobre a coisa, sem base no domínio, este definitivamente não servirá de exceção ao réu, mesmo que seja legítimo proprietário da coisa (vide artigo 1.210, §2°, do Novo Código Civil²). Quando muito, sua invocação servirá apenas, em casos específicos, de reforço no contraditório.³


3. -      Nada obstante, existem casos em que o autor ajuíza ações possessórias com base simplesmente no domínio, o que, a nosso ver, configura uma anomalia em relação à causa de pedir do processo possessório4. Para a solução desses casos, aplica-se a súmula 487 do STF, que dispõe: "será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio, se com base neste for ela disputada". Isso posto, cabe ainda analisar o artigo 923 do Código de Processo Civil ("CPC"), que assim prescreve: "Na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar ação de reconhecimento do domínio". É aqui, precisamente, onde reside um dos pontos mais polêmicos entre as ações possessórias e as reivindicatórias.


4. -      Apesar da letra da lei ser bastante clara, entendemos que impedir o proprietário de ajuizar ação reivindicatória seria violar-lhe o direito constitucional de ação. Ademais, o  referido dispositivo acaba, também, dando respaldo legal a quem, ardilosamente, queira ajuizar uma ação possessória simplesmente para impedir a recuperação da coisa pelo seu legítimo dono. Por essa razão, tanto a nossa doutrina como a nossa jurisprudência vêm refutando a interpretação literal do artigo 923 do CPC. O próprio Supremo Tribunal Federal, mesmo tendo entendido não ser inconstitucional o artigo 923 do CPC, já se manifestou no sentido de restringir a interpretação desse dispositivo aos casos em que o processo possessório é fundado simplesmente no domínio5.


5. -      Sob essa ótica, entendemos ser a melhor interpretação do artigo 923 do CPC a seguinte: 


(i)         Ação possessória fundada em domínio: Aplicação literal do artigo 923 do CPC - Inadmissibilidade do réu propor ação reivindicatória, sob pena de restar configurada a litispendência.


(ii)        Ação possessória sem fundamentação no domínio: Não se dá a aplicação literal do artigo 923 do CPC - Admissibilidade do réu propor ação reivindicatória, sob pena de violação de seu direito constitucional de ação (artigo 5°, XXXV, da Constituição Federal: "A lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"). 

6. -      Repise-se que, se tal interpretação restritiva não fosse adotada, cometer-se-ia uma grande injustiça, posto que seria dada margem a ações possessórias intentadas com o único e antiético intuito de impedir a recuperação da coisa pelo seu legítimo dono, pois este ficaria impedido de recorrer à reivindicação, enquanto a possessória não estivesse definitivamente julgada.

 

7. -      Assim sendo, por regra geral, pode-se dizer que as ações possessórias diferenciam-se das reivindicatórias na medida em que as primeiras têm como causa de pedir o jus possessionis (a posse como fato) e visam à manutenção ou à reintegração de posse sobre a coisa, enquanto as últimas têm como causa de pedir o jus possidendi (a propriedade) e visa ao reconhecimento do direito de gozar, fruir e dispor da coisa. Anomalia, porém, a essa regra consiste na hipótese de ser ajuizada ação possessória com fundamento exclusivo no domínio, em que será deferida a posse a quem, evidentemente, tiver o domínio (Súmula 487 do STF) e será aplicado o artigo 923 do CPC de forma literal.

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1 Nesse sentido, o ensinamento de TITO FULGÊNCIO acerca dos processos petitório e possessório: "o possuidor é protegido pelo simples fato de o ser; a ação possessória é independente e distinta da petitória; aquela se apóia na posse como puro estado de fato, a última tem por fundamento a ofensa de um direito". (Da Posse e das Ações Possessórias, vol. 1, 7ª edição, Editora Forense, Rio de Janeiro, 1994, p. 281).

