
Farias e Rosenvald ao explanarem sobre o surgimento do instituto
afirmam que: “A usucapião restou consagrada na Lei das XII Tábuas,
datada de 455 antes de Cristo, como forma de aquisição de coisas móveis e
imóveis pela posse continuada por um ou dois anos (..)” (2012, p.395).
O instituto na Lei das Doze Tábuas, dispunha na Tábua 6ª, inciso III,
que se intitula “Da propriedade e da posse”: “III – A propriedade do
solo se adquire pela posse de dois anos; e das outras coisas, pela de um
ano”.
Sendo desde então, modalidade de aquisição de bens também pela posse
continuada, porém o lapso temporal era substancialmente menor, qual
seja, entre um e dois anos.
Só poderia ser utilizada pelo cidadão romano, eis que os estrangeiros
não gozavam dos direitos preceituados nos iuscivile. Desta forma, os
romanos mantinham seus bens perante os peregrinos e podiam
reivindicá-los quando bem entendessem. (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p.395)
A priori somente o cidadão romano poderia se utilizar dessa manobra
para adquirir bens, pois os estrangeiros não tinham direitos. Porém, com
o passar dos anos, e a evolução dos direitos, que é inerente a evolução
humana, os peregrinos, que outrora não podiam gozar dos frutos do
instituto da usucapião, passaram a ter os mesmos direitos que os
cidadãos romanos.
Com o tempo, expandem-se as fronteiras do império, concedendo-se ao
possuidor peregrino que não tinha acesso à usucapião, uma espécie de
prescrição, como forma de exceção fundada na posse por longo tempo das
coisas, nos prazos de 10 e 20 anos, servindo de defesa contra ações
reivindicatórias. O legítimo dono não mais teria acesso à posse se fosse
negligente por longo prazo, mas a exceção de prescrição não implicava
perda da propriedade. (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p.395)
Passava então os peregrinos a ser brindados com os benefícios do
instituto, bastando que se mantivessem na posse pelo prazo determinado
em lei. Masembora tivessem a posse do bem e desta não pudessem mais ser
privados, preenchido o requisito temporal na posse, não se tornavam
proprietário dos bens usucapidos.
Em 528 d.C., Justiniano funde em um só instituto a usucapio e a
praescriptio, pois já não mais subsistiam diferenças entre a propriedade
civil e a pretoriana (dos peregrinos). Ambos os institutos se unificam
na usucapião, concedendo-se ao possuidor longitemporis a ação
reivindicatória para obter propriedade e não a mera exceção, que não era
capaz de retirar o domínio do proprietário. (FARIAS; ROSENVALD, 2012,
p. 396)
O instituto da usucapião sofreu modificação quando no ano de 528 d.C.,
Justiniano, o então imperador da Constantinopla,hoje Istambul, capital
da Turquia, fundiu a prescrição aquisitiva à usucapião, concedendo ao
possuidor de um bem a longo tempo a possibilidade de reivindicar também a
propriedade do mesmo.
No Brasil, a codificação influenciada pelos juristas alemães, manteve a
dualidade conceitual diferenciando a prescrição da usucapião que se
consolidava em trinta ou quarenta anos, (bens do estado, imóveis da
igreja, do imperador etc.) a depender da modalidade dos bens. Hoje, esse
lapso temporal foi reduzido substancialmente, o que se poderá averiguar
no transcurso do presente trabalho.
Embora haja uma forte ligação entre prescrição aquisitiva e usucapião, o
legislador brasileiro optou por abordar a primeira na parte geral do
Código Civil Brasileiroe a outra no Livro do Direito das Coisas.
Acerca da historicidade do referido instituto, Gonçalves (2011, p. 257)
pontua que a prescrição aquisitiva é uma instituição multissecular,
transmitida pelos romanos. E que a primeira vista, o instituto parece
ferir o direito a propriedade, pois favorece o usurpador do bem em face
do verdadeiro proprietário, permitindo que o possuidor passe a ocupar o
lugar do antigo proprietário, despojando-o do seu domínio.
Assim, a prescrição aquisitiva permite que o possuidor passe a ter o
domínio do bem usucapido, em detrimento do antigo proprietário
negligente.
A propriedade, embora seja perpétua, não pode conservar este caráter
senão enquanto o proprietário manifestar a sua intenção de manter o seu
domínio, exercendo uma permanente atividade sobre a coisa possuída; a
sua inação perante a usurpação feita por outrem, durante 10,20 ou 30
anos, constitui uma aparente e tácita renúncia ao seu direito. De outro
lado, à sociedade interessa muito que as terras sejam cultivadas, que as
casas sejam habitadas, que os móveis sejam utilizados; mas um indivíduo
que, durante largos anos, exerceu esses direitos numa coisa alheia,
pelo seu dono deixada ao abandono, é também digno de proteção.
Finalmente, a lei faculta ao proprietário esbulhado o exercício da
respectiva ação para reaver a sua posse; mas esta ação não pode ser de
duração ilimitada, porque a paz social e a tranqüilidade das famílias
exigem que os litígios cessem desde que não foram postos em juízo num
determinado prazo. (GONÇALVES, 2011, p. 257-258 apud Cunha Gonçalves, Da
propriedade e da posse, p. 207-208)
Permitir que o proprietário do bem pudesse reaver a posse do mesmo a
qualquer tempo, muito embora tenha se mantido inerte durante a ocupação
de seu bem por outrem num lapso temporal razoável, seria imputar um ônus
a quem imprimiu ao bem usucapido a real finalidade dele.
Neste sentido de dar ao bem a finalidade social, é que o instituto
aparece como uma forma célere de garantir ao possuidor a longo tempo, a
propriedade do bem no qual manifestou sua vontade de ser dono ao
utilizá-lo para sua moradia e de sua família, ou nos casos dos imóveis
rurais, onde passou por largos anos tornando aquelas terras
anteriormente abandonadas, terras produtivas.
O fundamento da usucapião está assentado, assim, no princípio da
utilidade social, na conveniência de se dar segurança e estabilidade à
propriedade, bem como de se consolidar as aquisições e facilitar a prova
do domínio. Tal instituto, segundo consagrada doutrina, repousa na paz
social e estabelece a firmeza da propriedade, libertando-a das
reivindicações inesperadas, corta pela raiz um grande número de pleitos,
planta a paz e a tranqüilidade na vida social: tem aprovação dos
séculos e o consenso unânime dos povos antigos e modernos (GONÇALVES,
2011, p. 258 apud Orlando Gomes, Direitos Reais, p. 187-188)
Como acima indicado, a usucapião faz valer o princípio da utilidade
social, e ainda, faz prevalecer a paz social, inibindo o antigo
proprietário desidioso a reivindicar o bem que por tanto tempo deixou ao
léu.
Sobre o instituto da prescrição, Farias e Rosenvald (2012, p. 399-400)
ensinam ainda que a prescrição é forma de neutralizar as pretensões
obrigacionais que existem, por conta da inércia do titular da
propriedade através do direito subjetivo que se estabelece no tempo.
Enquanto prescrição aquisitiva implica extinção da pretensão, em face
do não exercício de certo direito, diante de um decurso temporal, a
usucapião é modo de aquisição de propriedade em decorrência de o
usucapiente se manter na posse do imóvel negligenciado pelo dono de
direito.
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