Todos os contratos têm uma finalidade precípua que é sua razão de existir. Quando tal finalidade não é atendida, deve o contrato ser revisto, mesmo contrário a pacta sunt servanda. Se determinada pessoa aluga um imóvel com a finalidade de nele instalar uma oficina mecânica em área onde é permitido seu funcionamento e, posteriormente, a municipalidade vem a proibir a existência deste tipo de prestação de serviços naquela zona urbana, o contrato celebrado perde sua finalidade e deve ser revisto.
Mas, não só devem ser revistos os contratos por "fato do príncipe". Até mesmo pelas mudanças durante sua execução, desde que impossibilite atingir sua finalidade. Nos "contratos de galonagem" celebrado entre distribuidoras e revendedores de combustível, quando o preço fica exorbitante e não permite a concorrência com outros revendedores, também. A finalidade da aquisição é a revenda de combustíveis e se os preços praticados pela distribuidora impossibilita sua revenda, nas condições da concorrência, torna-se imperiosa sua revisão, por inadequação ao princípio da finalidade do contrato.
Na revisão do contrato entra o chamado princípio da equivalência material que busca realizar e preservar o equilíbrio real de direitos e deveres no contrato, antes, durante e após sua execução, para harmonização dos interesses. Esse princípio preserva a equação e o justo equilíbrio contratual, seja para manter a proporcionalidade inicial dos direitos e obrigações, seja para corrigir os desequilíbrios supervenientes, pouco importando que as mudanças de circunstâncias pudessem ser previsíveis. O que interessa não é mais a exigência cega de cumprimento do contrato, da forma como foi assinado ou celebrado, mas se sua execução não acarreta vantagem excessiva para uma das partes e desvantagem excessiva para outra, aferível objetivamente, segundo as regras da experiência ordinária. O princípio clássico pacta sunt servanda passou a ser entendido no sentido de que o contrato obriga as partes contratantes nos limites do equilíbrio dos direitos e deveres entre elas.
O princípio da equivalência material rompe a barreira de contenção da igualdade jurídica e formal, que caracterizou a concepção liberal do contrato. Ao juiz estava vedada a consideração da desigualdade real dos poderes contratuais ou o desequilíbrio de direitos e deveres, pois o contrato fazia lei entre as partes, formalmente iguais, pouco importando o abuso ou exploração da mais fraca pela mais forte.
O princípio da equivalência material desenvolve-se em dois aspectos distintos: subjetivo e objetivo. O aspecto subjetivo leva em conta a identificação do poder contratual dominante das partes e a presunção legal de vulnerabilidade. A lei presume juridicamente vulneráveis o trabalhador, o inquilino, o consumidor, o aderente de contrato de adesão. Essa presunção é “absoluta”, pois não pode ser afastada pela apreciação do caso concreto. O aspecto objetivo considera o real desequilíbrio de direitos e deveres contratuais que pode estar presente na celebração do contrato ou na eventual mudança do equilíbrio em virtude de circunstâncias supervenientes que levem a onerosidade excessiva para uma das partes.
Atenção para o fato de que “questões meramente subjetivas do contratante não podem nunca servir de pano de fundo para pretender uma revisão nos contratos. A imprevisão deve ser um fenômeno global, que atinja a sociedade em geral, ou um segmento palpável de toda essa sociedade. É a guerra, a revolução, o golpe de Estado, totalmente imprevistos” (Sílvio Venosa, 2003, 463).
CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - Pode o comprador pleitear rescisão do contrato por impossibilidade do pagamento das prestações em face de os reajustes destas superarem os aumentos do seu salário. Inaplicabilidade, contudo, da teoria da imprevisão. Rescindido o contrato por motivo imputável ao comprador, as partes são restituídas ao estado anterior, perdendo este o sinal dado. Nulidade da cláusula contratual das perdas das prestações pagas. É nula a cláusula do contrato que prevê a perda, por parte do comprador, em favor do vendedor, de toda a quantia paga como pagamento do preço da venda. Incidência do art. 53 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078 de 11.09.90). Ilicitude do objeto por propiciar enriquecimento sem causa. Aplicação dos arts. 82 e 145 do Código Civil. A restituição das partes ao estado anterior implica, para o comprador, na perda do sinal dado e na entrega ou devolução do imóvel e, para o vendedor, na devolução de todas as quantias recebidas corrigidas monetariamente, de uma só vez. (TJDF - Ac. 34.595-DF - (Reg. Ac. 81.275) - 1ª T. - Rel. Des. Jerônimo de Souza - DJU 07.02.96)
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