2 Art. 1.210, §2°, do Novo Código Civil: "Não obsta à manutenção ou reintegração de posse a alegação de propriedade, ou de outro direito sobre a coisa".

3 Nesse sentido, citando os ensinamentos de Pontes de Miranda, afirmam Paulo Tadeu Haendchen e Rêmolo Letteriello: "A circunstância de na reintegração ser possível a alegação excepcional de domínio não importa em atribuir a ambas a ações, a dominial e a possessória, a mesma causa de pedir, porque, na possessória, a invocação do domínio na realidade sequer é exceção mas simples alegação de peso a mais em caso de dubiedade das provas" (sem grifos no original).T. HAENDCHEN, R. LETTERIELLO, Ação Reivindicatória, 5ª edição, São Paulo, Ed. Saraiva, 1997, p. 152.

4 "Ação possessória. 'judicia duplicia'. Prova testemunhal e pericial. Não cabe, em sede possessória, a discussão sobre o domínio, salvo se ambos os litigantes disputam a posse alegando propriedade ou quando duvidosas ambas as posses alegadas (...)" (Superior Tribunal de Justiça, 4ª turma, rel. min. Athos Carneiro, Resp n° 5.462-MS, j. 20.8.1991, v.u.) (sem grifos no original).

5 "Na pendência de processo possessório, fundado em alegação de domínio, é defeso tanto ao autor como ao réu intentar a ação de reconhecimento de domínio - art. 923 do CPC. Procedente. RE conhecido e provido para julgar os autores carecedores de ação reivindicatória". (Supremo Tribunal Federal, 2ª turma, rel. min. Cordeiro Guerra, RE n° 89.179-0-PA, j. 3.8.1979, v.u.) (sem grifos no original).

"(...) Somente naqueles casos em que a disputa de posse se baseia em título dominical é que há de se aplicar o artigo inquinado. Fora daí, o proprietário tem o direito de reivindicar a propriedade de quem quer que a detenha injustamente". (Supremo Tribunal Federal, sessão plenária, rel. min. Moreira Alves, RE n° 87.344 - MG, j. 14.9.1978) (sem grifos no original).

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*Advogados do escritório Pinheiro Neto Advogados

* Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.

© 2006. Direitos Autorais reservados a PINHEIRO NETO ADVOGADOS

Epa! Vimos que você copiou o texto. Sem problemas, desde que cite o link: https://www.migalhas.com.br/depeso/24726/acoes-possessorias-e-reivindicatorias---distincao-e-aspectos-controversos


segunda-feira, 4 de abril de 2022

TRT-2: Mulher tem veículo penhorado por dívidas do marido

 O colegiado destacou que o fato de se tratar de bem indivisível não impede a penhora, "por não prejudicar a meação".

sexta-feira, 1 de abril de 2022

 

A 16ª turma do TRT da 2ª região reconheceu como legítima a penhora de um carro adquirido pela esposa de um devedor trabalhista. O colegiado entendeu que a mulher deixou de comprovar regime de bens capaz de impedir a penhora.

Os autos mostram que o bem constava na declaração do imposto de renda do devedor porque sua esposa, a proprietária, está no mesmo documento na condição de dependente. No entanto, a mulher deixou de comprovar regime de bens capaz de impedir a penhora. Com isso, o carro foi considerado parte do patrimônio comum do casal.

 

Ao analisar o caso, a desembargadora Dâmia Ávoli, relatora, destacou que o fato de se tratar de bem indivisível não impede a penhora, "por não prejudicar a meação". Assim, parte do valor obtido com a venda judicial do veículo seria destinado à esposa e outra parte à satisfação da dívida.

 

Meação é a divisão ideal de bens comuns entre os dois integrantes de um casal. 

Para a magistrada, "não resta outra alternativa a não ser a improcedência dos embargos de terceiro, uma vez que a embargante não comprovou inequivocamente a impossibilidade jurídica de constrição sobre o bem litigioso".

