2. O Ministério Público: órgão agente e órgão interveniente
“Entre todos os ofícios judiciários, o mais árduo parece-me o do acusador público, o qual como sustentador da acusação deveria ser tão parcial quanto um advogado e, como guardião da lei, tão imparcial quanto um juiz. Advogado sem paixão, juiz sem imparcialidade: este é o absurdo psicológico em que o representante do Ministério Público, se não tiver um senso de equilíbrio especial, correrá o risco de perder a cada instante, por amor à serenidade, a generosa combatividade do defensor ou, por amor à polêmica, a apaixonada objetividade do magistrado”.
O Ministério Público exerce função ímpar no sistema jurídico brasileiro, participando da relação processual como órgão agente ou órgão interveniente. No processo penal, por ser titular exclusivo da ação penal pública, atuará, na grande maioria das vezes, como órgão agente. Quando não atuar desta maneira, nos casos de ação penal de iniciativa privada (exclusiva da vítima), deverá haver sua presença obrigatória como custus legis, nos termos do art. 45 do Código de Processo Penal.
Todavia, é o papel do Ministério Público no processo civil que vem ganhando maior relevância nos últimos tempos, principalmente após a Constituição Federal de 1988. Nossos Códigos Civil e de Processo Civil, assim como a legislação extravagante, prevêem diversos casos de atuação do Ministério Público, seja como órgão agente ou interveniente. Como órgão agente, o Ministério Público, ao propor a demanda, agirá, conforme o caso, com legitimação ordinária ou extraordinária. A legitimidade ad causam — como já visto — corresponde à pertinência subjetiva da ação e será ordinária quando exercida pelo titular da relação de direito material deduzida no processo, sendo esta a regra geral em nossa ordem jurídica. São exemplos de legitimidade ordinária do Ministério Público: a ação de nulidade de casamento e a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal (art. 129, IV, da Constituição Federal). Já a legitimidade extraordinária ocorre quando uma norma jurídica autoriza que terceiro (quanto à
relação de direito material pleiteada) proponha demanda, em nome próprio, na defesa de interesse alheio.
Há casos, então, que o Ministério Público ingressa em juízo, em nome próprio, para defender direito de outrem, como é o caso da demanda proposta em defesa do incapaz na chamada ação de investigação de paternidade, prevista na Lei nº 8.560/92, art. 2º, § 4º. Outra hipótese de legitimidade extraordinária do parquet prevista em nosso ordenamento seria para propor a ação civil ex delictu (art. 68, CPP) quando o titular do direito à reparação do dano for pobre. Contudo, parece prevalecer entendimento segundo o qual
tal artigo não foi recepcionado pela atual Constituição Federal, por ser esta considerada, agora, função atípica do Ministério Público.
O outro modo de participação do Ministério Público no processo civil é como órgão interveniente, ou custus legis, como preferem alguns autores. Destarte, o legislador prevê casos em que, embora não haja legitimidade para propor a demanda, o Ministério Público deve intervir no processo para zelar pelo correto cumprimento das normas jurídicas, participando, assim, do procedimento em contraditório na defesa dos interesses da sociedade. O Código de Processo Civil exige a presença do Ministério Público nas situações previstas no art. 82. É curial observar que o inciso III do referido artigo prevê uma ampla possibilidade de atuação do Ministério Público no processo civil (sempre que houver interesse público envolvido). Existem, ainda, outras hipóteses de intervenção do Ministério Público previstas no CPC — como os casos da participação do MP nos procedimentos de jurisdição voluntária (art. 1.105) e na ação de usucapião (art. 944) — e na legislação extravagante (ex.: mandado de segurança; art. 20 da Lei nº 1.533/51).
Problemas
1. É necessária a intervenção de órgão do Ministério Público, como custus legis, quando outro órgão do Ministério Público houver proposto a demanda? (Ex.: ação civil pública proposta pelo Ministério Público tendo no pólo passivo menor impúbere)?
2. Está o membro do Ministério Público obrigado a oferecer recurso quando intervier no processo, em razão da presença de incapaz, e a sentença foi desfavorável a esse?
3. Que sentido deve ser dado à interpretação “interesse público” prevista no art.82, III, do CPC? Deve, por exemplo, o Ministério Público ser “ouvido” em todo processo que existe interesse patrimonial da Fazenda Pública? Pode o magistrado obrigar que o membro do Ministério Público atue como órgão interveniente quando o promotor já tiver se manifestado pela ausência de interesse público?
4. Pode o Ministério Público desistir de ação de investigação de paternidade em que figure como autor (legitimidade extraordinária) se, após a instrução probatória, estiver convencido de que o réu não é pai do substituído?
5. Pode o Ministério Público (instituição) ser condenado a pagar honorários advocatícios quando, na qualidade de autor da demanda, vier a sucumbir? Em caso positivo, quem deve arcar com os referidos honorários?
6. A investigação criminal realizada diretamente pelo Ministério Publico é permitida em nosso ordenamento? Pode o membro do Parquet utilizar-se de elementos colhidos em inquérito civil para oferecer ação penal?
7. Que sanções podem ser atribuídas ao membro do Ministério Público (pessoa física) caso fique comprovado que ele ajuizou ação civil pública infundada para satisfazer interesses pessoais ou de outrem
(desvio de finalidade)?
Fonte: Apostila da FGV - Teoria Geral do Processo - Autor: Rodrigo Pereira Martins Ribeiro
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