sábado, 4 de fevereiro de 2012

9 mentiras sobre dinheiro que podem arruinar seu casamento

02/02/2012 | Fonte: Exame.com
São Paulo - Sinceridade e confiança são pré-requisitos para um casamento sadio. Mas quando se fala em traição, nem sempre se trata de infidelidade sexual ou afetiva. Existe outro tipo de traição que pode arruinar um relacionamento: a infidelidade financeira.

Às vezes, para evitar brigas, os casais mentem ou omitem informações financeiras do parceiro. Mas o tiro pode sair pela culatra. Quando a verdade é revelada, o casamento pode entrar em xeque. Em relações onde a confiança não mais existe, as enganações podem ser ainda piores. Não são incomuns os casos de pessoas que tentam blindar o patrimônio por meio da abertura de empresas ou de contas secretas para não terem de dividir os bens em caso de divórcio.

Para evitar esse tipo de constrangimento, os casais podem lançar mão de pactos pré e até pós-nupciais que mudem o regime de bens para "separação total", em que cada um é dono do que é seu e nada é partilhado em caso de divórcio (saiba mais sobre os regimes de divisão de bens). Mas para isso, é preciso haver confiança, diálogo e acordo de ambas as partes.

A mentira é sempre o pior caminho para manter, salvar ou mesmo sair dignamente de uma relação. Mesmo as menores mentiras podem minar a confiança e destruir toda a base sobre a qual é construído o relacionamento. Casamentos são contratos e cada cônjuge deve se ver como uma empresa que se fundiu com outra - manter a transparência é fundamental para o bom andamento das finanças da família. Veja a seguir nove mentiras sobre dinheiro que podem acabar com o seu casamento:

1. "Ah, esta blusa? Foi presente": esconder gastos e dívidas
Não são poucos os casamentos que acabam devido à incompatibilidade financeira - em que um dos cônjuges é gastador e o outro é contido. Esconder gastos entra no rol das mentiras financeiras irritantes que deterioram uma relação. Algumas pessoas compram por impulso, gastam muito dinheiro com bobagens e se tornam até gastadoras compulsivas, o que pode levar a família ao endividamento.

No início, são pequenas mentiras: esconder o novo jogo de videogame, dizer que tem aquele par de sapatos há anos, que a blusa nova foi um presente ou que o gadget foi comprado em uma liquidação. Com o tempo, as dívidas podem se multiplicar e se tornar impagáveis. Há quem faça dívidas e não conte para o cônjuge - uma bomba que só vai estourar lá na frente, quando as finanças da família estiverem completamente comprometidas. Em última instância, são os herdeiros que vão ter que pagar essa conta.

2. "Foi apenas uma cervejinha com os amigos": nutrir um vício escondido
Na mesma linha, mas mais grave, estão as compulsões secretas. Além de serem problemas sérios de saúde, vícios podem destruir uma família, inclusive financeiramente. Em especial quando há mentiras envolvidas. Quem joga, usa drogas, bebe álcool ou mesmo gasta compulsivamente tende a esconder do outro enquanto sangra as finanças da família. Quando se tem um problema dessa natureza e o casamento ainda tem salvação, o melhor é se abrir com o cônjuge e pedir ajuda.

3. "Está tudo bem no trabalho": esconder um revés financeiro
Por incrível que pareça, há quem perca o emprego ou sofra algum outro revés financeiro e esconda isso do parceiro, fingindo que ainda trabalha normalmente. "Por uma questão de ego, a pessoa não consegue reduzir o padrão de vida e continua gastando, pois não quer deixar faltar nada em casa. Quando se vê obrigado a contar, a situação da família já foi para o buraco", diz André Massaro, especialista em finanças pessoais da consultoria MoneyFit.

4. "Que tia rica?": negar ter um parente abastado
Negar ser herdeiro de alguém de posses não só representa uma quebra de confiança como pode ser desnecessário se o medo for dividir a herança com o cônjuge em caso de divórcio. Heranças não são comunicáveis, ou seja, não são partilháveis no regime de comunhão parcial. Só é preciso dividir os frutos dessa herança - aluguéis, valorização de imóvel ou rendimentos de aplicações que ocorrerem após o recebimento da herança e ainda na vigência do matrimônio.

5. "Você é única na minha vida": manter uma segunda família com a amante
Embora a extensão da traição já seja motivo suficiente para terminar um casamento, manter uma família paralela às escondidas é um tremendo problema financeiro. A quantia destinada à amante e aos filhos bastardos pode começar a fazer falta, levando a esposa a descobrir a traição.