 

Nesse sentido, o colegiado, por unanimidade, autorizou o prosseguimento da penhora do veículo.

 

Processo: 1000301-30.2021.5.02.0351

Leia o acórdão.

Informações: TRT da 2ª região.

Por: Redação do Migalhas

Atualizado em: 1/4/2022 18:30

Fonte: https://www.migalhas.com.br/quentes/362997/trt-2-mulher-tem-veiculo-penhorado-por-dividas-do-marido

domingo, 3 de abril de 2022

Estelionato sentimental, o amor mais líquido do que nunca

Melissa Aparecida Batista de Souza

"Vivemos tempos líquidos, nada hoje é para durar", Zygmunt Bauman.

terça-feira, 29 de março de 2022

O estelionato, figura típica do Direito Brasileiro prevista no artigo 171 do Código Penal pátrio e já bastante conhecida na prática forense e na vida do lado de fora do fórum, é resumida e penalizada na forma do artigo retro mencionado da seguinte forma: "CP, art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa [...].

Daí, dado o extenso rol de possibilidades contido neste curto texto legal, não falta à mente humana criatividade para dar vida ao artigo no mundo dos fatos das mais variadas maneiras e através do uso dos mais variados ardis possíveis e necessários ao atingimento do resultado almejado: a satisfação do interesse próprio através da ilusão criada na mente do outro. Quando mais predador o método, melhor.

É o estelionatário, ainda que não saiba, seguidor da doutrina de Montesquieu quando esta diz que "que os fins justificam os meios", sendo é claro, interpretada ao seu próprio modo ilícito. Não importa o meio, o que importa é o fim, o resultado a ser atingido e também sem saber, utilitarista que é, o autor do crime estará buscando "agir sempre de forma a produzir a maior quantidade de bem-estar", sem muito apego as consequências para a outra parte, essa é a principal máxima do utilitarismo proposto primeiramente por Jeremy Bentham (1748-1832) e John Stuart Mill (1806-1873)¹.

E deste modo, dentre todas as possibilidades de usos e combinações de artifícios, ardis, ou quaisquer outros meios fraudulentos para obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, uma que, embora desde sempre tenha existido, mas que vem ganhando enfoque no cenário jurídico por ser um tema recente, cunhado em 2015 em uma ação de indenização por danos materiais e morais julgada pelo poder Judiciário da União-Distrito Federal é o chamado estelionato sentimental, ou afetivo.

O estelionato sentimental consiste na prática do fato típico, ilícito e culpável da forma anteriormente descrita, com o adendo de que o meio utilizado para o alcance dos efeitos é o sentimento e a afetividade na qual é envolvida a vítima, isto em qualquer tipo de relacionamento social, sendo, no entanto, mais comuns entre relacionamentos ditos amorosos, ou em sua premeditada encenação.

Consiste em um ilícito no qual o (a) criminoso (a) cria a falsa realidade de uma relação afetiva com a vítima, mas com aparência bastante promissora, utilizando-se do afeto, da boa-fé e da lealdade desta para, com abuso de confiança, malícia e sordidez, obter dinheiro ou qualquer outro tipo de vantagem, ou seja, para "dar o golpe".

Prática essa que vem avançando junto com o uso das redes sociais e dos meios de comunicação de modo geral, que constituem alguns dos recursos mais utilizados na prática deste crime, já que neles qualquer um pode ser e dizer o que quiser.

O termo estelionato sentimental não está presente no Código Penal, de modo que a justiça trata esses casos como estelionato simples quando não há a presença de qualificadoras, como idade avançada, por exemplo: "CP, art. 171 [...] § 4º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é cometido contra idoso ou vulnerável, considerada a relevância do resultado gravoso".

