Não se trata da consciência da prática de nenhum ato contrário ao Direito (boa-fé subjetiva), mas sim, da lealdade e da cooperação entre as pessoas envolvidas nas relações obrigacionais. Deste modo, sua essência resume uma regra de comportamento e atitudes que serão valorados de acordo com os parâmetros da lealdade, da probidade e da honestidade, ou seja, estabelecendo procedimentos éticos mínimos de comportamento.
1) Função Ativa – a boa-fé impõe deveres anexos ou laterais, diferentes da prestação principal. Como se percebe esses deveres? O Código Civil não os elencou. A doutrina é unânime em dizer que eles existem:
- Dever de segurança - garantir a incolumidade física do outro contratante;
- Dever de informação – mesmo que as informações prestadas lhe causem prejuízo;
- Dever de cooperação – as partes devem se ajudar mutuamente para atingir o resultado do contrato. Conseqüência do descumprimento desses deveres: pagamento de perdas e danos.
2) Função reativa – uso da boa-fé como defesa.
- “Tu quore” – quem faz o que devia pode exigir da parte contrária que faça a sua parte. Vide art. 476, CC
- “Venire contra factum proprium” – voltar-se contra as minhas próprias atitudes. Vide art. 330, CC.
“Alienação fiduciária. Busca e apreensão. O cumprimento do contrato de financiamento, com a falta apenas da última prestação, não autoriza o credor a lançar mão da ação de busca e apreensão, em lugar da cobrança da parcela faltante. Não atende à exigência da boa-fé-objetiva a atitude do credor que desconhece esses fatos e promove a busca e apreensão, com pedido liminar de reintegração de posse” (STJ, REsp 272.739-MG, 4ª T., rel. Min. Rosado de Aguiar, DJU, 2-4-2001).
Alinne Novais (2001, 78-9) citando Cláudia Lima Marques, expõe segundo esta autora a dupla função assumida pela boa-fé objetiva na nova teoria contratual:
1) “Como fonte de novos deveres especiais de conduta durante o vínculo contratual”. São citados como exemplo os deveres de informação; aviso e esclarecimento; de segredo e omissão, entre outros.
2) “Como causa limitadora do exercício, antes lícito, hoje abusivo, dos direitos subjetivos”, que “nada mais expressa do que a obediência ao mandamento constitucional de que o contrato cumpra sua função social”.
Abre, pois, um enorme campo para revisão judicial dos contratos, relegando a segundo plano a autonomia da vontade, pois, como cláusula geral do contrato, a boa-fé objetiva, busca alcançar o fim do contrato.
O legislador dispôs no art. 422 do CC que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé. A respeito desta disposição legal, procede a observação de Caio Mário (2003, 20) acerca do esquecimento legislativo dos períodos pré e pós-contratual, “dentro dos quais o princípio da boa-fé tem importância fundamental para a criação de deveres jurídicos para as partes, diante da inexistência nessas fases de prestação a ser cumprida”. Diante de tal esquecimento entende este jurista que cabe interpretação extensiva da norma “para abranger também as situações não expressamente referidas, mas contidas no seu espírito”.
Enunciado 24 CSJF: em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa.
Enunciado 25 CSJF: o art. 422 do Código Civil não inviabiliza a aplicação, pelo julgador, do princípio da boa-fé nas fases pré e pós-contratual.
Enunciado 26 CSJF: a cláusula geral contida no art. 422 do novo Código Civil impõe ao juiz interpretar e, quando necessário, suprir e corrigir o contrato segundo a boa-fé objetiva, entendida como a exigência de comportamento leal dos contratantes.
Enunciado 27 CSJF: na interpretação da cláusula geral da boa-fé, deve-se levar em conta o sistema do Código Civil e as conexões sistemáticas com outros estatutos normativos e fatores metajurídicos.
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