Manter uma segunda família não é crime. Mas em caso de divórcio da esposa "oficial" e não oficialização da relação com a outra, os problemas serão dobrados. "O homem vai ter que dividir o patrimônio. Ou divide em dois, e dá a sua parte para a parceira não oficial, ou divide em três. Já há jurisprudência para os dois casos", afirma Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

6. "Você sabe exatamente quanto eu ganho": esconder o valor real dos rendimentos
Alguns cônjuges mentem para o outro a respeito do quanto ganham, ou escondem o recebimento de um bônus, de um aumento ou mesmo a entrada de um dinheiro extra, no caso de um trabalho como freelance, por exemplo. Quem faz isso normalmente quer manter uma quantia só para si, seja para gastos "inocentes", como um novo gadget, seja para despesas "escusas". É o chamado "caixa 3". "No meio jurídico, chamamos informalmente de caixa 3 aquela quantia que um cônjuge esconde do outro", diz Rodrigo Pereira.

7. "Tudo que é meu é seu": manter uma conta secreta
O dinheiro do caixa 3 pode ser destinado a uma conta ou uma aplicação mantida em segredo do outro cônjuge. Quem faz isso geralmente quer impedir o acesso do restante da família ao "seu" dinheiro, principalmente se não confiar nos parentes quando o assunto é finanças. Mas há quem faça isso para tentar proteger parte do patrimônio em caso de divórcio.

Além de já ser uma tremenda quebra de confiança, manter uma conta às escondidas é também inútil em caso de separação. Se a conta estiver em território nacional, pode ser facilmente descoberta. Caso o regime de bens do casal seja comunhão parcial de bens e os recursos da conta tiverem sido gerados após o matrimônio, não vai ter jeito: os dois vão ter que dividir. Se a conta for anterior ao casamento, pelo menos os rendimentos gerados após o matrimônio deverão ser divididos.

"Se a pessoa não quer ter de dividir nenhum centavo, é simples. Basta pedir a separação total de bens antes de casar", diz Pereira. Mesmo um pacto pós-nupcial, feito após o casamento, pode modificar o regime de bens para a separação total. Mas para fazer isso, é preciso que haja sinceridade e acordo entre os membros do casal.

8. Primeiro é "meu bem", depois "meus bens": esconder o patrimônio atrás de um CNPJ
Há aqueles que, na iminência de um divórcio, se antecipam ao processo e começam a "esconder" seus bens pessoais atrás de um CNPJ. Abrem uma empresa e transferem para lá boa parte do seu patrimônio, na tentativa de impedir que a quantia entre na partilha. Também há como fazer isso usando um tipo de plano de previdência privada chamado Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL), em que o investimento fica em nome da seguradora e não do beneficiário.

De acordo com Rodrigo Pereira, essa estratégia é uma "mentira instituída", pois se utiliza de um mecanismo legal. Os bens que estão em nome de uma pessoa jurídica não podem entrar numa partilha de divórcio. Mas embora seja legal abrir uma empresa para administrar seus próprios bens - em muitos casos, há vantagens tributárias -, a tentativa de ocultá-los da partilha pode ser caracterizada como fraude. Se detectada, não haverá consequências criminais, mas os bens deverão ser partilhados de qualquer forma.

9. "Tudo que eu tenho está no Brasil": manter uma conta ou empresa no exterior
Há quem sofistique a fraude e esconda o patrimônio em uma conta ou empresa aberta no exterior. Nesse caso, é bem mais difícil descobrir a fraude, embora não seja impossível. As implicações são as mesmas - o patrimônio terá que ser dividido. "Se a atitude for caracterizada como de má fé é possível fazer o que se chama de desconsideração da personalidade jurídica", diz Pereira.

Direito de Família no Oscar

01/02/2012 | Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM
Um divórcio em uma sociedade marcada pelo conservadorismo. Esse é o fio condutor do filme iraniano A Separação, dirigido por Asghar Farhadi, que concorre ao Oscar na categoria filme estrangeiro.

No longa, Simin, interpretada pela atriz Leila Hatami, quer deixar o país com sua filha para que a garota não cresça no Irã. Porém, seu marido Nader, vivido pelo ator Peyman Moaadi, não concorda em acompanhar a esposa já que seu pai é um idoso que sofre de Alzheimer em estágio avançado e precisa de seus cuidados. De maneira inusitada, Simin não desiste de seus planos e pede o divórcio que é concedido pelo marido. 

Os conflitos familiares não acabam com a separação. Com a ausência da ex-mulher, que cuidava de seu pai, Nader se vê obrigado a contratar uma diarista grávida, sem o consentimento do marido, para ficar com seu pai enquanto ele trabalha. A partir daí, um incidente une as duas famílias que vão viver uma trama recheada de aspectos morais e religiosos. 