Não obstante, a repercussão do caso fático pode se dar tanto no âmbito penal quanto no âmbito cível, uma vez que tais casos configuram perfeitamente a quebra da boa-fé estipulada pelo Código Civil em seu art. 187 que diz claramente que "CC, art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes", o que é passível de reparação por danos matérias e também morais, como leciona o mesmo códex, nos artigos seguintes:

CC, art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. [...] Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

E quanto ao aspecto moral, sua garantia é ainda de ordem constitucional:

CRFB, art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] V. é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; X. são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

Logo, é importante considerar que a reparação, na qual se convertem em pecúnia os danos causados, deve sopesar todas as circunstâncias que possam influenciar na fixação do quantum indenizatório, levando em consideração que o dano abrange, além das perdas valorativas internas, as exteriorizadas no relacionamento diário pessoal, familiar, profissional e social da pessoa ofendida, diante da situação vexatória à qual se viu exposta e de suas consequências psicológicas de longa duração 8.

Sendo importantíssimo um ressarcimento não apenas de ordem financeira, mas também de ordem moral, que visa não apenas apenas a reparação patrimonial da vítima, mas também uma punição educativa em face do (a) autor (a) do delito cível-criminal, de modo que lhe seja desencorajada a prevalência dessa postura criminosa perante a sociedade.

O referido ilícito penal e cível costuma ocorrer com o mesmo modus operandi, que, no entanto, nem sempre pode ser facilmente identificado pela vítima, afinal, o golpe é muito bem-aplicado. Quem o aplica mostra-se como alguém inteligente, perspicaz e que sabe realizar uma perfeita leitura não apenas da situação, mas também da vítima, sendo por esse motivo tal crime um verdadeiro crime intelectual² acompanhado também de um nítido vício de consentimento³.

O (a) autor (a) do ilícito muito comumente se apresenta como uma pessoa perfeita, cheia de valores e princípios, carinhosa e atenciosa, e que se coloca como a parte frágil, vulnerável e dependente da intensa relação de amizade, afeto e amor criada entre as partes, podendo até mesmo, inicialmente, oferecer vantagens de qualquer cunho à vítima, para dar mais crédito à empreitada, mas já sabendo que a sua simples presença na vida da outra parte já constitui a própria vantagem em si, uma vez que esta já se encontra dependente e viciada na atenção que lhe é dispensada.

A partir desse momento é então iniciado ou intensificado o agir do(a) autor(a), que com abuso do direito de ajuda passa a requisitar frequentemente ou até mesmo exigir benefícios da vítima em seu favor. Como dito anteriormente, tais benesses podem ser tanto de cunho financeiro direto, como o pagamentos de contas, viagens, empréstimos e a compra, transferência ou até mesmo a doação de bens materiais; até a satisfação de outros interesses econômicos indiretos, como aproveitar-se do conhecimento técnico/acadêmico da vítima para a prática de algum ato intelectual em seu favor, ou do acesso desta a simplesmente qualquer coisa que lhe traga algum benefício, etc..

Assim, após o alcance de razoável e satisfatória vantagem, o ato posterior é afastar-se consideravelmente, ou até mesmo desaparecer completamente da vida da vítima, o que lhe deixará em um estado misto de confusão mental e com um sentimento de culpa por toda a situação que lhe será intencionalmente implantado pelo (a) estelionatário (a), até o momento em que perceberá que foi vítima de um golpe, o que, com a reunião das provas que possui, lhe dará a possibilidade de buscar os meios judiciais reparatórios anteriormente descritos. Serão possíveis a repercussão penal mediante ação penal privada condicionada à representação, e a repercussão cível através da ação de indenização por danos materiais e a ação de indenização por danos morais, sendo que estas duas últimas poderão correr nos mesmos autos.

Caso recente foi o julgado pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. A decisão é da sua 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais que constatou que: "O réu se valeu dos sentimentos da autora, envolvendo a vítima com declarações, e da confiança amorosa típica de um casal, além de promessas, como a de um futuro casamento, a induziu e manteve em erro, com o intuito de obter vantagens, praticando assim estelionato afetivo".

