Daqui a exatas duas semanas, em 1º de março, passa a vigorar nova redação dos incisos III, IV e V do artigo 37 do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, de modo que ações de merchandising ou publicidade indireta direcionadas a crianças serão condenadas.
Acerca das alterações no código, o advogado José Eduardo Maya Ferreira, especialista em Direito da Publicidade e sócio do escritório Osorio e Maya Ferreira Advogados, aplaude a iniciativa desde que dirigida à publicidade irresponsável e antiética, “que se valha de subterfúgios para atingir, inconsequentemente, um público que ainda não tem capacidade plena de discernimento.”
Já Isabella Henriques, diretora do Instituto Alana,
é crítica ao lembrar que, embora positiva a iniciativa no sentido de
reforçar o impacto da discussão sobre o tema, o merchandising voltado ao
público infantil já é proibido pelo ordenamento positivado (CDC) e “ações
de merchandising raramente são repetidas o que faz com que o Conar não
tenha muito a fazer se verificar algum merchandising voltado às
crianças, mesmo porque não tem poder de polícia, não pode aplicar multa,
só poderia pedir para que seja sustada a ação. Mas se ela já não será
mesmo repetida, essa recomendação fica sem sentido.”
Proibição
O veto integral de propagandas
voltadas para crianças é um ponto divergente na opinião dos
especialistas. Maya Ferreira enaltece a via do meio termo na medida em
que hábitos saudáveis, como escovar os dentes, praticar exercícios,
tomar banho e se alimentar bem “também são incentivados pelos
anunciantes, que têm nestas atividades a sua principal fonte de receita,
sendo de seu interesse estimulá-las”. “Entendo que tachar a
publicidade infantil de vilã quando o assunto é educação infantil é
sofismar um problema que tangencia aspectos políticos e sociais, seja
por falta de investimento, estrutura, planejamento, e até mesmo de
interesse do governo, seja por um comportamento passivo, pouco efetivo e
extremamente liberal de determinados pais”, pontua.
Em contrapartida, Isabella
Henriques cita pesquisas científicas ao redor do mundo que apontam a
publicidade de alimentos com altos teores de sódio, açúcar, gorduras
saturadas e trans e de bebidas de baixo teor nutricional como fator
responsável pela obesidade infantil: “É claro que a obesidade é
multicausal e não é somente a publicidade sua responsável, mas é um
fator importante e que se não existisse reduziria consideravelmente os
índices no mundo todo. E isso acontece porque a criança é altamente
influenciável, ela realmente acredita no que a publicidade diz, e
infelizmente não existe nos meios publicidade de alimentação saudável,
só de junk food. Até por isso o mercado, representado pelas maiores
empresas do setor, fez compromissos coorporativos em todo o mundo no
sentido de que não mais fará publicidade de produtos tais como os
mencionados para crianças. A Coca-Cola chegou a comprometer-se a não
fazer qualquer tipo de comunicação mercadológica às crianças de qualquer
produto seu, mesmo dos sucos!” A preocupação da diretora do Instituto é a ausência de controle sobre o cumprimento desses chamados pledges.
Tendências globais
A comunicação mercadológica
dirigida às crianças é objeto de ampla discussão levando-se em conta seu
possível impacto no público infantil, tais como a contribuição para a
obesidade, a violência e a erotização precoce.
Em outros países o tema tem sido
tratado de diferentes formas. Na Suécia, por exemplo, não é permitida a
publicidade para menores. Na Alemanha os programas infantis não podem
ser interrompidos por publicidade e na Inglaterra o uso de efeitos
especiais que confundam as crianças são proibidos, onde também desde
2006 está proibida a publicidade de alimentos com baixo teor nutricional
na televisão em programação destinada a um público de até 16 anos de
idade.
Já nos EUA, país que atualmente
apresenta altos índices de obesidade infantil, o governo tem sofrido
grande pressão por parte de defensores dos direitos das crianças para
tornar mais rigorosas as suas regras de controle.
Avanços
Aqui no Brasil, Isabella Henriques
pontua que para o Judiciário ainda é necessária uma norma específica
sobre o tema, uma vez que o CDC e o ECA não seriam suficientes: “Por isso seria interessante que o país investisse nessa legislação mais detalhada sobre o tema”.
José Eduardo Maya Ferreira recomenda bom senso. Um exemplo citado pelo causídico: “Fabricantes
de creme dental poderiam utilizar modelos do universo infantil para
incentivar o hábito saudável de escovar os dentes. Estes mesmos
fabricantes, porém, estariam infringindo princípios básicos de
transparência e ética se usassem este mesmo modelo para afirmar que seu
produto é o melhor, ou que torna os dentes mais claros e garante a
prevenção de cáries, independentemente do consumo de açúcar”, afirma, como forma de garantir o interesse da criança, sem lhe tirar, porém, o direito de ser corretamente informada.
http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI172554,21048-Especialistas+comentam+publicidade+infantil+com+nova+regulamentacao
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