Mais histórias de família - A película americana Os Descendentes, do diretor Alexandre Payne, também discute questões relacionadas ao Direito de Família. O longa concorre a cinco estatuetas de ouro: melhor filme, melhor diretor, melhor ator, melhor roteiro adaptado e melhor edição.  

O filme traz a história de uma família imersa em uma crise. A mãe Elizabeth (interpretada pela atriz Patrícia Hastie) está em coma devido a um acidente de barco e o pai Matt King (vivido por George Clooney) se vê obrigado a assumir o controle da família. Até então Matt era um marido indiferente e não tinha um bom convívio com suas filhas, mas a ausência de Elizabeth faz com que ele tente retomar esses laços afetivos. Além do resgate dos laços familiares, Matt tem que enfrentar a difícil decisão de vender um bem de família.

Os dois filmes já estão em cartaz no Brasil e a cerimônia de entrega do Oscar acontece no dia 26 de fevereiro.

Comentários (1) | comente esta matéria
A Separação, os descendentes e importantes questões de família.rnMais do que direito de família no Oscar, a partir desses filmes indicados pela Academia para o prêmio máximo do cinema, temos exemplos de diversidade de famílias e a complexidade da normatização (legal e extra-legal) de suas constituições.rnO filme iraniano (que antes de mais nada é uma obra de arte, simples e profunda) é todo intermediado por aspectos sociais e religiosos que, aparentemente sem interferência nas normas legais, antecedem estas na forma como as famílias se constituem, se mantêm, estabelecem suas relações e, ainda, se desfazem e levam - ou não - seus conflitos para o contexto jurídico.rnNa nossa sociedade essas normas, que antecedem os códigos e leis, e são fundadas na tradição, não apresentam mais a mesma força na regulação de comportamentos que ainda mantêm na sociedade iraniana.rnExatamente por esta distinção me parece ser um filme que deve obrigatoriamente ser visto e, se possível, debatido por todos operadores do Direito de Família. rnMinha sugestão se fundamenta justamento pelo fato de retratar relações familiares de uma sociedade totalmente distinta da nossa, pois é a partir do confronto com o diferente, especialmente se o confronto for despido de preconceito, que podemos refletir de forma mais adequada sobre nossa realidade.rnDepois de mais de duas décadas atendendo famílias em litígio judicial, este filme me foi uma grande lição, ajudando a refletir mais um pouco sobre a complexidade das famílias que atendo, sua complexidade intrageracional, as questões de gênero e a inserção dos filhos no conflito dos pais.rnSem querer tirar o encanto e a surpresa de quem se dispuser a assistir a obra de Asghar Farhadi, sugiro atenção às poucas - mas (desculpem-me o trocadilho) magistrais falas do juiz, e ao supreendente desfecho envolvendo a menina. rnA minha sensação, quando a película terminou, é que, plageando outro filme recente que também fala de família, "precisamos falar [mais] sobre" esta adolescente )e as nossas crianças e adolescentes) em sua relação com o contexto jurídico quando os pais se .rnO segundo filme, "Os descendentes", fala de uma organização familiar bem similiar à nossa, mas também coloca questões que ainda me parecem devam ser mais trabalhadas em nos nossos estudos: por um lado, a morte e os conflitos que ela - ou sua proximidade - trazem para o grupo familiar; por outro lado, o amadurecimento precoce - e por vezes danoso - dos filhos que são defrontados com algumas atitudes dos adultos com as quais não estão preparados para lidar.rnFelizmente os filmes em muitos casos são mais do que diversão, emoção ou, em alguns casos, deleite estético. São obras de arte que nos tiram da zona de conforto do dado e sabido, nos desconfortam e desacomodam, instigando a novos pensares.
Denise Duarte Bruno | 03.02.2012 13:10

Ainda há juízes em Brasília (Miguel Reale Júnior)

Quinta-feira o Supremo Tribunal Federal (STF), pelo apertado placar de 6 a 5, decidiu manter a competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) - órgão composto por nove representantes do Judiciário e seis alheios à carreira, sendo dois advogados, dois promotores, um membro indicado pela Câmara dos Deputados e outro pelo Senado - para diretamente receber, conhecer e julgar reclamações contra magistrados por descumprimento de deveres funcionais.