Motivo pelo qual entendeu o órgão julgador que: "restou comprovada a afronta a direito da personalidade, notadamente a incolumidade psíquica da recorrida, que foi severamente atingida na sua afetividade ante a conclusão de que o interesse do recorrente cingia-se à esfera material".

Dessa forma, em decisão unânime, a Turma Recursal manteve a sentença que condenou o réu ao ressarcimento do prejuízo de R$ 23.227,00 sofrido pela vítima, referente a presentes recebidos pelo condenado, acrescidos de juros e correção monetária, e ao pagamento de R$ 4.000,00 pelos danos morais afligidos pelo injusto cível.

Como no caso visto acima, costumam ser mais frequentes a notícia de casos envolvendo mulheres porque geralmente estas buscam mais por ajuda e pela satisfação judiciária, mas neste tipo de estelionato é comum a verificação de vítimas de qualquer sexo ou orientação sexual. Não existe barreiras ou parâmetros para o desrespeito aos valores decorrentes da boa-fé objetiva: lealdade e confiança.

Para o criminalista Rogério Greco "desde que surgiram as relações sociais, o homem se vale de fraude para dissimular seus verdadeiros sentimentos, intenções, ou seja, para, de alguma forma, ocultar ou falsear a verdade, a fim de obter vantagens que, em tese, lhe seriam indevidas" 4.

A liquidez das atuais interações humanas já não é apenas uma de suas características como também vem se tornando com cada vez mais força umas das razões de sua existência. Ela deixa de ser apenas um de seus elementos para se tornar o principal motivo pelo qual muitas delas surgem, uma vez que visam tão somente vantagens individuais que não estabelecem qualquer ligação duradoura com o elemento beneficente.

Uma vez que surgem, e delas é tirada a vantagem almejada na sua constituição, qualquer relação entre os seres humanos pode ser desfeita, da mesma forma como surgiram, fluída e rapidamente, como é típico do ser humano se comportar com qualquer serviço ou mercadoria.

 Após isso, a mercadoria será obrigada a se reinventar, inovar e se tornar mais resistente, para em seguida poder atender novamente as demandas do mercado da vida e das relações sociais humanas, como reflete Bauman, ao afirmar que, "ninguém pode manter segura sua subjetividade sem reanimar, ressuscitar e recarregar de maneira perpétua as capacidades esperadas e exigidas de uma mercadoria vendável".

Não tenha medo de dizer não.

É crime, denuncie.

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¹ Tal doutrina fundamenta-se no princípio de utilidade, que determina que a ética deve basear-se sempre em contextos práticos, pois o agente moral deve analisar a situação antes de agir, e sua ação deve ter por finalidade proporcionar a maior quantidade de prazer (bem-estar) ao maior número de pessoas possível para que seja moralmente correta. Dessa maneira, o utilitarismo descarta por completo o imperativo categórico kantiano, tirando toda a correção moral de uma razão universal e oferecendo-a ao sujeito. É uma doutrina moral consequencialista, ou seja, que visa às consequências das ações morais em detrimento das próprias ações morais. O que importa, nesse sentido, é o resultado de certa ação, e não a própria ação. Isso significa que o agente moral deve estar sempre atento ao que vai acontecer se fizer algo. Também abre brechas para que o agente moral possa praticar certas ações que foram, muitas vezes, condenadas pela ética, como a mentira. PORFÍRIO, Francisco. Utilitarismo. Brasil Escola. Disponível em: https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/utilitarismo.htm. Acesso em 28 de março de 2022

² Crime intelectual é aquele praticado com um considerável desempenho de uma atividade de natureza mental e relacionado com o intelecto e a inteligência do autor do crime, o que é comum, e pode-se dizer inerente, aos crimes de estelionato.

³ Os vícios de consentimento de acordo com o Código Civil, são: erro ou ignorância, dolo, coação, lesão e estado de perigo. O erro ou ignorância consiste em uma falsa ideia da realidade e do real estado e situação das coisas. O erro incutido na mente da pessoa, a leva a supor uma coisa que na verdade é outra, ou não existe, o que torna o negócio anulável.

4. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, volume III. 11 Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2014.

5. D'AMICO, Anahy. ESTELIONATO SENTIMENTAL | ANAHY D'AMICO. Papo com Anahy D'amico. You Tube, 27 de abril de 2020. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=2mjayrbMMQE. Acesso em 28 de out. de 2022.

6. DOS SANTOS, Fábio Celestino. ESTELIONATO SENTIMENTAL - QUANDO O AMOR PAGA A CONTA. O estelionato afetivo ainda é um tema que causa muita polêmica entre profissionais e estudiosos do direito. [s.l]: Brasil Escola, [s.d]. Disponível em: https://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/atualidades/estelionato-sentimental-quando-amor-paga-conta.htm. Acesso em 28 de out de 2022.

7. ODORISSI, Denise. Golpistas usam redes sociais para praticar estelionato sentimental. Domingo Espetacular. You Tube, 11 de ago. de 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sH1PJCgYtBU. Acesso em 28 de out de 2022.

8. SPAGNOL, Débora. "Estelionato sentimental": crime ou abuso de confiança?. [s.l]: Jus Brasil, 2016. Disponível em: https://deboraspagnol.jusbrasil.com.br/artigos/417697597/estelionato-sentimental-crime-ou-abuso-de-confianca. Acesso em 28 de out de 2022.

9. Vítima de estelionato sentimental receberá indenização de ex-parceiro. O homem recebeu mais de R$ 23 mil reais em presentes. A Justiça do DF determinou que ele devolva esse valor à vítima e, ainda, pague danos morais. [s.l]: Migalhas, 2022. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/quentes/357795/vitima-de-estelionato-sentimental-recebera-indenizacao-de-ex-parceiro. Acesso em 28 de out de 2022.

Atualizado em: 29/3/2022 14:33


 https://www.migalhas.com.br/depeso/362593/estelionato-sentimental-o-amor-mais-liquido-do-que-nunca

sexta-feira, 1 de abril de 2022

Peça Profissional - Ações possessórias (gabarito ao final)

Aline é proprietária de uma pequena casa situada na cidade de São Paulo, residindo no imóvel há cerca de 5 anos, em terreno constituído pela acessão e por um pequeno pomar. Pouco antes de iniciar obras no imóvel, Aline precisou fazer uma viagem de emergência para o interior de Minas Gerais, a fim de auxiliar sua mãe que se encontrava gravemente doente, com previsão de retornar dois meses depois a São Paulo. Aline comentou a viagem com vários vizinhos, dentre os quais, João Paulo, Nice, Marcos e Alexandre, pedindo que “olhassem” o imóvel no período.

Ao retornar da viagem, Aline encontrou o imóvel ocupado por João Paulo e Nice, que nele ingressaram para fixar moradia, acreditando que Aline não retornaria a São Paulo. No período, João Paulo e Nice danificaram o telhado da casa ao instalar uma antena “pirata” de televisão a cabo, o que, devido às fortes chuvas que caíram sobre a cidade, provocou graves infiltrações no imóvel, gerando um dano estimado em R$ 6.000,00 (seis mil reais). Além disso, os ocupantes vêm colhendo e vendendo boa parte da produção de laranjas do pomar, causando um prejuízo estimado em R$ 19.000,00 (dezenove mil reais) até a data em que Aline, 15 dias após tomar ciência do ocorrido, procura você, como advogado.


Na qualidade de advogado(a) de Aline, elabore a peça processual cabível voltada a permitir a retomada do imóvel e a composição dos danos sofridos no bem.


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Obs.: a peça deve abranger todos os fundamentos de Direito que possam ser utilizados para dar respaldo à pretensão. A simples menção ou transcrição do dispositivo legal não confere pontuação.