Rejeitou-se pedido da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), acolhido pelos cinco votos perdedores, segundo os quais o CNJ só deveria atuar em caso de falhas das corregedorias dos tribunais. Assim, por este entendimento só poderia o CNJ apurar a falta funcional dos magistrados de forma subsidiária, quando os tribunais agissem com simulação investigativa, com inércia. Duas razões motivaram a maioria dos ministros em sentido contrário, reconhecendo o poder originário, e não subsidiário, do CNJ de julgar reclamações: a clareza da Constituição e o ranço corporativista de muitos tribunais em favor de seus membros.

Lembro as manifestações de alguns ministros: para a estreante Rosa Weber, a competência do CNJ é originária e concorrente, e não meramente supletiva e subsidiária, sob pena de retirar a própria finalidade do controle a ele conferido; para Cármen Lúcia, a competência constitucionalmente estabelecida é primária e se exerce concorrentemente com a dos tribunais; observou Joaquim Barbosa que quando as decisões do conselho passaram a expor situações escabrosas no seio do Poder Judiciário nacional veio essa insurgência súbita, essa reação corporativista; segundo Gilmar Mendes, até as pedras sabem que as corregedorias estaduais não funcionam quando se trata de investigar os próprios pares.

Efetivamente, o texto constitucional é claro: o artigo 103B, § 4.º, III, atribui ao CNJ "receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário (...) sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais", indicando haver competência concorrente, e não subsidiária, com os tribunais. Além do mais, o poder de rever decisões dos tribunais é matéria do inciso V, com técnica legislativa a mostrar haver a regulação de duas matérias diversas: investigar reclamações diretamente e rever decisões dos tribunais.

Mais evidente ainda fica o poder de o CNJ receber reclamações diretamente ao se especificar, no inciso I do § 5.º do artigo 103B, como atribuição do corregedor desse órgão "receber as reclamações e denúncias, de qualquer interessado, relativas aos magistrados e aos serviços Judiciários". Soma-se, também, o disposto no § 7.º do mesmo artigo 103B: "A União, inclusive no Distrito Federal e nos Territórios, criará ouvidorias de justiça, competentes para receber reclamações e denúncias de qualquer interessado contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, ou contra seus serviços auxiliares, representando diretamente ao Conselho Nacional de Justiça".

Deflui, portanto, da Constituição o poder de qualquer interessado representar diretamente ao CNJ por via da sua Ouvidoria. Esta constitui o canal de comunicação com a sociedade, pelo qual o cidadão reclama, denuncia, elogia. Diante da exatidão do texto constitucional, foi impossível para a maioria do STF reconhecer que ao CNJ caberia, apenas, o poder de conhecer denúncias em situações anômalas, em grau de recurso. Seria mesmo um absurdo o conselho receber diretamente e admitir denúncias, mas não ter competência para investigá-las. Se assim fosse, o CNJ viraria mero guichê de reclamações, um Poupatempo dos tribunais.

O segundo motivo que fundamentou a orientação da maioria foi o reconhecimento do corporativismo, da autoproteção de alguns tribunais, aliás, acentuado no julgamento pelo procurador-geral da República. O corporativismo desarma o jurisdicionado ante o descumprimento dos deveres funcionais pelos magistrados, tais como a proibição de nomeação de parentes, a necessidade de manter conduta irrepreensível na vida pública e particular e a obrigação de tratar com urbanidade as partes e os advogados. Comprova-se a imprescindibilidade de órgão de controle isento de corporativismo, como o CNJ, na não observância pelos tribunais do artigo 37 da Constituição, consagrador do princípio da impessoalidade.

Não bastou a Carta Magna vedar a pessoalidade: foi preciso a Lei Federal n.º 9.421/96 proibir, especificamente, o nepotismo no Judiciário. E, ainda assim, não foi suficiente: o CNJ teve de editar a Resolução n.º 7 em 2005 para vedar "a prática de nepotismo no âmbito de todos os órgãos do Poder Judiciário". Essa resolução, tão óbvia no seu conteúdo, teve anteriormente sua constitucionalidade contestada (felizmente, sem sucesso) pela mesma AMB, a demonstrar a inconformidade do corporativismo com um princípio democrático essencial. A título de exemplo, lembro que em Pernambuco, conforme pesquisa da Fundação Joaquim Nabuco, havia em outubro de 2005, mês da edição dessa resolução, 99 parentes de desembargadores comissionados no tribunal.

Malgrado tantas regras, em junho de 2009 o CNJ fez diligências no tribunal do Espírito Santo, encontrando casos de nepotismo; em 2011 a OAB representou ao CNJ em face de casos de nepotismo cruzado no Estado do Pará. Como deixar aos próprios tribunais apurar o nepotismo por eles criado? O STF, ao reconhecer a competência do CNJ para apurar quebra dos deveres funcionais dos juízes, garantiu ao Judiciário toda a credibilidade como uma instituição passível de investigação isenta. O STF consolidou a via de comunicação e de aproximação da Justiça com o povo. Ainda há juízes em Brasília, parafraseando famosa expressão de um moleiro diante do rei da Prússia, em conto de François Andrieux.