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Gabarito


EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DE UMA DAS VARAS CÍVEIS DO FORO DA COMARCA DE SÃO PAULO/SP


(5 linhas)


ALINE, [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portadora da cédula de identidade RG n. XXX, inscrita no CPF/MF sob o n. XXX, com endereço eletrônico XXX, residente e domiciliada na Rua XXX, n. XXX, bairro XXX, cidade XXX, Estado XXX, CEP XXX, vem, respeitosamente, perante Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado, abaixo assinado (instrumento de procuração anexo), com fundamento no artigo 554 e seguintes do Código de Processo Civil, propor a presente


AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE


COM PEDIDO DE LIMINAR


pelo procedimento especial previsto no CPC, em face de JOÃO PAULO, [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portador da cédula de identidade RG n. XXX, inscrito no CPF/MF sob o n. XXX, com endereço eletrônico XXX, residente e domiciliado na Rua XXX, n. XXX, bairro XXX, cidade XXX, Estado XXX, CEP XXX, e NICE, [nacionalidade], [estado civil], [profissão], portadora da cédula de identidade RG n. XXX, inscrita no CPF/MF sob o n. XXX, com endereço eletrônico XXX, residente e domiciliada na Rua XXX, n. XXX, bairro XXX, cidade XXX, Estado XXX, CEP XXX, pelas razões de fato e de direito abaixo aduzidas.


I. SÍNTESE DOS FATOS


A autora é proprietária de um pequeno imóvel situado na cidade de São Paulo, residindo nele há 5 anos, em terreno constituído pela acessão e por um pequeno pomar.


Pouco antes de iniciar obras no imóvel, a autora fez uma viagem de emergência para o interior de Minas Gerais, a fim de auxiliar sua mãe, que se encontrava gravemente doente, com previsão de retornar dois meses depois a São Paulo. Na ocasião, a autora comentou sobre a viagem com vários vizinhos, dentre os quais os réus, João Paulo e Nice, pedindo que “olhassem” o imóvel no período.


Ao retornar da viagem, no entanto, a autora foi surpreendida com a notícia de que seu imóvel estava ocupado exatamente por João Paulo e Nice, que nele ingressaram para fixar moradia, acreditando que a autora não retornaria a São Paulo.


Nesse período, os réus danificaram o telhado da casa, ao instalar uma antena “pirata” de televisão a cabo, o que, devido às fortes chuvas que caíram sobre a cidade, provocou graves infiltrações no imóvel, gerando um dano estimado em R$ 6.000,00 (seis mil reais). Além disso, os ocupantes vêm colhendo e vendendo boa parte da produção de laranjas do pomar, causando um prejuízo estimado em R$ 19.000,00 (dezenove mil reais) até a presente data.


Assim, a autora serve-se da presente medida judicial, a fim de ser restituída na posse de seu imóvel, bem como indenizada pelos prejuízos causados pelos réus no período.


É o necessário relato dos fatos


II. DO CABIMENTO DA AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE


De acordo com o art. 560 do CPC e o art. 1.210 do CC, o possuidor tem direito a ser restituído na posse do imóvel, no caso de esbulho, mediante a propositura da ação de reintegração de posse. É o que se tem no caso concreto, em que a autora simplesmente perdeu a sua posse, em razão do esbulho pelos réus.


O art. 558 do CPC determina que a referida ação será regida pelo procedimento especial. Além disso, há possibilidade de liminar, contanto que seja proposta dentro de ano e dia da data do esbulho (art. 562 do CPC).


Logo, a presente ação é cabível e será regida pelo procedimento especial, considerando que foi proposta muito antes desse prazo de ano e dia, em verdade tendo sido ajuizada apenas 15 (quinze) dias após a ciência do esbulho por parte da autora.


III. DO DIREITO: DEVOLUÇÃO DA POSSE E INDENIZAÇÃO


Conforme já exposto, a autora detinha a posse do imóvel, atualmente ocupado pelos réus, até sua viagem de emergência ao Estado de Minas Gerais, que foi comunicada a vários vizinhos − fato que pode ser comprovado por meio da oitiva das testemunhas, em observância ao art. 561 do CPC.


Os réus, em conduta pautada por evidente má-fé e que, portanto, não merece qualquer guarida do Poder Judiciário, dispuseram da informação sobre a viagem da autora de forma mal-intencionada, ocupando o imóvel em sua ausência.


Assim, resta caracterizada a posse clandestina dos réus e, por consequência, injusta, nos termos do art. 1.200 do CC, sendo medida de rigor a restituição da posse do imóvel à autora.


Mas não é só.


Como se não bastasse o esbulho, ainda foram causados diversos danos à autora, cabendo, por certo, a respectiva indenização, sendo que a lei processual permite a cumulação do pedido com o de proteção possessória (CPC, art. 555).


Nesse sentido, a autora tem direito à indenização pelos danos decorrentes das graves infiltrações no imóvel, causadas pela instalação da antena “pirata” de televisão a cabo, bem como pelos frutos colhidos do pomar e percebidos pelos Réus no período, por força dos arts. 1.216 e 1.218 do CC.


Diante do exposto, com base nos arts. 560 e 555, I e II, do CPC, não restam dúvidas acerca do direito da autora à restituição da posse do imóvel e à indenização pelos danos causados ao imóvel e pelos frutos percebidos.


IV. DA CONCESSÃO DA LIMINAR POSSESSÓRIA


Nos termos do art. 562 do CPC, instruída a petição inicial com a prova de que a posse esbulhada é nova, o magistrado determinará a expedição do mandado liminar de reintegração, sem ouvir o réu.


No presente caso, resta comprovada a posse anterior da autora, bem como o esbulho praticado pelos réus, em período inferior a um ano e um dia, conforme exigido pelo art. 558 do CPC.


Sendo assim, presentes os requisitos para concessão da medida liminar, requer a expedição do mandado liminar de reintegração, inaudita altera parte, de modo que a autora seja reintegrada provisoriamente na posse do imóvel.


Subsidiariamente, caso V. Exa. assim não entenda – o que somente se admite para argumentar –, requer a designação de audiência de justificação (CPC, art. 562, parte final).


V. DOS REQUERIMENTOS E DOS PEDIDOS


Diante do exposto, a autora requer seja deferida a medida liminar pleiteada, determinando-se a expedição do mandado liminar de reintegração de posse e, ao final, seja confirmada a liminar, julgando-se procedente o pedido da presente demanda.


Caso V. Exa. não entenda possível a concessão da liminar de plano, requer a designação de audiência de justificação, nos termos dos arts. 562 e 563 do CPC, com a oitiva de testemunhas, conforme rol anexo.


Ainda, pede e requer:


(i) a citação dos réus para que apresentem contestação no prazo legal, sob pena de revelia;


(ii) sejam os réus condenados ao pagamento de indenização à Autora: 1) pelos danos materiais causados ao imóvel, no valor de R$ 6.000,00 (seis mil reais), e 2) pelos frutos colhidos percebidos, no valor de R$ 19.000,00 (dezenove mil reais); e


(iii) com a procedência da presente ação e consequente reintegração definitiva da autora ao imóvel, sejam os réus condenados ao pagamento dos ônus de sucumbência.


Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente a produção de prova pericial para demonstração dos danos causados à propriedade da autora.


Em atendimento ao disposto no art. 319, VII, do CPC, a autora informa que há / não há interesse na designação de audiência de conciliação.


Dá-se à causa o valor de R$ XXX, correspondente à soma dos pedidos indenizatórios (R$ 25,000,00) e do valor venal do imóvel.


Nestes termos,


Pede deferimento.


Local, data.


ADVOGADO


OAB n. XXX