O Estado de S. Paulo - 04/02/2012

O amor acaba? (Rodrigo da Cunha Pereira)

Os dados do IBGE divulgados em 30/11/11 de que o ano de 2010 foi recorde na taxa de divórcios corre o risco de reforçar a descrença em uma conjugalidade duradoura e induzir a uma leitura equivocada de que a família brasileira não está bem. Certamente este elevado índice advém de uma demanda reprimida, cuja vazão foi dada pela mudança da legislação. A Emenda Constitucional n.º 66 de julho de 2010, facilitou e simplificou o divórcio de casais acabando com os prazos para se formalizar o fim do casamento, e extirpou do ordenamento jurídico brasileiro o inútil e anacrônico instituto da separação judicial (antigo desquite), imprimindo mais responsabilidade aos casais. Afinal, quem deve decidir sobre o fim da própria vida conjugal não é o Estado, mas o próprio casal.

O fim do casamento não significa o fim da família, mas tão somente que aquele núcleo familiar se transformou em binuclear. Também não é o fim da felicidade. Quem tem filhos tem uma responsabilidade maior com a manutenção do casamento. Mas isto não significa que se deve manter um casamento a qualquer custo. O divórcio, por mais sofrido e indesejável que seja, pode significar um ato de responsabilidade com a própria saúde. O cuidado com o casamento passa pela compreensão em distinguir desejo de necessidade. Muitas vezes o divórcio não é desejo, pois imaginava-se ficar casado para sempre. Mas torna-se necessidade em razão de determinadas circunstâncias, como, por exemplo, quando há reiterado desrespeito ou até mesmo violência doméstica. Tal necessidade se impõe para se preservar ou resgatar a própria dignidade, após tantas humilhações sofridas. Outras vezes, embora não haja necessidade de se colocar fim ao casamento, há o desejo de reconstruir uma vida nova para voltar a ser feliz. E, se não foi possível reacender o desejo com a pessoa com quem se está casado, ou vivendo em união estável, o jeito é assumir que o amor chega ao fim, criar coragem e cumprir o difícil ritual de passagem que é o divórcio.

As facilidades jurídicas para se colocar fim ao casamento trazidas pela Emenda Constitucional n.º66, ao contrário do que se pensa, vieram ajudar a preservá-lo. Na medida em que o Estado deixa de tutelar os casais, estabelecendo prazos e culpa pelo fim da conjugalidade, consequentemente imprime mais responsabilidade às pessoas pela manutenção de seus vínculos amorosos. Foi a substituição do discurso de culpa, tão paralisante do sujeito, pelo da responsabilidade. E assim pode-se refletir melhor sobre desejo e necessidade da manutenção do casamento e até mesmo sobre o porquê de sua mantença ou não.

O amor conjugal tem prazo de validade? Afinal, o que mantém um casamento, ou o que o faz acabar? Quando permitimos que nossas neuroses cotidianas se tornem maiores que o amor, elas certamente conduzirão ao divórcio. É aí que se começa a voltar o olhar para outra direção ou a interessar-se por outras pessoas. Em outras palavras, o amor acaba porque começa-se a ver os defeitos do outro, ou começa-se a enxergar e realçar os defeitos do outro porque o desejo já não está mais ali?

Apesar de todas as facilitações para se dissolver casamentos, apesar dos amores tão líquidos de nosso tempo, a conjugalidade continua possível e até melhor que antes. Mas dá trabalho! Vê-se na "Clinica do Direito", agora sem tantas amarras jurídicas, para se dissolver um casamento que uma das possibilidades de o amor conjugal vencer as neuroses e o desencantamento, é diluir o mal estar, que geralmente advém de um mal entendido, falando dele. Dizendo de outra maneira, ao invés de "engolir sapos" é melhor cortar o mal pela raiz, esclarecendo a causa do incômodo por meio do exercício da palavra, que possa ser dita e ouvida com alma, sem rancor e sem agressões. Não é fácil, mas é necessário para cuidar do amor. E nisto, temos que aprender com as mulheres, que talvez saibam mais sobre o amor que os homens. De qualquer forma, e por mais elaborações verbais que tenhamos, ainda é Platão que continua apontando o melhor caminho para tornar a conjugalidade possível: o amor para permanecer o mesmo deve mudar sempre.

Correio Braziliense - 26/12/2011